PRESBÍTEROS-DISCÍPULOS
Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal (RN)
O Documento de Aparecida (DAp 199) afirma que “o Povo de
Deus sente a necessidade de presbíteros-discípulos: que tenham uma profunda
experiência de Deus, configurados com o coração do Bom Pastor, dóceis às
orientações do Espírito, que se nutram da Palavra de Deus, da Eucaristia e da
oração”. No parágrafo 201, acrescenta: “A primeira exigência é que o pároco
seja um autêntico discípulo de Jesus Cristo, porque só um sacerdote enamorado
do Senhor pode renovar uma paróquia. Mas, ao mesmo tempo, deve ser um ardoroso
missionário que vive o constante desejo de buscar os afastados e não se
contenta com a simples administração.”
Essas duas passagens revelam a necessidade urgente de
presbíteros que, mais do que administradores, executores de ritos e de
atividades, sejam discípulos de Jesus e missionários ardorosos do mistério do
Reino de Deus, comprometidos com a transformação da realidade à luz do
Evangelho. Mas, então, o que significa ser discípulo?
A palavra “discípulo” é comumente usada para designar um
aluno ou seguidor de uma doutrina. No contexto cristão, porém, esse conceito
vai além: o discípulo de Cristo não é alguém que apenas aprende uma doutrina e
torna-se capaz de ensiná-la, mas alguém que estabelece uma relação pessoal de
amizade profunda com o Mestre. Na antiguidade, os mestres formavam discípulos
para que aprendessem e propagassem suas ideias. Contudo, Jesus rompe com esse
paradigma. Ele não chama os discípulos para aderir a uma doutrina, ideias,
ideologia ou conjunto de leis, mas os convida a se encontrarem com Ele e
estabelecerem uma comunhão viva com Sua pessoa (DAp 131-133).
O discipulado cristão tem dois elementos essenciais: não é o
discípulo que escolhe o mestre, mas é o próprio Mestre quem escolhe seus
discípulos; além disso, os discípulos são chamados para estar com o Senhor e
participar de Sua missão (DAp 131). Quando Jesus convida os discípulos de João
Batista, “Vinde e vede” (Jo 1,39), Ele não está chamando-os para aprender uma
doutrina, mas para viver em comunhão com Ele. O discipulado, portanto, exige
uma entrega total e liberdade interior para seguir o Mestre aonde Ele for (Mt
19,16-26).
A relação entre o discípulo e Jesus é uma participação viva
no mistério de Sua relação trinitária. Na parábola da videira e dos ramos (Jo
15,1-8), Jesus descreve esse vínculo profundo. Ele não quer que sejamos apenas
servos, mas amigos e irmãos, compartilhando de Sua vida divina e da missão de
transformar o mundo. Essa amizade com Jesus transforma o discípulo, moldando
sua vida e suas motivações, de modo que ele possa fazer novas todas as coisas
(DAp 132).
Ser discípulo implica também carregar a cruz, assim como o
próprio Cristo a carregou. A esse respeito, Jesus é muito claro: “Se alguém
quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8,34). A
renúncia e o sacrifício fazem parte do caminho do discípulo (DAp 140). Em um
mundo que valoriza o prazer e a busca pelo conforto, o chamado de Jesus ao
sacrifício pode parecer estranho. No entanto, essa entrega é o que dá sentido à
vida cristã, pois é na doação de si que o discípulo encontra a verdadeira
vida.
Embora o discipulado comporte a cruz, ele também é marcado
pela profunda alegria de ter encontrado o Senhor. O Documento de Aparecida
lembra que “ser cristão não é uma carga, mas um dom” (DAp 23). A verdadeira
alegria do discípulo nasce do encontro com Jesus, que dá sentido à vida e à
missão. Essa alegria não é superficial, mas enraizada na fé, e se expressa em
cada ato de amor e serviço ao próximo (DAp 32).
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