O desgaste na vida sacerdotal
23 de outubro de 2024
Burnout: ameaça para os
sacerdotes diocesanos
De acordo com várias investigações importantes realizadas no âmbito
presbiteral, a síndrome de burnout é uma ameaça mais para os
sacerdotes diocesanos do que para os sacerdotes religiosos ou monásticos. Isso
é devido à forma como os presbíteros diocesanos com frequência desempenham seu
ministério sacerdotal, incluindo fatores como as múltiplas exigências do povo,
as condições peculiares do seu estilo de vida, a experiência da solidão em suas
paróquias e, em muitos casos, a falta de apoio social por parte das autoridades
eclesiásticas e comunitárias.
Saúde mental:
A saúde mental se refere ao estado de equilíbrio entre uma pessoa e seu meio
ambiente, de sorte que suas vivências emocionais, sociais e de trabalho lhe
permitem bem-estar e qualidade de vida. O termo “estresse” é atualmente
entendido como um estado que uma pessoa sofre frente a muitas exigências às
quais deve responder num período de tempo limitado. Quando uma pessoa se dá
conta e não dispõe de tempo suficiente para cumprir suas tarefas, começará a
experimentar sensações físicas, pensamentos e emoções desagradáveis, quadro ao
qual chamamos “estar estressado”.
As fontes de estresse: a
pressão, a frustração e o conflito.
As principais fontes de estresse são: a pressão, a frustração e o conflito. É o
caso de um sacerdote que se encontra sob muitas exigências pastorais,
experimentando pressão diante desses pedidos que não pode atender, visto que
não dispõe de tempo para fazê-lo. Então, a frustração surge quando ele sente a
necessidade do descanso e tampouco consegue obtê-lo, criando-se uma situação de
conflito diante da autoexigência de realizar tudo sem conseguir. Finalmente, as
causas de estresse são as solicitações externas junto aos pensamentos, emoções
e atitudes que exigem resposta de adaptação por parte do indivíduo.
O estresse do trabalho:
O estresse do trabalho pode ser definido como uma falta de ajuste entre as
capacidades do trabalhador e as exigências do ambiente no qual ele realiza sua
atividade laboral. É produzido quando não se obtêm o casamento adequado entre a
pessoa e o trabalho que ela realiza, quer porque as aptidões e capacidades da
pessoa não correspondem àquelas exigidas por seu trabalho, quer porque o
trabalho não satisfaz às necessidades ou expectativas do indivíduo, impedindo-o
de utilizar seus conhecimentos ou habilidades.
- Padrões
de conduta:
Certos padrões de conduta caracterizados por ambição desmedida, alta
necessidade de sucesso, impaciência, competitividade e sensação de urgência,
tudo isso classificado como padrões de conduta “tipo A”, segundo a décima
edição da Classificação Internacional de Enfermidades (CIE 10). O padrão de
conduta “tipo A” é característico dos que aceleram as reações próprias do
estresse natural exigido por suas circunstâncias, externando sua resposta ao
estresse mediante reações excessivas. Os indivíduos “tipo B”, ao contrário, são
os que dominam melhor e de formas mais naturais seu estresse, reagindo com
calma, prudência e boa filosofia frente às pressões da vida.
- As
consequências do estresse:
Alguns pesquisadores descobriram uma relação entre a dificuldade de enfrentar o
estresse e a ocorrência de doenças crônicas como as moléstias cardiovasculares
ou o câncer. De acordo com esses autores, o acúmulo de reações negativas ao
estresse ao longo do tempo imprime uma marca perniciosa no desenvolvimento do
ciclo vital das pessoas, e essa marca pode ser geneticamente transmitida às
gerações futuras. As manifestações mais conhecidas causadas pelo estresse
patológico, tanto de tipo físico como emocional, são as seguintes:
- Efeitos
físicos do estresse:
• Ao respirar: transtornos respiratórios, entre
os quais sobressaem a dispneia, hiperventilação, sensação de opressão no peito
e asma bronquial;
• Nos músculos: transtornos musculares, tais
como alterações nos reflexos das extremidades, contraturas, dores, câimbras e
rigidez muscular;
• No coração: transtornos cardiovasculares
e doenças das artérias coronárias, bem como angina e infartos do miocárdio,
hipertensão arterial e arritmias;
• Na pele: transtornos dermatológicos como
alopecia, eczemas, sudorese excessiva, tricotilomania e dermatite atípica;
• Do estômago e outros órgãos: transtornos
gastrointestinais como úlcera péptica, intestino irritado, colite ulcerosa,
dispepsia e aerofagia.
• Nos hormônios do corpo: transtornos
endócrinos como hipertireoidismo e hipotiroidismo, hipoglicemia, síndrome
metabólica, diabetes e síndrome de Cushing.
• Na vida sexual: transtornos sexuais de
vaginismo, impotência, ejaculação precoce, coito doloroso e alterações da
libido.
• Nas defesas contra as doenças: transtornos
imunológicos do tipo das cefaleias, alterações do apetite, gripe, herpes,
artrite reumatoide, insônia, dores de estômago e diversas dores crônicas.
- Efeitos
psicológicos do estresse:
O estresse afeta o cérebro em nível fisiológico e condutor,
produzindo sintomas psicológicos tais como irritabilidade, fadiga intelectual,
dificuldade de concentração, vazios de memória, queda do rendimento
intelectual, bloqueios mentais, propensão a sofrer acidentes, confusão e
tendências aditivas. A permanência desses efeitos pode levar a transtornos
psíquicos ainda mais graves, como depressão, os transtornos do sono,
esquizofrenia, ansiedade, angústia, fobias e transtornos de alimentação.
- Propostas
para combater o estresse:
A) O doutor James Gill, que é também sacerdote, propõe reconsiderar essa
tendência, tão característica de nossos tempos, de adotar condutas “tipo A”
fundamentadas num ideal exagerado de supervalorizar o trabalho duro, a entrega
ou o sacrifício a qualquer custo, ao mesmo tempo em que se descuidam da saúde e
do bem-estar pessoal. Por essa razão, Gill sugere a todos aqueles que são
responsáveis pela educação e a formação de outros, sejam eles crianças, jovens
ou adultos em vários contextos, que ensinem valores e condutas como as
seguintes:
- Crer
firmemente que o valor pessoal não depende dos próprios esforços.
- Aprender
a disfrutar aquilo que faz.
- Resistir
a transformar a vida somente em trabalho, descuidando amizades, oração,
eventos culturais, jogo, exercício físico e crescimento intelectual.
- Aprender
a hierarquizar as tarefas e atividades no horário pessoal, rejeitando
aquelas que não podem ser manejadas sem pressa ou hostilidade.
- Aprender
a dizer ‘não’ aos comportamentos que contribuem ao desenvolvimento de uma
personalidade apressada “tipo A”.
- Desenvolver
um hábito de compreensão, aceitação e percepção do bom, tanto em si
próprio como nos outros, em vez de viver reprovando as faltas e os
fracassos.
- Resistir
ao perfeccionismo, que é a tendência de estar insatisfeito e incomodado
com qualquer coisa ou pessoa que não atinja os ideais propostos.
- Deixar
de comparar os êxitos e talentos próprios com os dos outros.
- Jogar
pelo prazer do deleite e não pelo prazer da competição com outros.
- Fazer
amigos que lhe apontem e ajudem a mudar as características “tipo A”, visto
que elas lhe impedem viver co maior plenitude.
B) Do mesmo modo, o doutor Gastón de Mézerville apresenta três propostas
complementares para combater o estresse negativo e modificar os hábitos de
conduta “tipo A”:
- Autoexigência:
a meta neste primeiro tipo de recomendações consiste no combate a uma
atitude de excessiva severidade consigo mesmo e com os outros, associada a
atitudes pouco compreensivas e até hostis em todos os âmbitos da vida.
Entre as mudanças propostas está “Relaxar os músculos faciais e
sorrir com frequência; escutar melhor os outros sem interrompê-los; falar
num tom mais suave; dirigir o carro sem irritar-se com os outros
motoristas ou pedestres; distrair-se lendo ou conversando quando se está
na fila; proporcionar a si mesmo o tempo para a recreação e não
pressionar-se quando são praticados jogos individuais ou coletivos;
verbalizar o afeto para com os outros; desfrutar os pequenos presentes da
vida, como as crianças e as flores, um céu límpido, um panorama formoso ao
entardecer etc.”
- Pressa
excessiva: o objetivo desta segunda série de recomendações é a
superação da contínua tendência de urgência no tempo, caracterizada por
comportamentos de pressão sobre si mesmo que levam as pessoas a fazer
todas as coisas cada vez mais rapidamente em tempo menor. A esse
respeito “vários autores recomendam guardar o relógio em
determinados dias a fim de não depender excessivamente dele; ver as horas
somente quando necessário; levantar-se 15 minutos antes e preparar-se com
calma; caminhar mais lentamente e chegar a tempo às atividades
programadas; desculpar-se antecipadamente quando não é possível cumprir
pontualmente um compromisso assumido de tipo laboral ou social; não
estabelecer para si mesmo datas ou horas-limites excessivamente exigentes
para os trabalhos pendentes; hierarquizar os acontecimentos do dia ou da
semana, ‘deixando para amanhã aquilo que não é necessário fazer hoje’ –
nem sempre aplicar o refrão ‘não deixe para amanhã aquilo que pode fazer
hoje’; tratar de dar a si mesmo certa margem adicional à hora de
comprometer-se para a entrega de trabalhos etc.”
- Perfeccionismo:
com este último conjunto de recomendações, busca-se superar certos hábitos
perfeccionistas quanto às tarefas assumidas, fato que produz atitudes de
impaciência e intolerância diante do não cumprimento dos padrões
propostos. Os especialistas sugerem nesta área mudanças tais como as que
seguem: “Fixar para si mesmo metas realistas; ser excelente no
importante, mas flexível nas coisas irrelevantes; enfatizar sempre todo o
bem que se faz e subtrair atenção aos erros compreensíveis em toda
atividade humana; aceitar as diferenças individuais na forma de fazer as
coisas; prever certa margem de erro para as metas propostas e contentar-se
com êxitos ‘bons’ ou ‘muito bons’ quando as circunstâncias não permitem os
‘excelentes’; compreender que as pessoas são mais importantes que as
tarefas que desempenham; aprender dos erros próprios e alheios após a
busca de sadia excelência etc.”
- Conclusão:
Aprender a adaptar-se aos estresses da vida é fundamental para o ministério
sacerdotal, dado que o chamado de Cristo é em si mesmo exigente, mas também se
torna caminho de vida abundante quando se assume a existência com maturidade
mental, emocional e espiritual. Uma adaptação salutar ao estresse implica
reconhecer que as pessoas valem por aquilo que são, não somente por aquilo que
fazem, e isso implica aprender também a não viver se autopressionando com
condutas excessivas de autoexigência, pressa e perfeccionismo.
- Bibliografia:
Estes textos são extratos do livro “O desgaste na
vida sacerdotal: prevenir e supera a síndrome de burnout”, da autora
Helena López de Mézerville, publicado pela Editora Paulus, em São Paulo, no ano
de 2012.
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