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sexta-feira, 9 de outubro de 2020

ESTUDOS BÍBLICOS: Irmãos e irmãs de Jesus?

Ecclesia

Irmãos e irmãs de Jesus?

Visão católica e ortodoxa

Autor: rev. William G. Most
Trad.: Carlos Martins Nabeto

Em Mt 13, 55 e Mc 6,3, as seguintes pessoas estão nomeadas como irmãos de Jesus: Tiago, José (ou Josés - os manuscritos variam na forma) Simão e Judas. Mas, Mt 27, 56 diz que, «junto à cruz estava Maria, a mãe de Tiago e José». Mc 15, 40 diz que «ali estava Maria, a mãe de Tiago, o menor, e José». Logo, embora a prova não seja conclusiva, parece que os dois primeiros, Tiago e José, (ou Joses), - exceto se supormos que estes eram outras pessoas com os mesmíssimos nomes - eram filhos de outra mãe e não da Mãe de Jesus.

Vemos aqui que o termo «irmão» foi usado para indicar aqueles que não eram filhos de Maria, a Mãe de Jesus. Do mesmo modo, facilmente poderia ter ocorrido o mesmo com os outros dois «irmãos», Simão e Judas. Além disso, se Maria tivesse outros filhos e filhas naturais no tempo da crucifixão, seria estranho Jesus ter pedido a João para que cuidasse dela. Especialmente porque Tiago, o «irmão do Senhor» ainda estava vivo em 49 d.C. (cf. Gl 1, 19); certamente ele poderia ter cuidado dela... Lot, que era sobrinho de Abraão (cf. Gn 11, 27-31), é chamado de «seu irmão» em Gn 13, 8 e 14, 14-16. O termo hebraico e aramaico ah era usado para expressar vários tipos de graus de parentesco (v. Michael Sokoloff, A Dictionary of Jewish Palestinian Aramaic, Bar Ilan University Press, Ramat-Gan, Israel, 1990, p.45). O hebraico não tem palavra para parentes. Eles poderiam dizer ben-dod para expressar filho de um tio por parte de pai, mas para outros graus de parentesco eles precisavam construir uma frase complexa, tal como «filho do irmão de sua mãe» ou «filho da irmã de sua mãe» (para consultar expressões complexas do aramaico, v. Sokoloff, pp. 111 e 139).

Objeção 1: não deveríamos usar o hebraico, já que o grego possui um termo para designar primo e outros tipos de parentes, também os Evangelhos não se utilizam de outras palavras específicas para designar os parentes de Jesus. Eles usam somente o termo grego adelphos, o que significa irmão real.

Resposta: A Septuaginta (tradução grega do Antigo Testamento hebraico, (cuja abreviatura padrão é LXX), usa o grego adelphos para Lot que, como vimos acima, era, na verdade, sobrinho. Além disso, os escritores dos Evangelhos e Epístolas sempre tinham em mente as palavras hebraicas, mesmo quando escreviam em grego. Isto vale principalmente para São Paulo. E, como podemos ver atualmente, há uma forte evidência de que São Lucas, em certos pontos, estava traduzindo documentos hebraicos – dois tipos de hebraico [hebraico e aramaico] com grande cuidado. A LXX, para Ml 1, 2-3, traduz: «Eu amei Jacó e odiei Esaú». São Paulo, em Rm 9, 13, cita exatamente da mesma forma que a tradução grega. Ainda que os tradutores da LXX conhecessem o hebraico e o grego - e assim também Paulo - utilizaram um modo muito estranho de expressão, modificando potencialmente a expressão hebraica.

Como isso aconteceu?

O hebraico e o aramaico carecia dos graus de comparação (tais como: bom, melhor, o melhor; claro, mais claro, claríssimo) e, então, precisava-se encontrar outra forma de expressar as idéias. Enquanto nós poderíamos dizer: «Amo mais a um que a outro», o hebreu diria: «Amo a um e detesto o outro». Em Lc 14, 26, Nosso Senhor nos diz que devemos «odiar nossos pais» é óbvio, porém, que quer dizer que devemos amar mais a Cristo do que a nossos pais. De forma semelhante, em 1Cor1, 17, Paulo afirma: «Cristo não me enviou para batizar, mas para pregar»; só que o próprio Paulo já havia declarado ter batizado algumas pessoas; logo, o que realmente queria dizer é: «Minha missão mais importante é pregar; batizar é menos importante». São Paulo, em 1Tes 4, 5 diz que os gentios «não conhecem a Deus». Ele usa o termo conhecer no sentido do hebraico yada, um termo amplo que significa conhecer e amar. De fato, não são raras as vezes em que podemos afirmar que certa palavra hebraica encontrava-se na mente de São Paulo, que se expressava em grego.

Todos os estudiosos admitem que o Evangelho de São Lucas possui mais semitismos que os livros escritos por outros semitas (Lucas não era semita, mas médico de origem grega). Por quê? A princípio, parece que Lucas escrevia assim para imitar o estilo da LXX, mas, em um estudo que fiz (v. meu artigo «São Lucas imitava a Septuaginta?», publicado no Jornal [Internacional] de Estudos do Novo Testamento, jul./1982, pp.30-41, editado pela Universidade de Sheffied, Inglaterra), mostrei, estatisticamente, que Lucas não tentava imitar a Septuaginta. Eu fiz um estudo de um semitismo bem estranho em Lucas: o aditivo kai, que reflete o aditivo hebraico wau. Eis um exemplo tirado de Lc 5, 1: «E isto aconteceu quando as multidões se apertavam para ouvir dele a palavra de Deus e ele se encontrava de pé junto ao Lago [de Genesaré]». A palavra «e», grifada em itálico, poderia existir no hebraico, mas não no grego, nem mesmo no aramaico. Pela contagem real, São Lucas usa este «e» somente de 20 a 25% das vezes que poderia usá-lo, se estivesse imitando a Septuaginta. Certamente, não foi esta a razão de seu uso.

Então por que ele a empregou assim? Em linhas gerais, São Lucas nos diz que tomou grande cuidado, conversou com testemunhas oculares e checou relatos escritos sobre Jesus. Estes relatos escritos poderiam estar em grego (alguns judeus sabiam se comunicar em grego), hebraico ou aramaico. Logo, seria possível que São Lucas tivesse usado relatos escritos nessas linguagens. O problema não seria perceptível no grego se fossem usadas fontes gregas, é lógico; mas se ele usou, em certos momentos, documentos hebraicos, e se ele os traduziu com extremo cuidado - tão extremo a ponto de manter a estrutura hebraica no texto grego, onde não existiria - então poderíamos afirmar que foi dessa forma que ele resolveu fazer. As estranhas estruturas que encontramos – também anormais no aramaico - usadas por São Lucas em alguns pontos, mas não em outros, parecem demonstrar a existência de documentos hebraicos, traduzidos com extremo cuidado. Lucas sabia como escrever em grego culto, como demonstra certas passagens. Mas por que escreveu assim? Certamente por causa de seu extremo cuidado, para ser fiel aos textos originais que usava. Portanto, precisamos conhecer o hebraico fundamental para compreendermos a questão corretamente (o «e» é omitido nas traduções das linguagens modernas, como o inglês; o problema só é verificável quando lemos São Lucas na língua grega original).

Há uma palavra importante em Rm 5,19, que diz que «muitos» se tornaram pecadores (= pecado original). É óbvio, porém, que São Paulo se referia a «todos». De fato, o grego usa polloi; no grego comum, sempre significa «muitos», mas não «todos». Entretanto, se conhecermos o hebraico que estava na mente de Paulo, tudo torna-se claro. Havia uma estranha palavra, rabbim, que aparece pela primeira vez em Is 53, na profecia da Paixão. Pelo contexto, percebemos claramente que significa todos, ainda que também signifique muitos, para ser mais exato ela significa todos dos que são muitos. Por exemplo, se eu estiver em uma sala com outras três pessoas, eu poderia dizer todos, mas não poderia dizer muitos; agora, se usarmos uma concordância grega para encontrarmos todas as citações em que São Paulo usa a palavra polloi como substantivo, veremos, pelo contexto, que sempre - sem exceção - significará todos; é o caso de Rm 5, 19. Assim, precisamos retornar ao hebraico para compreender o termo grego usado aqui por Paulo.

Em outras partes, São Paulo freqüentemente faz uso do termo grego dikaiosyne não na forma estrita utilizada pelo sentido grego, mas na forma ampla do sentido hebraico de sedaqah. Há muitos outros lugares no Novo Testamento onde devemos considerar o fundamento hebraico para obter o sentido correto do grego. Demos apenas alguns exemplos que são suficientes para mostrar como os escritores do Novo Testamento trabalharam e a necessidade de se evitar que entendamos somente o que diz o grego (que insiste que devemos ignorar o fundamento hebraico, afirmando que o grego possui palavras próprias para designar primos e outros parentes, ao contrário do hebraico).

Objeção 2: J. P. Meier, em A Marginal Jew (Doubleday, 1991, pp.325-326) afirma que «o novo Testamento não é uma tradução grega»; assim, o termo hebraico usado para referir-se a irmão não pode ter gerado uma «desastrosa» tradução.

Resposta: Muitos estudiosos crêem que parte ou até mesmo todos os Evangelhos são traduções gregas. A evidência citada acima, no Jornal de Estudo do Novo Testamento contribui para demonstrar isso. Em adição, temos evidências extensivas mostrando que, apesar dos autores não terem feito uma tradução, eles muitas vezes usavam palavras gregas com o significado do pensamento hebraico fundamental. Isto é especialmente notável em Paulo, ainda que Meier afirme que Paulo não estava fazendo uma tradução, bem como conhecia «Tiago, o irmão do Senhor», em pessoa.

Meier também assegura (pp.327-328) que Josefo, um judeu que escreveu em grego, várias vezes utiliza a palavra correta para designar primo, mas usa a palavra irmão para indicar os «irmãos de Jesus». Concordamos que Josefo assim se expressa. No entanto, será que Josefo possuía informação direta acerca da real natureza dos «irmãos» de Jesus? É óbvio que não. Meier também não analisa a questão sob este ponto de vista...

Objeção 3: Meier afirma (p. 323) que se quisermos que ah signifique primo, então deveríamos ller Mt 12, 50 assim: «Todo aquele que faz o desejo de meu Pai que está nos céus é meu primo, prima e mãe». De maneira similar (p.357), ele diz que Mc 3, 35 deveria então ser lido: «Nem seus primos acreditavam nele».

Resposta: Meier parece ser deliberadamente cego nestes pontos. Ora, se ah possui um significado amplo, poderíamos então mantê-lo na tradução, não apenas limitando-o a primo; poderia ser primo, mas também qualquer outra espécie de parente.

Objeção 4: Em Mt 1, 25, os protestantes apontam para duas palavras: até que e primogênito.

Resposta«Até que»: muitas palavras antigas têm diversos significados possíveis. Às vezes o termo «até que» abrange o tempo posterior ao indicado mas nem sempre isso acontece. Em Dt 34, 6, Moisés foi enterrado «e até hoje ninguém sabe onde se encontra sua sepultura». Isto era verdade no dia em que o autor do Deuteronômio relatou o fato; e continua sendo verdade ainda hoje. No Sl. 110, 1, conforme interpretado pelo próprio Jesus, «o Senhor disse ao meu Senhor (= de Davi): 'Senta à minha mão direita até que eu coloque os teus inimigos sob os teus pés'». Obviamente, Jesus sempre estará à direita do Pai; logo, a palavra até que jamais significará uma mudança de estado. O Sl 72, 7, um salmo messiânico, diz que em seus dias «a paz abundará até a lua não mais existir». Aqui novamente, o poder do Messias jamais deixará de existir ainda que a lua deixe de brilhar (Mt 24, 29). Em 2Sm 6, 23, diz-se que «Mical, esposa de Davi, não terá mais filhos até o dia de sua morte». Logicamente, ela não os terá mesmo após sua morte! Em Mt 11,3, Nosso Senhor diz que se os milagres feitos em Cafarnaúm tivessem sido feitos em Sodoma, «ela teria durado até o presente dia». Isso não significa que Jesus a destruiria logo a seguir. Em Mt 28, 20, Jesus promete que permanecerá com sua Igreja e seus seguidores «até o fim do mundo». Será que deserdará depois, na eternidade? Em Rm 8, 22, São Paulo diz que toda a Criação suspira, esperando pela revelação dos filhos de Deus até os seus dias (de Paulo). Nem por isso ele irá para sua missão, mas continuará até a restauração final. Em 1Tm 4, 13, o apóstolo pede para que Timóteo se devote à leitura, exortação e ensinamento «até eu (Paulo) chegar». Isso não quer dizer que Timóteo deveria parar de fazer tais coisas após a chegada de Paulo. E existe muitos outros exemplos, embora estas poucas citações sejam suficientes para demonstrar que a expressão «até que», no Antigo e no Novo Testamento, significa uma mudança de coisas que está para acontecer segundo o ponto a que se refere.

Até mesmo J. P. Meier, que trabalha estressantemente para tentar provar que Jesus tinha irmãos naturais, admite que o argumento baseado na expressão «até que» nada prova (em CBQ - jan/1992, pp.9-11).

Primogênito: Jesus é assim chamado em Lc 2, 7 (e também em Mt 1, 25, se considerarmos a adição ao texto grego encontrada na Vulgata latina). Este termo se refere ao hebraico bekor, que expressa principalmente a posição privilegiada do primeiro filho com relação aos demais filhos. Não implica, porém, na existência real de outros irmãos. Podemos ler numa inscrição grega encontrada numa sepultura em Tel el Yaoudieh (cf. Biblical 11, 1930, pp.369-390) que uma mãe faleceu ao dar à luz ao seu filho: «Nas dores do parto de meu filho primogênito, o destino me trouxe o fim da vida». No mesmo sentido, existe outro epitáfio em Leontópolis (v. Biblical Archaeology Review, Set.-Out./1992, p.56).

Objeção 5: Alguns escritores cristãos primitivos dizem que os irmãos do Senhor eram irmãos reais.

Resposta: Meier, que tão diligentemente coleta todos os dados que possam servir para contestar a virgindade de Maria após o nascimento de Jesus, menciona apenas quatro:

  1. Hegésipo, no séc. II - Mas Meier admite (p. 329): «...tal testemunho não está livre de problemas e possíveis auto-contradições»;
  2. Tertuliano - Contudo, Meier reconhece que isto ocorria porque queria «reforçar sua posição ao ponto de vista docético sobre a humanidade de Cristo»; tal desejo fez com que fizesse tal afirmação. De fato, Tertuliano, com a mesma predisposição, afirmou que a aparência do corpo de Cristo era horrível! (Sobre o Corpo de Cristo, cap.9) Realmente ele era um extremista, como se comprova pelo fato de que não sendo os montanistas tão severos quanto à moralidade, acabou por fundar sua própria sub-seita;
  3. Meier também sugere que duas passagens de Santo Ireneu (séc. II) podem implicar na negação da virgindade pós-parto: na primeira Ireneu faz um paralelo entre Adão e Cristo, para segurança de sua teologia da recapitulação; na segunda, Ireneu desenvolve o tema da nova Eva. É difícil, porém, encontrar nessas passagens qualquer dica que negue a virgindade pós-parto. O próprio Meier admite que a interpretação desses textos são improváveis;
  4. Helvídio, no séc. IV [totalmente refutado por São Jerônimo]. Estes textos, contudo, são desprezíveis se comparados com o extenso suporte patrístico que favorecem a tese da virgindade perpétua (cf. Marian Studies, VIII, 1956, pp. 47-93).

Por isso, em seu sumário de conclusões (pp. 331-332), Meier não faz qualquer menção a estes escritores da Igreja primitiva.

Objeção 6: Meier (p.331) diz que devemos seguir o critério do múltiplo atestado: Paulo, Marcos, João, Josefo e talvez Lucas atestam a existência dos irmãos de Jesus.

Resposta: Isto nada mais é que o retorno ao início da questão. Méier não provou que qualquer um destes «irmãos» seja, de fato, um irmão real de Jesus. Meier acrescenta que o sentido natural de irmão é o que indica irmão real, mas já vimos na segunda resposta (acima), que tal sentido não é absolutamente obrigatório. Ele também afirma que não existe outro caso claro no Novo Testamento que possa admitir outro significado, a não ser irmão real ou meio-irmão. Novamente ele acaba retornando ao início do problema pois não consegue provar que algum desses textos possa significar irmão real.

O próprio Meier reconhece (p. 331) que «todos estes argumentos em conjunto não podem produzir uma certeza absoluta». Nós acrescentamos: em Mc 3, 20-21, os parentes de Jesus vão até ele para prendê-lo – os irmãos mais novos não poderiam tomar tal atitude na cultura semita, pois Jesus era o primogênito. E, quando Jesus contava com 12 anos ao visitar o Templo de Jerusalém, seus irmãos mais novos deveriam acompanhá-lo (exceto as irmãs), se de fato existissem, de outra forma Maria teria ficado em casa cuidando dos filhos mais novos. Vemos, assim, que não há evidências sólidas na Escritura que nos permitam supor que Nossa Senhora tenha tido outros filhos. Há, por outro lado, respostas lógicas para todas as objeções formuladas. Porém, a razão decisiva é o ensino da Igreja; os credos mais antigos chamam Maria de aei-parthenos, ou seja, «sempre Virgem».

Meier parece querer usar um machado para cavar... Em seu longo artigo publicado na CQP (1992, pp. 1-28), ele diz, na última página, que deveríamos perguntar se a hierarquia das verdades não nos deixaria aceitar protestantes dentro da Igreja Católica sem que pedíssemos a eles para que acreditassem na virgindade perpétua de Nossa Senhora. De fato, existe uma hierarquia de verdades, algumas mais básicas que outras. Mas isso não significa, em absoluto, que possamos incentivar a negação de uma doutrina que vem sendo repetidamente ensinada pelo Magistério Ordinário, bem como pelos mais antigos credos (portanto, infalíveis). Realmente, se alguns protestantes querem aderir à Igreja sem aceitar a autoridade do Magistério, então jamais serão católicos de fato, ainda que aceitem todos os demais ensinamentos. Aceitar realmente a autoridade significa aceitar tudo, e não quase tudo.

Até mesmo Meier, tão inclinado à negação da virgindade perpétua, admite (pp.340-341) que existe uma estranha tradição rabínica que diz que Moisés, após seu primeiro contato com Deus, deixou de se relacionar sexualmente com sua esposa. Isto aparece primeiro em Filo de Alexandria e foi suportado, depois, pelos rabinos. Ora, se Moisés, em virtude de um contato externo com Deus, agiu dessa maneira, porque então não poderia ocorrer o mesmo com Nossa Senhora, que foi preenchida pela divina presença para a concepção de Jesus e carregou a própria Divindade em seu ventre durante nove meses? De fato, Lutero e Calvino, como Méier reconhece (p.319), aceitaram a doutrina da virgindade perpétua de Maria.

Por que, então, Meier luta tanto contra ela? Realmente, os protestantes, se forem lógicos, não podem apelar para provas bíblicas, a partir do momento em que nem mesmo têm como determinar quais livros são inspirados. Lutero achava que, se um livro pregasse a justificação somente pela fé, então ele era inspirado, caso contrário, não. Mas, lamentavelmente, ele nunca conseguiu provar que isso era verdade (tanto ele quanto eu poderíamos escrever livros sobre o assunto e nem por isso seriam inspirados) eis que vários livros da Bíblia não mencionam a justificação pela fé... É que, infelizmente, Lutero não sabia o que São Paulo queria dizer com a palavra fé. (sobre este assunto, consultar a obra fundamental do Protestantismo: Interpreter's Dictionary of the Bible, Supplemento, p.333).


FONTE:

Petersnet

Ecclesia

A importância dos pais contarem histórias para seus filhos

© Evgeny Atamanenko I Shutterstock

Inventar histórias e contá-las aos seus filhos ajuda-os a desenvolver a imaginação, a memória e o conhecimento. A seguir encontre algumas dicas para criar contos de fadas feitos sob medida e assim compartilhar um tempo precioso com seus filhos.

Era uma vez um pequeno chimpanzé que tinha perdido a mãe… – Ah! e qual era o seu nome? – Hmm… Teófilo. – E por que ele se perdeu?” Que pai/mãe já se aventurou fora dos caminhos simples dos livros? Na verdade, não fazemos ideia de quanto as crianças adoram quando ouvem histórias inventadas.

De fato, essa atividade não é apenas um compartilhamento de tempo inestimável que ajuda a fortalecer o vínculo emocional. Nem é só um antídoto formidável para as telas.

Mas ela também é uma oportunidade de ouro para entrar em um diálogo educativo e construtivo. Isso longe das ordens do dia a dia como “tome a sua sopa”, “vá se arrumar”, “lave as mãos”, explicam Laure de Cazenove e Alice Le Guiffant, que escreveram um livro sobre o assunto.

Esse momento também pode ser uma boa oportunidade para construir uma história feita sob medida para cada criança, interagindo com elas. Assim, por meio dos altos e baixos da história, ela pode falar sobre seus medos, suas esperanças e suas fantasias, compartilhar seu mundo interior, sentir-se ouvida.

No entanto, muitas vezes, essa atividade é negligenciada pelos pais. Seja por falta de imaginação, tempo, desejo ou energia, por não saber como fazer, por medo de decepcionar ou entediar as crianças, existem mil e uma desculpas!

As inúmeras virtudes das histórias inventadas pelos pais

E por que inventar histórias, quando os livros estão cheios delas? “Nada impede você de ler histórias também, mas inventá-las tem vantagens que a leitura de livros, por mais maravilhosos que sejam, nunca vai trazer”, asseguram as autoras.

Inventar uma história para uma criança, objetivando apenas estar com ela e a ela dar total atenção, é verdadeiramente um ato de amor, porque significa coloca-la como a pessoa mais importante daquele instante. Também falamos com o interior dela, pois o que oferecemos vem também do nosso interior”, do fundo do nosso coração e do nosso ser.

Assim, é um momento de cumplicidade importante, como confirma o depoimento de Jacques de Coulon. Filósofo e autor de numerosos livros sobre educação, este ex-reitor de uma importante escola na Suíça ficou profundamente marcado pela figura de seu avô, um notável contador de histórias.

Mundos fascinantes

As crianças ficavam como que enfeitiçadas pela história. Ele falava devagar, com um tom de voz penetrante, gerando suspense. Lembro-me particularmente de uma história fascinante, que tinha a palavra “negro” voltando como uma ladainha: “Sob um céu negro, negro, negro, mergulhamos na floresta negra, negra, negra… até chegar em frente a um portão negro”. E assim por diante, até chegar nas pesadas cortinas negras por trás das quais se escondia um pássaro com resplandecente plumagem colorida. Era realmente impressionante. Claro, nem todo mundo tem o talento para contar histórias. Mas essa sensação que passa tanto pelo corpo quanto pelas emoções é insubstituível”. 

Outro argumento de peso: “A criança que escuta uma história, brinca com ela sem esforço (nem precisa se adaptar ao ritmo de leitura do adulto, nem ler, nem decifrar a história). Ela familiariza-se com uma dinâmica que nutre o gosto pela leitura: a criação de hipóteses”, explica Laure de Cazenove.

Assim, a criança aprenderá a amar os livros como amigos e não como professores. Ouvir uma história, portanto, desenvolve a imaginação, aguça a reflexão, desperta a curiosidade, enriquece a personalidade, prepara inconscientemente as pessoas para estruturar seu pensamento e representar concretamente conceitos abstratos (coragem, bondade, justiça, amor, etc.).

Mas onde encontrar inspiração?

Meu avô me deu o gosto pela leitura, mas ainda mais, sem dúvida, pela escuta”, concorda Jacques de Coulon. “A audição é um sentido muito poderoso, muito menos complexo do que a visão, por meio do qual forjamos nossas próprias imagens interiores”.

Por conseguinte, ao se sentir um pouco mais ator da história, sem o suporte de imagens ou de uma história pré-formatada, a criança assimila de forma diferente.

Mas o que é uma história? Basicamente, um problema a resolver (o enredo) que colocará em movimento todo um mecanismo.

De fato, o diagrama narrativo dos contos tradicionais – do tipo Grimm ou Andersen – é um diagrama comprovado. Ele oferece as melhores garantias: uma estrutura e personagens precisos, um elemento perturbador que serve como uma mola dramática (acidente, aparecimento de um monstro etc.), um elemento de resolução e um resultado.

Portanto, uma história é como um espelho da realidade, oferecendo toda uma gama de experiências e personagens arquetípicos (o astuto, o franco, o bravo, dentre outros).

Imaginação fértil

Ao contrário de muitos pais, inventar histórias nunca foi um problema para Alexandra, mãe de três filhos que agora são adolescentes. Nada poderia conter a imaginação fértil dessa amante do teatro.

Que risadas memoráveis! Um dia, cansei de ler as mesmas histórias indefinidamente. Então fui em frente, inspirando-me no início em meus livros favoritos. Então comecei a bordar a minha própria história. Também aproveitei muito a oportunidade para lembrar o dia deles de forma vívida ou dissipar certos medos”.

E um terror noturno? “Contei uma história num ambiente de acampamento, usando minicenários de quadrinhos! Até hoje eles comentam sobre isso”. “Seja nas montanhas ou na floresta, uma história é um bom combustível para pés cansados”, acrescenta Marcos.

Momentos assim são o suficiente para ajudar as crianças a extrair delas mesmas os recursos para superar a frustração e o tédio.

No entanto, existem dois pré-requisitos essenciais para um contador de histórias: tempo e observação”, continua Jacques de Coulon.

Penso no meu avô, apaixonado pela natureza, que regularmente nos levava para observar a raposa e os pássaros com binóculos. A vida era mais simples, com mais momentos reservados à contemplação e ao devaneio. O mundo estava menos saturado de objetos que roubavam nossa atenção”.

Mas o que fazer para ganhar tempo em nossas agendas lotadas? Este é o verdadeiro desafio!

Como começar?

Primeiramente, é preferível recorrer ao repertório existente (tramas de livros, contos, desenhos animados, histórias bíblicas ou mitológicas).

Depois você pode contar a história oralmente, tornando-a sua, modificando o final ou um detalhe, acrescentando um personagem excêntrico, misturando várias histórias.

Inventar é antes de tudo copiar”, explica Laure de Cazenove e Alice Le Guiffant. Outra recomendação: use expressões, imagens, rimas, poemas ou objetos infantis.

Na verdade, podemos também envolver as crianças (uma boa forma de as treinar para fazer descrições) fazendo-as desenhar três ou quatro imagens sobre as quais teremos que criar a história: uma nuvem, um castelo, um barco, um foguete, dentre outras.

Por fim, cabe a elas criar uma história com esses elementos!

Aleteia

S. JOÃO LEONARDI, FUNDADOR DOS CLÉRIGOS REGULARES DA MÃE DE DEUS

Blog Escravas de Maria

João nasceu em Diecimo, província de Luca, no seio de uma família modesta de latifundiários. Sua vida parecia estar orientada para a profissão de boticário, como era chamado um farmacêutico na época. Porém, de repente, se abateu uma grave crise sobre a sua cidade. Assim, junto com o grupo que frequentava, chamado "Colombinos", leigos comprometidos em viver como autênticos cristãos, ele se dedicou à ajuda dos pobres. Desta forma, amadureceu sua vocação ao sacerdócio e foi ordenado em 1571.

Apóstolo da Reforma

Como sacerdote, João compreendeu, imediatamente, que a prioridade na sua vida era educar as crianças à fé. Então, experimentou um método inovador de ensino do Catecismo, que levou o Bispo de Luca a adotá-lo em todas as igrejas da cidade. Até os adultos participavam das suas aulas, atraídos pelo seu modo de transmitir a Palavra. As iniciativas eram tantas, que João precisou de ajuda: assim nasceu a Companhia da Doutrina Cristã, dirigida por leigos, que, em 1574, se tornou família religiosa, a Irmandade dos Sacerdotes Reformados, que, no fim, foi chamada com o nome atual de Clérigos Regulares da Mãe de Deus. João era um grande reformador, que se destacou em meio àquela onda de novidade, existente no seio da Igreja católica do seu tempo. Porém, como se sabe, os inovadores nem sempre são bem vistos.

"Inimigo da pátria"

Os pregadores hereges, que não faltavam na época, começaram a tomar João como alvo, apoiados também por sacerdotes e leigos, que não compartilhavam da sua obra reformadora. Assim, em 1584, aproveitando da sua viagem a Roma, o baniram para sempre da cidade, como inimigo da sua pátria. No entanto, a situação não mudou, nem mesmo depois da investigação, por ele solicitada. Voltando a Roma, João foi enviado pelo Papa como Visitador apostólico e reformador dos mosteiros beneditinos: os que tinham menos de 12 membros foram supressos; uniformizou os móveis, as roupas e a alimentação, em coerência com o voto de pobreza; e deteve as ingerências leigas na vida dos monges.

Missão da "Propaganda Fide"

Com o tempo, a João foi confiada a pastoral da igreja de Santa Maria “in Portico”, onde introduziu o ensino regular da Doutrina cristã. Entre 1607 e 1608, com outros sacerdotes, instituiu uma nova Congregação masculina, com o objetivo específico de propagar a fé cristã entre as populações, que ainda não a conheciam. Assim, nasceu o núcleo que, depois, se tornou Colégio Urbano de Propaganda Fide, do qual é considerado cofundador.
João Leonardi faleceu em 1609 e foi canonizado por Pio XI, em 1938. Entre seus escritos, deixou o Memorial a Paulo V, sobre a reforma geral de toda a Igreja, com o qual promovia a realização de Sínodos nacionais, a restauração da Catequese das crianças e a renovação do Clero, premissa necessária para a mudança do laicato.

Oração dos catequistas:

São João Leonardo, amigo e irmão,
faça com que possamos nos comprometer como você
na escuta e no anúncio da Palavra divina.
Que seu testemunho de servo fiel do Evangelho
seja modelo para a nossa vida de cristãos e catequistas.
Acenda, em nossos corações, a caridade evangélica;
concede-nos a sabedoria dos pequeninos;
infunde em nós a paciência dos arautos do Evangelho.
Que tudo contribua em nossa vida
para que o Senhor Jesus seja conhecido, amado, servido, testemunhado.
Faça com que possamos permanecer fiéis
ao encontro com Cristo no Sacramento da penitência e da Eucaristia,
para cultivar em nós o dom do amor sem medida.
Que Maria, Mãe de Deus, nos indique o caminho evangélico
da semente oculta, que produz muitos frutos.
Amém.

Vatican News

S. ABRAÃO, PATRIARCA

JW.org

Abraão, descendente direto de Sem - um dos três filhos de Noé, - viveu com seu pai Taré e toda a sua família em Ur dos Caldeus, uma cidade na Baixa Mesopotâmia, atual Iraque. A sua descoberta gradual de amizade com o único e verdadeiro Deus, - que deu início à história dos Patriarcas de Israel, ao longo dos séculos XIX a XVII a.C., - é narrada no livro do Gênesis.

Homem de fé

O idoso Taré deixou Ur, com seu filho Abraão, sua esposa Sara e seu neto Ló, filho do seu falecido irmão Aram, para se dirigir à Terra de Canaã. Chegando a Harã, estabeleceram-se ali por um longo tempo. Com a morte de Taré, que já tinha 205 anos, Deus irrompeu na vida de Abraão, chamando-o para uma missão misteriosa, à qual respondeu com imensa fé. Aos 75 anos, com sua mulher e seu neto, pôs-se novamente a caminho, levando consigo o gado e os criados, à maneira dos nômades, atravessando a Palestina, sem saber qual o destino que Deus lhe reservava. Em dado momento, Abraão e Ló se separaram: este último dirigiu-se para o Vale do Jordão, estabelecendo-se perto de Sodoma; Abraão permaneceu na Terra de Canaã, onde o Senhor interveio de novo.

Amizade com Deus

Alguns reis orientais começaram a invadir a Palestina: confiscaram os bens de Ló e o prenderam junto com sua esposa. Abraão conseguiu libertá-los e recuperar seus bens. Deus estava sempre com ele e lhe confirmou a promessa da sua grande descendência. Então Sara, esposa de Abraão, já idosa, cedeu a escrava Agar ao seu esposo, de cuja união nasceu Ismael. Assim, Abraão selou sua aliança com Deus, iniciando a prática da circuncisão, à qual se submeteram todos os homens da família. Deus apareceu novamente a Abraão, perto do carvalho de Mambré, na forma de três anjos, que lhe predisseram a maternidade de Sara, mas também a destruição das cidades pecaminosas de Sodoma e Gomorra. Somente Ló e sua esposa foram poupados; mas, desobedecendo a Deus, ela voltou-se para olhar o incêndio e se transformou em uma estátua de sal.

Pai de todos os que creem

Com o passar do tempo, Sara, finalmente, deu à luz a Isaac e fez com que Agar e Ismael saíssem de casa. Abraão ficou muito entristecido por isso, mas o Senhor prometeu uma grande descendência a ele e também a Ismael. Daí, aconteceu o momento mais dramático da vida de Abraão: o Senhor pediu-lhe para sacrificar seu filho Isaac, o filho que ele tanto tinha esperado e que o próprio Deus lhe havia enviado. No entanto, estando prestes a sacrificar Isaac, Abraão viu um anjo, enviado pelo Senhor, que lhe segurou a mão, poupando a vida de Isaac, por causa da incomensurável fé e obediência de Abraão. O Patriarca morreu com a idade de 175, na Terra de Canaã, enquanto os descendentes de Isaac e Ismael, foram, respectivamente, as estirpes de hebreus e árabes.

Vatican News

São Dionísio

ArqSP

O santo Dionísio, popularmente conhecido como o são Dênis de Paris, que é comemorado neste dia, foi durante muito tempo venerado como único padroeiro de França, até surgir santa Joana d'Arc para dividir com ele a grande devoção cristã do povo daquele país.

De origem italiana, ele era um jovem missionário enviado pelo papa Fabiano para evangelizar a antiga Gália do norte no ano 250, portanto no século III. Formou, então, a primeira comunidade católica em Lutécia, atual Paris, sendo eleito o seu primeiro bispo. Alguns anos depois, teria sofrido o martírio, sendo decapitado no local hoje conhecido como Montmartre, isto é, "Colina do Mártir". Ao lado do bispo Dênis, o sacerdote Rústico e o diácono Eleutério, seus companheiros, também testemunharam sua fé cristã.

Sobre o seu túmulo em Montmartre, mais tarde, foi edificada uma basílica, junto à qual, no ano 630, o rei Dagoberto fundou uma abadia. Até esses monges acabaram sofrendo com o efeito de uma enorme confusão que se fez entre este mártir e outros dois Dionísios: o Areopagita, discípulo de são Paulo, e o célebre escritor de Alexandria. Mas esses religiosos foram citados indevidamente.

A estranha e rebuscada confusão que se fez em torno da figura do santo bispo Dênis envolvia nitidamente essas três figuras distintas, que viveram em épocas diferentes, mas que foram unidas num único personagem, o santo celebrado hoje. Contava-se que o mártir original, ou seja, o bispo Dênis de Paris, foi enviado à Gália francesa pelo papa são Clemente I no fim do século I. Por isso ele começou a ser identificado com a figura de Dionísio Areopagita, discípulo do apóstolo Paulo, comemorado no dia 3 de outubro. Por isso, também, passou a ser confundido com um homônimo da Alexandria, autor de uma famosa coletânea de escritos místicos, que desde o século V vinha sendo erroneamente atribuída ao discípulo Areopagita.

Não bastasse toda essa confusão, são Dionísio, ou Dênis, segue sendo aclamado pela mais antiga tradição cristã francesa, que o venera como um mártir cefalóforo, ou seja, carregador de cabeça. E assim ele chegou aos nossos dias sendo o bispo mártir que havia carregado a própria cabeça decepada até o local onde deveria ser enterrado. No caso, a Abadia de Saint-Denis, em Paris, local onde, tradicionalmente, todos os reis da França foram enterrados.

*Fonte: Pia Sociedade Filhas de São Paulo Paulinas http://www.paulinas.org.br

Arquidiocese de São Paulo

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A PENITÊNCIA EM TERTULIANO

 

Dom Vital Corbellini
Bispo de Marabá - PA

 Introdução

Tertuliano, padre da Igreja dos séculos II e III, dedicou uma obra sobre a Penitência, (De Paenitentia) no qual exortou aos cristãos, sobretudo os de sua comunidade, a de Cartago, para que a vivessem como mudança de vida, de volta para Deus, ao próximo como a si mesmo. Ele a definiu como uma aflição da alma, derivada por um desgosto de uma decisão precedente[1]. Ele percebeu que alguns pagãos até puderam fazer a penitência, sem saber o que se passava, mas eles fizeram em vista do bem e da misericórdia. Desse modo os cristãos deveriam fazê-la em vista de uma vida nova.

Escrita lá pelos anos 203, a obra é de uma altíssima importância na história da penitencia eclesiástica[2] pois coloca a realidade do catecumenato, pastoral da igreja antiga, na qual os adultos se aproximavam da comunidade, pediam ao sacerdote o batismo e a pessoa era preparada para receber o banho batismal, a crisma e a eucaristia. Tertuliano deu nesta obra a importância da penitência em vista do perdão dos pecados e da conversão de vida.

A verdadeira penitência

Tertuliano colocou a consistência da verdadeira penitência, que é aquela de estar unida a Deus, de se aproximar dele, de afastar-se do pecado e buscar a conversão. Por isso é importante temer a Deus de modo que isto acarretasse a conversão de vida. A penitência não pode se tornar vã, mas deve levar ao fruto na qual Deus a recomendou aos seres humanos, a sua salvação. Deus após a expulsão de o primeiro ser humano do paraíso, após muito tempo, manifestou a sua misericórdia e consagrou a penitência na sua pessoa, possibilitando ao ser humano o perdão de seus pecados, à sua obra e à sua imagem. Ele tinha o povo de Israel no qual o favoreceu com múltiplos benefícios da sua bondade, e mesmo encontrando-o extremamente ingrato, o exortou à penitência tendo como pregadores a boca de todos os profetas[3].

Com a presença do Precursor, ordenou que fosse prescrito um batismo de conversão, sob o sinal da penitência para que as pessoas pudessem viver na graça do Senhor. Não calou de fato João em afirmar a importância da penitência porque se apressava aos povos da salvação, porque o Senhor a fez segundo a promessa de Deus. Todos os bens são resumidos numa única palavra: a salvação do ser humano com o prévio cancelamento dos pecados precedentes. Aquilo que proporciona alegre algumas ações ao ser humano torna um serviço a Deus. As pessoas são convidadas a fazer boas ações e bons pensamentos[4].

Deus, em Jesus Cristo, admite as ações boas porque lhes pertencem, não as condenando. E sendo o seu autor, é também o seu defensor e o seu remunerador. Toda a ação boa tem como devedor o próprio Deus, porque Ele as inspira às pessoas. Deste modo é fundamental a realização da penitencia em todas as ações, em vista de ter diante de Deus, o perdão dos pecados em Jesus Cristo e com a sua igreja.

O que é o pecado?

Tertuliano teve uma importante definição do pecado, aquilo que Deus proíbe[5]. Sendo Ele o Sumo Bem, nada pode desagradá-lo senão o mal, pelo fato de que não pode haver alguma concordância entre coisas contrárias. Pela caída do pecado do ser humano, é preciso a realização da penitência para obter o perdão dos pecados aos seres humanos, por parte de Deus. É preciso evitar os pecados para assim viver bem o dia a dia. É preciso que a vontade seja forte para não cair no pecado. O fato é que o pecado tem origem na vontade, tendo ali a sua origem. É o próprio Senhor que fala do pecado do interior da pessoa quando uma pessoa olha para uma mulher e cobiçando-a no seu coração, já cometeu adultério em si[6]. Por isso é importante alimentar a boa vontade com as coisas de Deus, de vida para assim superar o mal na qual a pessoa não quer realizá-lo[7]. O que importa é o bem e a superação do mal através da atitude da penitência.

Os benefícios da penitência

Tertuliano percebeu benefícios que a penitência traz à vida cristã. Ele a viu como graça do Senhor Deus sendo uma atitude de conversão na qual pede para os seus discípulos e discípulas, sendo que a penitência levará a salvação. O Senhor prefere a penitencia que a morte do pecador, de modo que a penitência é vida e se antepõe a morte[8]. Ele a aconselha para que seja assumida na vida das pessoas e pela acolhida na existência humana ela levantará a pessoa e conduzirá o penitente ao porto da divina clemência. É preciso ser uma arvore nova, que pela penitência trará frutos novos à vida da Igreja e no mundo. Pela penitencia a pessoa se volta para Deus e vai amar o que Ele ama, vivendo uma vida diferente, aberta ao designo de Deus.

Por isso a penitencia traz benefícios enormes à vida nos seguidores de Cristo. O fato é que aquilo que Deus ordena é bom e ótimo. A pessoa não só deve obedecer porque o preceito é bom, mas porque Deus o ordena para todos. É o próprio Deus quem o ordena para fazer penitência de modo que a pessoa possa perseverar nos seus frutos e nos seus bons efeitos[9].

A penitência relacionada com o batismo

Tertuliano falou da penitência que precedia o batismo, aos catecúmenos, no sentido de que a pessoa era convidada a não mais cair no pecado[10]. Como não havia ainda a confissão individual a pessoa era convidada a manifestar o pecado de uma forma pública, sobretudo para os pecados de apostasia, homicídio e adultério. Tertuliano aprofundou esta penitência no sentido de que o pecador ou a pecadora antes do batismo, e de outros sacramentos, não voltassem a cair nesses pecados, fazendo a penitência. Uma vez que se conheceu o mandamento da lei do Senhor, o autor africano solicitava aos catecúmenos para que não caíssem nos pecados. O pecado não é só rebelião à vontade de Deus, mas é também ingratidão para a sua bondade, sendo uma espécie de recusa ao seu benefício. Como poderia agradar a Deus alguma pessoa que recusaria o seu dom?[11]. Deste modo é preciso fazer a penitência para temer a Deus, a sua fé nele[12], agradar aos seus mandamentos e fugir da tendência do pecado, tendo uma vida normal na família, na comunidade e na sociedade. A pessoa torna-se, pela penitência, mais devota ao Senhor, pelo fato de que ela aspira à salvação, procurando ganhar o favor de Deus[13], pois com a penitência há o perdão dos pecados. Quanto seria injusto não atender ao pedido da comunidade eclesial e do Senhor em vista do perdão dos pecados em vista do bem e da vida eterna[14], promessas dadas pelo Senhor.

Tertuliano convidou os catecúmenos para que entrassem na água, para assim receber o perdão dos pecados. Para isso deveriam fazer o esforço para receber bem os sacramentos, não se tratando de qualquer água, mas da água batismal em vista do perdão dos pecados[15]. Com o Senhor e com a sua igreja, pela penitência deve-se construir a casa sobre a rocha e não sobre a arreia destinada a cair[16]. Uma vez que se conheceu o Senhor, a pessoa é chamada a viver os seus mandamentos na vida cotidiana e na comunidade. O banho batismal confere a pessoa o selo da fé, porque dá a purificação dos pecados, como resultado de uma sincera penitência[17]. Os ouvintes receberão o batismo com fé, sendo este sacramento graça e não o será acolhido por presunção, porque seria um ato de soberba.

Desta forma Tertuliano propôs a penitência como forma de conversão de vida para seguir o caminho do Senhor e viver melhor em cada dia em unidade com Deus, com o próximo e consigo mesmo. A penitência aludiu à vida nova com Deus e com as pessoas humanas.

[1] Cfr. Tertulliano, La Penitenza. Texto critico de CCL 1. Introduzione, Traduzione, Note e Appendice, Attilio Carpin. Edizioni San Clemente, Edzioni Studio Domenicano, Bologna, 2011, pg. 89.

[2] Cfr. Johannes Quasten, Patrologia. I primi due secoli (II -III). Marietti, Casale, 1980, pg. 539.

[3] Cfr. Tertulliano, La Penitenza1, 5, pg. 97.

[4] Cfr. Idem, 2,8, pg. 99.

[5] Cfr. Idem, 3,1, pg. 103.

[6] Cfr. Mt 5,28.

[7] Cfr. Idem, 3,16, pg. 109.

[8] Cfr. Idem, 4,2, pg. 111.

[9] Cfr. Idem, 4,8, pg. 115.

[10] Cfr. Idem, 5,1, pg. 115.

[11] Cfr. Idem, 5,5-6, pg. 117.

[12] Cfr. Idem, 5,9, pg. 119.

[13] Cfr. Idem, 6, 1, pg. 123.

[14] Cfr. Idem, 6,6, pg. 125.

[15] Cfr. Idem, 6,10, pg. 127.

[16] Cfr. Mt 7,24-27; Idem, 6, 13, pg. 129.

[17] Cfr. Idem, 6,16, pgs. 130-131.

CNBB

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF