Francisco recebeu em audiência os participantes do Congresso
Internacional sobre o Futuro da Teologia, organizado pelo Dicastério para a
Cultura e a Educação. Ele fez um apelo para que esta disciplina, “luz” que faz
emergir o Evangelho, possa ser “acessível a todos” e ajude a “repensar o
pensamento” num mundo complexo. O Pontífice exortou a combater as ideologias
que “achatam tudo” e matam a realidade, o pensamento, a comunidade.
Mariangela Jaguraba - Vatican News
O Pontífice manifestou satisfação por professores,
pesquisadores e reitores, provenientes de várias partes do mundo, terem se
reunido para refletir sobre "como herdar o grande patrimônio teológico das
gerações passadas e imaginar o futuro".
Francisco disse que quando pensa na Teologia, vem à sua
mente a luz. "Graças à luz, as coisas emergem da escuridão, os rostos
revelam os seus contornos, as formas e as cores do mundo aparecem finalmente. A
luz é bela porque faz com que as coisas apareçam, mas sem se exibir",
disse ele.
"Agora, aqui, admiramos esta sala, vemos nossos rostos,
mas não percebemos a luz, porque ela é discreta, é gentil, é humilde e,
portanto, permanece invisível", disse o Papa, acrescentando:
Assim também é a Teologia: ela faz um trabalho escondido
e humilde, de modo que a luz de Cristo e seu Evangelho possa emergir. A partir
dessa observação, surge para vocês um caminho: buscar a graça e permanecer na
graça da amizade com Cristo, a verdadeira luz que veio a este mundo. Toda
Teologia nasce da amizade com Cristo e do amor por seus irmãos, suas irmãs, seu
mundo; este mundo, dramático e magnífico ao mesmo tempo, cheio de dor, mas
também de beleza comovente.
O Papa convidou os participantes do Congresso Internacional
sobre o Futuro da Teologia a se fazerem as seguintes perguntas: Teologia, onde
você está? Com quem você está caminhando? O que está fazendo pela humanidade?
"Esses dias serão importantes para abordar essas questões, para perguntar
se a herança teológica do passado ainda pode dizer alguma coisa aos desafios de
hoje e nos ajudar a imaginar o futuro. Este é um caminho que vocês são chamados
a percorrer juntos, teólogos e teólogas", disse ainda Francisco.
A seguir, o Papa recordou uma passagem do Segundo Livro dos
Reis que diz que "durante a restauração do Templo de Jerusalém, foi
encontrado um texto, talvez seja a primeira edição perdida de Deuteronômio. Um
sacerdote e alguns estudiosos o leram; até o rei o estudou; eles intuem algo,
mas não o entendem. Então o rei decide entregá-lo a uma mulher, Hulda, que
imediatamente o entende e ajuda o grupo de estudiosos – todos homens – a
entendê-lo". "Há coisas que só as mulheres intuem e a Teologia
precisa da sua contribuição. Uma Teologia apenas de homens é uma Teologia pela
metade. Ainda há um longo caminho a percorrer neste sentido", sublinhou o
Papa.
A seguir, o Papa entregou-lhes um desejo e um convite.
O desejo é que a Teologia ajude a repensar o
pensamento. O nosso modo de pensar, como sabemos, também molda nossos
sentimentos, nossa vontade e nossas decisões. Um coração amplo corresponde a
uma imaginação e um pensamento amplos, enquanto um pensamento retraído, fechado
e medíocre dificilmente pode gerar criatividade e coragem.
O Papa recordou os livros didáticos de Teologia que eram
usados para estudar. Disse que eram "todos fechados, todos parecidos com
museus, com bibliotecas, mas não faziam pensar".
Segundo o Pontífice, "a primeira coisa a fazer, para
repensar o pensamento, é curar a simplificação. De fato, a realidade é
complexa, os desafios são variados, a história é habitada pela beleza e, ao
mesmo tempo, ferida pelo mal, e quando não se consegue ou não se quer lidar com
o drama dessa complexidade, facilmente se tende a simplificar".
Mas a simplificação, no entanto, quer mutilar a
realidade, dá origem a pensamentos estéreis e, pensamentos unívocos, gera
polarizações e fragmentações. Assim fazem, por exemplo, as ideologias. A
ideologia é uma simplificação que mata: mata a realidade, mata o pensamento,
mata a comunidade. As ideologias achatam tudo numa única ideia, e depois a
repetem de forma obsessiva e instrumental, superficial e como papagaios.
De acordo com o Papa, "um antídoto contra a
simplificação é indicado na Constituição Apostólica Veritatis gaudium:
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Trata-se de fazer “fermentar” a
forma do pensamento teológico junto com a de outros conhecimentos: filosofia,
literatura, artes, matemática, física, história, ciências jurídicas, políticas
e econômicas. Deixar fermentar o conhecimento, porque são como os sentidos do
corpo: cada um tem a sua especificidade, mas precisam um do outro, segundo
também diz o apóstolo Paulo: «Se todo o corpo fosse olho, onde estaria a
audição? Se tudo fosse ouvido, onde estaria o olfato?»".
Francisco recordou que "este ano celebramos o 750º
aniversário da morte de dois grandes teólogos: Santo Tomás de Aquino e São
Boaventura. Tomás lembra que não temos apenas um sentido, mas múltiplos
sentidos, e sentidos diferentes, para que a realidade não nos escape. E
Boaventura afirma que, na medida em que alguém «acredita, espera e ama Jesus
Cristo», «recupera a audição e a visão, o olfato, o paladar e o tato»".
"Ao ajudar a repensar o pensamento, a Teologia voltará a brilhar como merece,
na Igreja e nas culturas, ajudando todos e cada um na busca da verdade",
disse ainda o Papa.
A seguir, Francisco fez um convite: que a Teologia
seja acessível a todos. Segundo o Pontífice, "há alguns anos, em
muitas partes do mundo, existe um interesse entre os adultos em retomar a sua
formação, incluindo a formação acadêmica. Homens e mulheres, especialmente de
meia-idade, talvez já formados, desejam aprofundar a sua fé, querem fazer um
caminho, muitas vezes matriculam-se numa faculdade universitária. E este é um
fenômeno de crescimento. É também um fenômeno em crescimento que merece o
interesse da sociedade e da Igreja".
"A meia-idade é uma época especial da vida. É uma época
em que geralmente se goza de uma certa segurança profissional e solidez
emocional, mas também é uma época em que os fracassos são sentidos com maior
dor e novas questões surgem à medida que os sonhos juvenis desmoronam. Nesta
fase é possível sentir uma sensação de abandono e, às vezes, a alma se
bloqueia. É a crise da meia-idade. Sente-se a necessidade de retomar uma busca,
talvez tateando, talvez sendo segurado pela mão, e a Teologia é esta companheira
de viagem ", disse ainda o Papa, concluindo:
Se alguma dessas pessoas bater à porta da Teologia, das
escolas de Teologia, por favor, encontre-a aberta. Façam com que estas mulheres
e homens encontrem na Teologia uma casa aberta, um lugar onde possam retomar o
caminho, onde possam procurar, encontrar e procurar novamente. Preparem-se para
isso. Imaginem coisas novas nos programas de estudo para que a Teologia seja
acessível a todos.
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