Papa Francisco | Vatican News |
"Já disse e repito: sinto vergonha e dor pelo papel que vários católicos, em especial com responsabilidade educacional, tiveram em tudo o que os feriu; nos abusos e na falta de respeito por sua identidade, cultura e até mesmo valores espirituais. Tudo isto é contrário ao Evangelho de Jesus", disse o Papa, encerrando uma semana de encontros com delegações indígenas do Canadá.
Bianca Fraccalvieri - Vatican
News
Vergonha, dor e indignação:
estes foram os sentimentos expressos pelo Papa Francisco ao receber esta manhã,
no Vaticano, delegações de indígenas canadenses.
No decorrer desta semana, o
Pontífice manteve encontros com três grupos - First Nations, Métis e Inuit -
que sofreram as consequências da colonização, cujo último episódio público foi
a descoberta de valas comuns no terreno da Kamloops Indian Residential School.
Entre o final de 1800 e o
início de 1900, o governo canadense instituiu escolas residenciais para que as
crianças indígenas assimilassem a cultura dos colonizadores. As escolas foram
confiadas às Igrejas cristãs locais, entre elas a católica. Nessas escolas, os
estudantes sofreram abusos e maus-tratos.
Colonização
ideológica: deplorável ontem e hoje
Em seu discurso, Francisco
afirmou que ouviu com atenção os testemunhos, “imaginando as histórias e as
situações”, e agradeceu por terem aberto o seu coração, no desejo de caminhar
juntos.
De tudo o que ouviu, o Papa
salientou alguns aspectos, como a sabedoria dos povos originários resumida
nesta frase: “É preciso pensar sete gerações à frente quando se toma uma
decisão”.
“É o contrário do que acontece
nos nossos dias”, comentou o Papa, pois não se considera o futuro das próximas
gerações. Ao invés, o elo entre idosos e jovens é indispensável, deve ser
cultivado e protegido. Esta mesma sabedoria se manifesta também no cuidado da
Criação, valorizada como “um dom dos céus”.
Mas a união com o território
sofreu um duro golpe, infligido pela colonização, disse ainda Francisco. Sem
respeito, muitos indígenas foram arrancados de seu ambiente vital e uniformizados
a outra mentalidade.
“Assim a sua identidade e sua
cultura foram feridas, muitas famílias separadas e muitos jovens se tornaram
vítimas desta ação de homologação, amparada pelo ideal de que o progresso
ocorra por colonização ideológica.”
É algo, denunciou mais uma vez
o Papa, que acontece ainda hoje.
Vergonha, dor e
indignação
A este ponto, Francisco
pronunciou as palavras mais tocantes do seu discurso, ao recordar o sofrimento
e a tristeza provocados pelos traumas sofridos:
“Tudo isso suscitou em mim
dois sentimentos: indignação e vergonha.”
Indignação porque é injusto
aceitar o mal e é pior ainda habituar-se a ele. Sem indignação, memória e
compromisso de aprender com os erros, os problemas não se resolvem, como
comprova a guerra que vemos nesses dias.
“E sinto também vergonha. Já disse e repito: sinto
vergonha e dor pelo papel que vários católicos, em especial com
responsabilidade educacional, tiveram em tudo o que os feriu; nos abusos e na
falta de respeito por sua identidade, cultura e até mesmo valores espirituais.
Tudo isto é contrário ao Evangelho de Jesus.”
Pela deplorável conduta
daqueles membros da Igreja Católica, o Papa pediu perdão a Deus e “gostaria de
lhes dizer, de todo coração: estou muito entristecido”.
Francisco encerrou a audiência
fazendo votos de que os encontros desses dias possam abrir caminhos a percorrer
juntos, encorajando os bispos e os católicos locais a empreender passos pela
busca transparente da verdade, promovendo a cura das feridas. “A Igreja está
com vocês e quer continuar a caminhar com vocês”, garantiu o Pontífice,
renovando o desejo de visitar o Canadá, mas “não no inverno”, brincou.
Depois de assistir a apresentações de cantos da cultura
autóctone, em inglês o Papa afirmou que reza pelos indígenas e pediu que façam
o mesmo por ele.