O pregador da Casa Pontifícia, padre Roberto Pasolini, fez
na tarde deste domingo, 09 de março, a sua primeira meditação no âmbito dos
Exercícios Espirituais da Quaresma à Cúria Romana, sobre o tema “A esperança da
vida eterna”. Os Exercícios Espirituais sem a presença do Papa Francisco, que
está internado no Hospital Gemelli. Publicamos a síntese da Meditação.
Vatican News
O fim será o início
A fé da Igreja, fundada na ressurreição de Cristo, sempre
ofereceu ao mundo a esperança da vida após a morte. Com o tempo, porém, esta
promessa foi ofuscada e, hoje, não é apenas contestada, mas ignorada. Diante
desta indiferença, os fiéis são chamados a redescobrir o valor e a beleza da
vida eterna, para restituir seu significado autêntico. Uma tarefa bem mais
urgente neste Ano Santo do Jubileu e neste momento de profundo sofrimento em
que o Santo Padre está atravessando.
O caminho dos exercícios espirituais sobre o tema da vida
eterna, que queremos empreender, encontra seu fundamento na revelação cristã.
Iniciamos extraindo algumas formulações sintéticas do Catecismo da Igreja
Católica (CIC), que oferecem uma síntese acessível do pensamento teológico. O
CIC apresenta a morte não como um fim, mas como uma passagem para a vida
eterna, em comunhão com Cristo. Este conceito encontra suas raízes na Carta aos
Romanos, onde São Paulo afirma que, pelo batismo, somos unidos à morte e
ressurreição de Cristo, entrando assim numa nova vida.
A morte, segundo o Catecismo, é o momento em que se realiza
o julgamento particular, que avalia a aceitação ou rejeição da graça de Deus.
No entanto, a salvação não é reservada apenas aos que conheceram formalmente a
Cristo: o Concílio Vaticano II reconhece que quem segue a própria consciência,
na busca sincera de Deus, pode entrar na vida eterna. O CIC ressalta que o
Juízo final não se baseia em meros atos exteriores, mas no amor vivido,
retomando o pensamento de São João da Cruz: "No entardecer da vida, seremos
julgados pelo amor".
O destino final do homem articula-se em três possibilidades:
o paraíso, a condenação eterna (inferno) e a purificação final (purgatório). O
paraíso representa a plena realização do ser humano, uma comunhão eterna com
Cristo, em que cada pessoa encontra a sua verdadeira identidade. O inferno, ao
invés, é descrito como a separação definitiva de Deus, mas a Igreja jamais
declarou, com certeza, que, por isso, alguém será condenado. O purgatório,
finalmente, é visto como um processo de purificação para os que, embora estejam
na graça de Deus, ainda não estão prontos para entrar no céu. Mas, talvez,
precisamente neste último “destino” encontraremos a originalidade da revelação
cristã. A possibilidade de um “momento” final de purificação poderá ser a
ocasião para fazer, até o fim, as contas com o amor infinito de Deus.
A reflexão da Igreja sobre a eternidade da vida não pretende
gerar temor, mas alimentar a esperança, recordando que o nosso destino depende
da liberdade com que escolhemos viver no amor. A verdadeira purificação não
consiste em tornar-se perfeito, mas em aceitar-se, plenamente, na luz do amor
de Deus, superando a ilusão de ter que ser “outro” para merecer a salvação.
Muitas vezes, somos obcecados em ter que ser perfeitos, mas
o Evangelho nos ensina que a verdadeira “imperfeição” não é fragilidade, mas
falta de amor. O purgatório pode ser visto como a última ocasião de
libertar-nos do medo de não sermos capazes de aceitar-nos serenamente como
somos, tornando-se um lugar de relação e comunhão com os outros. O purgatório
pode ser entendido como o “momento” em que, finalmente, deixamos de querer
demonstrar algo a Deus, mas, simplesmente, deixar-nos amar. A eternidade, portanto,
não é apenas uma recompensa futura, mas uma realidade que começa aqui, na
medida em que aprendemos a viver no amor e comunhão com Cristo. Enfim, nosso
destino não é traçado pelo temor e sim pela esperança. A morte não é uma
derrota, mas o momento em que, finalmente, veremos o rosto de Deus e
descobriremos que o fim... era apenas o início.
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