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segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

Santo Agostinho e a Rocha de Mateus 16, 18

S. Agostinho | Vatican News

Por José Miguel Arraiz.

Traduzido por Rafael Rodrigues. 

INTRODUÇÃO

Um leitor que está debatendo a questão do primado de Pedro com um pastor evangélico, enviou-me uma pergunta sobre a posição de Santo Agostinho sobre a interpretação de Mateus 16, 18. Em um blog protestante que encontrou, por exemplo, se reproduzem algumas citações de Agostinho para dar a impressão de que como ele interpretava que a rocha sobre a qual a Igreja está construída é a fé, não o próprio Pedro, que isso de alguma forma envolve uma rejeição do primado petrino.

Sobre este tópico, já tratei brevemente em outro post: Pedro, A Rocha (Testemunhos Patrísticos), agora eu vou complementar o que eu escrevi lá.

UMA ANÁLISE SOBRE O PENSAMENTO AGOSTINIANO

Primeiro: É verdade que Santo Agostinho disse em várias ocasiões que a rocha sobre a qual está construída a Igreja era a fé em Cristo que é o Filho de Deus. Embora seja comum ver que os pais da igreja tinham duas interpretações como complementares e não excludentes. Agostinho tem algum texto que parece vê-los como exclusivas e inclinando-se quer por uma ou outra. Uma análise mais detalhada desses textos também revela que ele usou ambas as interpretações alternadamente de maneira contemporânea, o que dificulta a questão.

Alguns textos onde a rocha sobre a qual está construída a Igreja são: Sermão 147,3; 270,6; 295,2; Comentário sobre o Salmo 60.3; Tratados sobre o Evangelho de São Lucas 124,5.

Alguns que adere à interpretação católica tradicional é que Pedro é a Rocha: Carta 53,2; O batismo contra os donatistas VII 43,85; Tratados Sobre o Evangelho de São João 11.5; Comentários sobre os Salmos 103 II s.3.2; s.2 30 II, 5; 39.25; 55,15; 63.4.

Esclarece o assunto no pensamento de Santo Agostinho a ideia de que Pedro simboliza a Igreja e sua unidade por causa da primazia que teve entre os apóstolos. Elas podem ser vistas, entre outros, nos seguintes textos: Sermões 75,10; 76; 137,3; 149,7; 244,1; 270,2; 295,1.2.4; Comentários sobre os Salmos 103 III 2; 108,1; Tratados Sobre o  Evangelho de São João7, 14; 50.12; 118,4; 124,5.

Mas o que importa é que, em última análise, em sua última declaração sobre o assunto em suas Retratações (I 21.1) ele faz a menção das duas opiniões sem se inclinar sobre uma ou outra e acaba deixando o leitor a escolher o ajuste mais preciso.

Em meu primeiro livro contra Donato mencionei em algum lugar uma referência ao apóstolo Pedro como ‘a igreja está fundada sobre ele como uma rocha’. Esta interpretação também soa em muitos lábios nas linhas de bênção de Santo Ambrósio, na qual falando de sua própria casa, ele diz: Quando ele canta, a rocha da Igreja absolve pecado. Mas eu me lembro que, frequentemente, explicou as palavras de Nosso Senhor a Pedro: ‘Sobre esta pedra edificarei a minha igreja’, de modo que deve ser entendida como referindo-se a confissão do próprio Pedro quando disse: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, no sentido de que Pedro tinha sido nomeado rocha, levou a figura da Igreja, que é construída sobre esta pedra e recebeu as chaves do reino dos céus. A partir do que foi dito sobre ele não disse “Você é Rocha,” mas “Tu és Pedro”, pois a pedra era Cristo, tendo sido confessado por Simão (e como toda a Igreja confessa), que foi chamado Pedro. Qual dessas interpretações é correta, decida o leitor”.  (Retratações, I, 21)

Em segundo lugar: Deve-se observar que, para compreender a posição de Santo Agostinho a respeito do primado de Pedro não deve ser limitada apenas aos textos onde comenta Mateus 16, 18, mas todos os seus comentários como um todo, que falam claramente de seu principado entre os apóstolos, ideia que se repete no Batismo contra os donatistas II 1.2 e 4.13 I contra Juliano. Para ele, a própria sé de Pedro, em Roma, é uma garantia da verdade e da Igreja apostólica de Cristo (Contra a Carta Fundamental dos maniqueístas 4,5, 53,2 Carta; 43,3,7). Ele também reconhece que a sua autoridade é definitiva (Sermão 131,10). Uma obra onde o assunto em questão é amplamente tratado é: Agostino. . Trapé, La Sedes Petri in S. Agostino, en Miscellanea A. Piolanti II, Lateranum, Nova Series, an. XXX (Roma 1964).

Portanto separar-se da Sé de Pedro é para ele se separar da Igreja, e, portanto, afirma que os donatistas (cismáticos da época) não têm cátedra, tendo sido separados da de Pedro, “in qua una cathedra unitas ab om nibus servaretur”; nem possuem o “Anjo” do batismo, unidos também as outras cátedras autênticas; nem o Espírito Santo, que é o espírito de caridade; ou a fonte de água viva, ou o selo de santificação (Sancti Optati Afri Milevitani episcopi de schismate donatistarum libri septem. I. III, 6-8 cc Ed Hurter… Patrum opuscula selecta X Oeniponti, 1870). A posição de Santo Agostinho, a este respeito não foi a única, mas compartilhado pelo cristianismo, uma vez que sempre foi considerado uma ruptura com a igreja local unida a Roma como uma ruptura com a Igreja universal, como sancionam os Concílios de Elvira (ano 306, can.53) , Arles (314, can.16) , Nicéia ( 325 dC, can.5), Antioquia (ano 341, can.5 -6), Sardica (ano 343, can.13) (Mansi, 2.14 , 2.473 , 2,669-670 , 2,1309-1312 , 3:16-17).

Veritatis Splendor

MILAGRE E MARTÍRIO

TVN24
“Como cordeiros para o meio de lobos”. A espada de São Paulo.
“No trecho do Evangelho que ouvimos, Jesus envia setenta e dois discípulos para a grande colheita que é o mundo, convidando-os a pedir ao Senhor da colheita, a fim de que nunca faltem trabalhadores para a sua colheita (cf. Lc 10, 1-3); e não os envia com meios poderosos, mas sim ‘como cordeiros para o meio de lobos’ (v. 3), sem bolsa, nem alforje, nem sandálias (cf. v. 4). Numa das suas Homilias, São João Crisóstomo comenta: ‘Enquanto formos cordeiros, venceremos e, mesmo que sejamos circundados por numerosos lobos, conseguiremos superá-los. Mas se nos tornarmos lobos, seremos derrotados, porque ficaremos desprovidos da ajuda do pastor’ (Homilia 33, 1: PG 57, 389). Os cristãos jamais devem ceder à tentação de se tornar lobos no meio dos lobos; não é com o poder, com a força e a violência que o reino de paz de Cristo se difunde, mas com o dom de si, com o amor levado ao extremo, também aos inimigos. Jesus não vence o mundo com a força das armas, mas com a força da Cruz, que é a verdadeira garantia da vitória. E isto, para quem quer ser discípulo do Senhor, seu enviado, tem como consequência o estar pronto também à paixão e ao martírio, a perder a própria vida por Ele, para que no mundo triunfem o bem, o amor e a paz. Esta é a condição para poder dizer, entrando em cada realidade: ‘A paz esteja nesta casa!’ (Lc 10, 5).

Diante da Basílica de São Pedro encontram-se duas estátuas grandes dos santos Pedro e Paulo, facilmente identificáveis: São Pedro está com as chaves na mão, e São Paulo, ao contrário, tem nas mãos uma espada. Para quem não conhece a história deste último, poderia pensar que se trata de um grande comandante que guiou exércitos poderosos e com a espada submeteu povos e nações, alcançando fama e riqueza com o sangue alheio. No entanto, é exatamente o contrário: a espada que ele tem nas mãos é o instrumento com que Paulo foi morto, com que padeceu o martírio e derramou o seu próprio sangue. A sua batalha não foi a da violência, da guerra, mas a do martírio por Cristo. A sua única arma foi precisamente o anúncio de ‘Jesus Cristo, e Cristo crucificado’ (1Cor 2, 2). A sua pregação não se fundou ‘em discursos persuasivos da sabedoria, mas na manifestação do Espírito e do poder divino’ (v. 4)”. [...] “Esta mesma lógica é válida também para nós, se quisermos ser portadores do reino de paz anunciado pelo profeta Zacarias e realizado por Cristo: devemos estar dispostos a pagar pessoalmente, a padecer em primeira pessoa a incompreensão, a rejeição e a perseguição. Não é a espada do conquistador que constrói a paz, mas a espada do sofredor, de quem sabe entregar a própria vida”. Palavras do Papa Bento XVI durante a audiência geral da quarta-feira, 26 de outubro de 2011.

 

Membra Christi et corpus sumus omnes simul; non qui hoc loco tantum sumus, sed et per universam terram; nec qui tantum hoc tempore, sed quid dicam? Ex Abel iusto usque in finem saeculi / Todos juntos somos membros e corpo de Cristo: não somente nós que nos encontramos aqui neste lugar, mas todos nós em toda a terra. E não somente nós que vivemos neste tempo, mas que dizer? desde o justo Abel até o fim do mundo”, Agostinho, Sermones 341, 9, 11; cf. Lumen gentium, n. 2.

Revista 30Dias

PAIS DA IGREJA: Sobre a Vida de Moisés (Parte 15/20)

São GREGÓRIO DE NISSA

(Aprox. 330-395)

Sobre a Vida de Moisés

Tradução segundo a Patrologia Grega de Migne
com base na versão de D. Lucas F. Mateo

História de Moisés

Capítulo 36

Se nos apegarmos à letra, o sentido destas coisas não só permanecerá obscuro a quem o examina, como nem sequer estará livre de uma concepção inverossímil de Deus. Com efeito, parte anterior e parte posterior existem só nas coisas que têm forma, e toda forma é limite de um corpo. Portanto, quem imagina uma figura delimitando Deus, não pensará que Ele está livre de uma natureza corporal. Pois bem, todo corpo é evidentemente composto. O composto é constituído pela concorrência de elementos heterogêneos. Ninguém diria que o composto é indissolúvel. O que se pode dissolver não pode ser imortal. De fato, a corrupção é a dissolução do que é composto. Se tomarmos ao pé da letra as costas de Deus, por via de conseqüência seremos levados necessariamente a um absurdo. De fato, diante e atrás só se dão no que tem forma, e a forma só se dá no que tem corpo. E este, por sua própria natureza, pode ser dividido, posto que todo o composto pode dividir-se. O que pode ser dividido não pode ser imortal. Portanto, quem é escravo da letra pensará como conseqüência que a Divindade está submetida à corrupção. E sem dúvida, Deus é imortal de incorruptível. Mas então, que interpretação alem do sentido literal será coerente com a letra? Se uma parte nos obriga, no contexto do discurso, a buscar outra interpretação das palavras escritas, sem dúvida será conveniente fazer o mesmo com relação ao todo. O que entendemos de uma parte, isso mesmo havemos de tomar necessariamente em relação ao todo, pois não existe um todo se não está composto de partes. Portanto, o lugar perto de Deus, e a pedra neste lugar, e nela o lugar que se chama fenda, e a entrada de Moisés ali, e o estender da mão de Deus até a boca da fenda, e sua passagem, e a chamada, e depois disto a contemplação das costas, tudo isto será considerado de forma mais adequada se seguirmos a norma da interpretação espiritual. Qual é o significado? Que da mesma forma que os corpos pesados, se algo recebe impulso em um plano inclinado, ainda que nada o empurre depois deste primeiro movimento, se não há nada que corte o impulso com um obstáculo, são empurrados por si mesmos para baixo com força pela ladeira enquanto o plano permanecer inclinado costa abaixo; assim de forma contrária, a alma que se liberta da paixão terrena, se volta leve e veloz, começando a voar desde baixo até às coisas de cima, até o alto. E como nada acima corta seu impulso, pois a natureza do bem atrai a si a quem levanta os olhos para ela, a alma sempre se eleva alem de si mesma, em tenção pelo desejo das coisas celestiais, como diz o Apóstolo, até às coisas que estão adiante (Flp 3, 13), e elevará seu vôo cada vez mais alto. Com efeito, graças ao já conseguido, deseja não renunciar ao que está acima e torna incessante seu impulso às coisas de cima renovando sempre, com o já conseguido, a tenção para o vôo. De fato, o trabalhar da virtude alimenta sua força no cansaço, já que sua tenção não diminui pelo esforço, mas aumenta. Por esta razão dizemos que o grande Moisés, apesar de fazer-se cada dia maior, nunca se deteve no caminho para o alto, nem impôs a si mesmo algum limite até o cume, mas que uma vez posto o pé na escada em cujo cimo estava Deus (Gn 28, 12), como diz Jacob, subiu ininterruptamente ao nível superior, sem cessar nunca de subir, porque sempre há um degrau mais alto do que aquele a que já se chegou.

Capítulo 37

Moisés rechaça o parentesco aparente com a rainha dos egípcios. Faz-se vingador do hebreu. Translada-se a uma vida solitária no deserto, não turbada pelo contato com os homens. Pastoreia ali em si mesmo o rebanho de animais domados. Vê o esplendor da luz. Torna leve sua subida à luz despojando-se do calçado. Conduz à liberdade seus parentes e compatriotas. Vê afundar-se o inimigo, carregado pelas ondas. Permanece sob a nuvem. Sacia a sede com a pedra. Recolhe pão do céu. Depois, com a elevação das mãos, vence o estrangeiro. Ouve a trombeta. Entra nas trevas. Penetra nas estâncias inacessíveis do tabernáculo não feito por mão de homem. Aprende as coisas inefáveis do sacerdócio divino. Destrói o ídolo. Aplaca Deus. Restabelece a lei quebrada pela maldade dos judeus. Resplandece pela glória e, alçado por estas elevações, ainda arde em desejos, e não se sacia de ter mais; ainda tem sede daquele de que foi completamente saciado, e pede obtê-lo como se nunca o tivesse obtido, suplicando a Deus que se revele a ele, não na forma em que ele é capaz de participar dela, mas tal qual Ele é. Este sentimento me parece próprio de uma alma possuída pela paixão do amor à beleza essencial: a esperança não cessa de atrair a partir da beleza que se viu até à que está mais alem, acendendo sempre no que já conseguiu o desejo do que ainda está por conseguir. De onde se conclui que o amante apaixonado da Beleza, recebendo sempre as coisas visíveis como imagem do que deseja, aspira saciar-se com o modelo original desta imagem. E isto é o que quer a súplica audaz que ultrapassa o limite do desejo: gozar da beleza, não através de espelhos e reflexos, mas face a face (1Co 13,12). A palavra divina admite a petição mesmo tempo que a repudia, mostrando em poucas palavras um abismo incomensurável de conhecimento. Com efeito, a magnanimidade de Deus concede a Moisés saciar o desejo, porem não lhe promete nenhum repouso nem fartura desse desejo. Pois não se teria mostrado a si mesmo a seu servo se a visão houvesse sido tal que detivesse o desejo do que via, pois nisto consiste ver verdadeiramente a Deus: em que quem o vê não se sacia jamais em seu desejo. Por isso diz: Não poderás ver meu rosto. Com efeito, nenhum homem verá meu rosto e seguirá vivendo (Ex 33, 20). O relato diz isto não como se o mostrar-se convertesse Deus em causa de morte para quem o visse. Como poderia a face da vida converter-se jamais em causa de morte para quem se acercasse dela? A menos que, posto que Deus é por essência o que dá a vida, e posto que um traço essencial do conhecimento da natureza divina é o de estar acima de todo o conhecimento, quem pensar que Deus é alguma das coisas agora conhecida, esse não tem vida, pois se desviou do ser dos seres a ponto de, com uma fantasia fora da razão, se pensar que existe. Pois o que verdadeiramente existe é a vida verdadeira. E isto é inacessível ao conhecimento. Se pois a natureza que dá a vida transcende todo o conhecimento, aquilo que é abarcado pelo conhecimento certamente não é a vida. O que não é a vida não tem uma natureza apta para dar a vida. Por esta razão, se dá satisfação ao desejo de Moisés precisamente naquilo que este desejo fica sem satisfação. Com efeito, aprende do que já foi dito que a Divindade, pela própria natureza, é inabarcável, pois não está circunscrita por nenhum limite. Pois se pensássemos a Divindade com algum limite, seria necessário considerar juntamente com o limite o que haveria mais além deste limite. Com efeito, o que está limitado termina certamente em alguma coisa, como o ar é limite dos animais terrestres, e a água é o limite dos aquáticos. E posto que o peixe é rodeado pela água em todas as partes, e o pássaro pelo ar, e o meio da água no caso dos aquáticos e o do ar no caso do pássaro é o marco do limite no ponto extremo que abarca o pássaro ou o peixe ao qual delimitam a água e o ar, assim necessariamente, se pensarmos a Divindade dentro de um limite, é necessário que esteja abarcada por algo heterogêneo a sua natureza, e a lógica mostra que o continente é maior que o contido.

Capítulo 38

Afirma-se que a Divindade é o Bem essencial. Pois bem, o que tem uma natureza distinta do bem é alheio ao bem, e o que é alheio ao bem pertence à natureza do mal. Demonstra-se que o continente é maior que o contido. Segue-se necessariamente que os que julgam que a Divindade está contida em um limite, devem admitir também que está abarcada pelo mal. Sendo evidentemente menor a natureza do contido que a do continente, segue-se a superioridade do mais vasto. Portanto quem encerra a Divindade em um limite estabelece que o bem está dominada por seu contrário. Porem isto é absurdo. Não se pensará, pois, em nenhum limite da natureza infinita. O que não está limitado não tem uma natureza que possa ser compreendida. Eis aqui porque todo o desejo do bem, que atrai para aquela ascensão, cresce constantemente junto com a trajetória de quem se apressa para o bem. Isto é ver realmente a Deus: não encontrar jamais a saciedade do desejo. É totalmente inevitável que quem vir se inflame em desejos de ver ainda mais, precisamente por causa daquelas coisas que é possível ver. E desta forma nenhum limite interromperá o progresso na ascensão a Deus, por não haver limite no bm, nem ser interrompido por nenhuma fartura o aumento do desejo do bem. Qual é aquele lugar perto de Deus? Que é a pedra? E qual é novamente a fenda na pedra? Que é a mão de Deus que tapa a fenda da pedra? Que é a passagem de Deus? Que são suas costas, cuja visão promete Deus a Moisés quando pedia para ver sua face? É necessário que cada um destes dons seja verdadeiramente grande e digno da magnificência do doador, ao ponto de julgar uma promessa mais esplêndida e elevada que todas as teofanias outorgadas já ao grande servidor. Porem, como pode alguém deduzir destas palavras acima com que Moisés pede subir depois de tantas ascensões, e a cuja subida Aquele que faz cooperar todas as coisas para o bem de quem ama a Deus (Rm 8, 28) conduz dizendo: Eis aqui um lugar junto de mim (Ex 33, 21)? Eis aqui uma interpretação que se harmoniza facilmente com as coisas que já consideramos. Ao falar do lugar, não delimita quantitativamente o que lhe mostra, pois não existe medida do que carece de quantidade, mas conduz o ouvinte ao infinito ilimitado por meio da consideração do limitado por uma medida. O relato parece significar isto: Posto que o desejo te lança ao que está adiante e não tens nenhuma fartura em tua corrida, e o bem não tem limite algum, mas o desejo se orienta sempre àquilo que é ainda maior, há tanto lugar junto a mim, que quem corre nele jamais poderá alcançar o final da corrida. Porem, de outro ponto de vista, a corrida é quietude. Coloca-te - diz - sobre a fenda (Ex 33, 21).

ECCLESIA Brasil

Papa aos músicos: o “silêncio” da pandemia seja “fase de escuta” para o renascimento

Papa Francisco | VaticanMedia
Que o “silêncio” que vivemos seja uma “fase de escuta”, de “harmonia da voz de Deus, conduzindo à ‘sinfonia’ universal.

Cidade do Vaticano (05/02/2021, 16:20, Gaudium Press) Para os participantes da 4ª Conferência Internacional de Música, que iniciou-se na quinta-feira, o4/02, o Papa Francisco dirigiu uma mensagem em modalidade on-line, o tema de “textos e contextos” em relação à Igreja e à Música.

O encontro está sendo organizado pelo Pontifício Conselho para a Cultura em colaboração com o Pontifício Instituto de Música Sacra e o Pontifício Instituto Litúrgico do “Ateneo Sant’Anselmo”.

Campo musical “uma área muito importante para a liturgia e a evangelização”

Através de sua mensagem o Pontífice expressou o desejo de que o evento possa enriquecer as comunidades eclesiais e todos que trabalham no campo da música, “uma área que é muito importante para a liturgia e a evangelização”.

Ao citar o profeta Isaías, o Pontífice recordou como “a Bíblia inspirou inúmeras expressões musicais” nos 5 continentes, basta pensar no percurso histórico da música com o canto gregoriano e Bach, por exemplo, mas também através de vários compositores contemporâneos que interpretaram textos sagrados.

Com a pandemia da Covid-19, a atividade no campo da música foi severamente afetada

O patrimônio musical da Igreja, disse o Papa no vídeo, é muito variado e pode apoiar não apenas a liturgia, mas também a apresentação de concertos em teatros, nas escolas e na catequese.

Mas, Francisco não poderia deixar de lembrar que, desde o início da pandemia da Covid-19, a atividade no campo da música foi severamente redimensionada.

O Papa, então, encorajou quem continua sofrendo as consequências da pandemia com recordando o espanhol Miguel de Cervantes que, numa das obras primas da literatura mundial quando ele afirmava que “onde há música não pode haver maldade” (Parte II, c. 34).

De fato, ainda insistiu o Pontífice em eu elogio à música, “muitos textos e composições, através do poder da música, estimulam a consciência pessoal de todos”.

O desafio comum é ouvir uns aos outros. Na liturgia, somos convidados a ouvir a Palavra de Deus.

Francisco refletiu em sua mensagem para o evento dos músicos que, no entanto, o próprio profeta Isaías mostrou o “valor do silêncio”.

Assim, o Papa tratou sobre a importância do valor da pausa, da “alternância entre som e silêncio” que permite “a escuta”, algo fundamental em qualquer diálogo:

“Caros músicos, o desafio comum é ouvir uns aos outros. Na liturgia, somos convidados a ouvir a Palavra de Deus. A Palavra é o nosso ‘texto’, o texto principal; a comunidade é o nosso ‘contexto’.

A Palavra é fonte de significado, ilumina e orienta o caminho da comunidade. Sabemos como é necessário narrar a história da salvação em idiomas e linguagens que possam ser bem compreendidos. A música também pode ajudar os textos bíblicos a ‘falar’ nos novos e diferentes contextos culturais, para que a Palavra divina possa efetivamente alcançar as mentes e os corações.”  (JSG)

(Da Redação Gaudium Press, com informações e foto Vatican News)

Falaram-me que o casamento é uma instituição falida

MNStudio | Shutterstock
por Vitor Roberto Pugliesi Marques

Ora, uma vez que Deus e sua Igreja não erram, como pode ser o casamento uma instituição falida?

Enquanto estávamos, minha esposa e eu, em preparação para o matrimônio, um conhecido nos disse, em um ambiente de conversa informal, que pensássemos bem, pois o matrimônio era uma instituição falida. Essa afirmação causou-nos uma grande surpresa, pois, estando em fase de noivado, já havíamos tomado a decisão de receber esse sacramento. Colocando, entretanto, o espanto de lado, é interessante perguntarmos o porquê tal alegação foi feita. 

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que se constitui uma das principais fontes de dados do Brasil, os brasileiros estão se casando cada vez menos. Em 2019, foram registrados 1.024.676 casamentos civis, o que representa uma redução de 2,7% em relação ao ano anterior. Desse total, 9.056 ocorreram entre pessoas do mesmo sexo. O número de casamentos registrados em cartório recuou em todas as regiões, com mais intensidade no Sudeste (-4,0%) e menos no Norte (-0,3%). Além disso, houve também uma diminuição no tempo de duração do casamento na última década. Em 2019, o tempo médio entre a data do casamento e o divórcio foi de 13,8 anos; em 2009, era de 17,5 anos. Acrescenta-se ainda a esse dado que 48,2% dos divórcios ocorreram após menos de 10 anos de casamento. Parece-nos que os brasileiros estão cada vez menos motivados a se casar, e, quando se casam, estão menos motivados a manter a promessa feita “até que a morte os separe”. 

Para proceder a uma análise do ponto de vista da fé, devemos primeiro ter em mente que o matrimônio não é uma instituição humana, mas, sim, divina. Este foi instituído por Cristo, de modo que São Paulo, em sua carta aos Gálatas, vai explanar sobre o mistério no qual um homem e uma mulher são chamados a se amar “como Cristo amou a Igreja” (Ef 5,22-33). Ora, uma vez que Deus e sua Igreja não erram, como pode ser o casamento uma instituição falida? Resposta: não é uma instituição falida! Pelo contrário é a única instituição na qual o homem pode ser verdadeiramente feliz, seja por meio do matrimônio entre um homem e uma mulher, seja pelo matrimônio espiritual entre um(a) vocacionado(a) e Deus. 

Sacramento

O que acontece, todavia, é que grande parte dos casais não tem em mente essa dimensão divina do sacramento do matrimônio, seja por má-formação na fé, seja pela cultura moderna que atribui status de cárcere ao casamento. Muitos são os que se unem por um mero formalismo social. Nessa dimensão, abre-se espaço para o egoísmo, para o individualismo e para o egocentrismo, de modo a culminar na descrença para com a união marital e, muitas vezes, em seu término. Vale lembrar que estamos versando sobre as uniões válidas, pois há inúmeras que são inválidas perante a Igreja (cf. Nulidade matrimonial: Impedimentos, publicado por Vanderlei de Lima, no Aleteia, em 24/01/2020). Sendo inválida uma união, não há como se argumentar perante os ensinamentos da Igreja, pois trata-se de uma instância jurídica social e não de um sacramento.

O Concílio Vaticano II vai nos ensinar que “a comunidade profunda de vida e de amor constituída pelo casal foi fundada e dotada de suas leis próprias pelo Criador: está estabelecida sobre a aliança dos conjugues, quer dizer, sobre o seu consentimento pessoal e irrevogável”.  Sendo algo perpétuo, para que seja vivido do modo como Cristo ensinou, deve ser bem preparado e não se pode pular etapas. Da mesma forma como um sacerdote tem de se preparar para a ordenação por meio do seminário e das faculdades de filosofia e teologia, também um casal deve ser preparar para o matrimônio. Deve-se ter um namoro santo, orientado por um bom sacerdote e um bom apoio familiar. Passa-se, após esse tempo de discernimento, à etapa do noivado, que é quando noivos e famílias se unem de modo mais visível, dialogando sobre os valores e sonhos em comum. Dado esse tempo, toma-se o passo do matrimônio, que deve ser a etapa final de concretização de um plano de vida, no qual Deus é o alicerce e diretor. Sobre essa base alicerçar-se-ão os filhos que Deus vier a conceder e, em última instância, a própria sociedade e a Igreja, pois são as famílias as células tanto do corpo social quanto do corpo místico de Cristo, que é sua Igreja. 

O que Deus uniu, nada separa. Para isso temos de caminhar conforme os caminhos que Ele intuiu à sua Igreja, sem pular etapas, para que não caiamos também na falácia de acreditar ser o casamento uma instituição falida. 

Aleteia

Papa Francisco reza pelo povo de Mianmar em meio aos protestos pelo golpe militar

Papa Francisco na oração do Ângelus. Foto: Vatican Media

Vaticano, 07 fev. 21 / 02:20 pm (ACI).- Ao concluir a oração do Ângelus deste domingo, o Papa Francisco rezou pelo povo de Mianmar e pediu para promover "a justiça social e a estabilidade nacional, para uma convivência harmoniosa".

“Nestes dias acompanho com grande preocupação a evolução da situação que se criou em Mianmar, um país que, desde a minha visita apostólica de 2017, carrego no coração com muito afeto”, disse o Papa.

Além disso, o Santo Padre acrescentou “neste momento tão delicado quero assegurar mais uma vez minha proximidade espiritual, minha oração e minha solidariedade com o povo de Mianmar. E rezo para que todos aqueles que têm responsabilidades no país se coloquem com sincera disponibilidade a serviço do bem comum, promovendo a justiça social e a estabilidade nacional, para uma convivência harmoniosa”.

Por isso, o Pontífice pediu "Rezemos por Mianmar" e permaneceu um breve momento em silêncio para oração.

A República da União de Mianmar (ex-Birmânia) é um país localizado no sudeste asiático limitado a noroeste pela Índia e Bangladesh, a leste pela Tailândia e Laos, a nordeste pela China e ao sul pela Baía de Bengala e o Mar Andamão.  

Em 1º de fevereiro, houve um golpe contra a líder Aung San Suu Kyi e os chefes militares declararam estado de emergência por um ano e que o país seria liderado pelo general Min Aung Hlaing.

Dois dias depois, o Conselho de Segurança das Nações Unidas pediu "a libertação de todos os detidos, o respeito aos direitos humanos evitando o uso da violência e a restauração do processo democrático".

Segundo informou Vatican News, a mensagem do Papa neste domingo acontece no dia em que a Conferência Episcopal de Mianmar fez "um apelo aos fiéis para participarem de um dia de oração pela paz" e acrescentou que "os bispos em suas homilias continuaram a apelo ao diálogo, à não violência e ao retorno da democracia”.

Por sua vez, o presidente da Conferência Episcopal, Cardeal Charles Maung Bo, disse em 4 de fevereiro que “a paz é o único caminho e a democracia é a luz deste caminho”.

Menores migrantes

Em seguida, o Santo Padre fez um apelo "a favor dos menores migrantes não acompanhados".

"São tantos! Infelizmente, entre aqueles que por motivos diversos são obrigados a abandonar a sua pátria, existem sempre dezenas de crianças e jovens sozinhos, sem família e expostos a muitos perigos”, alertou.

Neste sentido, o Santo Padre sublinhou que nos últimos dias foi informado sobre "a dramática situação de quem se encontra na chamada rota dos Balcãs" e acrescentou "mas existem em todas as rotas".

“Asseguremos que a estas criaturas frágeis e indefesas não faltem cuidados adequados e canais humanitários preferenciais”, pediu o Papa.

Publicado originalmente em ACI Prensa. Traduzido e adaptado por Nathália Queiroz.

ACI Digital

Hoje é celebrado o Dia mundial de oração e reflexão contra o tráfico de pessoas

Imagem referencial. Crédito: Unsplash

Roma, 08 fev. 21 / 09:00 am (ACI).- No dia 8 de fevereiro de cada ano, é celebrado o Dia Mundial de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas, evento promovido pelo Papa Francisco.

Este ano o tema é “Economia sem tráfico de pessoas”, pois visa “convidar a multiplicar e promover novas experiências econômicas que se oponham a todas as formas de exploração”.

Vale ressaltar que em 2015 o Santo Padre estabeleceu que em cada Dia Mundial se celebrasse a memória litúrgica de Santa Josefina Bakhita, religiosa que foi escrava e vítima de tortura, e que posteriormente “se tornou santa e símbolo universal do compromisso da Igreja contra a escravidão”.

“Se eu encontrasse de novo aqueles negreiros que me sequestraram e também aqueles que me torturaram, me ajoelharia para beijar as suas mãos, porque, se não tivesse acontecido isto, eu não seria agora cristã e religiosa”, disse a santa que hoje representa um ícone da história da África.

São João Paulo II a beatificou em 1992 e a canonizou durante o Jubileu do ano 2000. Além disso, Bento XVI, ao publicar sua encíclica Spe Salvi em 2007, a propôs como exemplo de vida para falar de esperança.

O Papa Francisco recordou no dia 8 de fevereiro de 2015, no final do Angelus, que a santa era uma “irmã sudanesa que quando era menina fez a trágica experiência de ser vítima do tráfico”, e encorajou “quantos estão comprometidos a ajudar homens, mulheres e crianças escravizados, explorados, abusados como instrumentos de trabalho ou de prazer e muitas vezes torturados e mutilados”.

“Faço votos por que todos os que têm responsabilidades de governo se comprometam com determinação a remover as causas desta chaga vergonhosa, uma chaga indigna da sociedade civil. Cada um de nós se sinta comprometido a ser voz destes nossos irmãos e irmãs, humilhados na sua dignidade”, acrescentou.

Iniciativas em Roma para o Dia Mundial de Oração e Reflexão de 2021

O Comitê Internacional do Dia Mundial de Oração e Reflexão contra o Tráfico de Pessoas é coordenado pela "Talitha kum", Rede de Vida Consagrada contra o Tráfico de Pessoas da União Internacional das Superioras Gerais (UISG).

Da mesma forma, o evento deste ano é promovido pela “Seção de Migrantes e Refugiados do Dicastério do Vaticano para o Desenvolvimento Humano Integral, Cáritas Internationalis, a União Mundial das Organizações Femininas Católicas, o Movimento dos Focolares e muitas outras organizações comprometidas em nível local”, afirmou o Vaticano em um comunicado.

O evento deste ano consistirá em um encontro de oração virtual que “viajará por diferentes áreas do planeta para chamar a atenção e sensibilizar a opinião pública sobre uma das principais causas do tráfico de pessoas”.

O Vaticano informou que a “maratona de orações” será realizada remotamente devido às restrições da pandemia Covid-19 e será transmitida ao vivo no canal oficial do YouTube do Dia Mundial com traduções em cinco idiomas de 10h às 17h (horário local).

Às 13h40 (hora local) será exibida a mensagem em vídeo do Papa Francisco, que “denunciou repetidamente a tendência de mercantilizar o outro, definindo o tráfico de pessoas como uma ferida no corpo da humanidade contemporânea”, afirmou.

Para mais informações você pode clicar AQUI.

Publicado originalmente em ACI Prensa. Traduzido e adaptado por Nathália Queiroz.

ACI Digital

S. JOSEFINA BAKHITA, VIRGEM

Sta. Josefina Bakhita | Vatican Media

Aquela menininha nunca pusera um vestido desde o dia em que os dois homens surgiram do nada nos campos, tapando o caminho e apontando-lhe um facalhão ao lado, para em seguida a levarem consigo, como se rouba uma galinha de um galinheiro. Naquele dia, em que a sua vida é sugada num pesadelo, aquela menina de 9 anos por medo esquece tudo, até mesmo o próprio nome e o nome da mãe e papá com quem morava serena.

Escrava

E assim pensam os mercantes árabes de escravos não em vesti-la, mas rebaptizá-la. "Bakhita", eles a chamam, "afortunada". Uma ironia atroz para aquela menina nascida em 1869 numa aldeia de Darfur, no Sudão do Sul, e que agora se torna mercadoria humana que passa de mão em mão nos mercados de El Obeid e Cartum. Um dia, enquanto estava ao serviço de um general turco, lhe é gravada com faca uma "tatuagem" no corpo, 114 cortes e as feridas cobertas de sal para permanecerem evidentes …

A luz

Bakhita sobrevive a tudo e um dia um raio de luz atinge o inferno. O agente consular que a compra dos traficantes de Cartum chama-se Callisto Legnami e naquele dia Bakhita-Afortunada veste pela primeira vez um vestido, entra numa casa, a porta é fechada e 10 anos de brutalidades indescritíveis ficam para trás. O oásis dura dois anos, quando o oficial italiano, que a trata com carinho, é forçado a repatriar sob a pressão da revolução mahdista. Bakhita se recordará daquele momento: "ousei pedir-lhe que me levasse a Itália com ele". Callisto Legnami aceita e, em 1884, Bakhita desembarca na península, onde para a pequena ex-escrava um destino inimaginável espera por ela. Ela se torna a menina de Alice, a filha dos esposos Michieli, amigos de Legnami, que moram em Zianigo, uma aldeia de Mirano Veneto.

Irmã Moreta

Em 1888, o casal que a hospeda deve sair para a África e durante 9 meses Bakhita e Alice são confiadas às Irmãs Canossianas de Veneza. Depois do corpo, Bakhita começa a revestir também a alma. Ela conhece Jesus, aprende o catecismo e, em 9 de janeiro de 1890, Bakhita recebe o Batismo, a Confirmação e a Primeira Comunhão do Patriarca de Veneza, com o nome de Giuseppina, Margherita, Fortunata. Em 1893, entra no noviciado das Canossianas, três anos depois emite os votos e, durante 45 anos, será cozinheira, sacristã e, acima de tudo, uma porteira do convento de Schio, onde aprenderá a conhecer as pessoas e a gente aprenderá a apreciar o sorriso dócil, a bondade e a fé daquela "morèta", "mourinha", e as crianças querendo provar a "irmã de chocolate”.

Beijo as mãos aos negreiros

Para todo o convento de Schio é um dia de luto quando Giuseppina Bakhita morre aos 8 de fevereiro de 1947 por pneumonia. Foi realmente ‘afortunada’ a sua vida e o dirá ela mesma: "Se encontrasse aqueles negreiros que me sequestraram e mesmo aqueles que me torturaram, eu me colocaria de joelhos para beijar as suas mãos, porque se tudo isso não tivesse acontecido, eu não seria agora cristã e religiosa”.

Vatican News

S. JERÔNIMO EMILIANO, FUNDADOR DOS SOMASCOS, PADROEIRO DOS ÓRFÃOS E DA JUVENTUDE ABANDONADA

S. Jerônimo Emiliano, Daniele Crespi
Vatican Media

"Comece a ser, desde já, o que você será no futuro".

Jerônimo era o quarto filho da família nobre dos Emiliani. Como todos os jovens venezianos de 1500, sonhava em ter uma carreira militar, mesmo porque era a mais rentável. As notícias sobre a sua vida, antes do seu alistamento, ocorrido em 1509, são muito escassas. Sabe-se, apenas, que quando tinha cerca de dez anos, seu pai se matou.

Prisão e conversão

Em 1511, durante o assédio da fortaleza de Castel Nuovo de Quero, ao longo do rio Piave, Jerônimo foi preso pelo inimigo. Esta experiência de reclusão, embora tenha durado apenas 30 dias, mudou completamente a sua vida. Na fome, no sofrimento e com medo de perder a vida, encontrou as palavras justas para rezar. Então, dirigiu seus pedidos especialmente a Nossa Senhora, a quem prometeu converter-se em troca da sua liberdade. Ao sair da prisão, encontrou refúgio em Treviso, mas não esqueceu seu voto feito à Virgem. Assim, confidenciou com um sacerdote e começou a ler a Bíblia. Este foi o início da conversão do seu coração.

Ao serviço dos últimos

A primeira ocasião que Jerônimo teve de colocar à prova sua nova vida foi durante a epidemia que se abateu sobre Veneza, em 1528. Com um grupo de voluntários, percorreu a cidade para aliviar os doentes, aos quais colocou à disposição todos os seus bens.
Contagiado pela doença, recobrou a saúde de modo prodigioso. Desta forma, iniciou seu caminho de caridade, dedicando-se sempre aos mais necessitados, partindo dos pobres, das prostitutas, mas, sobretudo, dos órfãos.

Ofereceu sua vida aos órfãos

Quando seu irmão Lucas morreu, deixando órfãos seus três filhos, Jerônimo cuidou deles e, desde então, teve a intuição que mudou sua vida: instituiu uma Associação em prol dos jovens sem família, encarregando-se da sua educação.
Assim, nasceu em Bergamo, em 1533, a Companhia dos Servos dos Pobres, em defesa dos órfãos de guerra, dos mais fracos e indefesos entre os últimos. Jerônimo fundou para eles uma escola de trabalhos manuais e artísticos, e de ensino do Catecismo, seguindo um método inovador para a época: seu programa fundamental era composto de oração e trabalho, os princípios fundamentais que enobrecem o homem.

Sua morte e difusão da obra

A Companhia dos Servos dos Pobres tornou-se depois uma Congregação, até que, em 1568, o Papa Pio V a elevou à Ordem, da qual os religiosos foram chamados Clérigos Regulares de Somasca, nome da cidade, dado pelo Arcebispo de Milão, onde Jerônimo havia iniciado a sua obra.
Segundo o carisma da Ordem, os Somascos são devotos de Maria, venerada como "Mater orphanorum". Naquelas alturas, Jerônimo já havia falecido de peste em 1537.
Canonizado em 1767, tornou-se o santo Padroeiro da juventude abandonada desde 1928.

Vatican News

domingo, 7 de fevereiro de 2021

PAIS DA IGREJA: Sobre a Vida de Moisés (Parte 14/20)

São GREGÓRIO DE NISSA

(Aprox. 330-395)

Sobre a Vida de Moisés

Tradução segundo a Patrologia Grega de Migne
com base na versão de D. Lucas F. Mateo

História de Moisés

Capítulo 33

Pois o erro da idolatria desapareceu completamente da vida, absorvido pelas bocas piedosas dos que realizaram em si mesmos o aniquilamento da matéria da impiedade por meio da confissão da fé. Os mistérios antigamente bem estabelecidos entre os idólatras se converteram em água que flui sem consistência, água que é bebida pelas mesmas bocas que em outro tempo eram seguidoras dos deuses. Assim pois, quando vês que os que antes se ajoelhavam ante esta vacuidade agora destroem e fazem desaparecer as coisas nas quais haviam posto sua confiança, não te parece que o relato anuncia abertamente que um dia todo ídolo será absorvido pelas bocas daqueles que se converteram do erro à piedade? Moisés arma os levitas contra seus compatriotas. E percorrendo o acampamento de um extremo ao outro, dão morte de forma indiscriminada aos que encontram, deixando à ponta da espada a escolha de quem partir ao meio. Ao causar a morte igualmente a todos os que encontra, o que decidia sobre a morte dos que eram suprimidos não era o ser inimigo ou amigo, estrangeiro ou vizinho, parente ou estranho; a mão acometia da mesma forma e atuava igual mente sobre todos os que atacava. Talvez a útil lição que nos oferece este relato seja a de que cai sobre eles um castigo indiscriminado porque todos foram cúmplices com o povo inteiro no mal, e todo o acampamento se havia feito um só homem no sentir. Da mesma forma, quem castiga com açoites alguém surpreendido em um delito golpeia com o chicote a parte do corpo que se lhe põe diante sabendo que a dor de uma parte se estende ao todo, assim também, posto que todo o corpo devia se castigado igualmente por ter estado unido na alma, o chicote atingiu o todo atuando sobre uma parte. Portanto, se a cólera de Deus, ao contemplar a mesma maldade em muitos, não atuou contra todos senão só contra alguns, convém ter em conta que a correção foi feita por causa do amor ao homem; ainda que nem todos tenham sido castigados, com os golpes de alguns todos foram corrigidos para que se afastem do mal. Esta consideração está feita ainda ao fio da literalidade do relato. O sentido espiritual talvez possamos aproveitar do seguinte modo. O Legislador disse a todos em uma exortação pública: Quem estiver a favor do Senhor, que venha a mim (Ex 32, 26). É a voz da Lei convidando a todos: Se alguém quer ser amigo de Deus, que se faça meu amigo, da Lei, pois efetivamente, se alguém é amigo de Deus, se faz também amigo da Lei. A todos os que se reuniram em torno dele por causa deste chamado, Moisés ordenou tomar a espada contra o irmão, o amigo e o vizinho (Ex 32, 27). Se tivermos presente o contexto da consideração espiritual, entenderemos que todo aquele que presta atenção a Deus e à Lei se purifica com a morte dos costumes que habitam perversamente nele. Com efeito, as palavras irmão, amigo ou vizinho nem sempre são usadas pela Escritura no bom sentido, mas há ocasiões em que o irmão é um estrangeiro, o amigo um inimigo, o vizinho alguém que se levantou como adversário. Entendemos por estes, nossos pensamentos íntimos, cuja vida causa nossa morte, e cuja morte causa nossa vida.

Capítulo 34

Concorda esta interpretação com as coisas já ditas a respeito de Aarão, quando, por ocasião de seu encontro com Moisés, o reconhecemos como o que socorre e protege, o que realiza juntamente com ele os prodígios contra os egípcios. O conhecemos justamente como superior, já que a natureza angélica e incorpórea foi feita antes que a nossa; como irmão, obviamente, pelo parentesco de sua natureza intelectual com nossa natureza intelectual. Existe a objeção de como se pode tomar em seu sentido melhor o encontro de Aarão, que se converteu para os israelitas em servidor da idolatria? Porem, neste lugar, o texto explica claramente o equívoco da "irmandade", pois o significado desta palavra não é o mesmo em todos os lugares, já que toma este nome em sentidos opostos. Um é o irmão que abate o tirano egípcio, e outro o que faz uma cópia do ídolo para os israelitas, ainda que seja idêntico o nome de ambos. Contra irmãos desta classe impunha Moisés a espada. O que ordena aos demais, sem dúvida o estabelece também para si mesmo. A destruição de um irmão desta classe é a aniquilação do pecado. Com efeito, todo o que faz desaparecer o mal metido dentro de si pela sedução do adversário, este matou em si mesmo o que vivia pelo pecado. Nosso ensinamento em torno disto se confirma ainda mais, se colocarmos a relação de alguns outros elementos do relato com a interpretação espiritual. Dissemos, de fato, que foi ordem daquele Aarão que eles se desprendessem de suas arrecadas. O desprendimento destas se converteu na matéria do ídolo (Ex 32, 2-3). Que diremos? Que Moisés havia adornado as orelhas dos israelitas com adorno de arrecadas, que é a Lei, e que o falso irmão, pela desobediência, tira o adorno colocado nas orelhas e faz com ele um ídolo. A primeira entrada do pecado foi o tirar as arrecadas, isto é, a decisão de desobedecer ao preceito. Como julgar a serpente como amiga e vizinha dos primeiros pais, a ela que sugeriu como coisa útil e boa afastar-se do mandado de Deus? Isto é o livrar as orelhas das arrecadas do preceito (Rm 10, 17). Portanto, quem tiver matado tais irmãos, amigos e vizinhos ouvirá da Lei aquela palavra que conta o relato que disse Moisés aos que haviam matado a estes: Cada um de vós consagrou hoje as suas mãos ao Senhor, matando seu filho, e seu irmão, para vos ser dada a benção (Ex 32, 29). Penso que a recordação daqueles que consentiram no pecado se introduziu oportunamente no discurso. Aprendemos assim que as tábuas feitas por Deus, nas quais havia sido gravada da lei divina, caíram na terra das mãos de Moisés e, quebrando-se pela dureza do solo, Moisés as refaz, embora não sejam inteiramente as mesmas, mas só o escrito nelas. Com efeito, tendo tomado as tábuas da matéria daqui de baixo, as apresenta ao poder de quem grava nelas a Lei, e assim atrai de novo a graça levando a Lei em tábuas verdadeiras, ao haver gravado Deus sua palavra na pedra. Guiados por estas coisas, talvez seja possível alcançar alguma inteligência da providência de Deus em nosso favor. Com efeito, se o divino Apóstolo disse a verdade chamando tábuas os corações (2Co 3, 3), isto é, a parte superior da alma - e sem dúvida diz a verdade aquele que sonda pelo Espírito as profundezas de Deus (1Co 2, 10) -, pode-se deduzir conseqüentemente que, no princípio, a natureza humana estava sem fraturas e era imortal, moldada pelas mãos divinas e embelezada com os caracteres não escritos da Lei, pois fisicamente estava dentro de nós uma vontade conforme à Lei, no afastamento do mal e no honrar à Divindade.

Capítulo 35

Porém depois de aparecer o ruído do pecado, ao que o começo da Escritura chama voz da serpente (Gn 3, 4) e o relato das tábuas chama voz dos que começam um canto na embriaguez (Ex 32, 18), então, as tábuas se quebram ao cair na terra. E o verdadeiro Legislador, aquele de quem Moisés era figura, novamente lavrou para si, de nossa terra, as tábuas da natureza. Pois sua carne, que contem Deus, não foi feita por obra do matrimônio, mas ele mesmo é o escultor da própria carne gravada pelo dedo de Deus. Com efeito, o Espírito Santo desceu sobre a Virgem e a força do Altíssimo a cobriu com sua sombra (Lc 1, 35). Depois deste acontecimento, a natureza foi feita de novo inquebrável, feita imortal pelos caracteres gravados pelo dedo. Dedo é o nome dado muitas vezes pela Escritura ao Espírito Santo (Ex 8, 19 e Dt 9, 10 e Lc 11, 20). Desta forma acontece uma tal transformação de Moisés, tão grande e de tanta glória, que os olhos daqui de baixo não podiam suportar a manifestação daquela glória (2Co 3, 12-4, 6). Quem tiver sido bem instruído no divino mistério de nossa fé não desconhecerá como a interpretação espiritual concorda com o relato. Com efeito, aquele que restaurou nossa natureza destroçada - pelo já dito, sabes bem quem é aquele que curou nossas roturas -, depois de haver elevado novamente a tábua quebrada de nossa natureza a sua primitiva beleza, havendo embelezado com o dedo de Deus, como dissemos, não é já suportável à vista dos indignos, pois pela super abundância de sua glória é já inacessível a quem o olha. Em verdade, quando vier em sua glória, como diz o Evangelho, e todos os anjos com Ele (Mc 8, 38), a duras penas os justos poderão contemplar seu aspecto. Quanto ao que é injusto e ao que pertence à seita judia, como diz Isaías, permanecerá incapaz desta visão. Que desapareça o ímpio - diz - para que não veja a glória do Senhor (Is 26, 11). Seguindo a concatenação das coisas que examinamos, nos deixamos levar à formulação de uma hipótese de interpretação espiritual desta passagem. Voltemos à questão que havíamos proposto: como aquele que viu Deus claramente nestas teofanias, o atestam a palavra divina, quando diz face a face, como quem fala a um amigo (Ex 33, 11 e 1Co 13, 12), ao chegar aqui, como se nunca tivesse alcançado o que cremos que alcançou pelo testemunho da Escritura, pede a Deus que lhe apareça, como se nunca tivesse visto Aquele que lhe tem aparecido continuamente. A voz do alto acede agora ao desejo do que pede e não lhe recusa a entrega desta graça, porem novamente o leva à desesperança, ao deixar claro que o que ele busca é inalcançável à natureza humana. Apesar disto, Deus diz que há um lugar junto a ele, e nesse lugar uma pedra, e na pedra, uma fenda (Ex 33, 21-23) na qual manda que Moisés se coloque. Depois Deus põe a mão na boca daquela fenda e, passando adiante, o chama. Ao ser chamado, Moisés sai fora da fenda, vê as costas de quem o chamou, e assim parece que viu o procurado, pois se cumpre a promessa da voz divina.

ECCLESIA Brasil

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF