Perdoai-nos, Senhor, porque pecamos.
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo
28 de fevereiro de 2025
A Quaresma inicia com um chamado à conversão: “convertei-vos
e crede no Evangelho” (Mc 1,25). A vida do cristão é um constante processo de
conversão a Deus. Somos tentados de muitos modos para nos desviarmos de Deus e
dos seus caminhos e a construir uma vida sem Deus. A grande e mais perigosa
tentação é a da autossuficiência, aliada à soberba: achar que não precisamos de
Deus, que nos bastamos a nós mesmos, que podemos, tomar o lugar de Deus. E
então passamos a viver em pecado.
Talvez não vejamos motivos para nos convertermos e achamos
que está tudo bem em nossa vida. E vivemos friamente nossa fé e nossa relação
com Deus e o próximo e não progredimos na vida cristã. O chamado à conversão é
para nos voltarmos para Deus novamente, abandonando a atitude de soberba e
autossuficiência. O chamado à conversão é concreto: é reconhecer que Deus é
Deus e que nós não somos deuses; é abraçar sua vontade, praticando os
mandamentos; é vivendo a caridade para com o próximo e não fechar o coração
diante de suas necessidades e sofrimentos.
A Quaresma nos recorda a atitude de penitência e conversão,
que deve acompanhar toda a nossa vida, até o último dos nossos dias neste
mundo. Neste ano, mediante a Campanha da Fraternidade, nosso processo de
conversão passa também pela revisão de nossas atitudes em relação ao cuidado do
mundo criado por Deus. No final do relato bíblico da criação do mundo, Deus
contempla a sua obra e se alegra. “Deus viu tudo o que tinha feito. E era muito
bom” (Gn 1,31). Isso significa que era harmonioso, sem maldade, bonito e
funcionava bem. O problema vem depois, com a história do pecado de Adão e Eva,
que se deixaram levar pelo tentador e pretenderam ser como Deus. A partir daí,
entrou a desarmonia e a confusão no mundo.
Começaram as brigas e a violência, a ambição desmedida, a
ganância, a sede de poder e o descaso de um pelo outro. E também se estragou a
relação do homem com a natureza. Em vez do cuidado do “jardim de Éden”, que
Deus colocou sob os cuidados de Adão e Eva, começou uma relação de domínio e de
exploração do homem sobre a criação de Deus. Assim chegamos ao ponto de termos
um mundo cada vez mais descuidado e até hostil ao homem. Se não nos
convertermos nas nossas relações com a natureza, ela deixará de ser a casa
comum de toda a família humana para se transformar numa casa inabitável, hostil
e em ruínas.
“Fraternidade e ecologia integral”: este é o tema da
Campanha da Fraternidade deste ano. Ao longo da Quaresma, somos chamados a uma
conversão que inclua nossas relações com a natureza: reconhecemos que ela é um
dom precioso do Criador, não apenas para nós, mas também para as futuras
gerações? Cuidamos do ar, da água, do verde, da vida de todos os seres e da
pessoa humana, que também é parte desse mundo maravilhoso criado por Deus? Ou
colaboramos com a nossa parte para que este mundo fique cada dia um pouco menos
belo, bom e habitável?
O cuidado do próximo, em quem reconhecemos um irmão e uma
irmã (“fraternidade”), é parte da ecologia integral. Todas as injustiças e
violências, todo desprezo e ódio contra o próximo é contrário ao plano de Deus
em relação à criação. Um mundo bem zelado e cuidado também é sinal de fé e de
esperança. Neste Ano Jubilar, vivamos a Quaresma na perspectiva da conversão e
da busca do perdão de Deus. E reviverá a esperança para nós e para o mundo.
Somos todos “peregrinos de esperança”.
Artigo publicado no Folheto Litúrgico “Povo de Deus em São Paulo” para a Quarta-Feira de Cinzas, 05 de março de 2025
Fonte: https://arquisp.org.br/
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