Na atividade missionária, padre Alexandre se desloca de barco | Vatican News |
280
entre leigos, religiosos, diáconos, seminaristas, sacerdotes e bispos dos 19
Regionais que fazem parte da Igreja do Brasil estiveram representados na
experiência missionária na Amazônia em janeiro, inserida no contexto do 3º Ano
Vocacional em curso no país. Padre Alexandre Favretto, da diocese de Limeira,
compartilhou suas impressões desta "grande riqueza eclesial" com o
Vatican News.
Jackson Erpen - Cidade do Vaticano
"Vou voltar lá, e quero voltar quantas vezes
for necessário". Padre Alexandre Boratti Favretto* , da Diocese de
Limeira, não pensa duas vezes ao responder a pergunta se repetiria a
experiência missionária enriquecedora na Amazônia realizada em janeiro e que
reuniu 280 seminaristas, sacerdotes e bispos de várias dioceses do Brasil. Uma
iniciativa missionária denominada "Pés a caminho" que está em
sintonia com a reflexão do IV Congresso Missionário Nacional de Seminaristas,
que abordou a questão da missão, a missão ad gentes e a
questão do paradigma da missão relacionando-o com o processo de formação
presbiteral.
Oriundo de um ambiente urbano, o sacerdote ficou
literalmente maravilhado com uma realidade que lhe era até então desconhecida
na prática, visto ter tido contato com ela de forma teórica durante o Sínodo da
Amazônia, da qual participou. Agora, pode então "somar essas duas
experiências, e agora espero também continuar contribuindo nessa dimensão
eclesial aqui no Brasil."
De fato, "todo mundo estava ali querendo
somar com a experiência da Igreja da Amazônia com a sua experiência regional.
Então todo mundo ali, eu posso dizer, que teve esse olhar, vamos dizer assim,
de aprender, de aprender também como ser Igreja, a partir da experiência da
Igreja na Amazônia, uma experiência comunitária, uma experiência muito
fraterna, muito evangélica."
E se a ideia era "levar alguma coisa", a
constatação é que "na verdade a gente foi receber", constata Pe.
Alexandre, após as ricas experiências com a população visitada. Prova disso,
foi a preparação sobretudo para ser uma "visita com escuta". E de
fato, a visita do seminarista, do sacerdote, é interpretada como "uma
presença do sagrado" pela população, o que propicia a riqueza de tantos
encontros vividos nas casas e igreja flutuantes, ou mesmo selva adentro.
Entre as tantas imagens marcou, em particular, a
desenvoltura de um menino, que pela empolgação em falar, acabou dando a
conhecer a realidade da comunidade em que vivia, incluinda a vida de Igreja.
"Olha - recomentou o padre aos avós do menino - ele é tão esperto e gosta
tanto de vida de igreja, de contar, quem sabe às vezes não vai pro seminário,
vai inspirando ele".
Marcante também o testemunho de uma senhora acamada
há 9 anos: “Eu tenho vida, qualquer vida é melhor que nenhuma. Eu vivo, eu
tenho vida”. Uma frase vinda de alguém naquela situação, que levou padre
Alexandre a comentar com o bispo que o acompanhava: "Ela acabou de fazer
teologia, teologia pura, vivencial, experiencial de Deus”.
Enfim, uma experiência que areja, renova o
ministério, anima e entusiasma: "Quanta Unção dos Enfermos, quanta Missa!",
recorda o sacerdote. "Teve uma comunidade lá que eu rezei Missa que eles
disseram que praticamente nunca tiveram, porque são núcleos, então ali não
costuma ter. Então emociona a gente."
A entrevista com Pe. Alexandre foi tema do programa
Porta Aberta desta quarta-feira, conduzido por Bianca Fraccalvieri:
Essa experiência missionária, ela nasce como
inspiração, no primeiro momento, dos trabalhos do Sínodo da Amazônia. Então a
partir do Sínodo - e também claro, articulado com o caminhar da Igreja no
Brasil que já tem um olhar especial para a Amazônia - foi organizado pelo
COMISE [Conselho Missionário de Seminaristas ], pelos seminários do Brasil
uma atividade missionária, envolvendo os seminaristas de todo o Brasil, das dioceses
do Brasil. Em um primeiro momento, mais ou menos a ideia era que três ou mais
seminaristas de cada Diocese, de todo o Brasil, junto com um formador, padre,
pudesse fazer então essa experiência missionária lá em Manaus, para conhecer um
pouco a realidade Amazônica. E nós conseguimos então que 280, entre
seminaristas seminário de seminaristas – acho que tinha 20 padres formadores -
que tinha 20 países formadores, mais alguns bispos também -, mas ao todo 280
pessoas foram, se disponibilizaram a realizar essa atividade missionária.
Então, portanto, nasce do Sínodo da Amazônia, nasce do caminhar da Igreja do
Brasil, e também dos seminários, da organização dos seminários do Brasil, que
fizeram essa organização com esses seminaristas e formadores para essa
atividade missionária lá em Manaus.
Num primeiro momento, nós nos reunimos no seminário
de Manaus, para haver uma formação, nos preparar para missão, e depois nós
fizemos uma semana de missão - é claro, nos arredores ali da cidade, mas
entrando então ali na realidade amazônica. Então nós tivemos a oportunidade de,
a partir da divisão de grupos - em geral grupos com 3, 4, 5 pessoas - de termos
contato com os ribeirinhos, as chamadas comunidades flutuantes, que é algo
absolutamente impressionante, bonito e as comunidades rurais que vão adentrando
assim ali na floresta, você vai vendo comunidades, pequenas vilas. Então nós
tivemos contato com toda essa gama, essa gama cultural absolutamente rica e
também de uma riqueza eclesial muito grande. E a ideia é que os seminaristas,
os padres, os bispos que participaram desse evento, que eles não só levassem
algo, mas a ideia é que a gente pudesse fazer uma experiência de inserção, de
compreensão e aculturação daquilo que eles vivem. Ou seja, é a gente aproveitar
aquilo que eles já estão vivendo de bom ali, como Igreja, como comunidade, e
fazer então essa relação, essa relação de fé, essa relação religiosa nesses
dias, fazendo visitas, dando as bênçãos, recebendo também muita coisa boa.
Então foi uma interação.
Depois dessa missão de 7 dias - e aí vai longe,
tinha gente longe lá dentro da floresta - então voltou para o seminário de
Manaus, o seminário arquidiocesano, e houve daí dois dias de avaliação, de
ressonância da missão, e depois disso concluiu-se então esse processo de
missionários, esse primeiro processo missionário. E foi tão bom, tão valioso,
que foi votado em assembleia para que esse evento pudesse se realizar a pelo
menos cada dois anos. Talvez não sempre na região do Amazonas - pode ocorrer em
outras regiões do Brasil – mas que houvesse uma circularidade dos missionários,
dada a importância que foi constatada nesse evento.
Participantes da experiência missionária | Vatican News |
As necessidades e expectativas das populações
visitadas...
Quando a gente chega em alguns lugares, sobretudo
ali no território amazônico, onde não há uma presença constante do sacerdote,
ou então do seminarista, devido às condições geográficas e à quantidade de
comunidades. Na região que eu fiquei há um padre para 60 comunidades. Ele
trabalha e trabalha muito. Mas é um padre para 60 comunidades. Então eles não
têm aquele acesso costumeiro ao sacerdote, que a gente em geral tem. Então
quando a gente chega numa casa, ou nessas casas flutuantes, nos ribeirinhos ou
nas zonas comunidades rurais, o primeiro olhar que eu vi era sempre de
encantamento. As pessoas vendo a visita do seminarista, do sacerdote, eles
interpretam aquilo como uma presença sagrada. E portanto, meio que essa visita
incorpora aquela realidade de fé que eles já vivem e já sabem, de que Deus olha
para eles. Então é um olhar de encantamento. Eles quando veem a gente chegar,
parece que é um selo de garantia, de que de fato Deus olha por eles, porque
mandou ali aquelas pessoas meio que chancelando esse olhar. E quando a gente
chega, o que eles esperam de nós? Eles esperam de nós uma conversa, eles querem
partilhar um pouco a vida, querem contar, tanto que a gente ali já foi
preparado para marcar a visita com escuta. A gente falou muito
pouco, escutou muito. As pessoas querem contar da vida, elas querem dizer as
coisas, e a gente escuta, como escuta cristã é muito valiosa. As pessoas pedem
a bênção. Então é bonito, eles pedem para abençoar a água, para deixar água
benta em casa, eles pedem para abençoar algum objeto, alguma imagem de santo, o
Terço, eles pedem a Unção dos Enfermos. Eu pude ministrar muitas unções dos
enfermos. Por que a visita ali, como não é tão periódica, eles já aproveitam:
“Padre, estou enfermo, ou alguém está enfermo, idoso, o senhor pode?”. Então
eles já pedem a Unção dos Enfermos também, a gente já aproveita e reza com
eles. As crianças, quando veem a gente, é bonito – como está dentro desse
espírito - elas trazem os animaizinhos que têm, trazem as bonequinhas, os
brinquedos e mostram tudo que tem ali, são empolgadas. Então a chegada da
gente, traz empolgação para pessoas, traz encantamento, traz coisa boa. Então a
gente pode assim, a cada visita, sair muito animado, e se a gente acho que foi
levar alguma coisa, na verdade a gente foi receber. Receber
receptividade, receber acolhida. As pessoas ali são muito amorosas, muito
amorosa porque são simples e a simplicidade, naturalmente, gera amor. Então, o
que eles esperavam de nós? Bênção! Presença, bênção, escuta. E feito isso, a
gente ia para outra casa, para outra casa, e assim em cada uma delas, com
história diferente, uma vida diferente, uma ação de Deus ali diferente. Foi
absolutamente belo esse momento que a gente viveu.
Pe Alexandre celebra Missa em igreja flutuante | Vatican News |
De uma vivência urbana, qual o impacto sentido
nesse contexto amazônico...
Num primeiro momento, a gente acaba compreendendo
um pouco, vamos dizer, a dimensão material como um desafio, porque os nossos
centros urbanos são bastante confortáveis. A gente tem muita coisa na mão, tudo
muito fácil e tem um ritmo em que a gente conta com vários instrumentos. Quando
a gente vai para uma realidade dessa, então um exemplo, lá é muito calor. Então
não precisa do chuveiro elétrico, mas de todo modo, para quem não está
acostumado..., então é água fria; a situação de saneamento, o sinal de
internet, televisão, tem lugar em que ele é quase inexistente ou inexistente.
Até para dormir, redes, se usa muita rede, tem a dinâmica da cheia dos rios.
Então depende um pouco onde vai, você precisa adentrar com a canoa, então às
vezes tem que entrar ali no rio um pouco. Ou seja, é todo um contexto, uma
situação, bastante diferente da que a gente vive. Então quando a gente vai, a
gente se vê um pouco desafiado, mas com o passar dos dias, a gente vai
incorporando aquela dinâmica e vai vendo também beleza em tudo isso. Por quê?
Porque aquela simplicidade que as pessoas vivem, prá nós que temos uma outra
visão, a urbana, a gente diz “é falta”. Para eles não. Eles não têm essa
consciência de falta. Até eu conversei com muitos ali, de uma forma bastante
leve, mas eles diziam: “Padre, olha tá tudo aqui. Então a gente tem as coisas
aqui, vive bem, e para comer vai até o rio, tem o peixe. A gente planta isso e
aquilo, tem o arroz”. Então a visão de mundo deles é muito mais assim pura do
que a nossa. A gente para estar bem precisa ter muitas coisas. E eles para
estar bem precisam ser muitas coisas. Então eles têm pouco, mas são demais, são
muito, rezam, trabalham, interagem, conversam, refeições longas de conversa,
eles têm uma dinâmica de vida onde se estimula essa vida comunitária que para
eles é muito importante, mais do que ter algumas coisas. Então num primeiro
momento, quando a gente vai de um centro urbano para essa região amazônica,
pode ser que a gente chegue com um olhar: “nossa, falta muita coisa!”. Mas com
o tempo, a gente vê que na verdade falta para nós, né, algumas coisas, alguma
consciência, que eles ali avisem. Então para eles a consciência de
simplicidade, da vida de comunidade, de fraternidade, um ajuda o outro. Um
exemplo, as casas flutuantes sobre o rio. Então são todas próximas,
coladas, então é uma grande família. Então um olha os filhos do outro e os
animais e cultiva e vai e volta, barco é meio coletivo. Então eles têm uma
consciência em que a vida ali não lhes falta nada. São absolutamente felizes.
Então, portanto, acho que é um pouco visão de mundo. A visão de mundo que eles
têm muito a nos ensinar, nesse sentido. Então o ser, de fato, é muito mais
importante do que o ter. Às vezes a gente tem tanta coisa e tem tantas
tristezas na cidade. E lá eu não vi tristeza em momento nenhum. Às vezes não
tem coisa material, mas tem tanta alegria. Então eu acho que a visão de mundo
ali é diversa, mas tem muito a nos falar, muito a nos ensinar.
Eu me lembro que no final daquilo, das visitas, dessa
experiência, eu vim pensando assim: nossa, eu não tenho problema. Eu não tenho
problema lá na paróquia, no dia a dia, porque uma ou outra coisa que eu acho
que é problema. a gente resolve. Então não tem problema. Olha, eles vivem lá
com tanta simplicidade, tanta nobreza, tanta alegria. Eu acho que isso me
cativou bastante, cativou a todo mundo lá inclusive. Um consenso quando a gente
conversou depois com os seminaristas e tudo, foi nesse sentido, de que eles nos
ensinaram muito, uma simplicidade feliz. Então de um certo olhar, quem olha
daqui, do centro urbano, é falta, mas quando você olha a partir do olhar deles,
não falta nada, não falta nada, eles vivem muito bem. Claro que, faço só um
parênteses para finalizar, uma ou outra questão sociológica: em alguns lugares
assim que precisa, mais essas vilas rurais prá dentro da floresta. Então tem
algumas situações, eles precisam de um posto médico e tal. Nesse sentido sim,
mas no sentido antropológico, eles conduzem bem a vida.
Igreja flutuante | Vatican News |
A experiência da “realidade teórica” sobre a
Amazônia em Roma durante o Sínodo e a experiência in loco
Eu disse pro pessoal da Amazônia: olha eu
participei do Sínodo e conheci teoricamente. E quando surgiu a oportunidade de
vir para cá, nessa missão - porque eu também sou diretor de estudos do
seminário de Limeira -, então a ideia era vir os formandos, os seminaristas e
os formadores. Então quando me convidaram, eu nem pensei duas. Eu falei:
“não, eu preciso ir, eu quero ir, porque eu conheço pelo Sínodo, na teoria, a
Igreja da Amazônia. Eu preciso ver, eu preciso experimentar como ela é”. Então
ali, realmente, eu tive a oportunidade de ver assim concretizado aquilo que eu
escutei lá no Sínodo. Acho que uma riqueza da experiência para essa parte,
vamos dizer assim, teológica, teórica, é de fato a gente ver o mundo a partir
de quem tá lá, a partir dos olhos, da experiência da pessoa que tá naquela
situação, naquela região. Então quando eu escutei muita coisa no Sínodo, eu vi
a lógica daquilo, e tal, mas estando ali eu pude de fato que entender
concretamente as demandas da igreja da Amazônia, a riqueza da Igreja na
Amazônia, e como que eles já vivem uma belíssima experiência eclesial. Ali eu
pude então, vamos dizer assim, fazer aquilo que tem que ser o primeiro passo
mesmo, né: experiência prática. Acho que agora eu posso remodelar
um pouco a mentalidade, quer dizer, da teoria eu fui lá para prática. Então
agora da prática eu preciso rever a teoria, que eu acho que foi um pouco o
método que o Sínodo quis aplicar ali quando levou tanta gente da Igreja
amazônica. Então nós tínhamos lá tantos representantes, inclusive encontrei
alguns lá, o padre Zenildo, que é o reitor do seminário de Manaus – estava no
Sínodo, estava lá também, conversei bastante com ele -; Dom Maurício, que na
época era o representante das POM, agora é bispo, bispo de Rondonópolis, fez
até missão conosco e ele participou do Sínodo, estava lá também. Então,
conversando com eles, tendo esse contato, a gente viu esse consenso. Quer
dizer, eles participaram lá, levaram a experiência da Amazônia, são pessoas
engajadas, eles e outros, esses foram os que eu convivi, mas levaram para lá,
para o Sínodo, a experiência amazônica, para justamente tentar fazer essa
articulação, esse casamento entre prática e teoria. E o Sínodo suscitou, como a
gente pode ver, muita coisa boa, mas eu acredito que esse suscitar muita coisa
boa, parte desse pressuposto, quer dizer, as pessoas que conhecem a realidade
estavam lá, falaram dela, e a partir disso gerou-se uma teologia, uma teoria,
uma eclesiologia, mas a prática é fundamental. Então acho que participar dali a
missão para mim foi muito especial, pude somar essas duas experiências, e agora
espero também continuar contribuindo nessa dimensão eclesial aqui no Brasil.
A motivação percebida nos seminaristas e sacerdotes
participantes da missão e que tiveram um primeiro contato com a realidade
amazônica...
Eu vejo assim, com quem eu pude conversar ali, os
debates depois pós missão da ressonância, é consenso: é espírito de abertura, é
espírito de encantamento pelas coisas que a gente encontrou, um espírito de
desejo, de contribuir com a Igreja enquanto Igreja, de uma forma mais ampla,
porque todo mundo que tá ali, então ampliou um pouco a perspectiva de Igreja
eclesial. Então saiu da sua diocese, saiu de seu território, saiu de seu
Estado, e o Brasil é enorme, tem culturas tão diferentes. Então assim, foi
pessoal do Sul, Sudeste, Oeste, Centro, Nordeste para o Norte. E a gente sabe,
são mundos muito particulares, e todo mundo entendendo que a particularidade
não é excludente, mas a gente pode somar as nossas particularidades, isso foi
muito enriquecedor. E a gente pode somar as nossas particularidades e se somar
de outras. Então todo mundo estava ali querendo somar com a experiência da
Igreja da Amazônia com a sua experiência regional. Então todo mundo ali, eu
posso dizer, que teve esse olhar, vamos dizer assim, de aprender, de aprender
também como ser Igreja, a partir da experiência da Igreja na Amazônia, uma
experiência comunitária, uma experiência muito fraterna, muito evangélica.
Então o olhar de todos os que estavam ali – isso é um consenso - foi um olhar
assim de aprendizagem, de aprendizagem, de valorização, um olhar muito
positivo, a maneira como a Igreja ali é organizada, uma Igreja bastante laical,
tem lideranças muito fortes nas comunidades. Os leigos precisam manter a vida
das comunidades ativa, porque o padre vai, faz o seu trabalho pastoral, mas
como eu disse, um exemplo que eu já falei, é um padre para 60 comunidades. Então
para o padre passar ali a comunidade tem que permanecer viva, atuante. Então o
trabalho dos leigos ali é fundamental. Eles são engajados, eles trabalham, tem
uma boa autonomia, e a vida de Igreja e de fé vai acontecendo e vai acontecendo
mesmo. Então acho que todo mundo, tendo contato com isso, se sentiu muito
feliz. E vendo os comentários dos seminaristas, dos padres, dos bispos, sempre
foram comentários desse espírito de abertura, espírito de ver beleza nas
coisas, nas diferenças, na forma de ser Igreja diferente - a gente tem formas
diferentes de ser Igreja – então portanto eu diria que esse espírito de
abertura foi uma constante em todo mundo ali que participou dessa experiência.
Foi muito bonito de ver como que essa abertura permitiu que a gente se
enriquecesse. E com certeza, cada um que se enriqueceu ali, agora vai poder
enriquecer seus Estados, suas dioceses, suas regiões.
Visitas às famílias | Vatican News |
Os fatos que marcaram....
Vieram-me duas imagens. A primeira delas é de um
menininho, e eu fiquei encantado com as comunidades flutuantes, porque eu não
conhecia. O que que são as comunidades flutuantes? Existem umas árvores que
eles cortam e colocam no rio e em cima constroem uma casa, e ela flutua,
literalmente. Dura 30 anos aquele tronco ali. Alguns 4,5 e a casa em cima. Mas
nas comunidades flutuantes não é só a casa, eles constroem a igreja. Então eu
rezei numa igreja flutuante, e ela acompanha a vazão do rio, quer dizer, ele
sobe, sobe, desce, desce. E eu me lembro que nessa igreja que eu fui rezar numa
manhã, tinha esse menininho, absolutamente esperto, sorridente, falante, e ele
tinha um desejo de te contar tudo, da vida de igreja deles ali, da vida dele,
dos avós, dos pais. Eu conheci a realidade ali daquela comunidade, daquelas
pessoas, a partir dele, né? Então assim, a empolgação dele foi algo notório
para todos nós. Então ele falava comigo, os seminaristas, e falava e falava e
falava, falou até experiência com animais. Contou que o jacaré queria pegar o
cachorro dele um dia lá, então coisas assim super interessantes. E eu saí
empolgado com a empolgação dele, uma criança muito vivaz. Até eu disse para os
avós: olha, ele é tão esperto e gosta tanto de vida de igreja, de contar, quem
sabe às vezes não vai pro seminário, vai inspirando ele, vai saber! E aquilo me
marcou, e como diz, aquela expressividade, dele, aquele encantamento com a vida
dele ali, e com os amigos dele, aquilo ali me marcou. Gosto de lembrar dessa
situação.
E também uma situação em que uma senhora realmente
fez teologia conosco. A gente então um dia, entrando dentro dos chamados
“ramais” dentro da floresta e vai lá numa comunidade, algumas casas, no meio do
nada mesmo.
E aí nós chegamos e tinha uma senhora acamada lá,
há 9 anos. E aí a gente chega, e aí aquele momento em que a gente pensa: “Meu
Deus, eu vou dizer o quê, né?”. Então tem que marcar a visita com a escuta
mesmo num primeiro momento. E aí ela começou contar, e eu me lembro de uma
frase que ela falou assim para nós, ela disse assim: “Olha, eu tô aqui há 9
anos, mas eu agradeço a Deus - ela disse -, porque eu tenho vida, acompanho
meus netos, acompanho tudo daqui.” Ela falou assim, “eu tenho vida, qualquer
vida é melhor que nenhuma. Eu vivo, eu tenho vida”. E essa frase me marcou. Até
o bispo tava junto e eu falei: “Olha, ela fez teologia aqui, e lá acabou de
fazer teologia, teologia pura, vivencial, experiencial de Deus”. Pensa, com
toda aquela situação ela dizer: “Dou graças a Deus porque Ele me mantém viva”.
Aquilo me chocou, num bom sentido. Quando você me perguntou agora me vieram
esses dois flashes na cabeça; uma de entusiasmo, de animação, e a outra de
profundidade teológica.
Deslocamento em canoa | Vatican News |
Sobre repetir a experiência...
Com certeza. Eu já disse lá: eu falei olha, como a
ideia é fazer a cada dois anos, já falei aqui para os padres formadores. Eu
acho que todo mundo tem a chance de ir, mas se ninguém, eu vou! Eu falei eu
vou, e vou voltar lá, e quero voltar quantas vezes for necessário. A gente indo
lá, eu vi que precisa mesmo, precisa mesmo. Quanta Unção dos Enfermos, quanta
Missa. Teve uma comunidade lá que eu rezei Missa que eles disseram que
praticamente nunca tiveram, porque são núcleos, então ali não costuma ter.
Então emociona a gente. Você vai num lugar e alguém diz que é a primeira Missa,
ou uma das primeiras depois em tanto tempo. Então eu falei: olha, eu volto lá e
vou voltar sim, quantas vezes eu puder, quantas vezes forem necessárias, e
indico para quem quiser, porque areja, renova o ministério da gente, anima
demais, entusiasma muito. Fez muito bem!
Sentimento de gratidão...
O sentimento de gratidão também agora, pela
Arquidiocese de Manaus, que organizou, de uma forma brilhante a missão, e com o
apoio dos seminaristas. Então tinha as comissões, os padres, mas os seminaristas
deram um apoio fantástico prá gente lá. Buscou no aeroporto, levou no lugar da
missão, depois foi buscar. Então a gente não teve preocupação nenhuma com
relação à logística. A gente foi prá missão mesmo, a instalação lá no seminário
muito confortável, eles se empolgam também em fazer a gente entrar na cultura,
falar das frutas, do estilo de alimentação, de estilo de vida, de lugares para
visitar, tanto que eu fui visitar – fomos – o chamado Musa, que é o Museu da
Amazônia lá na cidade de Manaus que eles indicaram pra gente, também belíssimo.
Então eu queria deixar esse sentimento de gratidão pela organização impecável,
impecável da Arquidiocese de Manaus, e também do COMISE, dos Seminários do
Brasil, porque foi algo assim muito bem organizado. Eu queria deixar assim esse
sentimento de gratidão e votos - eu sei que é pesado - votos para que continuem
organizando outras missões para a gente também.
Padre Alexandre Boratti Favretto* é incardinado na Diocese de Limeira,
professor de Teologia na PUC de Campinas e agora também diretor da Faculdade de
Teologia da PUC de Campinas. É pároco da Paróquia Bom Jesus de Araras e
coordena a Escola de Teologia da Diocese de Limeira.