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quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Santo Agostinho e a infalibilidade dos Concílios universais

Concílio de Nicéia | Apologistas Católicos

Santo Agostinho e a infalibilidade dos Concílios universais

NELSON SARMENTO 

Falar da posição de Santo Agostinho sobre a infalibilidade dos Concílios universais não é uma tarefa fácil, pois o Santo Doutor nunca tratou do tema ex professo. O que podemos concluir com facilidade é que negou a infalibilidade de Concílios regionais, como se depreende de sua visão sobre o Concílio de Cartago sob São Cipriano (cf. Carta 93,38 e Tratado sobre o Batismo, livro 6, cap. 2, 3) e do Concílio de Bagai (cf. Réplica à carta de Parmeniano, livro 3, cap. 6,29 e Carta 23,5).

No entanto, uma busca minuciosa nas obras de Santo Agostinho traz várias considerações importantes do Doutor da Igreja ao tratar de Concílios universais, vejamos:

1) Na sua visão, os Concílios universais são a última instância de julgamento na Igreja:

“Concedamos que aqueles bispos que julgaram em Roma não eram bons juízes; ainda os ficava o concílio plenário de toda a Igreja, no qual se poderia discutir a causa frente a esses mesmos juízes; se fosse demonstrado que eles julgaram mal, anularia-se sua sentença. Demonstrem os donatistas que eles executaram ambas as coisas. Eu provo facilmente que não as executaram, com somente ver que o mundo inteiro não está em comunhão com eles. Se as executaram, foram novamente vencidos, com sua própria separação demonstra”. (Carta 43, 19)

“Se ela, salvando a paz, uns creram ainda uma coisa e outros outra sobre este ponto, enquanto um concílio universal não havia tomado uma determinação clara e autêntica, cobriria a caridade da unidade o erro da fraqueza humana, como está escrito: O amor cobre uma multidão de pecados. Vou referir-me agora ao bem-aventurado mártir Cipriano, em cujos escritos encontramos preciosos documentos; e o faço precisamente porque estes donatistas querem apoiar-se carnalmente em sua autoridade quando na realidade é sua caridade a que os fulmina espiritualmente. (...) Com efeito, naqueles tempos, antes que a unanimidade de toda a Igreja houvesse confirmar com a sentença do concílio plenário o que se devia fazer nesta questão, pareceu-lhe, reunido com cerca de oitenta bispos africanos, que era preciso batizar de novo a todo aquele que vinha à Igreja tendo recebido o batismo fora da comunhão da Igreja católica”. (Tratado sobre o batismo, livro 1, cap. XVIII, 27-28)

2) Tacha de cismáticos aqueles que não obedecem a decisão de um Concílio universal:

“Ainda seguem batizando fora da Igreja; se pudessem, rebatizariam à própria Igreja. Oferecem seu sacrifício na dissenção e o cisma e saúdam ao povo em nome da paz, enquanto lhe privam da paz da salvação. Rasgam a unidade de Cristo, blasfemam contra a herança de Cristo, expulsam o batismo de Cristo”. (Carta 43,21)

“eles que estão convictos de haver perpetrado uma ruptura cismática da Unidade Cristo não por trezentos e dez bispos, mas pela autoridade dos do mundo inteiro”. (Réplica à carta de Parmeniano, livro 3, cap. 6, 29)

3) Diz aos donatistas que, após uma controvérsia obscura sobre um ponto teológico, um Concílio universal confirma qual é o “pensamento seguro de salvação”:

“Já é tempo, creio, de não dar a impressão de servir-me de argumentos humanos. Já nos tempos precedentes da Igreja, antes do cisma de Donato, a obscuridade desta controvérsia fez que ilustres varões e mesmo bispos animados de grande caridade, ficando sempre a salvos a paz, discutissem entre si e flutuassem de tal modo que não coincidiam os variados estatutos dos concílios em suas diversas regiões, até que, dissipadas todas as dúvidas, confirmou-se em um concílio plenário de todo o orbe qual era o pensamento seguro de salvação”. (Tratado sobre o batismo, livro 1, cap. 8, 9)

4) Diz que os Padres conciliares estabeleceram o termo ‘homousios” no Concílio de Nicéia com a autoridade da verdade e com a verdade da autoridade:

“Logo o Pai e o Filho são de uma mesma substância. É isto que significa aquele ‘homousios’, que os Padres católicos estabeleceram com a autoridade da verdade e com a verdade da autoridade no Concílio de Nicéia contra os hereges arianos” (Contra Maximino e Ário, II, XIV, 3)

Tudo isso é suficiente para concluir que Santo Agostinho defendia a infalibilidade dos Concílios universais? Tendo a crer que sim, e vários teólogos católicos têm argumentado através dessas passagens, desde São Roberto Bellarmino[1] e Melchor Cano[2] até aos mais modernos[3]. No entanto, é inegável que ainda abre espaço para um protestante tergiversar, ainda mais lembrando que o protestantismo tem uma visão eclesiológica bem diferente da nossa.

Há outra forma, no entanto, de evidenciar que para Santo Agostinho os Concílios universais são infalíveis. Nessa forma de argumentar recorrerei a um silogismo, demonstrando que as premissas, maior e menor, encontravam-se, claramente, no pensamento de Santo Agostinho, e que a conclusão, portanto, é inevitável pela lógica. Provavelmente a genialidade de Santo Agostinho não se furtaria à conclusão que suas próprias premissas demandam. O silogismo é uma argumentação dedutiva. Exemplificando: Premissa maior: Todo homem é um animal racional. Premissa menor: Carlos é um homem. Conclusão: Carlos é um animal racional. A premissa maior que “1) a Igreja universal não pode errar” estava presente em Santo Agostinho. A premissa menor que “2) os Concílios universais são expressões da Igreja universal”, igualmente. Daí que Santo Agostinho devesse concluir, portanto, que os Concílios universais não podem errar. Estando esses dois pressupostos referidos abundantemente no pensamento do Santo Doutor é muito improvável que Santo Agostinho negasse a infalibilidade dos Concílios universais.

1) A IGREJA UNIVERSAL NÃO PODE ERRAR

Foram várias as passagens encontradas nesse sentido nas Obras do Doutor de Hipona. Os dizeres são muito fortes e dificilmente questionáveis.

“Por conseguinte, embora não se apresente nenhum exemplo certo a este respeito tomado das Escrituras canônicas, mantemos, contudo, neste assunto a verdade das mesmas Escrituras, ao praticar o que já pareceu bem à Igreja universal, que recomenda a autoridade das mesmas Escrituras. Assim, como a santa Escritura não pode enganar, qualquer um que teme ser enganado pela obscuridade desta questão, deve consultar a mesma Igreja, assinalada sem ambiguidade pela santa Escritura. Mas se duvidas que a santa Escritura recomenda a esta Igreja que se estende em número tão abundante por todos os povos, e se não o duvidasse não estarias ainda no partido de Donato, eu te abrumarei com testemunhos abundantes e claríssimos, tomados da mesma autoridade, a fim de que com tuas concessões, supondo que não te aferras à tua obstinação, façam-te confessar isso. Ainda antes te mostrarei que nada verdadeiro pudeste responder a minha carta, que trataste de combater”. (Réplica ao gramático Crescônio, Livro 1, cap. 33, 39)

Contra o donatista Crescônio, Santo Agostinho refutava o rebatismo de hereges. Santo Agostinho argumenta que, embora não haja nas Escrituras nenhum exemplo claro a esse respeito, deve-se praticar o que a Igreja universal admite. E em seguida acrescenta o que é mais importante: como a Santa Escritura não pode enganar, qualquer um que teme ser enganado por causa da obscuridade do tema, deveria consultar a própria Igreja, assinalada pela Santa Escritura. Nada mais claro! Quem consulta a Igreja universal não pode ser enganado, já que a Bíblia não pode enganar ao recomendar essa mesma Igreja. Ou seja, Santo Agostinho prova a infalibilidade da Igreja universal através da autoridade das Escrituras inerrantes.

“Vêm, pois, estes sedutores e perguntam a um homem que não entende as divinas Escrituras como podem estar no céu os governadores das trevas, para que, ao não saber responder, seja arrastado por eles ao engano, pois toda alma ignorante é curiosa. Mas quem conhece bem a fé católica e vive protegido pelos bons costumes e a verdadeira piedade, embora não conheça sua heresia, sabe como responder-lhes. Pois ninguém pode enganar ao que conhece o que atém a fé católica, difundida pelo mundo inteiro, já que ela vive segura, sob o governo de Deus, frente aos ímpios e pecadores e frente aos próprios católicos negligentes”. (O combate cristão, cap. IV, 4)

Santo Agostinho nesta passagem é claríssimo que quem conhece o que atém a fé católica, difundida pelo mundo inteiro, não pode ser enganado, já que ela vive segura, sob o governo de Deus. Dito em outras palavras: o fiel que conhece o que crê a Igreja universal não pode ser enganado, pois essa crença vive segura sob a assistência de Deus

“Como contraponto destes dentes, aparecem os dentes da Igreja, sob cuja autoridade os crentes se vêem cortados do erro dos gentios e das doutrinas heterogêneas, e se vêem transvasados a ela que é corpo de Cristo”. (Salmo 3)

Santo Agostinho está comentando ao verso 7 do Salmo 3. Este verso fala sobre Deus quebrando os dentes dos pecadores. O contraponto desses dentes dos ímpios são os dentes da Igreja, sob cuja autoridade os católicos se vêem cortados do erro e das doutrinas heterodoxas. Não é preciso dizer mais nada.

“É algo evidente, o aceita a fé, o aprova a Igreja, é verdade”. (Sermão 1)                           

Em latim a frase é assim: Manifestum est, admittit fides, approbat Ecclesia catholica, verum est. Repare que ele toma por verdadeiro algo pelo fato da Igreja católica o aprovar. A Igreja o aprova, verdadeiro é.

“A Igreja de Deus, cercada por tanta palha e cizânia, tolera muitas coisas, mas Ela não aprova nem faz aquilo que é contrário à fé ou à virtude, nem tampouco Ela se cala perante essas coisas.” (Ep. 55. n 35 al 119)

Mais uma vez a infalibilidade da Igreja universal é manifesta em Santo Agostinho. A Igreja não aprova nem faz aquilo que é contrário à fé ou à virtude.

“Vejamos, então, o que me ensina Manes. Examinaremos antes de tudo aquele livro ao que denominais Carta do Fundamento, no qual se contém quase tudo o que vocês creem. Quando nos lia naquele tempo de minha miséria, dizia-nos que éramos iluminados por vocês. Começa assim: “Manes, apóstolo de Jesus Cristo pela providência de Deus Pai. Estas são as palavras saudáveis que emanam da fonte perene e viva”. Se os agrada, considera com boa paciência o que pergunto. Não vejo que o seja apóstolo de Cristo. Suplico-vos que não se irritem e comeceis a maldizer-me. Sabeis que me propus não crer temerariamente em nada o que é dito por vocês. Pergunto, então, quem é esse Manes. Respondeis: O apóstolo de Cristo. Não o creio. Não terás já o que dizer ou fazer. Prometeste-me a ciência da verdade e agora me obrigar que creia o que ignoro. Talvez me leias o Evangelho e tente mostrar-me nele quem é Manes. E se te encontrasses com alguém que ainda não crê no Evangelho, que farias se te dissesse: Não o creio? Eu, na verdade, não creria no Evangelho se não me movesse a ele autoridade da Igreja católica”. Portanto, se obedeci aos que me diziam que cresse no Evangelho, por que não iria obedecer aos que me dizem: “Não creias nos maniqueus”? Escolhe o que queres. Se diz: “Creia nos católicos”, eles me admoestam que não os outorgue a mais mínima fé; portanto, crendo-lhes, não posso crer-te a ti; se dizes: “Não creia nos católicos”, não agirás retamente ao obrigar-me a crer em Manes em virtude do Evangelho, porque cri nele pela pregação da Católica. Se, pelo contrário, diz: “Fizeste bem em crer nos católicos enquanto louvam o Evangelho, mas não fizeste bem em crê-los quando vituperam a Manes”, crês-me tão néscio como para crer o que tu queres e não crer o que tu não queres, sem dar razão alguma? Meu comportamento é, então, muito mais justo e mais cauto ao não passar a ti, dado que ao menos uma vez cri nos católicos, a não ser que no lugar de mandar-me crer, faça-me saber algo com toda claridade e evidência. Por consequência, se vai dar-me alguma razão, deixa de lado o Evangelho. Se te agarras ao Evangelho, eu me agarrei naqueles por cujo mandato cri no Evangelho, e por cuja ordem em nenhum modo crerei em ti. Porque se, casualmente, pudesses falar algo claro no Evangelho sobre a condição de apóstolo de Manes, terás que encerrar peso ante mim à autoridade dos católicos que me ordenam que não te creia; mas reduzida essa autoridade já não poderei crer nem no Evangelho, posto que havia crido nele amparando-me na autoridade deles. E dessa maneira, nenhum valor terá para mim o que saques dele. Portanto, se no Evangelho não se fala nada claro sobre a condição de apóstolo de Manes, crerei nos católicos antes que a ti. Se, por outro lado, lês nele algo claro em favor de Manes, não te crerei e nem neles. A eles não crerei porque me enganaram a respeito de ti; a ti tampouco porque me apresentas uma Escritura na qual havia crido graças aqueles que me mentiram. Mas longe de mim não crer no Evangelho! Crendo nele não acho modo de poder crer também em ti. Entre os nomes dos apóstolos que ali se lêem não se acha o de Manes. Nos Atos dos Apóstolos lemos quem ocupou o lugar do que entregou a Cristo. Se creio no Evangelho, necessariamente crerei nesse livro porque a autoridade católica me recomenda igualmente um e outro escrito. No mesmo livro lemos também o relato conhecidíssimo da vocação e apostolado de Paulo. Lê-me agora, se podes, um texto do Evangelho onde se nomeie a Manes como apóstolo, ou de qualquer outro livro no que confesse haver já crido. Vai ler-me, acaso, aquele no que o Senhor prometeu aos apóstolos o Paráclito? Em relação a esse texto, considera quantas e de quão grande peso são as razões que me apartam e me impedem crer em Manes”. (Réplica à carta chamada "do Fundamento", 5)

Essa passagem tem uma frase muito utilizada pela apologética católica: “Não creria no Evangelho, se não me movesse a ele a autoridade da Igreja”. Para contextualizarmos, Santo Agostinho replica um livro que se dizia revelado de Manes, chamado “Carta do Fundamento”. Os maniqueus queriam incentivar Santo Agostinho a crer na inspiração deste livro. Santo Agostinho responde, primeiramente, no capítulo imediatamente anterior, por que se encontra na Igreja católica. Fala dos motivos que lhe sujeitam ao seu seio: o consenso dos povos, a autoridade incoada com milagres, a sucessão apostólica da cátedra do Apóstolo São Pedro, até o episcopado de seu tempo, o nome "católica" que só esta Igreja obteve entre tantas heresias. Santo Agostinho, após isso, explica porque não pode aceitar a suposta inspiração de Manes. Ele explica que somente crê no Evangelho por causa do mandato da autoridade da Igreja Católica, que contém “tantos e tão poderosos laços”. Explica que essa mesma Igreja Católica ordena que ele não creia nos Maniques. No caso em que os maniqueus comprovassem pelo Evangelho a existência clara em favor de Manes, Santo Agostinho disse que já não poderia crer nos católicos. Acrescenta que, neste caso, não poderia mais crer no Evangelho, pois foi através daquela autoridade que foi movido a crer no Evangelho. Calvino quis explicar as palavras de Santo Agostinho no sentido de que um infiel é induzido a crer no Evangelho por causa da reverência à Igreja, da qual ele aprende sobre o Evangelho. Mas essa interpretação é uma distorção gritante ao contexto. Santo Agostinho não está dizendo que crê no Evangelho simplesmente no sentido de que outros católicos lhe levaram a esse conhecimento. Diz que a autoridade da Igreja lhe recomenda crer no Evangelho e por isso crê, e se a Igreja errasse sobre Manes já não poderia crer nem mesmo no Evangelho. Acrescenta depois que crê nos Atos dos Apóstolos e no Evangelho porque a Igreja recomenda (obriga) um e outro. Se a Igreja apenas o levasse ao conhecimento da existência do Evangelho, como quer Calvino, como é que ele diz que já não creria no Evangelho se a Igreja errasse sobre os Maniqueus? Não faz o menor sentido.

Santo Agostinho faz alusão claríssima a infalibilidade da Igreja. Não faz sentido crer numa autoridade como inerrante (as Escrituras), baseado numa autoridade falível (a Igreja, como querem os protestantes). Além disso, ele é claro que a Igreja não poderia errar sobre o que diz sobre Manes, pois do contrário já não poderia crer no Evangelho.

Parece-te que disse algo muito agudo quando interpretas que o nome de Católica não significa uma comunhão universal, mas a observância de todos os divinos preceitos e de todos os sacramentos. Embora a Igreja chama-se Católica porque retém toda a verdade, enquanto que as diversas heresias retém uma só parte dessa verdade, quem te disse que nos apoiamos nesse nome de Católica para demonstrar que a Igreja está estendida por todas as nações, e não na promessa de Deus e nos manifestos oráculos da própria Verdade? Pelo visto, tudo o que pretendes persuadir-me é, em resume, que somente há ficado os rogatistas com direito e apelidar como católicos, porque observais todos os preceitos divinos e todos os sacramentos, e que unicamente em vós achará a fé o Filho do Homem quando voltar. Perdoa, não o creio. Talvez tenhas a audácia de afirmar que vós não estais na terra, mas no céu, para que entre vós possa achar-se a fé, que o Senhor anunciou que não encontraria na terra. Contudo, o Apóstolo nos impôs tanta cautela, que nos mandou anatematizar ao anjo do céu se no evangeliza uma coisa distinta da que temos recebido. Como pelas divinas letras teríamos a confiança de haver recebido a Cristo manifesto, se não recebemos pelas mesmas fontes a Igreja manifesta? Por muitos expedientes e subterfúgios que urdais contra a simplicidade da verdade, por muitas névoas de falsidade astuta que difundes, será anátema quem pregar que Cristo não padeceu nem ressuscitou ao terceiro dia, posto que isso o temos recebido pela verdade evangélica: Era necessário que Cristo padecesse e ressuscitasse dentre os mortos ao terceiro dia. Pois do mesmo modo será anátema quem pregar uma Igreja fora da comunhão de todas as nações, posto que temos recebido pela própria verdade o que se diz na continuação: E que seja pregada em seu nome a penitência e remissão dos pecados por todos os povos, começando por Jerusalém. Devemos, então, reter sem vacilar: Quem os pregar algo fora do que haveis recebido, seja anátema... Temos que dizê-los mais alto o que dizemos a todos os donatistas. Suponhamos, por um impossível, que alguns achem motivo bastante justo para separar sua comunhão da comunhão do mundo inteiro. Suponhamos o que se chama Igreja de Cristo pode haver-se separado justamente da comunhão de todos os povos. Como sabeis que na sociedade cristã, tão difundida por toda parte, não houve uma justa e distante separação antes da vossa? Talvez por ser antiga não pôde chegar até vós a fama de sua justiça. Por que a Igreja está entre vós, no lugar de que entre aqueles que talvez se separaram antes? “Veja como, por não saber isso, convertestes em um problema para vós mesmos”. (Carta 93, 23, 25)

Aqui um donatista explicava que a expressão “Católica” não se deve entender como uma comunhão universal, mas como a observância de todos os divinos preceitos e de todos os sacramentos. Santo Agostinho responde que é justamente este o conceito que os católicos dão ao termo “Católica”. Acrescenta que não existe Igreja Católica fora da comunhão de todas as nações. Diz em seguida que é impossível achar um motivo justo para separar-se da comunhão do mundo inteiro. A Igreja de Cristo nunca seria outra senão a comunhão de todos os povos. Portanto, para Santo Agostinho a Igreja que observa todos os divinos preceitos, e que, por isso, chama-se “Católica”, é justamente esta do mundo inteiro. A infalibilidade, portanto, é inegável, a partir do termo “Católica”, por onde “retém toda a verdade”.

“Pedes-me que trate com prudência e cautela a questão da Trindade, isto é, da unidade de divindade e da distinção de pessoas, para que a cordura e minha doutrina e ingênio, como tu dizes, dissipe a névoa de tua mente e assim possas ver com teus olhos, iluminados pelo fulgor de minha inteligência, o que agora não podes pensar. Mas olha, de repente, se esta súplica está conforme com tua anterior convicção. Ao princípio da mesma carta, na qual me apresentas tua súplica, afirmas haver-te convencido de que “é necessário averiguar a verdade por meio da fé, no lugar que por meio da razão. Se a fé da santa Igreja, diz, houvesse de se aceitar pela razão e disputa e não pela piedade e a crença, ninguém alcançaria a bem-aventurança senão os filósofos e oradores. Mas aprouve a Deus escolher o débil deste mundo para confundir o forte, e salvar aos que creram pela estultícia da pregação. Por isso, não tanto há que buscar a razão quanto o seguir a autoridade dos santos”. Segundo estas palavras tuas, máxime neste ponto fundamental em que se apoia toda nossa fé, deverias pensar em teu dever de seguir a autoridade dos santos sem pretender de mim uma razão para entender”. (Carta 120, 2)

Neste caso, Santo Agostinho responde um consulente chamado Consencio, que queria explicações sobre o tema da Trindade. Santo Agostinho relembra as próprias palavras de Consencio que diziam que é necessário averiguar a verdade por meio da crença da Igreja universal, portanto, é mais importante buscar a autoridade dos santos do que a razão. Santo Agostinho diz que as palavras de Consencio é um ponto fundamental em que se apoia toda nossa fé. Se devemos seguir a autoridade da Igreja antes de seguir à razão, não se vê como a falibilidade da Igreja universal pode ser compatível com esse pensamento de Santo Agostinho. Como crer que a autoridade dos santos seria um ponto fundamental em que se apoia toda nossa fé se tal autoridade é falível? Como a verdade seria averiguada por meio da crença da Igreja universal se esta é falível?

“Por causa do seguro julgamento de todo o mundo não podem ser bons aqueles cristãos que se separam do resto da terra em qualquer parte que estejam” (Réplica a carta de Parmeniano, livro 3, 24)

A evidência se encerra na expressão seguro julgamento ou juízo de todo o mundo (Securus iudicat orbis terrarum). Essa expressão de Santo Agostinho foi muito importante na conversão de Newman, como o mesmo relata. Newman disse que tais palavras de Santo Agostinho lhe impressionaram com um poder que ele nunca tinha sentido antes, comparando ao "Tolle, lege,—Tolle, lege", da criança que converteu ao próprio Santo Agostinho[4].

“Assim o afirma a autoridade da madre Igreja, assim consta no cânon bem fundado da verdade: qualquer um que lance seus aríetes contra esta robustez e contra este muro inexpugnável, ele mesmo se arrebentará” (Sermão 294, 18)

A autoridade da santa Madre Igreja é uma regra seguríssima da verdade, qualquer um que tentar derrubar esse muro imbatível, será abatido. O contexto é sobre a prática universal do batismo infantil, que Santo Agostinho usava como argumento.

“Esta passagem aplica-se àqueles a quem o Senhor não abandona quando o procuram. Ele tem sua morada em Sião, o que significa contemplação e é o portador da imagem da Igreja atual, como Jerusalém é portadora da imagem da futura Igreja, isto é, da cidade dos santos que já desfrutam da vida dos anjos. Com efeito, Jerusalém se traduz por visão da paz. Por outro lado, a contemplação precede à visão, assim como esta Igreja precede aquela cidade imortal e eterna, objeto de promessas. Mas se trata de uma precedência temporal, não por razões de dignidade, uma vez que é mais digno de estima o fim em que nos esforçamos para chegar, do que os meios que usamos para atingir esse objetivo. De fato, praticamos a contemplação para chegar à visão. Mas mesmo uma contemplação, por mais minuciosa que fosse, levaria ao erro se o Senhor não residisse formalmente na Igreja atual. E a esta Igreja foi dita: o templo de Deus é santo, e esse templo sois vós. E em outra passagem: no homem interior, Cristo vive pela fé em seus corações. Nos é ordenado, então, cantar ao Senhor que reside em Sião, para louvar em unidade de coração ao Senhor que habita na Igreja. Narre suas ações entre os povos. Já foi feito e nunca vai deixar fazer-se ". (Salmo 9, 12)

Santo Agostinho explica que a palavra Sião significa contemplação e é imagem da Igreja atual. Explica que a Igreja atual pratica a contemplação para chegar a visão do bem do século vindouro. E o que é mais importante: esta contemplação, por muito minuciosa que fosse, cairia ao erro se o Senhor não residisse na Igreja atual. Ora, segundo Hebreus, “a fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos” (11,1). Com uma fé falsa é impossível fazer uma verdadeira contemplação. Segue-se que a Igreja é infalível.

2) OS CONCÍLIOS UNIVERSAIS SÃO EXPRESSÕES DA IGREJA UNIVERSAL

 

Há várias passagens de Santo Agostinho onde se refere aos “Concílios plenários do mundo inteiro” e que a Igreja universal, por vezes, se manifesta por meio dos Concílios plenários. Vejamos:

“Já é tempo, creio, de não dar a impressão de servir-me de argumentos humanos. Já nos tempos precedentes da Igreja, antes do cisma de Donato, a obscuridade desta controvérsia fez que ilustres varões e mesmo bispos animados de grande caridade, ficando sempre a salvos a paz, discutissem entre si e flutuassem de tal modo que não coincidiam os variados estatutos dos concílios em suas diversas regiões, até que, dissipadas todas as dúvidas, confirmou-se em um concílio plenário de todo o orbe qual era o pensamento seguro de salvação”. (Tratado sobre o batismo, livro 1, cap. 8, 9)

 “Com efeito, naqueles tempos, antes que a unanimidade de toda a Igreja houvesse confirmar com a sentença do concílio plenário o que se devia fazer nesta questão, pareceu-lhe, reunido com cerca de oitenta bispos africanos, que era preciso batizar de novo a todo aquele que vinha à Igreja tendo recebido o batismo fora da comunhão da Igreja católica”. (Tratado sobre o batismo, livro 1, cap. 18, 28)

“Na África somente condenaram alguns. Mas estes foram respaldados logo pelo juízo favorável do mundo inteiro”. (Réplica à carta de Parmeniano, livro 1, cap. 3, 4)

“eles que estão convictos de haver perpetrado uma ruptura cismática da Unidade Cristo não por trezentos e dez bispos, mas pela autoridade dos do mundo inteiro”. (Réplica à carta de Parmeniano, livro 3, cap. 6, 29)

A lógica de Santo Agostinho é simples. Como cada Bispo administra a pessoa de sua igreja, vez que a igreja está no bispo, como ensina São Cipriano (cf. Epistola 66,8.3), a reunião de muitos deles numa assembléia conciliar pode chegar ao ponto de ser representativa de todo o mundo católico.

Os especialistas[5] discutem se nessas passagens Santo Agostinho se referia ao Concílio de Nicéia (325), ecumênico, ou ao Concílio de Arles (314). Por isso optamos no artigo em falar de infalibilidade de Concílios universais de modo genérico e não simplesmente de Concílios ecumênicos. Se um Concílio não ecumênico pode ser veículo de manifestação da Igreja universal por causa da sua representatividade, com muita mais razão o será um Concílio ecumênico. Eusébio mesmo chama o Concílio de Nicéia com 318 bispos de reunião do mundo inteiro (de vita Constantini, lib. 3).

A conclusão, portanto, é imperiosa. Essa forma de argumentar em favor da infalibilidade dos Concílios universais sempre foi usada pela apologética católica. Parece-me absurdo pretender que Santo Agostinho se esquivasse da conclusão contida em seus princípios. 

Para terminar, é importante resolver três objeções comumente lançadas por protestantes contra a tese, a partir de três passagens de Santo Agostinho.

Objeção 1: Santo Agostinho negou a infalibilidade dos Concílios universais, pois diz que os concílios plenários mais antigos “são frequentemente corrigidos por aqueles que os seguem”. (Tratado sobre o batismo, livro 2, cap. 3, 4). Se são corrigidos é porque admite-se que contêm erros.

Resposta: Santo Agostinho falava ou de questões de fatos não dogmáticos ou de questões disciplinares. Explico melhor: A Igreja Católica nunca negou que os Concílios universais podem errar em fatos não dogmáticos ou serem corrigidos em questões disciplinares. Os fatos não dogmáticos não dizem respeito à doutrina, mas à matéria profana. Por exemplo, se os bispos de Nicéia recebessem fraudulentos escritos de “Fulano de Tal” e por esta razão resolvessem condená-lo no Concílio Ecumênico sem conhecer da falsidade dos documentos apresentados, não haveria erro doutrinal, mas erro de fato. Assim, alguns teólogos argumentam com relação à condenação de Honório por alguns Concílios, eis que, explicam, as cartas apresentadas foram falsificações de orientais, e por isso os bispos enganados o condenaram. Outro exemplo, se um Concílio ecumênico diz que a capital do Rio Grande do Sul é Bagé o erro seria de fato. Os católicos defendem que os Concílios universais são infalíveis em questões de fé e moral e não de fato não dogmático. É possível que Santo Agostinho esteja falando em questões desse tipo, pois a questão particular dos católicos com os donatistas era sobre Ceciliano, se este devia ou não entregar os livros sagrados aos inimigos de fé. Por outra parte, as questões disciplinares de costumes podem ser corrigidas, mas não dogmas. Os preceitos são alterados de acordo com a mudança de tempos, lugares e pessoas, e essas mudanças podem ser chamadas de correções, não por causa de ser ruim no momento em que foi estabelecido, mas porque passou a ser ruim com a mudança de circunstâncias. As duas respostas podem ser confirmadas pela continuação das palavras de Santo Agostinho, pois fala de Concílios que são corrigidos quando o que foi fechado é aberto por algum experimento. A experiência tem como campo os fatos positivos, as questões de fato ou de costumes, não os assuntos de direito universal ou de fé.

Outra possibilidade é que Santo Agostinho esteja usando o termo “emendari” no sentido de “melhorados”, na ótica de um desenvolvimento homogêneo de doutrina, e não de correção de erros. Robert B. Eno considera possível que a melhor definição seja esta no contexto, eis que põe entre parênteses a palavra “improved” com uma interrogação, representando uma pergunta retórica em seu artigo já citado Doctrinal authority in Saint Augustine, p. 163. Em nota de rodapé este autor também cita: “Sieben, op.cit.92. Para E.Benz, "emendari" significa "melhorar" ao invés de "corrigir”, Veja-se E.Benz, Augustins Lehre von der Kirche (Mainz,1954) 35”. Se Santo Agostinho quer falar de melhora nada disso é contrário à doutrina católica sobre os Concílios universais. De fato, só com essa melhora ou progresso poderia o Concílio de Trento definir uma verdade que o de Viena havia apresentado com a nota de provável (Denz. 483 e 800). Outro exemplo: O Concílio de Laodicéia rechaça certos livros canônicos, pois não havia certeza de sua canonicidade naquele tempo. O Concílio de Cartago III, com uma análise mais apurada do tema, pôde admitir tais livros.

Objeção 2: Santo Agostinho diz que os concílios posteriores são os preferidos “entre as gerações posteriores aos [concílios] de data anterior, e o todo é sempre, com razão, visto como superior às partes” (Tratado sobre o batismo, livro 2, cap. 9, 14). Logo, os concílios são falíveis.

Resposta: Santo Agostinho estava contrapondo o Concílio de Cartago sob Cipriano a um Concílio universal (de Arles ou Nicéia). É claro que um Concílio regional pode ser corrigido e preterido a um Concílio universal. Sto. Agostinho explica que para se conservar a unidade de todo o corpo deve-se aceitar o que diz um Concílio universal. Santo Agostinho diz que esse seria o procedimento do próprio São Cipriano se naquele tempo a unanimidade da Igreja, através de um concílio universal, tivesse resolvido a questão sobre o rebatismo.

Objeção 3: Santo Agostinho diz que não dever arguir o Concílio de Nicéia, nem seu adversário o Concílio de Rímini, mas ambos a autoridade da Sagrada Escritura (cf. Contra Maximino e Ário, II, XIV, 3). Logo, não considerou o Concílio de Nicéia infalível.

Resposta: Não se segue. Santo Agostinho apenas estava dizendo que por conta de Maximino não estar preso à autoridade do Concílio de Nicéia nessa disputa, e por Santo Agostinho não estar em relação ao Concílio de Rímini, seria uma perda de tempo que um e outro citassem um Concílio que um ou outro não considerava legítimo. Daí que devessem usar uma fonte que ambos concordassem para argumentar. Santo Tomás de Aquino tem um trecho bastante similar com relação a outras fontes: “os maometanos e pagãos, não convém conosco em admitir a autoridade de alguma parte da Sagrada Escritura, pela que pudessem ser convencidos, assim como contra os judeus podemos disputar pelo Velho Testamento, e contra os hereges pelo Novo. Mas esses não admitem nenhum dos dois. Temos que recorrer, então, a razão natural, que todos se vêem obrigados a aceitar, mesmo quando não tenha muita força nas coisas divinas”. (Suma contra os gentios, livro 1, cap. 2)

[1] On Councils, their nature and authority, St. Robert Bellarmine, SJ. Translated by Ryan Grant, Mediatrix Press. Kindle.

[2] De Locis Theologicis: http://www.documentacatholicaomnia.eu/03d/1509-1560,_Cano_Melchior,_De_Locis_Theologicis,_LT.pdf

[3] Dictionnaire de Théologie Catholique, verbete AUGUSTIN (Saint) . III. Doctrine: http://jesusmarie.free.fr/dictionnaire_de_theologie_catholique_lettre_A.html; Constancio Palomo, SAN AGUSTIN Y LA AUTORIDAD DE LOS CONCILIOS, Salmanticensis. 1961, volume 8, #3. Pages 581-602., este cita vários outros autores.

[4] http://www.newmanreader.org/works/apologia/part5.html

[5] Robert B. Eno, Augustinian Studies 12:133-172 (1981), Doctrinal authority in Saint Augustine, p. 162; Dictionnaire de Théologie Catholique, verbete AUGUSTIN (Saint) . III. Doctrine: http://jesusmarie.free.fr/dictionnaire_de_theologie_catholique_lettre_A.html.

PARA CITAR

SARMENTO, Nelson. Santo Agostinho e a infalibilidade dos Concílios universais. Disponível em < > Desde 31/12/2017.

Papa Francisco denuncia o "pecado" das guerras esquecidas

Papa com membros do P.I.M.E | Vatican News

Em discurso aos redatores da revista "Mundo e Missão" do PIME, que comemora 150 anos de fundação, Papa Francisco falou da importância da missão e de dar voz aos oprimidos. E denunciou o "pecado" das guerras que ensanguentam há anos várias partes do mundo.

Bianca Fraccalvieri – Vatican News

A missão no centro: este foi o aspecto ressaltado pelo Papa ao receber em audiência esta quinta-feira os redatores e colaboradores da revista “Mundo e Missão”, publicada pelo Pontifício Instituto para as Missões Estrangeiras (PIME).

A revista foi fundada há 150 anos na região italiana da Lombardia com um espírito de modernidade, pois já promovia naquele período a “Igreja em saída” de que nos fala hoje Francisco.

O primeiro diretor, Padre Giacomo Scurati, e seus colaboradores compreenderam o valor de comunicar a missão, a importância de conhecer os países missionários fora da ótica colonizadora, narrando o encontro entre o Evangelho e as comunidades locais.

Hoje como ontem, são as periferias geográficas e existenciais, que continuam relegadas a um segundo plano. Eis então o desafio apontado por Francisco: “mostrar a beleza e a riqueza das diferenças, mas também as distorções e injustiças de sociedades sempre mais interligadas e, ao mesmo tempo, marcadas por fortes desigualdades”.

O pecado das guerras esquecidas

Trata-se de um modo de fazer jornalismo colocando-se do lado de quem não tem direito de palavra ou não é ouvido, dos mais pobres, das minorias oprimidas, das vítimas das guerras esquecidas.

“Isto eu quero destacar: as guerras esquecidas. Hoje todos estamos preocupados com uma guerra na Europa, às portas da Europa e na Europa, mas há anos existem guerras: há mais de dez na Síria, pensem no Iêmen, pensem em Mianmar, pensem na África. Estes não entram porque não são da Europa culta, a Europa culta… As guerras esquecidas são um pecado, esquecê-las assim.”

Deste modo, a revista cumpre outra sua tarefa específica: colocar a missão no centro; recordar às comunidades cristãs que se olharem somente para si mesmas, perdendo a coragem de sair e de levar a todos a palavra de Jesus, acabam por apagar-se.

Com efeito, partindo em missão, os missionários descobrem que o Espírito Santo chegou antes deles. “Quem partiu para evangelizar, acabou por receber uma Boa Nova.”

Depois de 150 anos, para o Papa esta é razão para publicar uma revista como “Mundo e Missão”: dar voz à esperança que o encontro com Cristo semeia na vida das pessoas e dos povos. Para dizer a todos que um mundo melhor é possível quando, seguindo Jesus, aprendemos a segurar a mão de cada irmão e irmã.

“Avante” foi a exortação final de Francisco, fazendo votos de que redatores e colaboradores se mantenham fiéis às raízes da revista, sempre atentos aos sinais dos tempos e abertos ao futuro de Deus.

Homilia de Nossa Senhora Aparecida

Nossa Senhora Aparecida | catequizar
Dom Paulo Cezar Costa
Cardeal Arcebispo de Brasília

Homilia de Nossa Senhora Aparecida

“Estamos celebrando Nossa Mãe, Nossa Senhora da Conceição Aparecida. O estarmos aqui, nesta grande celebração, aos pés da Virgem Maria toca o profundo do coração de todos nós, pois é a presença materna da Mãe: Mãe de Deus e Nossa Mãe. Sua presença, através esta simples imagem de Aparecida, simboliza a ternura e a proximidade de Deus para conosco. O nosso coração se enche de amor e dele, sai um canto natural de louvor pela proximidade e presença da Mãe. O mistério da sua presença materna toca o mais profundo do nosso ser. O amor nos leva a nos determos diante da proximidade do mistério de Mãe, contemplá – La, desfrutar de sua presença. Diante Dela nos sentimos acolhidos no peso da vida, diante das nossas dores, sofrimentos, sonhos. Nosso coração se comove e a súplica sincera que brota confiante é a expressão de um coração que renunciou à autossuficiencia, reconhecendo que sozinho nada pode.
Maria é mãe e sua presença materna intercede a Deus por nós. A imagem da rainha Ester que suplica ao Rei pelo seu povo preanuncia Maria, que como mãe intercede por seus filhos e filhas, mas não diante do rei, mas diante daquele que é Senhor da História, diante do seu Filho Jesus Cristo, rei do Universo.

Evangelho das Bodas de Caná apresenta uma festa de casamento. Esta festa representa a Aliança de Deus com a humanidade que se deu em Jesus Cristo. Uma festa de casamento que representa a vida de cada um de nós nesta aliança com Deus; a vida pode ser lida como uma festa e nesta festa está a Mulher, Maria. Ela é aquela que aponta para o Filho a falta do vinho: “Eles não têm mais vinho”. O vinho tinha acabado, Israel não tinha mais profetas que falavam em nome de Deus, não tinham mais vinho. Também, na nossa festa, quantas vezes o vinho parece ter acabado. Quando bate o sofrimento, a doença, a falta de dinheiro, os problemas, parece que o vinho acabou. É preciso, nestes momentos ter a sua presença materna. Ela sempre dirá ao Filho: “eles não têm mais vinho”.
O Filho, Jesus Cristo, lhe objeta: Minha hora ainda não chegou. Jesus está falando do seu sacrifício, da sua morte na cruz. A cena que contemplamos no Evangelho, está intimamente ligada à morte de cruz de Jesus. Esta é a hora de Jesus. E nesta hora Ela estará aos pés da cruz e receberá a cada um de nós como filhos e filhas. Ela é nossa mãe. Na hora que o seu Filho morria, Ele nos deu a sua mãe como nossa mãe. Ela é nossa mãe. Diante dela, é preciso nos sentirmos filhos e filhas.
Mas a festa de Caná, continua e a mulher aponta para os servos, para aqueles que estavam servindo: “fazei tudo o que ele vos disser”. Os servos, nesta cena, são descritos com a palavra grega diakonos. Diakonos significa o discípulo. Maria diz aos discípulos que façam tudo o que o seu Filho mandar. Aqui tem-se um texto rico de significado. A mãe, nesta sena, nos aponta a vontade do Filho, mas onde está contida a vontade do Filho? Onde encontrar a vontade do Filho? A vontade do Filho se encontra nas Escrituras, na Palavra de Deus, principalmente nos Evangelhos. A palavra de Deus deve estar presente na festa da nossa vida, alimentando a nossa vida de seguidores e seguidoras de Jesus Cristo. Por isso, a importância de se ler um pequeno trecho da Bíblia cada dia. Sugiro que você leia e medite evangelho do dia. É a Palavra de Deus que vai formando o nosso coração de amigos e amigas de Deus, muda a nossa vida e dá sentido ao ser e agir, corrigindo posturas e aderindo ao modo de ser, de pensar e de agir de Jesus Cristo”1.
Se na cena de Caná, a mulher (Maria) aponta para os discípulos a vontade do Filho, na cruz Ela se torna mãe do discípulo. Há um crescente no papel da Virgem Maria, que não é lembrada com o próprio nome (Maria), mas vem designada por mulher. O uso do termo mulher, traz toda uma rica densidade. Mulher relembra a Primeira mulher, Eva; relembra a Sião do Antigo Testamento. O sinal de Caná da Galiléia é de natureza messiânica, isto é, se relaciona com a obra do Messias, com a obra de Jesus Cristo.
Na economia da Nova Aliança, sancionada com o Mistério Pascal, a mãe de Jesus se torna personificação da Nova Jerusalém, ou seja, da Filha de Sião à qual os profetas dirigem seus vaticínios sobre os últimos tempos. E assim como na linguagem bíblico-judaica Jerusalém, como também o povo eleito, eram geralmente representados sob a imagem de uma “Mulher”, assim se compreende por que Jesus se dirige à Mãe com o apelativo de “Mulher”. Em Maria, Jesus aponta a personificação da Nova Jerusalém – Mãe, isto é, a Igreja Mãe. Temos uma transposição da imagem da Jerusalém para a Mãe de Jesus. A Mãe de Jesus é mãe universal dos filhos de Deus dispersos, unificados na pessoa de Cristo, que ela revestiu de nossa carne no seu seio materno. Sendo Mãe de Jesus, aos pés da cruz Maria é declarada Mãe dos que são uma só coisa com Jesus, em razão da fé2• Ela é mãe dos discípulos e discípulas de Jesus que somos todos nós.

Através da palavra do Filho: “Enchei de água as talhas” e eles encheram e ainda: “Tirai e levai ao mestre sala”. Há a transformação da água em vinho. Só Jesus podia mudar a água em vinho e transformou. O vinho significa os bens messiânicos: sua palavra, seus milagres, sua salvação, sua presença no meio dos homens. É ele o vinho novo que quer continuar a dar sentido à nossa vida. Sem o vinho que ele nos trouxe a nossa vida fica mais pobre, fica sem sentido, nós vamos perdendo o brilho nos olhos. A festa da nossa vida vai ficando sem sentido. Quando o vinho vem a faltar a tristeza toma conta, a desunião, as desavenças. Sem o vinho de Jesus Cristo vamos perdendo os grandes referenciais da vida humana, pois só “Nele o ser humano encontra o verdadeiro sentido da vida humana”. Em Cristo, o homem encontra o que é ser homem. Nele, o ser humano encontra o seu caminho, pois o mistério de Cristo revela ao homem o que é ser homem, pois Cristo é o homem segundo o projeto de Deus. A um homem que corre o risco de perder o sentido do que é ser homem, pois vai perdendo a sua origem e o seu destino, a Igreja lhe apresenta Cristo, ele é o sentido do homem. Somente Nele, encontramos a nossa verdadeira vocação. É preciso, na festa do nossa vida ter os olhos fixos em Jesus Cristo. É preciso viver da beleza de Cristo, testemunhá-lo, contemplá-lo. São João Paulo li diz que “o nosso testemunho será pobre se não formos antes, contempladores do rosto de Cristo”. Sermos contempladores do rosto de Cristo, aqui está o segredo para o caminho da nossa vida e para o nosso caminho de Igreja arquidiocesana.
Talvez, neste momento de escolha do novo presidente, de polarização, que em si não é um mal, mas que está dividindo as famílias, criando ódio, peçamos à mãe que interceda por nós: “Eles não têm mais vinho”. Que nos dê o vinho da unidade, da convivência fraterna, que nos ajude a nos respeitarmos nas nossas diferenças.
O Evangelho termina dizendo que naquela festa de casamento foi manifestada “a glória de Jesus e seus discípulos creram Nele”. Deus, no AT, revela a sua glória através das suas obras. Jesus, em Caná, através do milagre revela a sua messianidade, a sua divindade. Esta revelação conduz os discípulos à experiência da fé em Jesus. A fé nos dá a certeza de que não estamos sozinhos na vida do dia a dia, que o Senhor caminha conosco, que nos assiste, que é uma presença na nossa vida.
Nós temos uma mãe gloriosa no céu, mas que olha pelos seus filhos e filhas. Aparecida nos relembra isso, quando em 1717, o conde de Assumar, passava pela Vila de Guaratinguetá e deviam lhe oferecer um banquete. Vão pescar, mas não é tempo de pesca. Lançam as redes e apanham a imagem: primeiro o corpo, depois a cabeça. Mas não era uma simples imagem e Deus deu o sinal com a pesca dos peixes em seguida. A partir daquele fato, a presença materna de Maria na vida dos brasileiros se encheu de luz. Sentimos que a sua presença materna caminha conosco. Sentimos que na festa da nossa vida há uma mãe, que sempre nos aponta para o seu Filho, para a sua vontade, que nunca deixa que falte o vinho da alegria, da esperança que o s
eu Filho nos trouxe, Amém.”

Santo Eduardo, o confessor

S. Eduardo | arquisp
13 de outubro

Santo Eduardo, o confessor

O “bom rei Eduardo”, como o chamavam seus súditos, deixou uma bela recordação de si, antes de tudo por haver abolido algumas leis injustas. A seguir, por causa do temperamento suave e generoso. Instaurou um período de paz e prosperidade na Inglaterra, depois de longas contendas entre o partido normando e o anglo-saxão.

Por amor à paz desposou a culta Edite Golwin, filha de seu mais irredutível adversário, o astuto barão Golwin. Este ficou convencido de haver realizado seu sonho de governar o país: receberia carta branca do piedoso monarca, que deixaria em suas mãos a administração de todo o Estado, a fim de cultivar sem preocupação seu hobby, a caça, e dedicar-se à oração e à ascese cristã.

O jovem rei desfrutava a fama de santidade e era já chamado de “confessor” — talvez para distingui-lo do avô, Eduardo, o Mártir, assassinado por ordem de sua madrasta.

Mas o barão havia feito um cálculo errado, pois o jovem rei Eduardo, ao perceber as intenções do sogro, exilou-o do reino e encerrou Edite em um convento. Mas por pouco tempo: apaixonado pela mulher, chamou-a para junto de si. Segundo os biógrafos do santo, ambos fizeram voto de virgindade de comum acordo. Não faltavam ilustres exemplos também na história das casas reinantes da Europa.

Filho do rei Etelredo II, o Irresoluto, Eduardo tinha vivido no exílio junto com os parentes maternos, de 1014 a 1041, na Normandia. Então fez voto de realizar uma peregrinação a Roma se obtivesse a graça de poder voltar à pátria. Quando, por fim, pôs os pés na Inglaterra e tomou posse do trono, quis cumprir seu voto, mas foi dispensado pelo papa.

Em troca, depois de haver socorrido os mais pobres do reino com o dinheiro da viagem, restaurou a abadia de Westminster, na qual foi depois sepultado.

Morreu a 5 de janeiro e seu corpo, encontrado ainda intacto depois de 50 anos, foi trasladado solenemente para a igreja abacial a 13 de outubro de 1162, o ano seguinte ao de sua canonização.

*Fonte: Pia Sociedade Filhas de São Paulo Paulinas http://www.paulinas.org.br

A vida não é o faz de conta que você criou

Shutterstock | Kite_rin
Por Talita Rodrigues

Não, a vida não é fácil como você gostaria. E é justamente por isso que ela é tão bela.

Atualmente, tenho percebido que boa parte das pessoas que buscam por um psicólogo o fazem pelo medo da solidão, do abandono, da dificuldade de lidar com relacionamentos ruins ou insatisfações relacionadas à carreiras. Situações que, em sua maioria, decorrem de escolhas erradas e da imaturidade.

Ter um trabalho estável, sustentar-se e ter saído da casa dos pais não garantem maturidade emocional. E sem maturidade emocional você não tem a plena capacidade de se instalar na realidade e assumir a liderança da própria vida. 

Achar que todos os problemas serão resolvidos quando você encontrar um amor e se casar é um grande erro. Você também não terá o poder de transformar o seu parceiro num príncipe encantado ou em uma princesa, para viver o “faz de conta” que você criou. Amargo? Sim. Verdadeiro? Com certeza.

Nada de birras!

Você não será capaz de conseguir o que tanto deseja em qualquer âmbito da sua vida, elevando o seu tom de voz, batendo o pé ou discutindo e se enfurecendo até explodir, como você fazia quando era uma menininha ou um menininho. Se você estiver diante de uma pessoa madura, você terá que superar esse modo infantil de lidar com todos os seus problemas.

Não, a vida não é fácil como você gostaria. As pessoas não irão atender a todos os seus desejos e não adianta nada você levar isso dentro de você. Não adianta remoer. Só deixe doer. 

Você precisará reduzir os seus desejos e expectativas entre a realidade que cabe hoje, e amadurecer.

Somente uma vida ordenada é capaz de trazer o sentido para lidarmos com tudo aquilo que, por vezes, parece não fazer sentido. Ter uma vida ordenada exige renúncia e escolha. Você precisará realizar uma escolha que certamente partirá o seu coração, mas que vai manter você caminhando. E no caminho certo. 

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Fonte: https://pt.aleteia.org/

Por que o número 13 é importante nas aparições de Nossa Senhora de Fátima?

Nossa Senhora de Fátima. Crédito: Igreja em Valladolid (CC BY-SA 2.0)

REDAÇÃO CENTRAL, 13 Out. 22 / 08:00 am (ACI).- As principais aparições da Virgem Maria em Fátima (Portugal) aconteceram nos dias 13 de cada mês, um número com um grande significado que mostra a relação da Mãe de Deus com a salvação do mundo.

Em uma artigo de National Catholic Register, o escritor e autor do livro “Fruits of Fatima – Century of Signs and Wonders”, Joseph Pronechen, disse que os números têm um “grande significado e simbolismo parao povo judeu”.

“Eram dados significados particulares aos números no Antigo Testamento que continuaram no Novo e foram mencionados pelos Padres da Igreja”, afirmou.

Pronechen ressaltou que o número 13 nas aparições da Virgem de Fátima tem uma conexão com a história bíblica de Ester, que foi considerada pelos Padres da Igreja “como uma representação da Santíssima Virgem Maria” no Antigo Testamento.

Ester fazia parte dos exilados judeus na Pérsia, onde seu tio Mordecai, um servo diligente do rei, cuidava dela. O rei Assuero precisava de uma rainha e, de todas as mulheres, decidiu escolher Ester.

“Ele amava Esther mais do que todas as outras mulheres; de todas as virgens, ela conquistou seu favor e devoção, então ele colocou a coroa real em sua cabeça e a fez rainha", sem saber que ela era judia, citou Pronechen em seu artigo.

Hamã, que tinha ciúmes da posição de Mordecai, enganosamente conseguiu ser o braço direito do rei e decretou que no dia 13 do mês judaico de Adar todos os judeus no reino deveriam morrer.

Pronechen disse que, diante dessa sentença, Ester revela sua origem judaica e os planos de Hamã ao rei, o qual "ficou indignado com a transgressão, decretou morte ao vilão e deu a ordem para salvar os judeus".

O dia 13, “dia em que os inimigos dos judeus esperavam ganhar poder sobre eles, tornou-se um dia em que os judeus ganharam poder sobre seus inimigos”, afirmou o escritor. Ester salvou seu povo. Eles viveram ”.

Pronechen destacou que esta relação mostra que, na sua aparição em Fátima, a Virgem Maria “veio para salvar o seu povo, mostrando-lhes o caminho certo a seguir”.

Além disso, disse que na Enciclopédia Católica New Advent recorda-se que Ester "vem do hebraico que significa 'estrela' e 'felicidade'" e sublinhou que Irmã Lúcia dos Santos, uma das três videntes de Fátima, indicou ao Pe. Thomas McGlynn que a Virgem "sempre teve uma estrela em sua túnica".

“O céu estava novamente fazendo a conexão para nos dizer que Maria viria a Fátima também para salvar seu povo e a Igreja do mal”, afirmou.

Disse também que a Virgem nos orienta a rezar o Rosário, mensagem que se reflete especialmente durante a sua aparição em Fátima no dia 13 de outubro, mês que a Igreja dedica ao Santo Rosário, onde se identificou como Nossa Senhora do Rosário.

O escritor destacou que em uma conversa entre Irmã Lúcia e alguns frades carmelitas, ela assinalou que “o escapulário e o Rosário são inseparáveis. O escapulário é um sinal de consagração a Nossa Senhora”.

“Foi no século XIII que Nossa Senhora deu o Rosário a Santo Domingo. E foi novamente no século XIII que também deu a São Simão Stock o escapulário marrom”, disse Pronechen.

Por fim, destacou que a Virgem Maria conduz os fiéis à Sagrada Eucaristia, e suas aparições no dia 13 de cada mês têm relação com o Espírito Santo, ao ser treze pessoas no total, ela e os doze apóstolos, os que estiveram na vinda do Espírito Santo em Pentecostes.

“O número '13' ligado a Fátima, direta ou indiretamente, é outra razão pela qual a mensagem e o significado de Fátima devem ser relevantes para nós”, concluiu.

Fonte: https://www.acidigital.com/

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Dia das Crianças: a fé dos pequeninhos

A fé dos pequeninhos | Jovens Conectados

DIA DAS CRIANÇAS: A FÉ DOS PEQUENOS E PEQUENAS, PRESENTE E FUTURO DA IGREJA

A Igreja no Brasil celebra neste 12 de outubro a festa de Nossa Senhora Aparecida que este ano, em especial, comemora os 300 anos do encontro da imagem no Rio Paraíba do Sul (SP). Além disso, a data marca o Dia das Crianças. Pequenos e Pequenas que são o futuro, mas também são o presente da Igreja.

Elas animam, embelezam, dão vigor e são parte viva do Corpo de Cristo. É o cuidado, a acolhida e a formação que a Igreja proporciona que vai marcar o tipo de pessoa e cristãos que essas crianças serão amanhã. Por isso, é muito importante que a Igreja cuide dos pequenos sendo as Mãos de Deus na orientação e no crescimento delas em estatura, sabedoria e graça Divina.

A iniciação das crianças na Igreja se dá pelo Batismo. Mas, é na catequese que elas são inseridas na vivência da fé e dão início a uma jornada cristã. O Papa João Paulo II dizia que as crianças são os pequenos-grandes missionários. A missão que Jesus confiou aos cristãos é a de “ir e fazer discípulos entre todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28, 19-20).

A Igreja proporciona diversas atividades, espaços iniciativas que visam a evangelização dos pequeninos como a formação da catequese e a organização de grupos como a Infância e Adolescência Missionária (IAM) que tem como finalidade suscitar o espírito missionário universal nas crianças, desenvolvendo-lhes o protagonismo na solidariedade e na evangelização e, por meio delas, em todo o Povo de Deus: “Crianças ajudam e evangelizam crianças”. São crianças em favor de outras crianças.

De acordo com a secretaria nacional da Infância e Adolescência Missionária, irmã Patrícia Souza, na obra da IAM, a criança e o adolescente assumem seu protagonismo, com a sua linguagem, característica e experiência.

“Na missão, a criança e o adolescente são capazes de evangelizar outra criança e outro adolescente, dando testemunho, fazendo sacrifício daquilo que ela tem, para ajudar aos menos favorecidos. Com isso, tornam-se seus amigos por meio da oração, do sacrifício e da própria solidariedade. Estas crianças e adolescentes evangelizadoras, são sinais para outras, em meio à globalização mundial”, destaca.

A Infância e Adolescência Missionária forma grupos de crianças e pré-adolescentes com uma média de 12 participantes entre os que desejam pertencer à IAM. A estrutura principal da obra são os grupos, cujos membros tornam-se fermento missionário na família, na escola, na comunidade eclesial e no ambiente em que vivem.

Tomando como exemplo a vida de Jesus e de seus discípulos, a Infância e Adolescência Missionária têm em Maria, a mãe de Jesus, uma fiel testemunha da autêntica ação evangelizadora. Inspira-se também em São Francisco Xavier e Santa Teresinha do Menino Jesus, Padroeiros das Missões. Ambos viveram ardentemente o carisma missionário universal, doando suas vidas pelo anúncio do Evangelho.

A psicóloga e missionária da Canção Nova, Aline Rodrigues, escreveu no artigo “Saiba a importância das crianças estarem na Igreja”, publicano no site da comunidade, que “crianças inseridas em um ambiente cristão tendem a desenvolver comportamentos mais humanizados, como compaixão, companheirismo, solidariedade, disciplina, respeito, amor fraternal, reconhecimento dos limites, clareza do certo e errado e inúmeras outras características, pois acreditam no ser humano”.

Segundo a psicóloga, os pequenos não criticam o ser humano e são capazes de amar mesmo quando são decepcionadas, o que faz toda diferença para a vida adulta.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

O diário de padre Canovai, “canto dulcíssimo da Tua misericórdia”

Um retrato de padre Giuseppe Canovai [© Opera Familia Christi]
Por Revista 30Dias - 05/2010

O diário de padre Canovai, “canto dulcíssimo da Tua misericórdia”.

História de padre Giuseppe Canovai, sacerdote romano que viveu na primeira metade do século passado. Em Roma, onde passou grande parte de sua vida, ocupou cargos na Cúria e foi assistente da Fuci. No final de 1939, transferiu-se para a Argentina, como auditor da nunciatura apostólica local. Escreveu um diário, que veio a público após a sua morte: nele, anotava seus pensamentos como se fossem orações

de Paolo Mattei

“Não tem jeito: o romano é sempre assim; até as coisas dolorosas ele consegue transformar em festa. Bendito bom humor”. O jovem Giuseppe Canovai anota esse pensamento numa página de um dos muitos diários aos quais confiará seus pensamentos e observações durante quase a vida inteira. Ele escreve muito, desde menino, roubando momentos do tempo reduzido que lhe resta após os estudos e os afazeres normais do dia-a-dia. Nas primeiras décadas do século XX, mais precisamente em 1919, aos quinze anos, ele coleta também um pouco do cotidiano da cidade – “carruagens, automóveis, charretes cheias de gordas mulheres provincianas enfeitadas com colares, bondes lotados, com gente nos estribos, pendurada até do lado de fora, às vezes até no teto” –, observando a alegria do povo no meio do qual cresceu, a maneira leve como vive o dia de Finados: “Toda essa gente vai e vem movida por um pensamento piedoso [...], um pensamento caridoso, realmente cristão; por isso, não é uma gente triste, muito pelo contrário, parece que estão todos indo para uma festa, e a prova disso são as várias tabernas abertas e as carrocinhas cheias de maçãs e peras, os cartazes...”.
Essa visão da Roma do início de um mês de novembro dá também uma imagem sugestiva da história desse homem que a delineia: um padre romano e romanesco, exemplo de letícia e de vivacidade para todos os que o conheceram, que descreve seus dias com constância monástica nas páginas de seus diários (“minhas pobres notas”), traçando, assim, o retrato de uma vida que se desenrola num diálogo cotidiano com Jesus – uma vida cheia de alegrias e dificuldades, esperanças e tribulações, expectativas, incertezas, lágrimas. Muitos dos que tiveram a sorte de encontrá-lo provavelmente nem suspeitavam de que no diário íntimo mantido por aquele homem – cheio de tiradas populares espirituosas e de uma alegria contagiante – pudessem-se acumular reflexões e observações tão dramáticas em torno da própria existência. Reflexões e observações que Canovai, desde o início, confidencia a seu único grande amigo, Jesus. E que parecem uma única oração: “Senhor”, anotará em 1941, “dá-me a graça de nunca escrever coisas em que o eu encontre a satisfação da sensibilidade e da soberba; que eu escreva apenas o que eleva a ti, o que purifica e humilha, o que castiga e renova: o canto dulcíssimo da tua misericórdia”.

O clima do mundo
O filho de “seu Luigi” – empregado do Instituto Italiano de Crédito Fundiário – e de dona Egeria – de família romana e papalina, cujo pai fora decano dos “liteireiros” pontifícios – mora com os pais em via Terenzio, no bairro Prati, onde nasceu, em 27 de dezembro de 1904. Só começa a dar as caras fora de seu bairro quando se matricula no ginásio Visconti, localizado na praça do Colégio Romano, nas proximidades da Universidade da Companhia de Jesus, a Gregoriana. Sua imaginação lança-se apressada no futuro: o garoto já se vê um “homem de negócios”, que reservará sempre um tempo para “ver e conhecer o belo país em que nasci”, para aventurar-se “nas obras da pintura, da poesia, da escultura; poderei deleitar-me com a mecânica, observando seus grandes triunfos; com a arquitetura, observando as grandes maravilhas de que minha pátria é adornada. Assim vejo o meu futuro...”. Essas palavras, de uma redação da oitava série – com todas as compreensíveis nuanças de ingenuidade retórica –, são as de um estudante curioso e aberto às belezas e aos mistérios da realidade. Afinal, sua cidade é invadida todas as manhãs pelo vento do mundo, levando-lhe o eco das línguas estrangeiras dos viajantes ou o das conversas dos estudantes da Gregoriana, provenientes de vários países do globo. Entre eles, muitos padres, que logo o conquistam: “Sua missão sobrenatural, sua perfeição de caráter, [...] a maravilhosa sucessão que os une aos apóstolos e, com estes, a sua divina origem...”.
A vocação tem seus particulares expedientes para se manifestar; às vezes é lenta e discreta, às vezes rápida e despreocupada, mas tem sempre seu tempo próprio. Muitas vezes parece querer brincar de esconder com o caráter dos homens, uns fleumáticos, outros apressados, como é o caso de Giuseppe, que continua a estudar, e a peregrinar, depressa, “di prescia”, como dizem no dialeto de Roma, pelas ruas de sua amada cidade, cuja história antiga sabe contar desde pequeno com a competência de um “romanista” experiente. Completa o curso secundário em 1921 e, no ano seguinte, matricula-se em Direito, na antiga sede da Universidade Sapienza. Nas circunstâncias mais corriqueiras – o estudo e o tempo livre, que passa com seus muitos amigos, várias vezes fazendo com eles passeios nas montanhas –, abre-se aos poucos a perspectiva da vida sacerdotal, que se vai esclarecendo com o tempo nas conversas com padre Enrico Rosa, diretor da La Civiltà Cattolica, de quem recebera a Primeira Comunhão: o jesuíta será por muito tempo seu orientador espiritual. É ele quem aconselha mais repouso a esse jovem que ninguém consegue segurar, em suas iniciativas e atividades: “Hoje fui-me confessar com padre Rosa. [...] Ele me deu muitos bons conselhos, entre os quais o de escrever menos e dormir mais...”. Essa anotação está no diário de 1924, poucos meses depois da morte de seu pai, seu Luigi, que contraíra a febre espanhola em março desse mesmo ano. As dificuldades e o desconforto daqueles meses são suportados graças à proximidade de seus muitos amigos, e especialmente à “letícia proveniente sobretudo de me sentir em paz com Deus e com os amigos de Deus: essa letícia é quase, eu diria, o sinal de uma vida realmente unida a Deus; essa letícia simples e interior brilha em todos os santos: porque neles está a doce habitação de Deus”. A respeito do sacerdócio, anotará no ano seguinte: “Tenho pensado, Senhor, que a vocação [...] é uma coisa absolutamente divina, que qualquer pensamento humano ofusca e arruína; é algo que parte de ti e a ti retorna, sustentada e iluminada por tua graça; tenho pensado, enfim, que é uma coisa tua, um dom todo teu, resposta íntima de nossa alma a ti, que amorosamente nos chamas e nos convidas a seguir-te”.

Padre Canovai com alguns estudantes da Fuci, numa foto de 1937 [© Opera Familia Christi]

“Na tua vontade está a nossa paz”
A Companhia de Jesus exerce um apelo formidável sobre Giuseppe: ele deseja formar-se para o sacerdócio na ordem de Santo Inácio. Mas a situação financeira incerta depois da morte do pai e a saúde precária da mãe, que a torna necessitada de cuidados, aconselham prudência a padre Rosa, que o veria bem, mesmo assim, como futuro colaborador da La Civiltà Cattolica. Nesse meio-tempo, em 1926, ano de estudo intensíssimo, o jovem Canovai se diploma em Direito na Sapiência e em Filosofia na Gregoriana, onde, no mesmo ano, se matricula em Teologia. Padre Rosa cuida para que o Colégio Capranica seja seu seminário, de modo que possa prosseguir os estudos na Gregoriana. Entra no seminário em 1929, um ano de grandes provações: o sonho da Companhia parece virar fumaça, até pelo desacordo do cardeal vigário Basilio Pompili, que gostaria de tê-lo no seminário lateranense e permite sua entrada no Capranica de má-vontade. No mesmo período, começa a sofrer de uma úlcera no duodeno, que jamais o abandonará. Anota naquele ano: “Senhor, na paz que no fundo habita em minha alma, vejo a sombra amorosa da tua misericórdia e da tua providência. Obrigado, ó meu Deus, pela paz que hoje me concedeste, apesar da más notícias que recebi e dos problemas que prevejo encontrar. Faze, ó Senhor, que esta paz e esta paciência nunca me faltem. Sinto às vezes vacilar a minha vontade frágil, a minha confiança. Dá-me, Senhor, força e coragem, faze que contra todas as aparências humanas eu me mantenha cheio de confiança, de esperança, de alegria. Dá-me, Senhor, a tua paz, a paz da tua paciência e da tua resignação. Faze que eu esteja sempre, qualquer que seja o meu destino, igualmente contente, igualmente sereno”.
Giuseppe tentará entrar na Companhia outra vez, no ano seguinte, ainda que padre Rosa o desaconselhe a isso. Não será aceito. Mas tudo confia à vontade de Deus: “O que preparará o amanhã? Eu não sei, está em tuas mãos, meu Deus. Mas, qualquer que seja o futuro, será portador de paz, pois ‘na tua vontade está a nossa paz’”. Escreve também à mãe, agitada por já não aguentar a inércia a que a fragilidade da saúde a obriga: “Fique tranquila outra vez e reze sempre ao Senhor. Digo sempre, porque a oração deve ser ‘ininterrupta’ para ser realmente aceita pelo Senhor. Nunca devemos abandoná-la: portanto, ou rezar ou oferecer o que fazemos, ou melhor, o que temos o dever de fazer, essa é a melhor oração. E a senhora tem agora o dever de não fazer nada e de ficar tranquila, quando talvez tivesse algum ‘pretexto’ para não aderir; assim, ofereça ao Senhor o ‘não fazer nada’ e o ‘estar tranquila’, e o ofereça com muito amor e com grande simplicidade, e assim rezará ininterruptamente com a oração mais bela e mais aceita por Deus”.
São meses duros para Giuseppe, que escreve em 6 de agosto: “Passo por momentos em que o pensamento de que sou incapaz de tudo, inapto para tudo [...], de que já não há esperança nenhuma para mim me oprime de um modo absurdo e indizível. No entanto, esses são os únicos momentos em que me conheço a fundo”.

“Como é fácil sermos carregados por Ele”
“Ó Senhor, o que pode dar-te uma pessoa como eu? E dizer que os outros falam de mim como uma pessoa que pode fazer alguma coisa; eu sinto claramente, Senhor, que não poderei fazer nada, que estou acabado! Mas nem isso me abate, só tu bastas, in nomine tuo laxabo retes!”. Com essas breves notas, padre Giuseppe entrega ao Senhor seu sacerdócio: a ordenação ocorre em 3 de maio de 1931, e já no mês seguinte o padre novato é destinado a seu primeiro cargo, como escrivão da Sagrada Congregação para os Seminários e das Universidades dos Estudos. Esse trabalho também não corresponde nem um pouco a suas aspirações. Sente-se chamado ao ensino e à pregação, ministérios para os quais, segundo dizem muitos de seus conhecidos, possui uma evidentíssima propensão: “Tenho uma vida tão diferente da que sonhei, uma atividade tão distinta da que gostaria! Paciência, tu me sustentarás, ó meu Senhor, e eu te oferecei tudo!”.
Em 21 de dezembro de 1932, diploma-se em Direito Canônico: tem vinte e sete anos e quatro diplomas, uma combinação de números que sugere velocidade, a mesma com que se desloca pela cidade naqueles anos, a pé ou em seu carrinho de 500 cilindradas: “Ia sempre ‘di prescia’”, conta um dos muitos que convivem com ele nas várias ocasiões em que se dedica – depois do horário de trabalho ou durante as férias – a seu ministério predileto: a pregação. Vai aonde quer que o chamem, e o chamam a toda parte, para dar conferências sobre São Bento e São Francisco, sobre Bento XV e Belarmino, sobre Carlos Magno e Giambattista Vico; fala de apologética e teologia, de catacumbas romanas e direito, de Guerra e paz e de Papini... E ainda prega exercícios espirituais e faz exortações em todos os cantos da cidade. Com alguns amigos, começa ainda a dar forma a uma obra baseada no laicato contemplativo, a “Familia Christi”, cujo estatuto será aprovado em 1938.
Nesse meio-tempo, muda de casa, se estabelece em via Monserrato como assistente das irmãs brigidinas e é nomeado capelão de Santo Ivo, na Sapiência, sede da Universidade de Roma. Em 1937, torna-se assistente da seção romana da Federação Universitária Católica Italiana (Fuci). E também monsenhor: “E agora sou Arlequim”, ironiza, ao assumir as insígnias ligadas ao título honorífico.
As palavras do diário são um rio intermitente que corre silencioso sob o barulho do dia: “Como é fácil andar com Ele, como é fácil, carregando-O, ser carregado por Ele!” Tudo se torna mais simples quando padre Giuseppe está na companhia do destinatário de suas orações escritas, de suas “pobres notas”: “Senhor, mantém minha alma nestes desejos; sei, Senhor, que não é possível permanecer sem o perene auxílio de tua graça”. Nessas páginas anota também pensamentos para as homilias, como aqueles sobre a parábola evangélica do filho que, tendo anteriormente recusado submeter-se a uma ordem do pai, no fim obedece: “... gosto muito desse cantinho do Evangelho, porque é tão cheio de discrição, tão cheio de compaixão pela nossa fraqueza. [...] Porque é tão humano. [...] Justamente por ser tão maravilhosamente divino, parece-me que passe aí por dentro, quase despercebida, uma misteriosa complacência de Deus com as pobres resistências da natureza que se contorce em sua fraqueza antes de ceder à invasão da caridade”. Muitas vezes são breves contemplações em que prevalece a surpresa por uma beleza vislumbrada: “Como é santa a lei do Senhor! Gosto muito do longo salmo de domingo em que essa lei é glorificada de todas as formas possíveis! Mas hoje de manhã pensava especialmente neste versículo: ‘iudicia tua iucunda’. Como é deleitosa no coração a lei do Senhor! [...] E como é bom ouvir a promessa do Paráclito bem perto desse convite à observância dos preceitos. [...] Como é bom! Parece que o Senhor não pode pedir tudo isso sem prometer ajuda [...], para nos fazer entender que mesmo essa observância não será nossa, mas d’Ele, que será a difusão em nós e fora de nós do Espírito de Deus prometido”.

Padre Giuseppe Canovai no convés do navio “Oceania”, que
o levou à Argentina em dezembro de 1939 [© Opera Familia Christi]
“Con mucho gusto, Señor”
“Hoje de manhã sua excelência Montini me propôs que fosse para Buenos Aires, para ser auditor! Que triste Pentecostes! Sinto uma pena imensa. [...] Será isso mesmo que o Senhor deseja para mim?” Estamos em 27 de maio de 1939. Padre Giuseppe tem a impressão de que tudo teima em acontecer na direção contrária à de seus desejos: primeiro, a “papelada” da congregação romana, agora a proposta de Montini, substituto da Secretaria de Estado, de ir para a Argentina ser auditor da nunciatura apostólica local, onde a “papelada” será muito provavelmente ainda maior e mais chata. Ao falar com os amigos, de quem sabe que terá de se despedir para sempre, brinca com a novidade: “Agora vou ser diplomata. [...] Sabem, essa é uma vida muito ruim. [...] Porque o diplomata, coitado, vive sempre com medo do incidente, que dirá do acidente...”.
Naturalmente obedece, depois de ter-se aconselhado com alguns padres da Companhia, como Felice Cappello, e vê os primeiros raios de sol de 1940 nas costas da capital argentina. Em 1º de janeiro desse ano, desembarca no Novo Mundo.
“Diga ao Senhor uma frase que aprendi aqui e que repito ao bom Deus em meu coração todas as vezes – e não são poucas – em que tenho de fazer algo de que não gosto: ‘Con mucho gusto, Señor’.” Monsenhor Canovai estuda espanhol e o aprende depressa, até porque é chamado a pregar por toda parte na Ciudad Porteña, a pronunciar uma palavra “que não é nossa; é uma graça infinita que Deus nos conceda pronunciá-la, amá-la, venerá-la, dar a nossa vida para anunciá-la dignamente”. A vida de trabalho, essa mesma que ele considera como um “bico”, por mais que seja de um certo nível, é sempre entregue à oração: “Todo o meu dia é trabalho, e muito para a correspondência, que é intensa; oração, sobretudo adoração, e jornais. Se alguém me dissesse um dia que eu teria de ler tantos jornais!”. Sente “uma grande calma e tranquilidade; eu experimento nisso uma verdadeira e particularíssima ajuda da graça [...]. Vivo constantemente à espera da santa missa e do breviário”.
O auditor se vê muitas vezes em situação incômoda nas recepções (“onde a gente vê tanta pilantragem”, explicava antes de partir a seus amigos de Roma: “E você é obrigado a participar do beija-mão dos ministros, dos senadores, dos deputados, dos representantes, de todos os glutões internacionais...”); mas se sai muitíssimo bem, como cabe a um diplomata, embora suas anotações sejam, como sempre, cheias de apaixonada humilhação: “É doce para mim não apenas saber, mas sentir, saborear a imperfeição e a miséria de que são cheias todas as minhas obras, degustá-la até os mínimos detalhes, até o íntimo, pois então me parece que a misericórdia do perdão penetra em todas as fibras da vida e me parece que cada momento, cada instante da minha vida seja sustentado pela efusão da misericórdia”.
Tudo o que considera necessário para a sua vida, também ali, é “... bater e insistir sempre numa única coisa, a única que com certeza é boa: a comunhão amorosa e confiante, humilde e serena com a cruz do Filho de Deus”. Seu conforto é a amizade com Jesus, que o vem acompanhando até lá: “Não consigo expressar o consolo que experimentei ao sentir que celebrei a missa de um modo incomparavelmente melhor do que na minha primeira vez: depois de dez anos de infidelidade e de misérias, esse gesto de misericórdia do meu Deus pareceu uma dádiva suave de perdão e certeza da amizade divina”.
A jornada do sacerdote romano chegava à meta final, entre as orações dos que o rodeavam, e as suas, as mais simples de todas: “O que mais me comoveu”, anotara em 1941, “foi a busca de Deus na mais humilde das orações, a oração vocal [...], o Rosário, o pai-nosso, as ave-marias, repetidas aqui e ali ao longo do nosso dia, as jaculatórias que dizemos quase a meia voz quando a alma está cansada e ocupada, a via-sacra, as fórmulas das orações prediletas, que pronunciamos quase comendo as sílabas, de tanto que são conhecidas, as ladainhas da Virgem, as ladainhas dos santos, os salmos de penitência e de alegria, todas palavras santas com as quais pedimos a Deus, com as quais imploramos sua ampla descida em nosso espírito, em que a alma se abre para ser invadida, se humilha, se prostra diante de Deus para ser acolhida por sua misericórdia. Pequenas e humildes orações dos nossos lábios cansados! [...] Quando faltarem as forças para ornar a casa interior da alma e tudo estiver consumido, quando os lábios moribundos mal se puderem mover, vós, humildes irmãs menores da minha meditação secreta, vós florescereis mais uma vez em meus lábios apagados, a buscar a misericórdia de Jesus e a doçura de Maria”.

Fé e Saúde - CNBB

A força da fé | Camilianos

FÉ E SAÚDE

Dom Pedro Cipollini
Bispo de Santo André (SP)

A fé tem poder: “Quanto mais pode a fé que a força humana”, exclamava Luiz Vaz de Camões. De fato, a fé é o único abrigo, no qual pode refugiar-se o homem na neblina de sua razão, e nas calamidades de sua natureza passageira. 

Na Bíblia está escrito que “a fé é um modo de possuir o que se espera, a convicção a cerca de realidades que não se veem” (Hb 11, 1-2). Na Bíblia a fé é antes de tudo adesão à pessoa que revela, é a certeza da fidelidade e lealdade de Deus que nos fala. Isto não tem nada a ver com certa interpretação intelectualista que ensina ser a fé, aceitar uma verdade incompreensível.  

 A fé no sentido bíblico correto, deve ter em conta o aspecto de confiança e o aspecto da verdade-revelação, entre Deus e o ser humano. Quem tem fé nunca está sozinho, e quem perde a fé, não tem mais nada a perder, porque a fé é o conhecimento do significado da vida humana. 

Surpreendi-me ao ler um livro do famoso médico Dr. Kenneth H. Cooper, intitulado “É melhor acreditar” (Ed. Record, Rio, 1998), no qual ele fala das vantagens da fé para a saúde. Faz o elo entre fé e saúde, explicando por que a crença pode levar a mais saúde e boa forma, abordando o lado científico da crença: “Hoje em dia, diversos pesquisadores comprovaram que o fato de manter a mente calma e equilibrada, pela confiança num sólido sistema pessoal de crença, traz um efeito salutar para o corpo…é importante assumir um compromisso definitivo em relação ao embasamento da sua fé e depois estar prestes a agir de acordo com esse compromisso” (cf. pag 53 e 59). 

A Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social. Nesta afirmação, porém, a OMS não incluiu o aspecto da fé. Por mais que haja indiferença e até desprezo por parte do meio acadêmico, que se importa sobretudo em ser “politicamente correto”, pesquisas científicas tem confirmado a importância da fé nos processos de cura. Isto porque a fé vem sempre junto com a esperança. Quando se tem fé, há esperança no tratamento, na cirurgia e em tudo o que envolve a cura. Mas acima de tudo, há confiança no poder de Deus, em dar a cura quando parece não ter mais saída. 

É frequente ouvir relatos nos quais pessoas doentes que receberam orações diárias e que rezaram pela sua cura, se restabeleceram mais depressa, precisaram menos medicamentos e tiveram menos complicações no processo de cura. Assim não é difícil a partir da prática, concluir que orar e ter fé faz parte do processo de cura.  

Acreditar no tratamento, no médico, em si mesmo e na recuperação é importante e pode ajudar a curar. Por isso o Dr. Cooper intitula o capítulo décimo quarto de seu livro: “Alimento interior: é melhor acreditar”! Ter uma fé, uma religião promove o bem-estar. Muitos médicos e eu mesmo, quando era capelão de hospital, presenciei situações de recuperação e cura que a medicina não explicava. De fato, como disse Jesus: “tudo é possível a quem tem fé”. 

Anatole France, famoso escritor francês, se sentia infeliz sem a fé e exclamava: “Não tenho fé, mas quisera tê-la. Considero a fé o bem mais precioso deste mundo”.  

Enfim é melhor acreditar!

A minha filha de 8 anos quer que eu conte ao mundo sobre este milagre

Shutterstock / Darkdiamond67
Por Michael Rennier

O que é que uma borboleta faz, afinal?

Eu cometi o erro de chamar a crisálida de casulo. “É uma crisálida, papai”, a minha filha de 8 anos corrigiu-me imediatamente. “As traças fazem casulos, mas esta é uma lagarta que se transforma numa borboleta, e ela faz uma crisálida”.

Acenei seriamente e fingi que já sabia o que ela me estava a dizer. Cá entre nós, não fazia ideia que as borboletas não saem dos casulos.

Estávamos de cócoras no jardim, de pés descalços na terra a procurar por lagartas e borboletas. Olhávamos atentamente para um vaso de salsa que minha mulher comprou, com a esperança de que algo surgisse por ali.

Testemunhar uma transformação

Há algumas semanas atrás, quando as temperaturas começaram a descer juntamente com algumas folhas, cinco lagartas subiram para a salsa e metodicamente começaram a banquetear-se com as folhas. Todas as manhãs, corríamos para fora para ver quantos centímetros tinham conseguido consumir dos caules durante a noite.

O maior desenvolvimento veio quando as lagartas deixaram de comer e se atrelaram a vários ramos verdes por pequenos arreios de seda que elas próprias fiaram. Aí balançaram, virando lentamente crisálidas. Colocamos uma proteção sobre a planta para evitar que passarinhos as comessem enquanto ali se pendurassem vulneravelmente. Embora estejam camufladas para parecerem uma folha de salsa murcha, algumas das aves mais espertas veem através do estratagema.

Estou inclinado a deixar a natureza seguir o seu curso – afinal, as borboletas conseguem de alguma forma nascer todos os anos – mas é uma hipótese que as minhas duas filhas mais novas se recusam a aceitar. Neste momento, elas estão a proteger estas crisálidas, a dar-lhes banho de pensamentos e orações, a acompanhar o seu progresso como uma mãe vigia o seu bebê para lhe abrir os olhos pela primeira vez.

A minha filha já sabe que eu sou escritor e exigiu que eu escrevesse sobre isto. A sua opinião é que o mundo precisa de saber que um milagre está a acontecer aqui mesmo no nosso quintal. Portanto, aqui estou eu, falando-vos da transformação de lagartas em borboletas.

Mas o que é que as borboletas fazem?

A poetisa Emily Dickinson diz: “A borboleta obtém/ Mas pouca simpatia”. Na sua época, os novos ingleses pensavam que as borboletas eram demasiado ostensivas, demasiado preciosas e vistosas. Eles não gostavam da cor das borboletas, pensando que as suas grandes asas translúcidas traíam uma criatura que não tem inclinação para o trabalho árduo.

Os novos ingleses, na altura, estavam apenas a algumas gerações de distância de terem feito cidades das antigas florestas de Massachusetts. Se havia algo que eles valorizavam, era o trabalho árduo. Para ser honesto, nem sequer sei qual é o trabalho de uma borboleta. As abelhas fazem mel, as formigas constroem colónias, as crianças aprendem as suas lições de história, mas o que é que uma borboleta faz?

Observando quanto esforço foi feito para criar as crisálidas, tenho um novo apreço pelo esforço que é feito para construir uma borboleta, por isso tenho de discordar da ideia de que as borboletas não sabem nada sobre trabalho árduo. O trabalho tem sido tão metódico, que tenho de admitir que é um pouco aborrecido de assistir. Todos os dias, o progresso era constante mas insignificante, uma folha comida aqui, alguns centímetros de talo de salsa consumida ali. As minhas filhas, contudo, ficaram e continuam a ficar totalmente fascinadas. Isso faz-me pensar o que eu estou a perder.

Progresso lento e constante… até à eternidade

Talvez eu, tal como os descendentes dos Puritanos, tenha falhado o ponto. A borboleta e a lagarta são a mesma criatura. Mesmo que, dia após dia, pareça que nada de mais acontece, todas as pequenas coisas se somam, todo o trabalho, o esforço, a paciência. Talvez não experimentemos mudar a forma como pensamos que o fazemos. Não é um acontecimento repentino e inesperado. Pelo contrário, é o culminar de milhares de pequenas decisões que parecem sem importância na altura, mas que, no final, equivalem a um desenrolar de uma criatura aparentemente completamente diferente.

As minhas filhas, que estão a assistir com tal intensidade, cujas bocas estão manchadas de sumo de gelado de cereja, cujos vestidos de bailarina são uma confusão de tule rasgado, que passam os seus dias a rodar em círculos no balanço, estas crianças estão a mudar. Um dia, elas serão adultas, ainda muito elas próprias, mas ainda assim, irão se tornar surpreendentemente diferentes pelo tempo e pela experiência. Cada minuto que tenho para passar com elas é um tesouro, cada uma delas dobra-se para a eternidade.

Você e eu também ainda não acabámos de mudar. Por vezes sentimo-nos encalhados, ou que as nossas ações não têm qualquer efeito. Posso garantir, no entanto, que estamos a trabalhar em grande medida. A mudança não parece estar a acontecer até que, de repente, está. Por isso, não desista.

O que é que uma borboleta faz? Estende as suas asas para voar.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF