Translate

terça-feira, 6 de setembro de 2022

Santa Francisca Rubatto: testemunho feminino do franciscanismo moderno

A Ir. Maria Francisca de Jesus, fundadora das Irmãs Terciárias Capuchinhas
de Loano | Vatican News

A Irmã Francesca Rubatto - uma migrante, uma religiosa, uma irmã entre as irmãs, a primeira santa do Uruguai - "ao final da sua vida consumida pela caridade e pelo amor a Jesus e aos pobres".

Sebastián Sansón Ferrari

«Sede irmãs do povo» — escrevia Santa Francisca Rubatto (no século, Anna Maria), primeira santa do Uruguai — às religiosas da Congregação das Irmãs Capuchinhas. Nascida a 14 de fevereiro de 1844 em Carmagnola, na Itália, foi canonizada pelo Papa Francisco no domingo, 15 de maio de 2022. Este foi o espírito que inspirou a sua vida e apostolado em Montevidéu, capital do Uruguai, onde escolheu viver desde 1892 até à sua morte em 1904. Com efeito, no seu testamento deixou a seguinte disposição escrita: «Que o meu corpo seja sepultado entre os meus amados pobres».

O site da Congregação que fundou afirma que ela «deu ao franciscanismo uma versão feminina moderna» e também que «constitui uma das maiores figuras do franciscanismo feminino atual. Precisamente como São Francisco de Assis, Madre Francisca encontrou Cristo nos pobres e no sofrimento, e viveu uma experiência autêntica da pobreza da Virgem», acrescenta-se na página web.

«Foi irmã entre irmãs, mais do que madre fundadora, e viveu um zelo missionário e um desejo de martírio tão profundos que a acompanharam até ao fim da sua vida, consumida pela caridade e pelo amor a Jesus e aos pobres».

Fundada a 23 de janeiro de 1885, agora a Congregação está presente na Itália, Uruguai, Argentina, Brasil, Peru, Etiópia, Eritreia, Quénia e Malawi com escolas, paróquias onde trabalham as suas religiosas e obras de assistência às pessoas mais necessitadas.

Uruguaia por adoção e decisão

Quando chegou ao Uruguai, escolheu a área de La Teja, Belvedere, Paso de la Arena e Barra de Santa Lucía, que na época era uma terra deserta. Santa Francisca misturava-se com o povo, inclusive com os trabalhadores que iam ao matadouro aos domingos de manhã, e apanhava o comboio com eles às 4h da madrugada. Entre outras coisas, foi capaz de intuir a necessidade de roupas e alimentos da população e, com uma visão profunda, decidiu que um grupo das suas religiosas vivesse no bairro de Belvedere, onde se encontra o santuário onde hoje repousam os seus despojos.

Madre Rubatto realizou um louvável trabalho de promoção e evangelização: fez com que as meninas aprendessem uma profissão para ganhar a vida, a fim de não depender das suas famílias. Ensinou-lhes a ler, escrever, coser, tecer, bordar, mas também lhes deu uma formação religiosa. Mais tarde, as oficinas fundadas por Francisca tornaram-se grandes institutos, como a escola e o liceu de San José de la Providencia, em Montevidéu, ou a escola de San Francisco de Asís, em Rosário e Buenos Aires, Argentina.

Uma das caraterísticas distintivas de Santa Francisca foi a sua disponibilidade para aceitar a chamada de Deus nos desafios que a realidade lhe apresentava e para agir em conformidade, comentou o padre Carlo Calloni, postulador da causa de canonização, à Rádio Vaticano-Vatican News. Por exemplo, quando tinha quarenta anos, foi-lhe oferecida a direção de uma obra em Loano, diocese de Génova. O convite veio de forma estranha, de acordo com a maneira humana de pensar: «Uma pedra caiu de um andaime e ela socorreu o pedreiro ferido e, ao mesmo tempo, recebeu a chamada de um capuchinho, padre Angelico de Sestri Ponente, que lhe ofereceu o cargo de diretora», recordou o postulador. Mais tarde, Madre Rubatto analisou a proposta com o seu diretor espiritual e decidiu aceitar.

A arte da disponibilidade

Um aspeto pouco conhecido de Santa Francisca foi a sua proximidade a Dom Bosco. A família salesiana no Uruguai aprofundou a questão e explicou a influência decisiva do “Sacerdote e Mestre da Juventude” sobre Santa Francisca.

Santa Francisca e São João Bosco

Segundo uma publicação dos salesianos no Uruguai, o currículo da nova santa revela «um vínculo forte e decisivo com Dom Bosco». Anna Maria, escreveram, chegou a Turim em 1862, depois de ter perdido quase toda a sua família, e estabeleceu-se na casa da sua irmã mais velha, casada, e depois foi trabalhar com uma rica condessa. «Era o tempo em que Dom Bosco trabalhava nos seus oratórios e ela decidiu colaborar com ele com a discrição, prudência, amabilidade e ternura que sempre a caracterizaram», acrescentaram.

As profecias de Dom Bosco, frisam os salesianos, foram plenamente realizadas e Anna Maria incorporou vários elementos do Sistema preventivo na própria missão, como desejo de ajudar os jovens mais abandonados para os educar e promover, a fim de dar dignidade às suas vidas.

O facto de Madre Rubatto ser conhecida como «a primeira santa do Uruguai» inspira-se na definição cunhada pelo Papa João Paulo II, quando durante a beatificação, a 10 de outubro de 1993, disse: «Hoje saudamo-la como a primeira beata do Uruguai».

A primeira santa do Uruguai

João Paulo II acrescentou na homilia:

«A Igreja saúda-te, Irmã Maria Francisca de Jesus, Fundadora das Irmãs Terciárias Capuchinhas de Loano, que fizeste da tua existência um serviço contínuo aos últimos, testemunhando o amor especial que Deus tem para com os pequeninos e humildes. Seguindo fielmente as palavras de Francisco, apaixonado pela pobreza evangélica, aprendeste não só a servir os pobres, mas também a te tornares pobre, e indicaste às tuas filhas espirituais esta especial forma de evangelização. Com o crescimento do Instituto, esta intuição inicial tornou-se um profundo impulso missionário que te guiou, a ti e ao teu trabalho na América Latina, onde algumas das tuas filhas espirituais selaram com o sacrifício da vida aquele serviço aos pobres, que constituem o carisma confiado à tua Congregação em benefício de toda a Igreja».
Projetos fundados pela santa do Uruguai:
As atividades no Quênia | Vatican News
As crianças no projeto na África | Vatican News
Com um grupo na Etiópia | Vatican News
As crianças no projeto na África | Vatican News
As atividades no Perú | Vatican News
Mais projetos da fundadora | Vatican News
As irmãs de Madre Rubatto | Vatican News
Foto na Missa de canonização de Santa Francisca | Vatican News
O Santuário de Santa Francisca Rubatto | Vatican News

segunda-feira, 5 de setembro de 2022

Dia da Amazônia

CNBB

EM CARTA, PRESIDENTES DA COMISSÃO PARA A AMAZÔNIA DA CNBB E DA REPAM-BRASIL APONTAM QUE É “TEMPO DE SONHAR UMA POLÍTICA PARA O BEM COMUM NA AMAZÔNIA” 

Neste dia 5 de setembro, data que marca a celebração do Dia da Amazônia, o arcebispo de Manaus (AM) e presidente da Comissão Episcopal Especial para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cardeal Leonardo Ulrich Steiner, e o bispo da prelazia de Marajó (PA) e presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM-Brasil), dom Evaristo Pascoal Spengler, publicaram a carta: “Tempo de Sonhar uma política para o bem comum na Amazônia”.

No texto, os presidentes da Comissão para a Amazônia da CNBB e da REPAM-Brasil afirmam que “a insaciedade voraz do capital declara sua marcha extrativista e decreta seu avanço rumo à última fronteira da expansão de uma “economia que mata” (cf. EG 53), alicerçada nos grandes projetos predatórios e suicidas, que contaminam e destroem as fontes da vida, secam os rios, aquecem o ar, prejudicam a agricultura familiar, expulsam comunidades, perseguem lideranças e povos, concentram gente em cidades insustentáveis e adoecidas”.

O texto aponta, ainda que, cresce a fome entre a população enquanto grãos, minérios e riquezas são exportados. A violência socioambiental, alimentada pela impunidade, torna mais profunda a desigualdade, causa de dor, sofrimento e morte dos amazônidas. “Está declarada, também, a emergência climática na Amazônia e no Planeta. Assombra-nos as perspectivas fundadas no conhecimento científico de chegarmos a um ponto de irreversibilidade do processo predatório nos territórios amazônicos”, aponta o documento.

A carta aponta que o primeiro passo para a “política melhor”, na Amazônia e no Brasil, é reconquistar o compromisso com um projeto comum (cf. FT, Cap. 5), que reúna todos os povos e integre os/as excluídos/as, no campo, na floresta e na cidade. Essa tarefa compete a todos, particularmente, aos políticos e aos que exercem cargos públicos.

“Comprometidos com a defesa da vida, da dignidade e da cultura dos povos da Amazônia, nós, em nome dos bispos da Amazônia legal brasileira manifestamos nosso repúdio às lideranças políticas, em todas as esferas de poder, que defendem ou promulgam projetos de morte na Amazônia, como a concentração e grilagem da terra, a liberalização do garimpo, a mineração em terras indígenas, o marco legal. Apoiar lideranças que agem assim é tornar-se cúmplice de sua abominável prática”, diz um trecho.

Conheça a íntegra do documento:
“Tempo de Sonhar uma política para o bem comum na Amazônia”

Meditações sobre a Ressurreição (Parte VIII)

Ressuscitou | comshalom

8. SÃO PAULO, MESTRE DA LUTA ESPIRITUAL

Um olhar humilde e agradecido

            São Paulo, no final da primeira Carta aos Coríntios, após falar das diversas aparições de Cristo e evocar o seu encontro com Jesus ressuscitado às portas de Damasco, diz com humildade: E, por último de todos, apareceu também a mim, como a um abortivo. Porque sou o menor dos Apóstolos, e não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a Igreja de Deus… (1 Cor 15,8-9).

                       São Paulo é uma testemunha excepcional da Ressurreição de Jesus. Para ele, o fato decisivo, que transformou toda a sua vida, foi o encontro pessoal que teve com Cristo ressuscitado às portas de Damasco (At 9,1ss.).

            Paulo, por mais que passassem os anos, nunca se esquecia de que fora um perseguidor dos cristãos, de quem Jesus teve misericórdia, e de que Cristo o escolheu, sem mérito algum da sua parte, para fazê-lo Apóstolo. Não se sentia digno disso. Comparando-se com os outros Apóstolos, via-se a si mesmo como um aborto, como o mais indigno… Ele mesmo dirá que Deus escolheu o que é fraco no mundo para confundir os fortes; e o que é vil e desprezível no mundo, como também aquelas coisas que nada são, para destruir as que são. Assim, nenhuma criatura se vangloriará diante de Deus (1 Cor 1,27-29).

            É importante ter presente essa sua declaração, totalmente sincera, de ser nada, último, para avaliar melhor o que afirma a seguir, após aquelas palavras: não sou digno de ser chamado apóstolo.  Textualmente, diz: Mas, pela graça de Deus, sou o que sou, e a graça que Ele me deu não tem sido inútil. Ao contrário, tenho trabalhado mais do que todos eles; não eu, mas a graça de Deus que está comigo (1 Cor 15-10). Não parece que agora, de repente, Paulo fica orgulhoso, convencido e arrogante, ao dizer: Tenho trabalhado mais do que todos eles, do que todos os outros Apóstolos…? Que significa isso?

            Significa que São Paulo era humilde de verdade, e não de fachada: porque a humildade é a verdade – como gostava de lembrar Santa Teresa de Ávila –, e São Paulo não se gaba de nada. Está feliz de poder louvar a Deus que, com a sua graça o tornou, mesmo sendo o menor, capaz de trabalhar por Cristo com uma eficácia inexplicável, enorme. Ele agradece, comovido, e sabe bem que tudo é puro dom de Deus: Pela graça de Deus sou o que sou… Tenho trabalhado…, não eu, mas a graça de Deus comigo. Fica bem claro.

A humildade e a esperança 

            Estamos aqui perante um paradoxo, que faz parte da essência da vida cristã, ainda que pareça um contra-senso. O paradoxo é que, ao mesmo tempo que – com muita humildade – devemos considerar que não somos capazes de fazer nada, devemos esforçar-nos e trabalhar como quem é capaz de tudo, porque confiamos na graça que Deus nos dá. Toda a vida cristã – toda a santidade – consiste em saber conjugar a graça de Deus e a nossa correspondência, a humildade com a luta cheia de esperança.

             O próprio Jesus, por meio da comparação da videira e das varas, nos disse que, por nós mesmos, somos incapazes da fazer nada, nada que tenha valor aos olhos de Deus, nada que santifique, nada que valha para a vida eterna.: Eu sou a videira, vós os ramos. Quem permanecer em mim e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer (Jo 15,5)

            São Paulo estava tão consciente disso que podia escrever, falando da sua vocação de Apóstolo:  Deus fez brilhar a sua luz [a luz da fé] em nossos corações, para que irradiássemos o conhecimento do esplendor de Deus, que se reflete na face de Cristo [para que déssemos a conhecer a luz da verdade de Cristo]. Porém –continua -, temos este tesouro em vasos de barro, para que transpareça claramente que este poder extraordinário vem de Deus e não de nós (2 Cor 4,6-7). Sem a graça, Paulo sabe que não tem nada, não pode nada e não é nada. Isto ele sentiu-o, de uma maneira muito especial, num momento dramático de sua vida.

“Basta-te a minha graça”: as fontes da graça

            Abrindo a alma aos coríntios, o Apóstolo conta-lhes que houve um momento em que quase se desesperou. A par de muitas graças de Deus, experimentou também muitas limitações, dificuldades e sofrimentos. De modo especial, o fez sofrer um tipo de fraqueza física ou de doença, que nós não conhecemos exatamente, mas que a ele o apavorava, porque achava que ia impedi-lo de continuar a trabalhar no apostolado. Como sofria! Era um desespero! Comparava esse mal a um anjo de Satanás, que me esbofeteia, para me livrar do perigo da vaidade. E dizia: Três vezes roguei ao Senhor que o apartasse de mim. Mas Ele me disse: “Basta-te a minha graça, porque é na fraqueza que se revela totalmente a minha força” …  Portanto, prefiro gloriar-me nas minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (2 Cor, 12,7-9).

            Bem claramente se vê a consciência que tinha de que, sem a graça de Deus, não podia nada. Sentia-se um zero absoluto. Que fazia, então? Porventura ficava passivo, esperando que a graça descesse do Céu sobre ele? Não. Fazia duas coisas, que todos os cristãos deveríamos fazer. Primeira: procurava constantemente a graça nas suas fontes Segunda: lutava com todas as suas energias para corresponder às graças que Deus lhe concedia. É muito bonito e ilustrativo recordar algumas das recomendações que fazia aos seus discípulos, porque refletem o que acabamos de lembrar.

             Numa das suas primeiras cartas, dizia aos tessalonicenses: Vivei sempre contentes. Orai sem interrupção…orai também por nós (1 Tes 5,16-17.25). Sentia a necessidade da oração constante, sem pausas, lembrando-se de que Deus vincula muitas das suas graças à oração – Pedi e recebereis! (Mt 7,7) , e que o próprio Cristo tinha insistido na necessidade de orar sempre e não desfalecer (Lc 18,1). Também dizia aos filipenses: Não vos inquieteis com coisa alguma! Em todas as circunstâncias apresentai a Deus as vossas preocupações, mediante a oração, as súplicas e a ação de graças (Fil 4,6). E, aos romanos: Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação e perseverantes na oração (Rm 12,12). Tinha a certeza de que, com a oração, tudo se alcança de Deus, tudo o que nos é necessário para vivermos como bons filhos de Deus e para superar o que nos quer afastar dessa vida santa.

            Na mesma carta aos romanos, Paulo usa uma expressão muito sugestiva. Compara a oração a uma grande arma de combate: Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo e do amor que é dado pelo Espírito Santo, combatei comigo, dirigindo as vossas orações a Deus por mim (Rm 15,30)O Catecismo da Igreja pode falar, por isso, do “combate da oração” (n. 2725). 

            A oração é tão importante, tão fundamental, que Santo Afonso Maria de Ligório chegava a dizer: Quem reza certamente se salva; quem não reza certamente se condena.

            Além dessa insistência na necessidade da oração, São Paulo afirma também, de uma maneira impressionante, que os que desprezam a graça da Comunhão, por tratarem com desrespeito a Eucaristia, por comungarem mal, ficam doentes espiritualmente e morrem, perdem a vida divina: Esta é a razão por que entre vós há muitos adoentados e fracos, e muitos mortos (1 Cor 11,30)Lembrava-se muito bem de que Jesus afirmara taxativamente, falando da Eucaristia: Este é o pão que desceu do céu… Quem come deste pão viverá eternamente, Se não comerdes a carne do Filho do Homem…não tereis a vida em vós mesmos (Jo 6, 51 e 53).

            Ao lado dessa exortação a tirar forças desse alimento eucarístico, que é o próprio Cristo, São Paulo não deixava de recordar aos fiéis a necessidade de estar em estado de graça para comungar; algo que é extremamente importante lembrar nos dias de hoje: Que cada um se examine a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Aquele que o come e o bebe indignamente, sem distinguir o Corpo do Senhor, come e bebe a sua própria condenação (1 Cor 11, 27-29). É forte, mas a Igreja sempre fez eco a essas palavras inspiradas pelo Espírito Santo: Examine-se cada um a si mesmo… E, se reconhecer que está afastado de Deus por algum pecado grave, um pecado mortal, vá confessar-se quanto antes e, sem dúvida, confesse antes de comungar.   

            O ensinamento de São Paulo deixa bem claro que, para vivermos bem a vida dos filhos de Deus, precisamos absolutamente da graça divina – da graça do Espírito Santo – que conseguimos por meio dos sacramentos – especialmente da Penitência e da Eucaristia –, e por meio da oração e do amor a Deus com que fazemos as coisas. Essas são as três grandes fontes da graça: os Sacramentos, a eficácia impetratória da oração e o mérito sobrenatural das boas obras realizadas por amor a Deus.

A luta ascética do cristão 

            Estivemos vendo a necessidade da graça. Vamos considerar agora o segundo “pólo” do paradoxo de que falávamos acima: a necessidade de lutarmos sinceramente para corresponder à graça que Deus nos dá.

            Sobre essa segunda “necessidade” – a necessidade de lutar, além de rezar – , São Paulo é mestre, e mestre genial. Já recordamos que ele dizia, após considerar-se nada: Mas, pela graça de Deus sou o que sou, e a graça que Ele me deu não tem sido inútil. Ao contrário, tenho trabalhado – tenho lutado – mais do que todos eles. Esse homem de garra fala sempre da luta do cristão como de um desafio otimista, como de uma competição atlética ou esportiva. Como nos faz bem lembrar-nos disso e decidir-nos também nós a ser “lutadores” – no esforço por melhorar – , cheios de otimismo e espírito esportivo. Não vemos que é assim que se manifesta a nossa esperança na graça de Deus? Se não tivéssemos essa confiança na ajuda de Deus, não lutaríamos, largaríamos tudo.

            Vamos, pois, meditar sobre um par de trechos dos mais “esportivos” de São Paulo. Podemos começar com aquele que fala do estádio olímpico.  São Paulo está escrevendo aos coríntios (que, por sinal, lhe deram muito trabalho), e diz-lhes: Nas corridas de um estádio, todos correm, mas bem sabeis que um só recebe o prêmio. Correi, pois, de tal maneira que o alcanceis… Assim corro eu, mas não sem rumo certo. Dou golpes [aqui pensa nos pugilistas], mas não no ar… (1 Cor 9,24-27).

             Quantas sugestões não contêm essas palavras! Não é verdade que, muitas vezes, nos sentimos espiritualmente parados, estagnados? Os nossos defeitos, em vez de diminuir, parece que aumentam. Não falo agora dos que se despreocupam da perfeição cristã, e só querem saber da “boa vida”. Estou pensando em gente que tem fé, que tem amor a Deus, e que desejaria melhorar. Mas, apesar da boa vontade, percebe que não avança nem um milímetro; pelo contrário, parece que a cada dia recua um pouco . E assim passam os anos, e aumenta o desânimo. E a esperança, onde fica? Parece que não existe. Mas, como pode existir se rezamos pouco, e não lutamos esportivamente, a sério, como os atletas no estádio?

            Poucos podem dizer que, para ganhar mais fé, mais paciência, mais compreensão, mais ordem, mais formação, mais constância, mais generosidade com o próximo, mais qualidade e profundidade na oração e no trabalho…, poucos podem dizer – insisto – que fazem o que diz São Paulo, ou seja, que lutam com a garra de um campeão no estádio olímpico. Para isso, precisariam ter metas concretas de oração e de luta, e não só boa vontade e bons sentimentos. Deveriam determinar-se e dizer: “Eu me proponho isto, a partir de amanhã: aquela oração, aquele esforço, e aquela mudança de atitude; não quero ficar dando golpes no ar (muito sentimento, muitas palavras vãs e pouco sacrifício)”. Deveriam evitar, além disso, correr sem rumo, ou seja, deveriam procurar ter uma orientação, uma direção espiritual que lhes facilitasse traçar roteiros, concretizar um plano de vida; que acompanhasse a aceleração da sua “corrida”, e os ajudasse a retificar e a aprender com os erros, como faz o treinador com os atletas… Sim.  Quantos há que possam dizer que fazem o que Paulo recomenda? Poucos. Muito poucos. Somos comodistas. Não gostamos dos nossos defeitos, mas conformamo-nos com eles. Não lutamos como Paulo pedia a Timóteo: Combate o bom combate da fé, conquista a vida eterna! …Nenhum atleta será coroado, se não tiver lutado segundo as regras… (1 Tim 6,12 e 2 Tim 2,5).

             Paulo podia pedir isso a Timóteo –e a todos os fiéis –porque ele o praticava. É tocante a “confissão” que faz na Carta aos Filipenses. Depois de falar das suas ânsias de conhecer mais e mais a Cristo e de experimentar o poder da sua ressurreição, diz que luta para conquistar Cristo, e explica como é essa luta: Não pretendo dizer que já alcancei esta meta e que cheguei à perfeição. Não. Mas empenho-me em conquistá-la, uma vez que também eu fui conquistado por Jesus Cristo. Consciente de não tê-la ainda conquistado, só procuro isto: prescindindo do passado e atirando-me ao que resta para a frente, persigo o alvo, rumo ao prêmio celeste, ao qual Deus me chama em Jesus Cristo (Fil 3,10-14).

             Bastaria que cada um de nós meditasse devagar essas palavras, para perceber que nelas se encerra um magnífico programa de luta – de vida – cristã. Um programa que poderíamos resumir assim: Se confiarmos na graça de Deus – no auxílio do Espírito Santo -, nunca iremos sentir-nos “satisfeitos” (“não pretendo ter alcançado a meta”); nunca iremos parar de nos propormos novas metas de melhora (“olhando para a frente”); nunca iremos olhar com desânimo para os nossos fracassos e erros, já perdoados por Deus (“esquecendo o que fica para trás”), mas continuaremos a esforçar-nos com alegria e otimismo renovados em cada instante (“atirando-me ao que resta para a frente”).

             Como animam essas palavras! Basta meditá-las um pouco, para nos sentirmos dispostos a não abandonar a luta – as batalhas que Deus nos pede – por maiores que sejam as dificuldades.

             Essa é a grande lição ascética de São Paulo: se formos humildes, se confiarmos totalmente em Deus, se perseverarmos na oração e na prática dos Sacramentos, se encararmos a luta com otimismo e espírito esportivo, Deus fará com que a nossa vida na terra seja uma caminhada feliz, que sempre progride – por mais que esteja pontilhada de quedas – e que desembocará na alegria inefável da meta, do prêmio celeste, ao qual Deus nos chama.

Fonte: https://presbiteros.org.br/

SANTA TERESA DE CALCUTÁ

Aleteia
05 de setembro

SANTA TERESA DE CALCUTÁ

“A santidade é um dever simples para cada um de nós”. Esse é um dos ensinamentos de Santa Teresa de Calcutá, a religiosa que surpreendeu o mundo com o seu amor, humildade, pobreza, carinho e entrega total pelos doentes e os pobres. Por meio de seu testemunho de acolhimento dos excluídos, Teresa nos ensinou que a maior pobreza não estava nos subúrbios de Calcutá, mas nos países ricos, quando faltava o amor nas sociedades e nos corações dos homens.

Agnes Gonxha Bojaxhiu – seu verdadeiro nome – nasceu no dia 27 de agosto de 1910 em Skopje, na Albânia, e foi batizada um dia depois de seu nascimento. Sua vocação para a vida religiosa despertou quando ela tinha apenas 18 anos. Atendendo ao chamado de Deus, ela ingressou na Casa Mãe das Irmãs de Nossa Senhora de Loreto, na Irlanda. Depois, foi enviada à Índia, a fim de iniciar seu noviciado. Sua profissão religiosa ocorreu no dia 24 de maio de 1931, quando adotou o nome Teresa, em homenagem à carmelita francesa, Teresa de Lisieux, padroeira dos missionários.

No desenvolvimento de sua vocação religiosa, Teresa serviu como professora em Calcutá por 17 anos, ensinando para as filhas das famílias mais tradicionais da cidade, mas, quando percorria os bairros pobres e as ruas, ela se impressionava com o que via: crianças desnutridas, homens, mulheres e crianças cercados pela miséria, pela fome e por inúmeras enfermidades.

No dia 10 de setembro de 1946, Teresa vivenciou um fato singular e determinante em sua história; o “Dia da inspiração”. Naquele dia de graça e de revelação, em uma viagem de trem ao noviciado do Himalaia, ela deparou-se com um pobre homem em situação de rua que lhe disse: “Tenho sede!”. Desde então, ela teve a certeza de sua missão: saciar a sede do amor de Deus, socorrer os pobres e os marginalizados com a consciência de que “qualquer ato de amor, por menor que seja, é um trabalho pela paz”.

Após um necessário tempo de discernimento, com o auxílio do Arcebispo de Calcutá e de sua madre superiora, Teresa deixou o conforto do Colégio da Congregação para dar início ao trabalho missionário nas ruas de Calcutá. Sua primeira ação foi reunir um grupo de cinco crianças, num bairro pobre, aos quais começou a ensinar numa escola improvisada. Dez dias depois, eram cerca de cinquenta crianças e esse número não parou de crescer nos anos seguintes.

Esse início foi muito difícil, desafiador e exigente, mas Deus estava com Teresa, abençoando sua obra. Desse modo, as vocações começaram a surgir entre as suas antigas alunas do Colégio da Congregação. Em 1949, ela começou a escrever as constituições das Missionárias da Caridade e, no dia 7 de outubro de 1950, a congregação fundada pela Madre Teresa foi aprovada pela Santa Sé, expandindo-se por toda a Índia e, em pouco tempo, pelo mundo inteiro.

Madre Teresa era uma mulher pequena em estatura, magra e encurvada, mas grande no testemunho da santidade e na correspondência ao amor de Jesus Cristo. Para Madre Teresa de Calcutá, “Jesus não era uma abstração, um conjunto de doutrinas, de dogmas ou a recordação de uma pessoa que viveu em outros tempos, mas uma pessoa viva, real, alguém a ser visto no próprio coração, e pelo qual deixar-se olhar”. (Fr. Raniero Cantalamessa, Pregação na Casa Pontifícia em 2003).

No serviço aos pobres, Teresa de Calcutá defendeu o valor do matrimônio e da família e condenou inúmeras vezes a prática do aborto. Quando encontrava mulheres que estavam pensando no aborto, ela dizia: “Se vocês não querem seus filhos, podem dar para mim que eu os acolherei”.

A saúde debilitada de Madre Teresa não foi impedimento para que a sua fama de santidade se expandisse pelo mundo. Ela era reconhecida, admirada e respeitada pelos líderes políticos e religiosos do seu tempo e, por isso, no ano de 1979, recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Naquele mesmo ano, o Papa João Paulo II a recebeu em audiência privada e a tornou sua melhor embaixadora em todas as nações, fóruns e assembleias de todo o mundo.

Após uma vida inteira de amor e doação aos pobres e abandonados, Madre Teresa foi encontrar-se com o Senhor de sua vida e missão no dia 5 de setembro de 1997. Sua despedida atraiu e comoveu milhares de pessoas de todo o mundo durante vários dias. Posteriormente, ela foi beatificada pelo Papa João Paulo II, no dia 19 de outubro de 2003, no Dia Mundial das Missões.

No dia 04 de setembro de 2016, Teresa de Calcutá foi canonizada pelo Papa Francisco, dentro da celebração do Jubileu dos voluntários e operários da misericórdia. Naquele dia, em sua homilia, o Papa Francisco afirmou: “Madre Teresa inclinou-se sobre as pessoas indefesas, deixadas moribundas à beira da estrada, reconhecendo a dignidade que Deus lhes dera. A sua missão nas periferias das cidades e nas periferias existenciais permanece nos nossos dias como um testemunho eloquente da proximidade de Deus junto dos mais pobres entre os pobres. Parece-me que, talvez, teremos um pouco de dificuldade de chamá-la de Santa Teresa: a sua santidade é tão próxima de nós, tão tenra e fecunda, que espontaneamente continuaremos a chamá-la de Madre Teresa”.

Santa Teresa de Calcutá, a fundadora das Missionárias da Caridade, a defensora da vida, da família e dos pobres e modelo de misericórdia, brilha na constelação do céu da Igreja evidenciando que “não podemos permitir que alguém saia da nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz”.

Esse dia em que celebramos a Memória Litúrgica de Santa Teresa de Calcutá é um dia propício para nos questionarmos quem é Jesus para nós e o que estamos fazendo em prol do Reino de Deus. É também um dia conveniente para ouvirmos os conselhos de Madre Teresa de Calcutá que nos diz: “Amem-se uns aos outros, como Jesus ama a cada um de vocês. Não tenho nada que acrescentar à mensagem que Jesus nos transmitiu. Para poder amar, é preciso ter um coração puro e é preciso rezar. O fruto da oração é o aprofundamento da fé. O fruto da fé é o amor. E o fruto do amor é o serviço ao próximo. Isso nos conduz à paz”. (Entrevista à revista Sem Fronteira em 1997). Santa Teresa de Calcutá, rogai por nós!

Aloísio Parreiras

(Escritor e membro do Movimento de Emaús)

III SIMPÓSIO INTERNACIONAL

rmater.org

Seminário Arquidiocesano Missionário Redemptoris Mater - Brasília (DF)
Nos dias 22 e 23 de agosto, tivemos o privilégio de ter em nossa casa mais um Simpósio Internacional, com o tema, “Relacionalidade: chave para um humanismo integral”. O evento foi organizado pelo nosso Centro de Estudos Filosófico-Teológicos Redemptoris Mater. Contamos com a presença dos seguintes conferencistas: Prof. ANGEL BARAHONA, Dr. em Filosofia - Univ. Francisco de Vitória –Espanha; Prof. FRANÇOÁ COSTA, Licenciado em Filosofia, Dr. em Teologia - Univ. de Navarra – Espanha; Prof. PAULO DE MATOS, Dr. em Filosofia - Univ. Lateranense – Roma. Foram dois dias de muito enriquecimento para todos os presentes e àqueles que nos acompanhavam virtualmente.
rmater.org
rmater.org
rmater.org
rmater.org

Quem quiser ser meu discípulo… reconheça as suas limitações

Guadium Press
Como alcançar a santidade, apesar das insuficiências e debilidades que sinto abundarem em mim?

Redação (04/09/2022 09:50Gaudium Press) Quantas vezes não passamos por ocasiões em que arquitetamos todo um plano e as coisas correm de uma maneira totalmente diversa à planejada. De fato, por mais que o homem almeje ser independente, traçando suas próprias vias e caminhos, a vida lhe ensina que ele é incapaz de rumar dessa forma. Não é novidade que todos temos debilidades e fraquezas. Afinal, não somos donos de nossos narizes…

Como então lidar com tais percalços sem se deixar abater pelo peso das próprias insuficiências e limitações? Eis o que nos ensina a liturgia de hoje.

“Dai ao nosso coração sabedoria”

Com o trecho do Livro da Sabedoria, recolhido para a primeira leitura desse domingo, o Autor sagrado evidencia o quanto o homem é débil, fraco e contingente: “Na verdade os pensamentos dos mortais são tímidos e nossas reflexões incertas”. (Sb 9,14)

Sublinha ainda o quanto nossa compreensão é falha e nossos conhecimentos, caducos. De fato, que valor tem o homem, pó formado dessa terra? Paradoxalmente, a esse mesmo homem o Filho de Deus convida para uma grandiosa e esplêndida missão: a de ser discípulo Seu (Cf. Lc 14,27).

Como é possível, pois, que dessa criatura tão frágil Deus exija vias heroicas como a de segui-Lo? Se não bastasse, Ele propõe, qual conditio sine qua non, um desapego ao mundo e um amor à cruz sem medidas. Pareceria proeza inalcançável.

O humilde é o verdadeiro sábio

Não obstante, conhecendo as fraquezas do gênero humano, Jesus nos mostra como realizar esse ato de heroísmo por meio de duas parábolas (Cf. Lc 14, 28-33). Nelas, tanto o construtor quanto o rei são postos em situações nas quais, apesar de débeis, devem alcançar uma determinada meta, como construir uma torre ou vencer uma batalha.

Como sair com êxito? Primeiramente, sentar e calcular os gastos; ou seja, olhar para si mesmo com sinceridade e reconhecer a própria insuficiência. Depois, enviar mensageiros a fim de negociar as condições de paz, isto é, juntar as mãos e pedir a Deus forças, pois sem elas jamais seremos dignos discípulos Seus.

É de primordial importância esse reconhecimento das próprias limitações, pois Deus só se agrada com o coração humilde.

Neste sentido, conta-se o fato de um monge chamado Moisés, o qual detinha grande força física aliada a uma força de vontade invulgar. Entretanto, pouco tempo após ingressar na vida religiosa, foi alvo de terríveis tentações contra a virtude angélica da pureza.

A fim de vencer tais provas, decidiu impor-se pesadas penitências, jejuns e orações. Desse modo agiu por muito tempo, sem, contudo, lograr vencer o demônio que lhe perseguia. Certo dia, veio ter com ele o santo abade Isidoro, que lhe disse: “Desde agora, em nome de Jesus Cristo, acabem as tuas tentações”.

E assim foi, porque nunca mais lhe vieram tais dificuldades. Isidoro acrescentou, porém: “Moisés, para que não te gloriasses nem caísses na soberba, pensando que pelos teus exercícios e esforços tinhas vencido [o demônio], permitiu Deus tão extensa tentação para o teu proveito”.[1]

Dessa maneira, sob a luz do ocorrido com o monge Moisés, cabe a nós ecoar a prece do salmista: “Dai ao nosso coração sabedoria” (89,3). Sabedoria que consiste na humildade: reconhecermos que, por nós mesmos, não podemos nada. E, por outro lado, sem jamais perder o entusiasmo; pois assim brada o verdadeiro humilde: “Tudo posso!” – e logo acrescenta – “naquele que me conforta” (Cf. Fl 4,13).

Imploremos a Nossa Senhora, sede de sabedoria e abismo de humildade, que nos obtenha tal graça, por sua maternal intercessão.

Por Jerome Sequeira Vaz


[1] Cf. RODRIGUES, Afonso. Exercícios de Perfeição e Virtudes Cristãs. São Paulo: Cultor de Livros, 2017, v. 2, p. 314.

Fonte: https://gaudiumpress.org/

Maláui: “Queremos chegar a todos os habitantes da diocese”

Ajuda à Igreja que Sofre (ACN)

As longas distâncias, e a escassez de sacerdotes e de estruturas eclesiais exigem a plena participação dos leigos no ministério.

Durante uma visita à sede da Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (Fundação AIS), o Bispo Martin Mtumbuka, da Diocese de Karonga, no Maláui, destaca a vitalidade da Igreja Africana, e fala tanto das histórias de sucesso como das lutas da jovem diocese. 

Situada no norte do Maláui, com o grande lago Maláui a leste e as montanhas a oeste, a Diocese de Karonga foi criada em 2010. Os seus 24 padres – 17 diocesanos e sete religiosos – dão assistência a mais de 60.000 católicos num território de cerca de 12.000 km2, maior do que o Líbano, o Kosovo ou a Jamaica. 

A principal preocupação do Bispo Martin Mtumbuka nesta imensa área é a evangelização, que continua a ser muito importante para toda a região. “Devemos assegurar-nos que as pessoas não vão à nossa procura, mas que nós as procuramos. Devemos tentar estar o mais próximo possível delas”, afirma. 

O povo não partilhará os seus problemas e preocupações com alguém que mal conhece, explica, o que significa que a proximidade dos padres aos seus paroquianos é fundamental. É por isso que, apesar da sua escassez, cada padre procura visitar todos os fiéis das suas paróquias pelo menos uma vez por ano e o plano estratégico da diocese exige a presença constante de um padre num raio de pelo menos 20 km de cada paróquia de Karonga.

Mas as distâncias não são o único problema, as colinas e as montanhas constituem a maior parte da diocese. É difícil para os idosos subir as colinas para ir à igreja e as pessoas doentes também precisam de receber os sacramentos, pelo que o padre tem de chegar a eles. No entanto, as estradas nas montanhas e nos distritos rurais são muito más e os automóveis nem sempre são a melhor opção, especialmente durante a estação das chuvas. 

“A estrada é tão má que em alguns casos os padres ficaram presos e tiveram de passar a noite ao relento. No entanto, precisamos de fazer todos os possíveis para chegar aos nossos paroquianos: se não chegarmos de carro, chegaremos de mota. Senão, de bicicleta, ou a pé. Ou ainda pela rádio. Que ninguém nos possa acusar de não lhe termos levado a mensagem de Cristo. Devemos poder dizer que fomos a todas as aldeias.”

Para ajudar a tornar isto possível, e na sequência de um pedido do Bispo Martin, a Fundação AIS ajudou a financiar a compra de nove motas para ajudar no trabalho pastoral.

Ultrapassar distâncias com criatividade

As melhorias dos transportes ajudam, mas, como o bispo explica, a rádio continua a ser a ferramenta mais poderosa para o esforço da catequização em África. A Rádio Tuntufye FM foi criada em 2014, com o apoio da Fundação AIS. A língua oficial utilizada na Diocese é Tumbuka, mas a população local também utiliza Lambya, Ndali, Nyakyusa, Ngonde, bem como vários dialectos. Os sacerdotes procuram utilizar a língua da comunidade local, e a rádio transmite nas três principais línguas da diocese. 

O uso de telemóveis e da Internet é extremamente raro, mas isso não constitui um obstáculo à criatividade. Por exemplo, um dos missionários, o Pe. Federico, tem sempre um telemóvel consigo quando vai a uma aldeia remota para se encontrar com o chefe. No final da reunião, dá-lhe o telemóvel e, a partir desse dia, envia uma mensagem diária com um versículo da Bíblia a cada um dos chefes que encontra, que depois o partilham com toda a aldeia.

A fé do povo é profunda e viva. Mesmo que o padre não possa estar presente, em alguns lugares o povo reúne-se para rezar sozinho. Cada paróquia tem entre 15 e 60 pequenas igrejas ou capelas. “Quando uma comunidade pequena não tem um lugar para se reunir, eles próprios constroem a igreja”, explica o Bispo Martin. As pessoas contribuem com cimento e tijolos e colaboram como podem na construção mas, não sendo profissionais, pouco tempo depois muitos dos edifícios desmoronam. Para diminuir os problemas, a diocese está a adoptar uma abordagem comum, com normas, para a construção de igrejas e outras infra-estruturas paroquiais.

Um laicado empenhado

As longas distâncias, e a escassez de sacerdotes e de estruturas eclesiais exigem a plena participação dos leigos no ministério. O Bispo Mtumbuka acredita que “não se pode dar tudo ao padre. Por exemplo, nem todos os funerais podem ser presididos por um padre, não é possível na nossa situação. Assim, há leigos que foram formados como ministros que presidem aos funerais. A ideia é que os leigos podem desempenhar todas as responsabilidades que a Igreja permite. Temos de assegurar que as pessoas recebem uma formação muito sólida na catequese. Queremos ter o maior número possível de agentes de evangelização.”

Há um longo caminho a percorrer, mas nos 12 anos desde a sua criação houve um aumento significativo de paróquias, de 5 para 16, e muitos jovens padres juntaram-se à diocese, que actualmente conta com 28 seminaristas. Alguns padres estão a estudar no estrangeiro para serem futuros educadores e professores. 

A diocese também beneficiou da generosidade dos benfeitores da Fundação AIS que tornaram possível a realização de mais de 100 tipos de projectos, num total de quase 1,5 milhões de euros, incluindo a construção de 25 edifícios, 12 dos quais são igrejas. 

Novos desafios a ultrapassar

Agora, porém, a Diocese de Karonga enfrenta um novo desafio. Sendo uma zona rural, as pessoas costumavam contribuir para a manutenção do clero com produtos, e não com peditórios. Contudo, devido à invasão russa da Ucrânia, os preços dos alimentos duplicaram, enquanto o combustível triplicou. Os fertilizantes, que normalmente vêm da Ucrânia e da Rússia, estão agora inacessíveis. 

A guerra também afectou a actividade da Igreja local: “O óleo de cozinha costumava custar cerca de 1000 ou 2000 kwachas [entre um e dois euros, mais ou menos], agora custa 9000. O povo não tem dinheiro para isso! E isto conduz a outro problema: muito em breve os padres deixarão de ser apoiados pelo povo”, adverte o Bispo Martin.

O Bispo Martin Mtumbuka conclui a sua conversa com uma mensagem para os benfeitores da Fundação AIS: “Somos uma diocese jovem, e estamos muito gratos. Estamos a tentar fazer todos os possíveis para a salvação das almas e a glória de Deus. É uma honra trabalhar em conjunto com aqueles que ajudam a Igreja que sofre. Não queremos que a generosidade das pessoas que nos apoiam seja em vão, por isso estamos a dar o nosso melhor. E gostaria de vos assegurar que rezamos por elas. Deus vos abençoe a todos!”

(Via Fundação AIS)

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Episcopado brasileiro aprova nova marca da CNBB

Marca CNBB

A marca, com a explicação dos seus sentidos, será oficialmente lançada no dia 14 de outubro, data do aniversário de 70 anos da CNBB.

Silvonei José – Aparecida – Vatican News

A proposta de modernização da marca da CNBB foi apresentada e aprovada pelos bispos do Brasil na última terça-feira, 30 de agosto. Foi desenvolvida pela doutora em design e especialista em marcas, Dulce Albarez, a partir das indicações de um trabalho de conclusão da pós-graduação em Marketing Digital e Negócios Estratégicos realizada na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, desenvolvido pelos jornalistas Larissa Carvalho, Manuela Castro e Willian Bonfim, membros da Assessoria de Comunicação da CNBB.

O bispo auxiliar de Belo Horizonte (MG) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Comunicação da CNBB, dom Joaquim Mol, falou que se trata de uma prática comum no mundo corporativo e das organizações, de tempos em tempos, desenvolver um processo de “rebranding” termo do campo da comunicação e marketing, que significa um processo de reposicionamento da marca junto aos seus públicos. “A modernização da marca é parte deste processo”, disse.  

O jornalista e mestre em comunicação pela Universidade de Brasília, Willian Bonfim, informou que a modernização da marca da CNBB é resultado de um estudo aprofundado e “que a sua reformulação é compreendida como parte do processo de renovação que a entidade está passando, com a atualização de seu Estatuto, a reforma de sua sede em Brasília e demais novidades que o Sínodo 2023 está fazendo brotar na Igreja”.

O jornalista lembrou também que a modernização da marca é uma das ações previstas no Plano de Comunicação da CNBB (2019-2023), aprovado pelo Conselho Permanente da entidade em 2020.

Para embasar os estudos do desenvolvimento da nova marca, foi realizada uma escuta quali-quantitativa com 848 pessoas, entre bispos, jornalistas, fiéis católicos, agentes pastorais, representantes de organismos, os bispos membros da atual presidência e membros das campanhas e projetos realizados pela entidade para diagnosticar como avaliam e percebem a marca.

“Um dos problemas identificados foi o fato de não haver um manual que padronize o uso da marca e que, em razão disto, se percebeu diferentes tipos de aplicações e usos, dificultando assegurar a identidade da CNBB”, ressaltou Willian. 

O jornalista reforçou também que a proposta de renovação da identidade visual não é uma mudança brusca, mas consiste em sua modernização, à luz das tendências do designer contemporâneo, mantendo e considerando os elementos, símbolos e significados que fazem parte da tradição da instituição, sobretudo de uma marca com 70 anos como a da CNBB.

Marca CNBB

Marca aprovada pelos bispos

 A assessora de Comunicação da CNBB, Manuela Castro, apresentou a proposta de modernização da marca que foi desenvolvida com base nas palavras e valores que mais foram sugeridos na pesquisa: “unidade, fraternidade, sinodalidade, comunhão, colegialidade e amor”.

Ela reforçou também que foi desenvolvida uma tipografia específica para a marca. “Na concepção da assinatura visual, o posicionamento do cajado mudou de sentido para que a pomba, que representa o Espírito Santo, e o olhar dos pastores estejam voltados para a atualidade, para o presente e para frente”, apresentou.  

Processo de implementação

A marca, com a explicação dos seus sentidos, será oficialmente lançada no dia 14 de outubro, data do aniversário de 70 anos da CNBB. Após a aprovação pelo episcopado, inicia-se uma fase de construção do seu Manual de Aplicação e Padronização no qual constará seus significados, sua política de gestão e as regras de sua utilização e aplicação. Cumprida esta etapa, será feita uma rodada de conversa com os departamentos, organismos vinculados e regionais da CNBB com vistas a manter a unidade na sua implantação e uso, garantido o reforço da identidade da instituição.

Fonte: Vanuza Wistuba - CNBB

domingo, 4 de setembro de 2022

A eficácia de Deus

d.ee_angelo | Shutterstock
Por Francisco Borba Ribeiro Neto

A grande prova da nova humanidade que vivemos é a capacidade de comunicar a beleza do amor a todos e em tudo que fazemos.

Deus realmente age na história? A vida dos cristãos é diferente daquela dos outros seres humanos? Nós mesmos muitas vezes nos fazemos essas perguntas, principalmente em momentos de grande dor ou de flagrantes injustiças. J. Ratzinger, futuro Bento XVI, no livro Introdução ao Cristianismo (São Paulo: Loyola, 2017), com argúcia lembra que momentos de dúvida são algo que crentes e não-crentes têm em comum. O crente, em alguns momentos, duvida que Deus exista; o não-crente, pergunta se é verdade que Deus existe.

O encontro com Cristo

Numa carta ao jornalista italiano Eugenio Scalfari, datada de 4 de setembro de 2013, o Papa Francisco evoca uma passagem da Deus caritas est (DCE 1), escrevendo: “a fé, para mim, nasceu do encontro com Jesus: um encontro pessoal, que tocou o meu coração e deu uma direção e um sentido novo à minha existência”. Quem não fez esse encontro pessoal com Cristo não tem uma fé verdadeira – pode até professar os valores cristãos por uma questão de tradição, mas será uma confissão abstrata, mais próxima de uma “filosofia de vida” do que de uma experiência religiosa. Não se trata de julgar aqui a vida dos outros, alguns realmente nunca receberam o anúncio cristão, outros o receberam de uma forma adulterada e por isso não fizeram o encontro, outros ainda, quando conheceram a Cristo, não empenharam sua liberdade em conhecê-Lo.

Muitas vezes, porém, mesmo nós que temos plena consciência de termos feito esse encontro que mudou nossa vida, quando queremos testemunhar nossa fé, nos deparamos com essa questão: como explicar aos demais que Ele realmente atuou em nossa vida e na vida dos outros cristãos? Como dizer que Ele é eficaz quando existe tanto mal e tanto sofrimento no mundo?

Onde reside a eficácia de Deus

Esse tema surgiu numa reunião de minha pequena comunidade e tomo aqui “emprestada” a resposta dada por meu amigo Olívio Pereira de Oliveira Júnior: Deus se mostra eficaz na história quando faz com que transpareça, em nossa vida, uma humanidade nova – um modo diferente, mais condizente com nossos anseios mais profundos, de nos relacionarmos com os outros, com as coisas e até mesmo com nós mesmos, com nossas alegrias e dores, êxitos e fracassos.

Essa resposta inclui muitas coisas, mas devemos superar dois reducionismos igualmente fatais: o do moralismo esquemático e o da fantasia otimista.

É verdade que, nesse caminho de mudança de vida trazida pelo encontro com Cristo, tendemos a ser moralmente melhores, tanto por compreendermos mais do que é a bondade no mundo quanto por nos esforçarmos para corresponder à graça recebida. Contudo, isso é diferente de um esquema moral incapaz de aceitar os outros, de olhar com misericórdia para os próprios erros e para os erros do outro. Somos todos incoerentes, em maior ou menor grau, e nossa coerência é importante, mas não é a prova definitiva de que Deus agiu em nossa vida. Nesse sentido, a grande prova da nova humanidade que vivemos é a capacidade de comunicar a beleza do amor a todos e em tudo que fazemos. Nesse testemunho, nossa incoerência é realmente uma dificuldade, mas não dá a última palavra, pois até mesmo em nossos erros é o amor e a misericórdia de Deus que se evidenciam.

A fantasia otimista é a ilusão de que para os cristãos nada vai dar errado, como se entre nós não houvesse também aqueles que morrem precocemente por causa de doenças, acidentes ou vitimados pela violência, como se não fracassássemos em negócios ou perdêssemos combates e guerras, como se não tivéssemos mais que sofrer o cancelamento cultural ou mesmo o martírio de sangue. Deus é “nosso escudo”, como dizem vários Salmos, mas não nos termos da concepção humana. Ele reservou o martírio para seu próprio Filho Unigênito, não poupará a nós dos sofrimentos. Porém, a humanidade nova permite viver até mesmo o sofrimento de um outro modo. Sempre me marcou a experiência de um casal de amigos que, no enterro da própria filha, consolava os demais. Evidentemente sofriam uma grande dor, mas sua humanidade renovada por Cristo lhes dava uma esperança e um conforto que lhes permitia ser sinal do amor de Deus para os demais.

A liberdade ineficiente

Surpreendentemente, a nossos olhos, Deus nunca deixa de ser eficaz, de fazer sua graça agir na vida dos seres humanos e no mundo; mas, de certa forma, escolheu por não ser eficiente.

Aqui vale uma explicação técnica, do uso dos termos pelos estudiosos do funcionamento de processos e operações. Ser eficaz significa atingir um objetivo almejado, superar a dificuldade que se apresenta. Ser eficiente significa fazer isso com o mínimo de esforço, com o menor gasto de recursos. Se devemos ir de São Paulo ao Rio de Janeiro, nos perdemos no caminho e passamos primeiro por Belo Horizonte, não deixamos de ser eficazes, mas não fomos eficientes.

Deus é eficaz, garantiu que possamos ser salvos, conforme seu desígnio de amor, mas, também por amor, deu-nos o livre-arbítrio, a possibilidade de renegarmos Sua graça, de sermos incoerentes, de termos a necessidade de construir um mundo que pode ser melhor ou pior em função de nossas opções. Poucos mistérios de Deus são tão incompreensíveis para nós, seres humanos, como o do livre-arbítrio. É fato que a obra de Deus no mundo, a nossos olhos, ao menos, parece ser menos eficiente por causa dele – mas Deus parece valorizar muito a nossa liberdade, a ponto de se conter, de ser “menos eficiente”, para respeitá-la.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF