O ÓBOLO DA VIÚVA
Cardeal Dom Paulo Cezar Costa
Arcebispo de Brasília
32º Domingo do Tempo Comum (B)
O Evangelho deste domingo nos apresenta Jesus que ensina no
templo de Jerusalém (Mc 12, 38-44). Na primeira parte do Evangelho, Jesus
critica a atividade dos escribas que se movem pela cultura da aparência. Gente
que parece boa, religiosa, que externamente parece boa, cumpridora dos
preceitos religiosos, mas que internamente, no coração, está longe dos
preceitos de Deus. Jesus acusa os escribas de “[devorarem] as casas das viúvas
e [simularem] fazer longas preces”. As viúvas eram desprotegidas no tempo de Jesus.
Eles são acusados de se aproveitarem dos desprotegidos, daquelas que não tinham
ninguém por si.
A denúncia de que os escribas devoravam as casas das viúvas,
de certa forma, faz a ligação entre a primeira parte do Evangelho e a segunda.
Agora, Jesus sentado frente ao tesouro do templo observa como as pessoas fazem
suas ofertas. A multidão que lançava pequenas moedas e muitos ricos que
lançavam muitas moedas. Era a fé do povo que se expressava, também, na sua
capacidade de ajudar o templo. O ir ao templo manifestava a fé do povo simples
que buscava fazer de Deus o tudo de suas vidas, que, na sua simplicidade,
afirmava o primado de Deus. Entre tantos que doavam, Jesus observa a atitude de
uma pobre viúva que está no templo e faz a sua oferta: ela doa duas moedinhas,
isto é, um quadrante. Jesus chama os discípulos e diz que essa viúva, que é
pobre, lançou mais do que todos os que ofereceram moedas no tesouro, pois os
outros deram do que lhes sobrava, mas ela, na sua pobreza, ofereceu tudo o que
tinha, tudo o que possuía para viver (Mc 12, 43-44). Essa viúva é pobre e
generosa. Os outros dão do seu supérfluo, mas ela não, ela dá tudo que possui
para viver. É uma mulher de profunda fé e de profunda generosidade. Dar tudo é
um ato de fé absoluta, de confiança e abandono. Aqui, ninguém a incita a doar,
a ser generosa com promessas absurdas de recompensa de Deus. Há a gratuidade e
a generosidade. Por isso, Jesus vê, no ato dessa mulher, a antecipação da sua
entrega, da sua doação. Aquela mulher deu tudo; também Jesus dará tudo, dará a
própria vida por amor a nós, pela nossa salvação.
A atitude dessa mulher admirada por Jesus e que os
Evangelhos narram quer nos iluminar hoje. Quer nos fazer sair da exterioridade
e hipocrisia que marcavam a vida e atitude dos escribas e entrar na dinâmica da
conversão do coração, da liberdade do coração. Essa viúva que podia ser
explorada não se deixa dominar pela amargura, não perde a liberdade do coração.
Só quem tem um coração livre dá tudo como essa viúva do Evangelho e Jesus. Só
quem trabalhou a sua interioridade e tornou-se livre doa tudo. O religioso, a
religiosa, o presbítero é alguém que busca dar tudo. Também, nas nossas
comunidades, encontramos inúmeras pessoas que dão, na sua gratuidade, tudo que
têm: o tempo, os dons, o serviço nas pastorais e movimentos, o dízimo para
manter a vida da comunidade. Que a liberdade dessa viúva e a liberdade de Jesus
que deu a vida por nós interpele-nos na nossa capacidade de doar-nos, de amar,
de servir.
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