BENDITA MARIA
Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)
Maria de Nazaré, Mãe de Jesus, representa uma
revolução silenciosa e profunda na história das mulheres. Vivendo em uma
sociedade onde o poder masculino era absoluto e as obrigações femininas
impostas com rigor, Maria se manifesta como um símbolo de autonomia e
liberdade. Sua força não está na oposição direta, mas na unidade interior que a
faz profetisa da igualdade e dignidade entre homens e mulheres.
Num contexto machista, onde o amor erótico era reduzido ao
satisfazer os homens, Maria opta por um amor maior: o ágape, uma entrega total
a Deus. Ela desafia não apenas as normas do seu tempo, mas o julgamento
masculino que condenava mulheres ao apedrejamento. Seu “sim” ao anjo Gabriel
não é ingênuo, mas um ato de coragem. Ela conhece os riscos caso seu noivo não
a acolhesse com seu filho, e mesmo assim, confia plenamente no projeto
divino. Sua liberdade não se opõe à condição de serva do Senhor, mas a
fortalece. Maria é a mulher que arrisca tudo pelo chamado de Deus.
Este vínculo de Maria com Deus não se limita ao espiritual;
abrange todo o seu ser e agir. Ela não está confinada a uma dimensão meramente
religiosa, mas integra todas as dimensões de sua vida para realizar a vontade
do Pai. Ela realiza de modo extraordinário e eficaz os valores humanos e
femininos de sua condição, e exorta cada mulher e cada homem a entrar nesse
caminho. Seu itinerário é universal: homens e mulheres são chamados a um
propósito maior, encontrando sentido na entrega livre e generosa ao Criador.
Na Mãe de Jesus, encontramos não apenas um modelo feminino,
mas um modelo humano. Suas virtudes – fé, abertura, humildade, caridade e
disponibilidade – têm valor atemporal. Sua grandeza está na extraordinária
simplicidade do cotidiano. Mesmo vivendo sob regras patriarcais, ela é livre
para abraçar a maior novidade da história: gerar o Cristo ao mundo. Longe de
ser submissa. Maria é uma mulher de decisão. Como noiva prometida, não teme
acolher um projeto maior do que o seu e de seu noivo. Acusada e mal interpretada,
não hesitou em correr o risco de ser rejeitada e apedrejada. Seu sim é um ato
de liberdade, um encontro entre a vontade divina e a coragem de uma jovem de
Nazaré.
A presença de Maria na história da salvação evidencia que o
plano divino envolve igualmente homens e mulheres. Maria é o testemunho
feminino por excelência, o ícone da Igreja. Desde o início, coopera com os
discípulos, assumindo papel essencial no cristianismo nascente. Sua presença é
ativa, fecunda e indispensável. Na Mãe de Deus, a mulher é valorizada em sua
essência, não como figura secundária, mas como participante fundamental na
história da redenção.
Maria nos recorda que a verdadeira força feminina não está
na oposição, mas na plenitude de sua identidade, na coragem de dizer sim ao que
é maior que ela mesma, na liberdade que encontra no amor a Deus e ao próximo.
Seu testemunho é um chamado para que todos, homens e mulheres, vivam em
plenitude e liberdade diante do Criador.
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