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domingo, 11 de outubro de 2020

Fascínio e testemunho de Francisco

Antoine Mekary | ALETEIA
por Francisco Borba Ribeiro Neto

Francisco, com seu exemplo, nos indica um caminho para a verdadeira humildade e a verdadeira simplicidade

Nesse momento, em que o Francisco está lançando sua nova encíclica, Fratelli tutti, vale a pena uma reflexão sobre o fascínio que o Papa exerce tanto entre católicos quanto entre não católicos – e sobre o que nós podemos aprender com ele, para nosso bem e de todos os que encontramos. Para entendermos esse fascínio, não podemos deixar de nos focar também na figura do Santo de Assis, provavelmente o mais carismático entre os homens santos católicos, do qual o Papa emprestou o nome.

Se voltarmos na história, para o dia de sua eleição, veremos que a humildade e a simplicidade de Bergoglio cativaram o mundo imediatamente. A opção por uma Igreja “pobre para os pobres”, a visão que partia da periferia – local característico dos excluídos – e o movimento em direção a essas periferias, foram “capturados” pelas pessoas, por assim dizer, a partir dessa humildade e dessa simplicidade. Num mundo em que os poderosos usam sua força para se imporem aos demais, um chefe humilde é uma revolução em si mesmo.

A humildade e a simplicidade não são posicionamentos político-ideológicos. São virtudes morais, que podem estar presentes ou faltar seja qual for o posicionamento de uma pessoa. Encontrarmos gente que se torna arrogante por ser mais rica, mais poderosa ou materialmente mais bem-sucedida que os demais; mas também encontramos gente arrogante porque se considera mais inteligente, mais correta ou com um posicionamento político mais adequado. Paradoxalmente, podemos encontrar pessoas que são arrogantes por se considerarem mais justas, mais bondosas ou até mais humildes que as demais!

Francisco, com seu exemplo, nos indica um caminho para a verdadeira humildade e a verdadeira simplicidade. O humilde vai sempre em busca do seu irmão, quer dialogar com ele, entendê-lo e de alguma forma compartilhar sua vida. O humilde sofre com as dores do outro e não se propõe a condená-lo, mas sim a ajudá-lo em suas dificuldades.

A precedência da empatia

Francisco demonstrou que a empatia precede o julgamento. A frase lapidar, que marca essa posição existencial, é a resposta dada pelo Papa a uma jornalista, na sua viagem de volta da Jornada Mundial da Juventude no Brasil, quando diz “Se uma pessoa é gay e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para a julgar?”. A humildade e a simplicidade são compreendidas facilmente, mas essa precedência da empatia exige reflexão. Muita gente confunde essa empatia com falta de critérios claros, quando a própria empatia já é a aplicação de um critério maior: a caridade que engloba e, de certa forma, supera todos as demais dimensões da vida cristã (cf. 1Cor 13).

Além disso, precisamos ter uma visão realmente cristã do que seja o “juízo”. Quando pensamos, por exemplo, no famoso método Ver/Julgar/Agir, o juízo é muito semelhante ao “discernimento” jesuíta: aprofundar-se tanto na realidade quanto na intimidade com Deus, para compreender o Seu desígnio naquela situação. O discernimento procura o verdadeiro e o justo, para orientar a ação. Numa ótica “mundana”, contudo, o julgamento destina-se a condenar ou não condenar (isto é, absolver) alguém ou alguma situação. Enquanto o juízo cristão é uma postura propositiva, voltada ao bem da pessoa e do outro, o julgamento humano é normalmente entendido como uma postura negativa, voltada – na melhor das hipóteses – à supressão de algo que não está certo.

Daí nasce a capacidade de diálogo, que se abre para o encontro com o outro – categorias chave para a compreensão da nova encíclica do Papa.

O fruto da misericórdia

Essas virtudes de Francisco/Bergoglio não são méritos exclusivos dos cristãos. Existe uma infinidade de não cristãos que praticam esses valores, tanto ou mais que a maioria dos cristãos. Contudo, os cristãos contam com uma ajuda a mais, uma facilitação para viverem assim.

Certa vez, um jornalista agnóstico, pessoa muito generosa e sincera, depois de passar um longo tempo procurando entender o cristianismo, me deu a seguinte explicação: “Tanto vocês, cristãos, quanto eu, agnóstico, somos capazes de amar e procurar fazer o bem. Mas vocês acreditam fazer a experiência de serem amados com um amor imenso e totalmente gratuito e, por isso, agem acreditando que podem e devem amar aos demais com esse amor gratuito. Eu nunca experimentei esse amor, por isso não acredito que conseguirei amar assim”.

A fonte da postura humana e do testemunho do Papa é a experiência que ele mesmo faz da misericórdia, de receber um amor imerecido e gratuito, um perdão que supera seus limites e pecados – como declara numa entrevista ao jesuíta Antonio Spadaro. Por isso proclamou o Jubileu Extraordinário da Misericórdia.

O jornalista agnóstico estava certo ao perceber que a experiência do encontro com Cristo que nos ama gratuitamente é a origem do amor e do testemunho cristão, como lembra o Papa em sua carta ao jornalista Eugenio Scalfari.

Fratelli tutti?

Dizer que todos somos irmãos pode parecer ingênuo às pessoas do nosso tempo, marcado por um certo realismo cínico, que “desconstrói” valores e ideais. É preciso um testemunho como o de Francisco pode trazer credibilidade a essas palavras. Quando esse testemunho acontece, se mostra fascinante e capaz de levar esperança e gerar um compromisso com o bem comum.

Aleteia

A forma do batismo: somente por imersão? (Parte 7/12) – O batismo do eunuco

Veritatis Splendor

O BATISMO DO EUNUCO

O texto diz assim:

  • “E, indo eles caminhando, chegaram ao pé de alguma água, e disse o eunuco: ‘Eis aqui água; que impede que eu seja batizado?’ E disse Filipe: ‘É lícito, se crês de todo o coração’. E, respondendo ele, disse: ‘Creio que Jesus Cristo é o Filho de Deus’. E mandou parar o carro, e desceram ambos à água, tanto Filipe como o eunuco, e o batizou. E, quando saíram da água, o Espírito do Senhor arrebatou a Filipe, e não o viu mais o eunuco; e, jubiloso, continuou o seu caminho” (Atos 8,36-39).

Se nossos amigos imersionistas afirmam que “descer” é “mergulhar”, então devem interpretar (cf. Atos 8,38) que o batizador e o batizado, ambos, mergulharam na água e, portanto, os dois foram batizados ao mesmo tempo; e, o que é pior: Felipe se rebatizou, pois ele já era batizado – tudo isso porque o texto diz “desceram ambos à água” e nossos amigos interpretam que esse “descer” significa batizar-se por imersão.

Felipe desceu à água e subiu novamente, assim como também o eunuco. Os dois desceram à água. Se os nossos amigos imersionistas podem demonstrar que o eunuco foi mergulhado, eles acabam demonstrando exatamente o mesmo em relação a Felipe!

Com efeito, o fato de o texto dizer que “desceram” não quer dizer que o eunuco foi batizado por imersão, já que o mesmo texto também diz que Felipe desceu à água, porém ele não foi batizado. Portanto, não há prova absoluta de um batismo por imersão nessa passagem. Nós simplesmente ignoramos qual forma foi empregada aí, mas pelo contexto que nos foi especificado, que se tratava de um lugar com “alguma água” (Atos 8,36), “no deserto” (Atos 8,26), o mais provável é que se deu por infusão [ou aspersão].

Entrar na água pode sifnificar que se mantiveram de pé em cima da água, para tomar algo dela em um recipiente ou hissopo, a fim de poder derramá-la ou aspergí-la e, a seguir, deixá-la, já que o texto também diz que “ambos saíram da água”. Desse modo, “entrar” e “sair” não significa absolutamente que houve ali um batismo por imersão.

Coloquemos o exemplo (cotidiano) de uma criança colocando os pés numa poça de água; sua mãe, ao vê-lo pisar na poça, grita brava: “Sai da água”; e o menino sai da água. Esse “sair da água” não significa que o menino tenha mergulhado nela, já que se tratava apenas de uma poça d’água.

Logo, o descer para o batismo nas expressões de Mateus 3,16, que diz que “Jesus batizado, saiu logo da água”, e de Atos 8,38, que diz que ambos desceram e saíram da água, não afirma sem margem a dúvidas que as pessoas aí mergulharam; uma vez que a água sempre está abaixo do nível da terra, sempre se fala em “descer” e “sair” ou “subir” da água, mesmo que tenham somente colocado os pés na água.

Como os imersionistas interpretariam então João 11,55, que diz: “E muitos subiram daquela região a Jerusalém”? As pessoas saíram debaixo da terra para se dirigirem a Jerusalém? Óbvio que não!

Veritatis Splendor

XXVIII Domingo do Tempo Comum - Ano A

Dom José Aparecido
Adm. Apost. Arquidiocese de Brasília

A FESTA DO CASAMENTO ESTÁ PRONTA

Neste Domingo vibramos na feliz esperança da ressurreição e da participação no Banquete do Cordeiro. No seu grande apocalipse, Isaías anuncia que o Senhor dos exércitos, após o juízo sobre a humanidade infiel à antiga aliança, preparará “para todos os povos, um banquete de ricas iguarias, regado com vinho puro, servido de pratos deliciosos e dos mais finos vinhos” (Is 25,6), libertando-os de toda cadeia. Este banquete é prefiguração da Eucaristia e do Banquete escatológico antecipado na história pela mesma Eucaristia.

Esta promessa escatológica não nos livra das dificuldades da vida presente. Na segunda Leitura, São Paulo confidencia: “Eu aprendi o segredo de viver em toda e qualquer situação, estando farto ou passando fome, tendo de sobra ou sofrendo necessidade. Tudo posso naquele que me dá forças” (Flp 4,12-13). Cheio de gratidão, ele glorifica o Deus providente, que o sustém pelas mãos generosas dos irmãos, e nos conforta na esperança da vida eterna.

Ao dar este banquete, “o Senhor Deus eliminará para sempre a morte, e enxugará as lágrimas de todas as faces” (Is 25,8). Paulo aludirá a esta promessa afirmando que a ressurreição de Cristo comportou a vitória definitiva sobre a morte (cf. 1Cor 15,54-55). João dela se lembrará ao anunciar a salvação que o Cordeiro morto e ressuscitado trará, enxugando toda lágrima e destruindo a morte, a dor e todo pranto (cf. Ap 21,4 e 7,17). Ao pedir que Deus receba os mortos no Seu Reino, a Igreja assume esta esperança: “Unidos a eles, esperamos também nós saciar-nos eternamente da vossa glória, quando enxugardes toda lágrima dos nossos olhos. Então, contemplando-vos como sois, seremos para sempre semelhantes a vós e cantaremos sem cessar os vossos louvores” (Oração Eucarística III).

A primeira Leitura exalta justamente a fidelidade de Deus à Sua promessa. O Evangelho (Mt 22,1-14), contudo, nos faz refletir sobre a exigência de uma adequada resposta humana: “Amigo, como entraste aqui sem o traje de festa?” (v.8). Da parte de Deus tudo está dado. A nossa correspondência, porém, será fruto da experiência exigente da caridade, a veste nupcial. “Ninguém – diz são Josemaría – é excluído da salvação, se livremente abre as portas às amorosas exigências de Cristo” (É Cristo que passa, 180). Para saborear as ricas iguarias e os vinhos mais finos é preciso afastar o coração de tudo o que afasta de Deus.

Bento XVI assim conclui uma meditação sobre esta Parábola do Evangelho de Mateus: “Todos nós somos convidados a ser comensais do Senhor, a entrar com fé no seu banquete, mas devemos vestir e guardar o hábito nupcial, a caridade, viver um profundo amor a Deus e ao próximo” (Homilia, 9.X.2011).

A Igreja missionária anuncia a alegria e a esperança do Evangelho pelas ruas e encruzilhadas das nossas cidades, convidando todos ao Banquete do Reino.

Folheto: "O Povo de Deus"|Arquidiocese de Brasília

S. JOÃO XXIII, PAPA

S. João XXIII, Basílica de São Paulo Extramuros

Ângelo José Roncalli, quarto filho de 13, nasceu em Sotto il Monte, Bergamo, em 25 de novembro de 1881. Em 1892, entrou para o Seminário de Bergamo e, em 1896, foi admitido à Ordem Franciscana Secular. De 1901 a 1905 foi aluno no Pontifício Seminário Romano e, em 1° de agosto de 1904, ordenado sacerdote. A seguir, foi convocado como secretário do Bispo Giacomo Maria Radini-Tedeschi, e, por isso, regressou à "sua" cidade de Bergamo.

Experiência da guerra

Viver ao lado do Bispo e acompanhá-lo nas suas visitas aos lugares mais recônditos da diocese, certamente, constituíram a inspiração pastoral que guiará sempre o futuro Papa. Porém, em 1914, tudo se interrompeu bruscamente: faleceu Dom Giacomo Radini e estourou a I Guerra Mundial. Quando a Itália entrou no conflito, em 1915, Ângelo Roncalli foi convocado para servir como novo Sargento no campo da Saúde; depois, tornou-se Capelão militar, trabalhando nos hospitais militares de reserva, e coordenador na assistência espiritual e moral dos soldados.

Em Roma, a serviço da Santa Sé

Ângelo Roncalli entrou oficialmente no Vaticano, em 1921, onde teve início a segunda parte da sua vida: foi convocado a Roma, por Bento XV, para presidir, pela a Itália, ao Conselho Central da Pontifícia Obra de Propagação da Fé; quatro anos depois, o novo Papa, Pio XI, o nomeou Visitador Apostólico na Bulgária. Nomeado Bispo, em 19 de março de 1925, em Roma, começou sua missão, em Sofia, em 25 de abril. A seguir, foi nomeado primeiro Delegado Apostólico na Bulgária, visitando as comunidades católicas e estabelecendo cordiais relações com as demais comunidades cristãs, até 1934.

Vida no exterior, como pastor missionário

Por vários anos, Ângelo José Roncalli foi representante da Santa Sé no exterior. Em 27 de novembro de 1935 ,foi nomeado Delegado Apostólico na Turquia e Grécia e Administrador Apostólico dos latinos em Constantinopla. Não foi uma tarefa fácil. Na "nova" Turquia, proclamada Estado não confessional, trabalhou para que os Católicos não se sentissem excluídos da sociedade; ao invés, na Grécia, deviam melhorar as relações com o Patriarca e os metropolitas da Igreja Ortodoxa. Com a explosão da II Guerra Mundial, a situação de Dom Roncalli teve que mudar, novamente: em 20 de dezembro de 1944, Pio XII confiou-lhe, mais uma vez, uma tarefa delicada: foi nomeado Núncio Apostólico em Paris. A França, em uma situação de libertação, iniciava um profundo processo de laicismo estatal. O que sempre inspirava Dom Roncalli, em cada nova função, era buscar a simplicidade evangélica, mesmo diante das questões diplomáticas mais complexas: era sustentado por um desejo pastoral sacerdotal, em todas as situações, com também por uma piedade sincera, que consistia em dedicar, diariamente, um maior tempo à oração e à meditação.

Pastor de almas na Cátedra de Pedro

Como quase sempre acontece, a vida passa por rápidas mudanças. Assim aconteceu com Dom Ângelo Roncalli: em 1953, foi criado Cardeal e, imediatamente, teve que voltar para a Itália, onde se tornou Patriarca de Veneza. Achou, portanto, que estão podia dedicar os últimos anos da sua existência ao ministério direto de cuidar das almas, na capital veneta. Ao invés, com a morte de Pio XII, foi eleito Papa, em 28 de outubro de 1958, escolhendo o nome de João XXIII. Durante seu quinquênio de Pontificado, deu ao mundo uma autêntica imagem de Bom Pastor, recebendo, de fato, o apelido de "Papa bom" ou "Papa da bondade".

Concílio Vaticano II e Magistério da Igreja

João XXIII demonstrou, imediatamente, ser um Papa inovador: convocou o Sínodo Romano, instituiu a Comissão para a revisão do Código de Direito Canônico, mas, sobretudo, de modo surpreendente, da Basílica de São Paolo fora dos Muros, convocou, em 25 de janeiro de 1959, o Concílio Ecumênico Vaticano II. O objetivo não era mudar a Doutrina católica, nem definir novas verdades de fé, mas repropor o conteúdo da fé ao homem contemporâneo, para dar resposta às novas problemáticas e desafios de uma sociedade em evolução. Coerente com uma atitude de diálogo e compreensão e não de oposição e condenação, convidou também expoentes das várias Confissões cristãs como observadores do Concílio. A mensagem de João XXIII foi lançada com força pelas suas oito Encíclicas, inclusive a "Mater et magistra", de 1961, na qual repropôs o ensinamento social da Igreja, 70 anos depois da "Rerum novarum" e da "Pacem in terris”, de 1963: o primeiro documento da história, dirigido a todos os homens de boa vontade, no qual destacava os conceitos de paz e de uma justa ordem social. Há algum tempo, João XXIII estava doente. De fato, faleceu em 3 de junho de 1963, logo depois do Dia de Pentecostes. O “Papa bom” foi beatificado por João Paulo II, durante o Grande Jubileu de 2000, e canonizado pelo Papa Francisco, em 27 de abril de 2014.

Oração que João XXIII gostava de rezar durante a Missa:

Pai do Céu. Pai de misericórdia!
Atendei a oração do vosso servo:
1) pela satisfação e remissão de todos os meus pecados;
2) pela saúde e fortaleza da minha alma, da minha casa e daqueles que estão vinculados ao meu serviço;
3) pela satisfação e remissão dos pecados dos governantes,
dos prelados, das almas consagradas e de todos,
para que vos dignais conceder a todos a graça do Espírito Santo;
4) por todos os pecadores do mundo, a fim de convertê-los
e reconduzi-los ao caminho da salvação;
5) pelo conforto dos aflitos, concedendo-lhes apoio e verdadeira paciência;
6) pelo refrigério e libertação das almas do purgatório, especialmente as que têm direito à minha oração;
enfim, para iluminar todos os povos, que não receberam a luz do Evangelho, e os nossos irmãos separados, para que possam vos conhecer e amar.
Pai Todo-Poderoso, bendito sejais para sempre, junto com o Filho e o Espírito Santo. Assim seja!

Vatican News

sábado, 10 de outubro de 2020

TODOS IRMÃOS: O que será de um mundo sem o amor?

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)

“Fratelli tutti” – Todos irmãos – é a interpelação antiga, mas sempre atual, da autenticidade cristã, que inspira a nova Carta Encíclica do Papa Francisco. O Santo Padre retoma a exemplaridade de São Francisco de Assis, que partilha o segredo de sua grande paixão: o amor a todos, ‘todos irmãos’. O amor que vem de Deus é a fonte sempre transformadora. A referência argumentativa insubstituível está inscrita na Primeira Carta do Evangelista João – “Deus é amor, e quem permanece em Deus, permanece no amor” (I Jo 416). A exemplaridade de Francisco de Assis é inspiradora comprovando que vale temperar a vida com o sabor do Evangelho, deixando-a repleta de amor. O amor é capaz de gerar mudanças significativas nas pessoas, convertendo-as em instrumento de transformação social. O amor fecunda a profecia que o mundo precisa ouvir, fortalecendo e iluminando entendimentos para inspirar gestos
qualificados.

Percebe-se a razão que faz o Pobrezinho de Assis, mesmo após oito séculos de sua presença testemunhal, continuar preciosa referência para a contemporaneidade. A sua vida é lição com propriedades singulares na tarefa de se estabelecer aproximações e diálogos. São Francisco inspira a competência humana para “reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas, independentemente da sua proximidade física, do ponto da terra onde cada um nasceu ou habita”. Importante lembrar que São Francisco de Assis já havia inspirado o Papa Francisco a escrever a Carta Encíclica Laudato Sí, sobre o cuidado com a casa comum. Agora, o seu testemunho, a partir da nova Encíclica do Papa, evoca a centralidade da fraternidade universal e da amizade social. O brilho dessa profecia faz reconhecer a necessidade de se encontrar respostas e saídas para mudar a civilização contemporânea, reconfigurando tudo – da economia à convivialidade.

O que será de um mundo sem o amor?

Foto ilustrativa: pearleye by Getty Images

Amor a Deus e ao próximo

Especialmente aos cristãos é imprescindível cultivar o amor ao próximo, selo de autenticidade do amor a Deus, lembrando que o Mestre Jesus entrelaçou dois mandamentos. Reconhecer que não é possível separar esses mandamentos garante a superação dos riscos das escolhas equivocadas, justamente por desconsiderarem o próximo. Só um coração sem fronteiras tem o tecido próprio do amor que gera mudanças, é alicerce da amizade social e da fraternidade universal. Avanços tecnológicos, científicos e culturais são indispensáveis, mas é evidente que, sem o amor, o mundo não encontrará a nova ordem almejada. A Encíclica “Fratelli Tutti” ensina que a vivência do amor é o caminho para fazer nascer, entre todos, o anseio mundial pela fraternidade.

A civilização contemporânea carece de relações mais fraternas. A triste realidade de que, mesmo após mais de 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, muitos ainda não os reconhecem ou são privados de suas garantias, sinaliza a carência generalizada de fraternidade. Urgente é, pois, inspirar-se pelas chamas da profecia, que alertam para a inigualável força do amor fraterno, capaz de mudar o coração e iluminar a mente. Como sublinha o Papa Francisco, sem essa força persistirão as inúmeras formas de injustiças alimentadas por visões antropológicas redutivas e por um modelo econômico fundado no lucro, explorador, que depreda de modo indiferente e doentio a
Casa Comum, além de descartar e, até mesmo, assassinar seres humanos.

Ligação entre todos

No primeiro capítulo de sua Carta Encíclica, o Papa Francisco aponta as sombras de um mundo fechado, as contradições presentes nestas duas décadas do terceiro milênio, período de anunciados progressos, mas também de retrocessos históricos. O remédio do amor fraterno é reapresentado, em tom de profecia, com suas propriedades para amalgamar projetos urgentes, inspirando a capacidade para gerar integração e cooperação entre as pessoas, no passo a passo crescente da solidariedade. Um contraponto aos interesses que hoje, conforme sublinha o Papa Francisco, colocam todos contra todos – uma luta em que vencer significa destruir, fazendo com que muitos considerem um delírio sonhar com o desenvolvimento integral a serviço de toda a humanidade.

Entre as guerras de configurações variadas e perversas insere-se o fenômeno da exasperação, exacerbação e polarização nos contextos políticos. Ao outro, que pensa e é diferente, é negado até mesmo o direito de existir. Muitos se permitem utilizar recursos abomináveis para ridicularizar aqueles com quem se discorda, alimentando preconceitos e discriminações, promovendo a exclusão social e permanecendo indiferentes à violação dos Direitos Humanos na convivência social. Há uma esperança para mudar essa realidade. Só o amor permitirá enxergar para além do “eu”, do “outro” e reconhecer a ligação entre todos. Não somente considerar o “eu” ou o “outro”, mas arquitetar o “nós”, passo decisivo para construir o novo tempo almejado. Todos possam investir na reflexão e nas indicações que a Encíclica “Fratelli Tutti” apresenta. As chamas da profecia brilhem e prevaleça o amor, capaz de construir a fraternidade universal, efetivando a indispensável e urgente amizade social.

Portal Canção Nova

Alegria no Céu! Carlo Acutis já é Beato e sua memória será lembrada no 12 de outubro

Tumba de Carlo Acutis. Foto: Daniel Ibáñez / ACI Prensa

ASSIS, 10 out. 20 / 11:59 am (ACI).- Carlo Acutis já é beato. O jovem italiano falecido em 2006 devido a uma fulminante leucemia quando tinha 15 anos e conhecido como o “ciberapóstol da Eucaristia”, foi proclamado beato pelo Cardeal Agostino Vallini, Legado Pontifício para as basílicas de São Francisco e Santa María dos Anjos, em uma cerimônia celebrada na Basílica de São Francisco de Assis este sábado 10 de outubro.

Ao dar começo o rito de beatificação, o Cardeal Vallini leu em latim a Carta Apostólica com a fórmula de beatificação: “Nós, acolhendo o desejo de nosso irmão Domenico Sorrentino, Arcebispo-Bispo de Assis Nocera Umbra-Gualdo Tadino, de muitos outros irmãos no episcopado e de muitos fiéis, depois de ter obtido a autorização da Congregação para as Causas dos Santos, com nossa autoridade apostólica concedemos que o Venerável Servo de Deus, Carlo Acutis, leigo, que, com o entusiasmo da juventude cultivou a amizade com o Senhor Jesus pondo a Eucaristia e o testemunho da caridade no centro de sua vida, a partir de agora em adiante seja chamado Beato e que cada ano se celebre nos lugares e segundo as regras estabelecidas pelo direito, o 12 de outubro, dia de seu nascimento para o céu. Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém”.

Em seguida foi revelado o retrato oficial do novo Beato e uma relíquia sua foi levada pelos seus pais até o altar, onde se adornou com velas e flores.

Enquanto se procedia à veneração, o coro e a assembleia entoaram o hino dedicado ao Beato Carlo Acutis:

“A Igreja de Cristo saúda festejando seu jovem filho. OH, Carlo beato! O Coração de Cristo procura com zelo dentro da Igreja. Oh, Carlo beato!”.

Depois de uns instantes de intensa veneração da relíquia, o Cardeal procedeu com a cerimônia.

A cerimônia ainda decorre em Assis e pode ser acompanhada através do nosso Facebook: https://www.facebook.com/acidigital/videos/357015519078309

ACI Digital

Catedral armênia severamente danificada em conflito com o Azerbaijão

DAVIT GHAHRAMANYAN/AFP/East News
por John Burger

Novas hostilidades, que tiraram mais de 300 vidas, envolvem agora locais religiosos.

Fotos

A Igreja Armênia culpou os militares azerbaijanos pelo bombardeio de uma catedral histórica no disputado território de Nagorno-Karabakh.

Em sua página do Facebook, a Igreja, com sede em Etchmiadzin, Armênia, postou fotos da Catedral do Santo Salvador fortemente danificada na cidade de Shushi.


A Igreja na Armênia divulgou um comunicado lamentando os fatos. De fato, considera o bombardeio um ato de “intolerância religiosa extrema”. Ainda exorta

“os pastores de Igrejas, comunidades e organizações internacionais a levantarem uma voz em prol da suspensão do sangramento, vida livre e independente do povo Artsakh”.

De fato, a agência de notícias francesa AFP tuitou na quinta-feira que o Azerbaijão negou ter bombardeado a catedral.

Sérios danos

De acordo com um meio de comunicação da Índia, o Deccan Herald, a Armênia confirmou na quinta-feira que as forças do Azerbaijão bombardearam a catedral e que jornalistas da AFP viram que a igreja havia sofrido sérios danos.

De fato, tanto a página do Facebook quanto o relatório do Deccan Herald traziam fotos dos danos mencionados pela AFP.

“Havia um buraco no telhado da Catedral Ghazanchetsots (Santo Salvador), um local icônico para a Igreja Apostólica Armênia,” relatou o Herald. Além disso, há escombros por todos os lados e parte do teto cedeu.

“O inimigo azerbaijano atingiu o símbolo de Shushi – a Catedral de Ghazanchetsots”, disse o porta-voz do ministério da defesa armênio Artsrun Hovhannisyan. Do mesmo modo, um residente local chamado Simeon disse à AFP: “não há militares, nada estratégico aqui, como você pode atacar uma igreja?”

Conflito

Nagorno-Karabakh é uma região no sul do Cáucaso, cercada pelo Azerbaijão. Na verdade, a região, a leste da Armênia e ao norte do Irã, é conhecida pelos armênios como Artsakh. É principalmente uma área montanhosa.

De acordo com o CIA World Factbook, a disputa em Nagorno-Karabakh e a ocupação militar armênia das terras vizinhas no Azerbaijão “continua sendo o foco principal da instabilidade regional”.

Assim, mais de 300 pessoas morreram e milhares foram deslocadas desde o início dos últimos combates em 27 de setembro, de acordo com a BBC.

Do mesmo modo, France24 relatou que na principal cidade de Nagorno-Karabakh, Stepanakert, os residentes têm usado a catedral da Santa Mãe de Deus como abrigo contra bombardeios.

Aleteia

Milagre alcançado por um menino brasileiro levará à beatificação de Carlo Acutis

Matheus, menino que alcançou a cura milagrosa.
Foto: Danielle Valentim / Campo Grande News

Campo Grande, 09 out. 20 / 04:20 pm (ACI).- A cura de um menino brasileiro que sofria de uma anomalia congênita rara foi o milagre reconhecido pelo Vaticano que levará à beatificação de Carlo Acutis, no próximo sábado, 10 de outubro.

O pequeno Matheus sofria de pâncreas anular, uma doença que fazia com que ele vomitasse tudo o que ingeria, e ficou milagrosamente curado após pedir para “parar de vomitar” diante de uma relíquia do futuro beato.

Após a publicação, no início deste ano, do decreto que autorizou a promulgação do milagre atribuído à intercessão jovem Carlo Acutis, o vice-postulador da causa no Brasil, Padre Marcelo Tenório, relatou por meio do Facebook como ocorreu o milagre, na cidade de Campo Grande (MS).

“No dia 12 de outubro de 2013, na capela de Nossa Senhora Aparecida, de nossa Paróquia, no momento da Bênção com a Relíquia, aproximou-se um garoto, levado por seu avô e que sofria o drama do pâncreas anular, que trata-se de uma anomalia congênita rara”, recordou.

Segundo o sacerdote, “essa enfermidade fazia com que a criança vomitasse todo tempo o que a deixava fraca e muito abatida, pois tudo o que comia, voltava, inclusive líquido. Já andava com uma toalhinha, porque era grave a sua situação. Cada vez mais fraco, debilitado, encontraria a morte certa”.

“Na fila para bênção, a criança ao tocar na relíquia, espontaneamente faz seu pedido : ‘para parar de vomitar’, e assim aconteceu, não vomitou mais”, relatou.

De acordo com o vice-postulador, “em  fevereiro de 2014, a família mandou fazer novos exames no garoto e foi-lhe constatado a plena cura”.

Hoje, Matheus tem 9 anos e mora em Campo Grande com os avós, Solange Lins Viana, de 62 anos, e Elias Verão Viana, de 75 anos, a mãe Luciana Viana, de 37, e o irmão Ângelo, de 13 anos.

Em entrevista ao site Campo Grande News, a avó do menino, Solange Lins, recordou que desde bebê ele vomitava muito e demoraram para chegar ao diagnóstico de pâncreas anular.

Explicou que o pâncreas anular dá uma volta no estômago causando, em alguns casos, o fechamento completo da entrada de alimento. “No caso de Matheus, o fechamento estava próximo e nós achamos que ia perdê-lo”, disse.

Por sua vez, a mãe do menino, Luciana Viana, contou que, até os 4 anos, ela carregava seu filho “como um bebê no carrinho”. “Então, o Matheus é a prova viva da cura, não precisa falar mais nada”, disse.

“Eu lembro que no dia da cura, estávamos eu, Matheus e meu pai na fila. Meu pai pediu para pegá-lo no colo e eu expliquei o que era uma relíquia e que as pessoas beijavam e faziam um pedido. Eu expliquei que a relíquia era um pedacinho de Carlo Acutis e que ele poderia pedir o que quisesse”, contou a mãe a Campo Grande News.

Luciana recordou que já tinha combinado com seu pai de pedirem pela cura de Matheus. “Mas como ele estava no colo, chegou na frente e soltou um: parar de vomitar”.

Exames posteriores comprovaram que o menino não tinha mais pâncreas anular.

Para a avó de Matheus, a família teve “duas alegrias até agora, uma quando comparamos os exames e outra com a notícia do Vaticano”.

ACI Digital

São Daniel Comboni

ArqSP
Daniel Comboni era italiano de Limone sul Garda, na Brescia, tendo nascido, em 15 de março de 1831, numa família cristã, unida, humilde e pobre de camponeses. Os pais, Luis e Domenica, dedicavam-lhe um amor incontido, pois era o único sobrevivente de oito filhos.

Por causa da condição econômica, enviaram Daniel para estudar no Instituto dos padres mazzianos em Verona, quando, então, despertou sua vocação para o sacerdócio, especialmente para a missão da África Central, onde os mazzianos atuam. Em 1854, já formado em filosofia e teologia, Daniel é ordenado sacerdote. Três anos depois, recebe as bênçãos dos pais e parte para a África, junto com mais cinco missionários.

Após quatro meses de viagem, padre Comboni chega a Cartum, capital do Sudão. A realidade africana é cruel e choca. As dificuldades começam no clima insuportável, passam pelas doenças, pobreza, abandono do povo e terminam com o índice elevado de mortes entre os jovens companheiros. Mas tudo isso serve de estímulo para seguir avante, sem abandonar a missão e o entusiasmo.

Pela África e seu povo, padre Comboni regressa à Itália, numa tentativa de conseguir uma nova tática para evangelizar naquele continente. Em 1864, rezando junto ao túmulo de são Pedro, em Roma, surge a luz. Elabora seu plano para a regeneração da África, resumido apenas num tema: "Salvar a África com a África", um projeto missionário simples e ousado para a época.

Padre Comboni passa, imediatamente, à ação, pede todo tipo de ajuda espiritual e material à sociedade européia, vai aos reis, bispos, ricos senhores e recorre também ao povo pobre e simples. A missão da África Central precisa de todos engajados no mesmo objetivo cristão e humanitário. Dedica-se com tanto empenho e ânimo que consegue fundar uma revista de incentivo missionário, a primeira na Itália.

Além disso, fundou, em 1867, o Instituto dos Missionários, depois chamados de Padres Missionários Combonianos e, em 1872, o Instituto das Missionárias, mais tarde conhecidas como Irmãs Missionárias Combonianas.

No Concílio Vaticano I, ele participa como teólogo do bispo de Verona, conseguindo que outros setenta bispos assinem uma petição em favor da evangelização da África Central. Em 1877, Comboni é nomeado vigário apostólico da África Central e, em seguida, é também consagrado o primeiro bispo católico da África Central, confirmação de que suas idéias antes contestadas são as mais eficientes para anunciar a Palavra de Cristo aos africanos.

Depois de muito sofrimento no corpo e no espírito, no dia 10 de outubro de 1881 o bispo Comboni morre, em Cartum, em meio ao povo africano, rodeado pelos seus religiosos, com a certeza de que sua obra missionária não morreria.

Chamado de "Pai dos Negros" pelo papa João Paulo II, ao beatificá-lo em 1996, o mesmo pontífice declarou santo Daniel Comboni em 2003. A sua comemoração litúrgica deve ocorrer no dia de sua morte.
Arquidiocese de São Paulo

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Santo Tomás de Aquino, o Doutor Angélico

Aleteia

Queridos irmãos e irmãs:

Após algumas catequeses sobre o sacerdócio e minhas últimas viagens, voltamos hoje ao nosso tema principal, isto é, para a meditação sobre alguns grandes pensadores da Idade Média. Havíamos visto a grande figura de São Boaventura, franciscano, e hoje gostaria de falar daquele que a Igreja chama o Doctor communis: São Tomás de Aquino. Meu adorado antecessor, o Papa João Paulo II, em sua encíclica Fides et ratio, lembrou que São Tomás “sempre foi proposto pela Igreja como mestre do pensamento e modelo do modo certo de fazer teologia” (n. 43). Não surpreende que, depois de Santo Agostinho, entre os escritores eclesiásticos mencionados no Catecismo da Igreja Católica, São Tomás seja citado mais que qualquer outro, até 61 vezes! Foi chamado também Doctor Angelicus, talvez por suas virtudes, em particular a sublimidade de seu pensamento e a pureza de sua vida.

Tomás nasceu entre 1224 e 1225, no castelo que sua família, nobre e rica, possuía em Roccasecca, nas proximidades de Aquino, perto da célebre abadia de Monte Cassino, onde foi enviado por seus pais para receber os primeiros elementos de sua instrução. Um ano depois, mudou-se para a capital do Reino de Sicília, Nápoles, onde Federico II havia fundado uma prestigiosa Universidade. Nela era ensinado, sem as limitações existentes em outros lugares, o pensamento do filósofo grego Aristóteles, a quem o jovem Tomás foi apresentado e de quem intuiu grande valor imediatamente. Mas, sobretudo naqueles anos transcorridos em Nápoles, nasceu sua vocação dominicana. Tomás foi, de fato, atraído pelo ideal da ordem fundada não muitos anos antes por São Domingos. Contudo, quando revestiu o hábito dominicano, sua família opôs-se a esta escolha, obrigando-o a deixar o convento e a passar algum tempo em família.

Em 1245, já maior de idade, pôde retomar seu caminho de resposta ao chamado de Deus. Foi enviado a Paris para estudar teologia, sob a orientação de outro santo, Alberto Magno, sobre o qual falei recentemente. Alberto e Tomás estreitaram uma verdadeira e profunda amizade e aprenderam a estimar-se e a apreciar-se, até o ponto que Alberto quis que seu discípulo o acompanhasse, também, a Colônia, aonde ele havia sido enviado pelos superiores da ordem para fundar um estudo teológico. Tomás manteve, então, contato com todas as obras de Aristóteles e de seus comentaristas árabes, que Alberto ilustrava e explicava.

Naquele período, a cultura do mundo latino estava profundamente estimulada pelo encontro com as obras de Aristóteles, que haviam sido ignoradas por muito tempo. Tratava-se de textos sobre a natureza do conhecimento, sobre ciências naturais, sobre metafísica, sobre a alma e sobre a ética, repletos de informações e instruções que pareciam válidas e convincentes. Era toda uma visão completa do mundo elaborada sem e antes de Cristo, com a pura razão, e parecia impor-se à razão como “a” própria visão; era, portanto, uma fascinação incrível para os jovens verem e conhecerem esta filosofia. Muitos acolheram com entusiasmo, até mesmo com entusiasmo acrítico, esta enorme bagagem do antigo conhecimento, que parecia poder renovar vantajosamente a cultura, abrir totalmente novos horizontes. Outros, porém, temiam que o pensamento pagão de Aristóteles estivesse em oposição à fé cristã e recusavam estudá-lo.

Encontraram-se duas culturas: a cultura pré-cristã de Aristóteles, com sua racionalidade radical, e a cultura clássica cristã. Certos ambientes eram levados à rejeição de Aristóteles, também pela apresentação que deste filósofo faziam os comentaristas árabes Avicena e Averróis. Na realidade, foram eles que transmitiram para o mundo latino a filosofia aristotélica. Por exemplo, estes comentaristas tinham ensinado que os homens não têm uma inteligência pessoal, mas que há um único intelecto universal, uma substância espiritual comum a todos, que opera em todos como “única”: portanto, uma despersonalização do homem. Outro ponto discutível transmitido pelos comentaristas árabes era aquele segundo o qual o mundo é eterno como Deus. Desencadearam-se, compreensivelmente, disputas sem fim no mundo universitário e no eclesiástico. A filosofia aristotélica ia se difundindo, inclusive pelas pessoas simples.

Tomás de Aquino, na escola de Alberto Magno, realizou uma operação de fundamental importância para a história da filosofia e da teologia, diria que para a história da cultura: estudou a fundo Aristóteles e seus intérpretes, procurando novas traduções latinas dos textos originais em grego. Assim, não se apoiava apenas nos comentaristas árabes, sendo que podia ler pessoalmente os textos originais, e comentou grande parte dos trabalhos aristotélicos, distinguindo neles o que era válido do que era duvidoso ou completamente rejeitável, mostrando a concordância com os dados da Revelação cristã e utilizando ampla e intensamente o pensamento aristotélico na exposição dos manuscritos teológicos que compôs. Em definitivo, Tomás de Aquino mostrou que entre a fé cristã e a razão subsiste uma harmonia natural. E esta é a grande obra de Tomás, que, naquele momento de confrontação entre duas culturas – momento em que parecia que a fé teria que render-se à razão -, mostrou que ambas caminham juntas; que, quando a razão parecia incompatível com a fé, não era razão, e quando a fé parecia opor-se à verdadeira racionalidade, não era fé; assim, criou uma nova síntese, que formou a cultura dos séculos seguintes.

Por seus excelentes dotes intelectuais, Tomás foi chamado a Paris como professor de teologia na cátedra dominicana. Aqui começou também sua produção literária, que prosseguiu até sua morte e que tem algo de prodigioso: comentários à Sagrada Escritura, porque o professor de teologia era, sobretudo, intérprete da Escrituras, comentários aos manuscritos de Aristóteles, obras sistemáticas poderosas, entre as quais sobressai a Summa Theologiae, tratados e discursos sobre argumentos diversos. Para a composição de seus textos, era ajudado por alguns secretários, entre eles seu irmão Reginaldo de Piperno, que o seguiu fielmente e ao qual esteve ligado por uma amizade sincera e fraterna, caracterizada por uma grande confiança. Esta é uma característica dos santos: eles cultivavam a amizade, porque esta é uma das manifestações mais nobres do coração humano e tem em si algo de divino, como Tomás mesmo explicou em algumas quaestiones da Summa Theologia, na qual escreve: “A caridade é a amizade do homem com Deus principalmente, e com os seres que Lhe pertencem (II, q. 23, a.1)”.

Não permaneceu durante muito tempo e de um modo estável em Paris. Em 1259 participou do Capítulo Geral dos Dominicanos para Valenciennes, onde foi membro de uma comissão que estabeleceu o programa de estudos da ordem. De 1261 a 1265, depois, Tomás esteve em Orvieto. O Pontífice Urbano IV, que sentia por ele uma grande estima, o encarregou da composição dos textos litúrgicos para a festa de Corpus Domini, que celebramos amanhã, instituída depois do milagre eucarístico de Bolsena. Tomás teve uma alma perfeitamente eucarística. Os belíssimos hinos que a liturgia da Igreja canta para celebrar o mistério da presença real do Corpo e do Sangue do Senhor, na Eucaristia são atribuídos à sua fé e à sua sabedoria teológica. Entre 1265 e 1268, Tomás residiu em Roma, onde, provavelmente, dirigia um Studium, quer dizer, uma Casa de Estudos da Ordem, e onde começou a escrever sua Summa Theologiae (cf. Jean-Pierre Torrell, Tommaso d’Aquino. L’uomo e il teologo, Casale Monf., 1994, pp. 118-184).

Em 1269, foi chamado novamente a Paris para um segundo ciclo de ensinos. Os estudantes – compreende-se – estavam encantados com suas lições. Um ex-aluno seu declarou que uma enorme multidão de estudantes seguia os cursos de Tomás, tanto que as salas de aula não conseguiam comportar-lhes, e acrescentou, com uma anotação pessoal que “escutá-lo era para ele uma felicidade profunda”. A interpretação de Aristóteles dada por Tomás não era aceita por todos, mas até mesmo seus adversários no campo acadêmico, como Godofredo de Fontaines, por exemplo, admitiam que a doutrina de Tomás era superior a outras por sua utilidade e valor e servia a todos os demais doutores. Talvez também para subtraí-lo das vivazes discussões em curso, os superiores enviaram-no mais uma vez a Nápoles, para colocar-se à disposição do rei Carlos I, que queria organizar os estudos universitários.

Além do estudo e do ensino, Tomás dedicou-se também à pregação ao povo. E também o povo ia de bom grado escutá-lo. Diria que é verdadeiramente uma graça grande quando os teólogos sabem falar com simplicidade e fervor aos fiéis. Por outro lado, o ministério da pregação ajuda os próprios especialistas em teologia, num saudável realismo pastoral, e enriquece de estímulos vivazes sua investigação.

Os últimos meses da vida terrena de Tomás permanecem rodeados de uma atmosfera particular, diria misteriosa. Em dezembro de 1273, chamou seu amigo e secretário Reginaldo para comunicar-lhe sua decisão de interromper todo o trabalho, porque durante a celebração da Missa havia compreendido, a partir de uma revelação sobrenatural, que tudo que ele tinha escrito até então era apenas “um montão de palha”. É um episódio misterioso que nos ajuda compreender não apenas a humildade pessoal de Tomás, mas também o fato de que tudo aquilo que chegamos a pensar e a dizer sobre a fé, por mais elevado e puro que seja, é infinitamente superado pela grandeza e pela beleza de Deus, que nos será revelada em plenitude no Paraíso. Um mês depois, cada vez mais absorto em uma meditação pensativa, Tomás morreu enquanto estava de viagem para Lyon, aonde ia para participar do Concílio Ecumênico proclamado pelo Papa Gregório X. Apagou-se na Abadia Cisterciense de Fossanova, após ter recebido o Viático com sentimentos de grande piedade.

A vida e o ensinamento de São Tomás de Aquino poderia se resumir em um episódio apanhado pelos biógrafos antigos. Enquanto o santo, como era seu costume, estava em oração perante o crucifixo, pelo início da manhã na Capela de São Nicolau, em Nápoles, Domingo de Caserta, o sacristão da igreja, sentiu desenvolver-se um diálogo. Tomás perguntava, preocupado, se o que havia escrito sobre os mistérios da fé cristã estava correto. E o Crucifixo respondeu: “Tu tens falado bem de mim, Tomás. Qual será tua recompensa?”. E a resposta que Tomás deu é a que nós também, amigos e discípulos de Jesus, sempre quisemos dizer: “Nada mais que Tu, Senhor” (Ibidem, p. 320).

Fonte: Zenit

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF