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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Pe. Alexandre, um olhar da Igreja para a Amazônia

Na atividade missionária, padre Alexandre se desloca de barco | Vatican News

280 entre leigos, religiosos, diáconos, seminaristas, sacerdotes e bispos dos 19 Regionais que fazem parte da Igreja do Brasil estiveram representados na experiência missionária na Amazônia em janeiro, inserida no contexto do 3º Ano Vocacional em curso no país. Padre Alexandre Favretto, da diocese de Limeira, compartilhou suas impressões desta "grande riqueza eclesial" com o Vatican News.

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

"Vou voltar lá, e quero voltar quantas vezes for necessário". Padre Alexandre Boratti Favretto* , da Diocese de Limeira, não pensa duas vezes ao responder a pergunta se repetiria a experiência missionária enriquecedora na Amazônia realizada em janeiro e que reuniu 280 seminaristas, sacerdotes e bispos de várias dioceses do Brasil. Uma iniciativa missionária denominada "Pés a caminho" que está em sintonia com a reflexão do IV Congresso Missionário Nacional de Seminaristas, que abordou a questão da missão, a missão ad gentes e a questão do paradigma da missão relacionando-o com o processo de formação presbiteral.

Oriundo de um ambiente urbano, o sacerdote ficou literalmente maravilhado com uma realidade que lhe era até então desconhecida na prática, visto ter tido contato com ela de forma teórica durante o Sínodo da Amazônia, da qual participou. Agora, pode então "somar essas duas experiências, e agora espero também continuar contribuindo nessa dimensão eclesial aqui no Brasil."

De fato, "todo mundo estava ali querendo somar com a experiência da Igreja da Amazônia com a sua experiência regional. Então todo mundo ali, eu posso dizer, que teve esse olhar, vamos dizer assim, de aprender, de aprender também como ser Igreja, a partir da experiência da Igreja na Amazônia, uma experiência comunitária, uma experiência muito fraterna, muito evangélica."

E se a ideia era "levar alguma coisa", a constatação é que "na verdade a gente foi receber", constata Pe. Alexandre, após as ricas experiências com a população visitada. Prova disso, foi a preparação sobretudo para ser uma "visita com escuta". E de fato, a visita do seminarista, do sacerdote, é interpretada como "uma presença do sagrado" pela população, o que propicia a riqueza de tantos encontros vividos nas casas e igreja flutuantes, ou mesmo selva adentro.

Entre as tantas imagens marcou, em particular, a desenvoltura de um menino, que pela empolgação em falar, acabou dando a conhecer a realidade da comunidade em que vivia, incluinda a vida de Igreja. "Olha - recomentou o padre aos avós do menino - ele é tão esperto e gosta tanto de vida de igreja, de contar, quem sabe às vezes não vai pro seminário, vai inspirando ele".

Marcante também o testemunho de uma senhora acamada há 9 anos: “Eu tenho vida, qualquer vida é melhor que nenhuma. Eu vivo, eu tenho vida”. Uma frase vinda de alguém naquela situação, que levou padre Alexandre a comentar com o bispo que o acompanhava: "Ela acabou de fazer teologia, teologia pura, vivencial, experiencial de Deus”.

Enfim, uma experiência que areja, renova o ministério, anima e entusiasma: "Quanta Unção dos Enfermos, quanta Missa!", recorda o sacerdote. "Teve uma comunidade lá que eu rezei Missa que eles disseram que praticamente nunca tiveram, porque são núcleos, então ali não costuma ter. Então emociona a gente."

A entrevista com Pe. Alexandre foi tema do programa Porta Aberta desta quarta-feira, conduzido por Bianca Fraccalvieri:

Essa experiência missionária, ela nasce como inspiração, no primeiro momento, dos trabalhos do Sínodo da Amazônia. Então a partir do Sínodo - e também claro, articulado com o caminhar da Igreja no Brasil que já tem um olhar especial para a Amazônia - foi organizado pelo COMISE [Conselho Missionário de Seminaristas ], pelos seminários do Brasil uma atividade missionária, envolvendo os seminaristas de todo o Brasil, das dioceses do Brasil. Em um primeiro momento, mais ou menos a ideia era que três ou mais seminaristas de cada Diocese, de todo o Brasil, junto com um formador, padre, pudesse fazer então essa experiência missionária lá em Manaus, para conhecer um pouco a realidade Amazônica. E nós conseguimos então que 280, entre seminaristas seminário de seminaristas – acho que tinha 20 padres formadores - que tinha 20 países formadores, mais alguns bispos também -, mas ao todo 280 pessoas foram, se disponibilizaram a realizar essa atividade missionária. Então, portanto, nasce do Sínodo da Amazônia, nasce do caminhar da Igreja do Brasil, e também dos seminários, da organização dos seminários do Brasil, que fizeram essa organização com esses seminaristas e formadores para essa atividade missionária lá em Manaus.

Num primeiro momento, nós nos reunimos no seminário de Manaus, para haver uma formação, nos preparar para missão, e depois nós fizemos uma semana de missão - é claro, nos arredores ali da cidade, mas entrando então ali na realidade amazônica. Então nós tivemos a oportunidade de, a partir da divisão de grupos - em geral grupos com 3, 4, 5 pessoas - de termos contato com os ribeirinhos, as chamadas comunidades flutuantes, que é algo absolutamente impressionante, bonito e as comunidades rurais que vão adentrando assim ali na floresta, você vai vendo comunidades, pequenas vilas. Então nós tivemos contato com toda essa gama, essa gama cultural absolutamente rica e também de uma riqueza eclesial muito grande. E a ideia é que os seminaristas, os padres, os bispos que participaram desse evento, que eles não só levassem algo, mas a ideia é que a gente pudesse fazer uma experiência de inserção, de compreensão e aculturação daquilo que eles vivem. Ou seja, é a gente aproveitar aquilo que eles já estão vivendo de bom ali, como Igreja, como comunidade, e fazer então essa relação, essa relação de fé, essa relação religiosa nesses dias, fazendo visitas, dando as bênçãos, recebendo também muita coisa boa. Então foi uma interação.

Depois dessa missão de 7 dias - e aí vai longe, tinha gente longe lá dentro da floresta - então voltou para o seminário de Manaus, o seminário arquidiocesano, e houve daí dois dias de avaliação, de ressonância da missão, e depois disso concluiu-se então esse processo de missionários, esse primeiro processo missionário. E foi tão bom, tão valioso, que foi votado em assembleia para que esse evento pudesse se realizar a pelo menos cada dois anos. Talvez não sempre na região do Amazonas - pode ocorrer em outras regiões do Brasil – mas que houvesse uma circularidade dos missionários, dada a importância que foi constatada nesse evento.

Participantes da experiência missionária | Vatican News

As necessidades e expectativas das populações visitadas...

Quando a gente chega em alguns lugares, sobretudo ali no território amazônico, onde não há uma presença constante do sacerdote, ou então do seminarista, devido às condições geográficas e à quantidade de comunidades. Na região que eu fiquei há um padre para 60 comunidades. Ele trabalha e trabalha muito. Mas é um padre para 60 comunidades. Então eles não têm aquele acesso costumeiro ao sacerdote, que a gente em geral tem. Então quando a gente chega numa casa, ou nessas casas flutuantes, nos ribeirinhos ou nas zonas comunidades rurais, o primeiro olhar que eu vi era sempre de encantamento. As pessoas vendo a visita do seminarista, do sacerdote, eles interpretam aquilo como uma presença sagrada. E portanto, meio que essa visita incorpora aquela realidade de fé que eles já vivem e já sabem, de que Deus olha para eles. Então é um olhar de encantamento. Eles quando veem a gente chegar, parece que é um selo de garantia, de que de fato Deus olha por eles, porque mandou ali aquelas pessoas meio que chancelando esse olhar. E quando a gente chega, o que eles esperam de nós? Eles esperam de nós uma conversa, eles querem partilhar um pouco a vida, querem contar, tanto que a gente ali já foi preparado para marcar a visita com escuta. A gente falou muito pouco, escutou muito. As pessoas querem contar da vida, elas querem dizer as coisas, e a gente escuta, como escuta cristã é muito valiosa. As pessoas pedem a bênção. Então é bonito, eles pedem para abençoar a água, para deixar água benta em casa, eles pedem para abençoar algum objeto, alguma imagem de santo, o Terço, eles pedem a Unção dos Enfermos. Eu pude ministrar muitas unções dos enfermos. Por que a visita ali, como não é tão periódica, eles já aproveitam: “Padre, estou enfermo, ou alguém está enfermo, idoso, o senhor pode?”. Então eles já pedem a Unção dos Enfermos também, a gente já aproveita e reza com eles. As crianças, quando veem a gente, é bonito – como está dentro desse espírito -  elas trazem os animaizinhos que têm, trazem as bonequinhas, os brinquedos e mostram tudo que tem ali, são empolgadas. Então a chegada da gente, traz empolgação para pessoas, traz encantamento, traz coisa boa. Então a gente pode assim, a cada visita, sair muito animado, e se a gente acho que foi levar alguma coisa, na verdade a gente foi receber. Receber receptividade, receber acolhida. As pessoas ali são muito amorosas, muito amorosa porque são simples e a simplicidade, naturalmente, gera amor. Então, o que eles esperavam de nós? Bênção! Presença, bênção, escuta. E feito isso, a gente ia para outra casa, para outra casa, e assim em cada uma delas, com história diferente, uma vida diferente, uma ação de Deus ali diferente. Foi absolutamente belo esse momento que a gente viveu.

Pe Alexandre celebra Missa em igreja flutuante | Vatican News

De uma vivência urbana, qual o impacto sentido nesse contexto amazônico...

Num primeiro momento, a gente acaba compreendendo um pouco, vamos dizer, a dimensão material como um desafio, porque os nossos centros urbanos são bastante confortáveis. A gente tem muita coisa na mão, tudo muito fácil e tem um ritmo em que a gente conta com vários instrumentos. Quando a gente vai para uma realidade dessa, então um exemplo, lá é muito calor. Então não precisa do chuveiro elétrico, mas de todo modo, para quem não está acostumado..., então é água fria; a situação de saneamento, o sinal de internet, televisão, tem lugar em que ele é quase inexistente ou inexistente. Até para dormir, redes, se usa muita rede, tem a dinâmica da cheia dos rios. Então depende um pouco onde vai, você precisa adentrar com a canoa, então às vezes tem que entrar ali no rio um pouco. Ou seja, é todo um contexto, uma situação, bastante diferente da que a gente vive. Então quando a gente vai, a gente se vê um pouco desafiado, mas com o passar dos dias, a gente vai incorporando aquela dinâmica e vai vendo também beleza em tudo isso. Por quê? Porque aquela simplicidade que as pessoas vivem, prá nós que temos uma outra visão, a urbana, a gente diz “é falta”. Para eles não. Eles não têm essa consciência de falta. Até eu conversei com muitos ali, de uma forma bastante leve, mas eles diziam: “Padre, olha tá tudo aqui. Então a gente tem as coisas aqui, vive bem, e para comer vai até o rio, tem o peixe. A gente planta isso e aquilo, tem o arroz”. Então a visão de mundo deles é muito mais assim pura do que a nossa. A gente para estar bem precisa ter muitas coisas. E eles para estar bem precisam ser muitas coisas. Então eles têm pouco, mas são demais, são muito, rezam, trabalham, interagem, conversam, refeições longas de conversa, eles têm uma dinâmica de vida onde se estimula essa vida comunitária que para eles é muito importante, mais do que ter algumas coisas. Então num primeiro momento, quando a gente vai de um centro urbano para essa região amazônica, pode ser que a gente chegue com um olhar: “nossa, falta muita coisa!”. Mas com o tempo, a gente vê que na verdade falta para nós, né, algumas coisas, alguma consciência, que eles ali avisem. Então para eles a consciência de simplicidade, da vida de comunidade, de fraternidade, um ajuda o outro. Um exemplo, as casas flutuantes sobre o rio. Então são todas  próximas, coladas, então é uma grande família. Então um olha os filhos do outro e os animais e cultiva e vai e volta, barco é meio coletivo. Então eles têm uma consciência em que a vida ali não lhes falta nada. São absolutamente felizes. Então, portanto, acho que é um pouco visão de mundo. A visão de mundo que eles têm muito a nos ensinar, nesse sentido. Então o ser, de fato, é muito mais importante do que o ter. Às vezes a gente tem tanta coisa e tem tantas tristezas na cidade. E lá eu não vi tristeza em momento nenhum. Às vezes não tem coisa material, mas tem tanta alegria. Então eu acho que a visão de mundo ali é diversa, mas tem muito a nos falar, muito a nos ensinar.

Eu me lembro que no final daquilo, das visitas, dessa experiência, eu vim pensando assim: nossa, eu não tenho problema. Eu não tenho problema lá na paróquia, no dia a dia, porque uma ou outra coisa que eu acho que é problema. a gente resolve. Então não tem problema. Olha, eles vivem lá com tanta simplicidade, tanta nobreza, tanta alegria. Eu acho que isso me cativou bastante, cativou a todo mundo lá inclusive. Um consenso quando a gente conversou depois com os seminaristas e tudo, foi nesse sentido, de que eles nos ensinaram muito, uma simplicidade feliz. Então de um certo olhar, quem olha daqui, do centro urbano, é falta, mas quando você olha a partir do olhar deles, não falta nada, não falta nada, eles vivem muito bem. Claro que, faço só um parênteses para finalizar, uma ou outra questão sociológica: em alguns lugares assim que precisa, mais essas vilas rurais prá dentro da floresta. Então tem algumas situações, eles precisam de um posto médico e tal. Nesse sentido sim, mas no sentido antropológico, eles conduzem bem a vida.

Igreja flutuante | Vatican News

A experiência da “realidade teórica” sobre a Amazônia em Roma durante o Sínodo e a experiência in loco

Eu disse pro pessoal da Amazônia: olha eu participei do Sínodo e conheci teoricamente. E quando surgiu a oportunidade de vir para cá, nessa missão - porque eu também sou diretor de estudos do seminário de Limeira -, então a ideia era vir os formandos, os seminaristas e os formadores.  Então quando me convidaram, eu nem pensei duas. Eu falei: “não, eu preciso ir, eu quero ir, porque eu conheço pelo Sínodo, na teoria, a Igreja da Amazônia. Eu preciso ver, eu preciso experimentar como ela é”. Então ali, realmente, eu tive a oportunidade de ver assim concretizado aquilo que eu escutei lá no Sínodo. Acho que uma riqueza da experiência para essa parte, vamos dizer assim, teológica, teórica, é de fato a gente ver o mundo a partir de quem tá lá, a partir dos olhos, da experiência da pessoa que tá naquela situação, naquela região. Então quando eu escutei muita coisa no Sínodo, eu vi a lógica daquilo, e tal, mas estando ali eu pude de fato que entender concretamente as demandas da igreja da Amazônia, a riqueza da Igreja na Amazônia, e como que eles já vivem uma belíssima experiência eclesial. Ali eu pude então, vamos dizer assim, fazer aquilo que tem que ser o primeiro passo mesmo, né: experiência prática. Acho que agora eu posso remodelar um pouco a mentalidade, quer dizer, da teoria eu fui lá para prática. Então agora da prática eu preciso rever a teoria, que eu acho que foi um pouco o método que o Sínodo quis aplicar ali quando levou tanta gente da Igreja amazônica. Então nós tínhamos lá tantos representantes, inclusive encontrei alguns lá, o padre Zenildo, que é o reitor do seminário de Manaus – estava no Sínodo, estava lá também, conversei bastante com ele -; Dom Maurício, que na época era o representante das POM, agora é bispo, bispo de Rondonópolis, fez até missão conosco e ele participou do Sínodo, estava lá também. Então, conversando com eles, tendo esse contato, a gente viu esse consenso. Quer dizer, eles participaram lá, levaram a experiência da Amazônia, são pessoas engajadas, eles e outros, esses foram os que eu convivi, mas levaram para lá, para o Sínodo, a experiência amazônica, para justamente tentar fazer essa articulação, esse casamento entre prática e teoria. E o Sínodo suscitou, como a gente pode ver, muita coisa boa, mas eu acredito que esse suscitar muita coisa boa, parte desse pressuposto, quer dizer, as pessoas que conhecem a realidade estavam lá, falaram dela, e a partir disso gerou-se uma teologia, uma teoria, uma eclesiologia, mas a prática é fundamental. Então acho que participar dali a missão para mim foi muito especial, pude somar essas duas experiências, e agora espero também continuar contribuindo nessa dimensão eclesial aqui no Brasil.

A motivação percebida nos seminaristas e sacerdotes participantes da missão e que tiveram um primeiro contato com a realidade amazônica...

Eu vejo assim, com quem eu pude conversar ali, os debates depois pós missão da ressonância, é consenso: é espírito de abertura, é espírito de encantamento pelas coisas que a gente encontrou, um espírito de desejo, de contribuir com a Igreja enquanto Igreja, de uma forma mais ampla, porque todo mundo que tá ali, então ampliou um pouco a perspectiva de Igreja eclesial. Então saiu da sua diocese, saiu de seu território, saiu de seu Estado, e o Brasil é enorme, tem culturas tão diferentes. Então assim, foi pessoal do Sul, Sudeste, Oeste, Centro, Nordeste para o Norte. E a gente sabe, são mundos muito particulares, e todo mundo entendendo que a particularidade não é excludente, mas a gente pode somar as nossas particularidades, isso foi muito enriquecedor. E a gente pode somar as nossas particularidades e se somar de outras. Então todo mundo estava ali querendo somar com a experiência da Igreja da Amazônia com a sua experiência regional. Então todo mundo ali, eu posso dizer, que teve esse olhar, vamos dizer assim, de aprender, de aprender também como ser Igreja, a partir da experiência da Igreja na Amazônia, uma experiência comunitária, uma experiência muito fraterna, muito evangélica. Então o olhar de todos os que estavam ali – isso é um consenso - foi um olhar assim de aprendizagem, de aprendizagem, de valorização, um olhar muito positivo, a maneira como a Igreja ali é organizada, uma Igreja bastante laical, tem lideranças muito fortes nas comunidades. Os leigos precisam manter a vida das comunidades ativa, porque o padre vai, faz o seu trabalho pastoral, mas como eu disse, um exemplo que eu já falei, é um padre para 60 comunidades. Então para o padre passar ali a comunidade tem que permanecer viva, atuante. Então o trabalho dos leigos ali é fundamental. Eles são engajados, eles trabalham, tem uma boa autonomia, e a vida de Igreja e de fé vai acontecendo e vai acontecendo mesmo. Então acho que todo mundo, tendo contato com isso, se sentiu muito feliz. E vendo os comentários dos seminaristas, dos padres, dos bispos, sempre foram comentários desse espírito de abertura, espírito de ver beleza nas coisas, nas diferenças, na forma de ser Igreja diferente - a gente tem formas diferentes de ser Igreja – então portanto eu diria que esse espírito de abertura foi uma constante em todo mundo ali que participou dessa experiência. Foi muito bonito de ver como que essa abertura permitiu que a gente se enriquecesse. E com certeza, cada um que se enriqueceu ali, agora vai poder enriquecer seus Estados, suas dioceses, suas regiões.

Visitas às famílias | Vatican News

Os fatos que marcaram....

Vieram-me duas imagens. A primeira delas é de um menininho, e eu fiquei encantado com as comunidades flutuantes, porque eu não conhecia. O que que são as comunidades flutuantes? Existem umas árvores que eles cortam e colocam no rio e em cima constroem uma casa, e ela flutua, literalmente. Dura 30 anos aquele tronco ali. Alguns 4,5 e a casa em cima. Mas nas comunidades flutuantes não é só a casa, eles constroem a igreja. Então eu rezei numa igreja flutuante, e ela acompanha a vazão do rio, quer dizer, ele sobe, sobe, desce, desce. E eu me lembro que nessa igreja que eu fui rezar numa manhã, tinha esse menininho, absolutamente esperto, sorridente, falante, e ele tinha um desejo de te contar tudo, da vida de igreja deles ali, da vida dele, dos avós, dos pais. Eu conheci a realidade ali daquela comunidade, daquelas pessoas, a partir dele, né? Então assim, a empolgação dele foi algo notório para todos nós. Então ele falava comigo, os seminaristas, e falava e falava e falava, falou até experiência com animais. Contou que o jacaré queria pegar o cachorro dele um dia lá, então coisas assim super interessantes. E eu saí empolgado com a empolgação dele, uma criança muito vivaz. Até eu disse para os avós: olha, ele é tão esperto e gosta tanto de vida de igreja, de contar, quem sabe às vezes não vai pro seminário, vai inspirando ele, vai saber! E aquilo me marcou, e como diz, aquela expressividade, dele, aquele encantamento com a vida dele ali, e com os amigos dele, aquilo ali me marcou. Gosto de lembrar dessa situação.

E também uma situação em que uma senhora realmente fez teologia conosco. A gente então um dia, entrando dentro dos chamados “ramais” dentro da floresta e vai lá numa comunidade, algumas casas, no meio do nada mesmo.

E aí nós chegamos e tinha uma senhora acamada lá, há 9 anos. E aí a gente chega, e aí aquele momento em que a gente pensa: “Meu Deus, eu vou dizer o quê, né?”. Então tem que marcar a visita com a escuta mesmo num primeiro momento. E aí ela começou contar, e eu me lembro de uma frase que ela falou assim para nós, ela disse assim: “Olha, eu tô aqui há 9 anos, mas eu agradeço a Deus - ela disse -, porque eu tenho vida, acompanho meus netos, acompanho tudo daqui.” Ela falou assim, “eu tenho vida, qualquer vida é melhor que nenhuma. Eu vivo, eu tenho vida”. E essa frase me marcou. Até o bispo tava junto e eu falei: “Olha, ela fez teologia aqui, e lá acabou de fazer teologia, teologia pura, vivencial, experiencial de Deus”. Pensa, com toda aquela situação ela dizer: “Dou graças a Deus porque Ele me mantém viva”. Aquilo me chocou, num bom sentido. Quando você me perguntou agora me vieram esses dois flashes na cabeça; uma de entusiasmo, de animação, e a outra de profundidade teológica.

Deslocamento em canoa | Vatican News

Sobre repetir a experiência...

Com certeza. Eu já disse lá: eu falei olha, como a ideia é fazer a cada dois anos, já falei aqui para os padres formadores. Eu acho que todo mundo tem a chance de ir, mas se ninguém, eu vou! Eu falei eu vou, e vou voltar lá, e quero voltar quantas vezes for necessário. A gente indo lá, eu vi que precisa mesmo, precisa mesmo. Quanta Unção dos Enfermos, quanta Missa. Teve uma comunidade lá que eu rezei Missa que eles disseram que praticamente nunca tiveram, porque são núcleos, então ali não costuma ter. Então emociona a gente. Você vai num lugar e alguém diz que é a primeira Missa, ou uma das primeiras depois em tanto tempo. Então eu falei: olha, eu volto lá e vou voltar sim, quantas vezes eu puder, quantas vezes forem necessárias, e indico para quem quiser, porque areja, renova o ministério da gente, anima demais, entusiasma muito. Fez muito bem!

Sentimento de gratidão...

O sentimento de gratidão também agora, pela Arquidiocese de Manaus, que organizou, de uma forma brilhante a missão, e com o apoio dos seminaristas. Então tinha as comissões, os padres, mas os seminaristas deram um apoio fantástico prá gente lá. Buscou no aeroporto, levou no lugar da missão, depois foi buscar. Então a gente não teve preocupação nenhuma com relação à logística. A gente foi prá missão mesmo, a instalação lá no seminário muito confortável, eles se empolgam também em fazer a gente entrar na cultura, falar das frutas, do estilo de alimentação, de estilo de vida, de lugares para visitar, tanto que eu fui visitar – fomos – o chamado Musa, que é o Museu da Amazônia lá na cidade de Manaus que eles indicaram pra gente, também belíssimo. Então eu queria deixar esse sentimento de gratidão pela organização impecável, impecável da Arquidiocese de Manaus, e também do COMISE, dos Seminários do Brasil, porque foi algo assim muito bem organizado. Eu queria deixar assim esse sentimento de gratidão e votos - eu sei que é pesado - votos para que continuem organizando outras missões para a gente também.

Padre Alexandre Boratti Favretto* é incardinado na Diocese de Limeira, professor de Teologia na PUC de Campinas e agora também diretor da Faculdade de Teologia da PUC de Campinas. É pároco da Paróquia Bom Jesus de Araras e coordena a Escola de Teologia da Diocese de Limeira.

Fez o Mestrado foi na PUC de Campinas em Ciência da Religião, com o tema “Liberdade religiosa na Declaração Dignitatis humanae do Concílio Vaticano II” e o Doutorado na Universidade Gregoriana em Roma, com o tema sobre Teologia das Religiões: “A compreensão das religiões como mediações participadas, a partir da Encíclica de João Paulo II Redemptoris missio”.

Escolha um hábito pecaminoso para abandonar nesta Quaresma

Stenko Vlad | Shutterstock
Por Philip Kosloski

Em vez de renunciar aos doces, ataque um pecado específico para erradicá-lo da sua vida.

Por ser um tempo penitencial, é comum que muitos católicos, durante a Quaresma, se abstenham de guloseimas ou de prazeres lícitos, como ouvir música ou assistir a filmes.

Embora esse tipo de sacrifício seja bom e possa ajudar-nos a crescer em santidade, os diretores espirituais nos encorajam prioritariamente a mirar em algum pecado que devamos extirpar da nossa vida.

É até possível que comer doces seja o hábito pecaminoso que alguém precise erradicar da sua vida, mas, se olharmos mais a fundo, certamente encontraremos algum vício ainda mais pernicioso. Por exemplo, é provável que nos vejamos tentados frequentemente a participar de fofocas, a falar mal dos outros pelas costas ou a cair em “tentações digitais” como a pornografia – ou mesmo a responder de modo sarcástico e agressivo a cada postagem nas redes sociais.

Reconhecer um pecado habitual e decidir-se a combatê-lo com firmeza é um sacrifício profundamente frutífero.

Há quem se diga decidido a eliminar de uma só vez todos os seus hábitos pecaminosos. Esse tipo de objetivo genérico e vastamente abrangente, porém, costuma ser irreal – e é frequente que a pessoa termine desistindo e retornando desanimada aos seus pecados habituais, achando que nunca poderá ser santa ou até caindo no desespero.

É claro que viver em estado de graça é o chamado fundamental que Deus faz a todo cristão; logo, é claro que devemos renunciar a todo pecado. No entanto, também é um fato que, sendo humanos, precisamos progredir passo a passo, conscientes de que o processo de genuína conversão não é nada fácil. Assim, a nossa resposta ao chamado de Deus à santidade se torna mais praticável quando identificamos de modo honesto e humilde os nossos “pecados de estimação” e focamos em combatê-los com disciplina, por amor a Deus, começando pelas nossas paixões dominantes.

A Quaresma nos apresenta uma oportunidade perfeita para escolher um pecado específico e extirpá-lo com determinação.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES (3/16)

O cristianismo e as religiões | Politize!

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES

(1997)

1.2. A discussão sobre o valor salvífico das religiões

8. A questão de fundo é a seguinte: as religiões são mediação de salvação para seus membros? A essa pergunta há os que respondem negativamente; mais ainda, alguns nem sequer vêem sentido em que ela seja levantada. Outros dão uma resposta afirmativa que, por sua vez, provoca outras perguntas: as mediações salvíficas são autônomas ou é a salvação de Jesus Cristo que nelas se realiza? Trata-se, portanto, de definir o estatuto do cristianismo e das religiões como realidades socioculturais em relação com a salvação do homem. Não se deve confundir essa questão com a da salvação dos indivíduos, cristãos ou não. Nem sempre se levou devidamente em conta essa distinção.

9. Tentou-se classificar de muitas maneiras as diferentes posições teológicas diante desse problema. Vejamos algumas dessas classificações: Cristo contra as religiões, nas religiões, acima das religiões, junto às religiões. Universo eclesiocêntrico ou cristologia exclusiva; universo cristocêntrico ou cristologia inclusiva; universo teocêntrico com uma cristologia normativa; universo teocêntrico com uma cristologia não-normativa. Alguns teólogos adotam a divisão tripartite exclusivismoinclusivismopluralismo, que se apresenta como paralela a outra: eclesiocentrismocristocentrismoteocentrismo. Como temos de escolher uma dessas classificações para prosseguir nossa reflexão, ficaremos com esta última, mas a completaremos com as outras caso necessário.

10. O eclesiocentrismo exclusivista, fruto de determinado sistema teológico, ou de uma compreensão errada da frase "extra Ecclesiam nulla salus", já não é defendido pelos teólogos católicos depois das claras afirmações de Pio XII e do concílio Vaticano II sobre a possibilidade de salvação para os que não pertencem visivelmente à Igreja (cf. por exemplo LG 16; GS 22).

11. O cristocentrismo aceita que a salvação possa acontecer nas religiões, porém lhes nega uma autonomia salvífica devido à unicidade e universalidade da salvação de Jesus Cristo. Essa posição é sem dúvida a mais comum entre os teólogos católicos, embora haja diferenças entre eles. Procura conciliar a vontade salvífíca universal de Deus com o fato de que todo homem se realiza como tal dentro de uma tradição cultural, que tem na respectiva religião sua expressão mais elevada e sua fundamentação última.

12. O teocentrismo pretende ser uma superação do cristocentrismo, uma mudança de paradigma, uma revolução copernicana. Tal posição brota, entre outras razões, de certa má consciência devida à união da ação missionária do passado com a política colonial, embora olvidando às vezes o heroísmo que acompanhou a ação evangelizadora. Trata de reconhecer as riquezas das religiões e o testemunho moral de seus membros e, em última instância, pretende facilitar a união de todas as religiões para um trabalho conjunto pela paz e pela justiça no mundo. Podemos distinguir um teocentrismo em que Jesus Cristo, sem ser constitutivo, se considera normativo da salvação, e outro em que nem sequer se reconhece a Jesus Cristo tal valor normativo. No primeiro caso, sem negar que outros possam também mediar a salvação, reconhece-se em Jesus Cristo o mediador que melhor a exprime; o amor de Deus revela-se mais claramente em sua pessoa e em sua obra, e assim ele é o paradigma para os outros mediadores. Porém, sem ele não ficaríamos sem salvação, mas tão-só sem sua manifestação mais perfeita. No segundo caso, Jesus Cristo não é considerado nem como constitutivo nem como normativo para a salvação do homem. Deus é transcendente e incompreensível, de modo que não podemos julgar seus desígnios por nossos padrões humanos. Tampouco podemos avaliar ou comparar os diversos sistemas religiosos. O "soteriocentrismo" radicaliza ainda mais a posição teocêntrica, pois tem menos interesse na questão sobre Jesus Cristo (ortodoxia) e mais no compromisso efetivo de cada religião com a humanidade que sofre (ortopráxis). Desse modo, o valor das religiões está em promover o Reino, a salvação, o bem-estar da humanidade. Tal posição pode caracterizar-se, assim, como pragmática e imanentista.

Fonte: https://www.vatican.va/

"Trata bem dele!"

O Papa Francisco visita um doente | conventodapenha

“TRATA BEM DELE!”

Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora (MG) 

A Igreja celebra, anualmente, o Dia Mundial do Enfermo. Essa lembrança foi instituída pelo Papa São João Paulo II, para que o dia 11 de fevereiro fosse dedicado a lembrarmos dos nossos irmãos doentes, e para cobrarmos dos governos em todo o mundo para que olhem com a atenção necessária para a saúde.  

Em 2023, o tema escolhido pelo Papa Francisco para o 31º Dia Mundial do Enfermo é “Trata bem dele! A compaixão como exercício sinodal de cura”. O Santo Padre espera que assim como profetizou Ezequiel, no grande oráculo que culminou com toda a revelação do Senhor, nós também não nos percamos pela estrada, acometidos pelas experiências ruins da doença e da fragilidade humana. A Igreja deve caminhar junta e unida para não ceder à tentação do descarte da vida humana. 

Na mensagem para o ano de 2023, o Papa retoma a encíclica “Fratelli tutti”, para restaurar a leitura da parábola do Bom Samaritano. “Com efeito, há uma profunda conexão entre esta parábola de Jesus e as múltiplas formas em que é negada hoje a fraternidade. De modo particular, no fato da pessoa espancada e roubada acabar abandonada na estrada, podemos ver representada a condição em que são deixados tantos irmãos e irmãs nossos na hora em que mais precisam de ajuda. Não é fácil distinguir os atentados à vida e à sua dignidade que provêm de causas naturais e, ao invés, aqueles que são provocados por injustiças e violências. Na realidade, o nível das desigualdades e a prevalência dos interesses de poucos já incidem de tal modo sobre cada ambiente humano que é difícil considerar “natural” qualquer experiência. Cada doença realiza-se numa “cultura” por entre as suas contradições” – Mensagem anual do Papa Francisco (https://www.vatican.va/content/francesco/pt/messages/sick/documents/20230110-giornata-malato.html). 

Cabe a cada um de nós, religiosos e religiosas, leigos e leigas, encontrar e cumprir a nossa missão na Igreja em favor dos irmãos doentes. Seja por meio do trabalho pastoral, exercendo o voluntariado, ou mesmo visitando nossos amigos e familiares adoecidos. Todos precisam de conforto e acolhimento, precisam de uma mensagem de fé e de esperança, para saberem que não estão sozinhos, pois Deus é um Pai generoso que não abandona nenhum de seus filhos. 

A velhice também é um período de intenso isolamento. Vivemos tempos tristes, em que a experiência humana de nada ou pouco vale. Adoecidos e esquecidos, muitos idosos estão cheios de vida e de energia, dispostos a ensinar e a continuar aprendendo. A vulnerabilidade trazida pela doença é potencializada pela solidão. Assim, a fragilidade humana se torna ainda mais intensa se acontecer em um contexto de abandono. 

Nesse Dia Mundial do Enfermo, rezemos e entreguemos todas as aflições de nossa alma a Deus Pai. Como nos lembra Francisco em sua mensagem, “na realidade, sentimos dificuldade de permanecer em paz com Deus, quando se arruína a relação com os outros e com nós próprios. Por isso mesmo é tão importante, relativamente também à doença, que toda a Igreja se confronte com o exemplo evangélico do bom samaritano, para se tornar um válido “hospital de campanha”: com efeito a sua missão, especialmente nas circunstâncias históricas que atravessamos, exprime-se na prestação de cuidados. Todos somos frágeis e vulneráveis; todos precisamos daquela atenção compassiva que sabe deter-se, aproximar-se, cuidar e levantar. Assim, a condição dos enfermos é um apelo que interrompe a indiferença e abranda o passo de quem avança como se não tivesse irmãs e irmãos”. 

Os anos de pandemia muito nos ensinaram pela dor, também. Que sejamos gratos aos profissionais da saúde, enfermeiros e médicos que deram à vida em sacrifício pelos enfermos. Que possamos recomeçar, após tanta tragédia, lidando com a doença com outro olhar, um olhar amoroso de Cristo, que a todos acolheu, sem julgamentos, oferecendo a cura do corpo e da alma, principalmente. Não precisamos de heróis, mas de cristãos e cristãs dispostos a ir anunciar o Evangelho de Jesus, tirando da escuridão tantos corações que estão adoecidos. 

Que neste dia de Nossa Senhora de Lourdes, protetora dos doentes, possamos viver, efetivamente, na plenitude do amor, sem sermos indiferentes à dor do próximo.

O Papa: proclamar a Palavra num mundo muitas vezes surdo à voz de Deus

Mulher indiana lendo a Bíblia | Vatican News

Francisco recebeu, no Vaticano, uma delegação da Aliança Bíblica Universal e disse que "as perseguições se tornam ocasiões para difundir a Palavra, não para esquecê-la". "A difusão da Bíblia através da publicação de textos em várias línguas e sua distribuição nos vários continentes é um trabalho louvável", frisou o Papa.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta quinta-feira (16/02), no Vaticano, uma delegação da Aliança Bíblica Universal, acompanhada pelo secretário-geral do organismo, rev.do Dirk Gevers, e pelo prefeito do Dicastério para a Promoção da Unidade dos Cristãos, cardeal Kurt Koch.

Francisco iniciou sua saudação com as palavras de São Paulo na Primeira Carta aos Coríntios: «A graça do Senhor Jesus esteja convosco. Meu amor a todos vós em Cristo Jesus». Disse que "o livro dos Atos dos Apóstolos narra a difusão da Palavra de Deus após o evento pascal. Depois do Pentecostes, com a força da guia do Espírito Santo, os Apóstolos difundem o kerigma, explicam o significado das Escrituras à luz do mistério de Jesus Cristo e advertem contra quem as utiliza com más disposições ou por interesses mesquinhos".

As vicissitudes da Igreja nascente são semelhantes às de nossos dias. A Palavra é proclamada, ouvida e vivida em circunstâncias favoráveis ​​e desfavoráveis, de diversas formas e com diversas expressões, enfrentando sérias dificuldades e perseguições, num mundo muitas vezes surdo à voz de Deus.

"A Igreja nascente vive da Palavra, a anuncia e, perseguida, foge com ela como única bagagem. Assim, as perseguições se tornam ocasiões para difundir a Palavra, não para esquecê-la", disse ainda o Papa, recordando "os muitos cristãos que, em nosso tempo, são obrigados a fugir de sua terra. Homens e mulheres que, como os primeiros cristãos, fogem levando consigo a Palavra recebida. Guardam a sua fé como o tesouro que dá sentido às duras, às vezes terríveis circunstâncias que têm de enfrentar: abraçando a cruz de Cristo, veneram a Palavra de Deus que «dura para sempre»".

Queridos irmãos e irmãs, a "corrida" da Palavra de Deus continua também hoje, e vocês, com sua atividade, se colocam ao seu serviço. A difusão da Bíblia através da publicação de textos em várias línguas e sua distribuição nos vários continentes é um trabalho louvável. Os dados que vocês publicam são significativos. Estou feliz de saber que esta tarefa da Aliança Bíblica se realiza cada vez mais em colaboração com muitos católicos em vários países.

O Papa concluiu, pedindo ao Espírito Santo que sempre guie e sustente o serviço da Aliança Bíblica Universal. "Ele é capaz de revelar as profundezas de Deus, de modo que aqueles que se aproximam do texto sagrado «cheguem à obediência da fé», ao encontro com Deus, por meio de Jesus Cristo".

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

"A terra é dada a todos e não apenas aos ricos" (Sant'Ambrogio)

Pobreza extrema | anf.org.br
Arquivo 30Dias - 02/1998

"A terra é dada a todos e não apenas aos ricos" (Sant'Ambrogio)

O recente documento do Pontifício Conselho Justiça e Paz contra o latifúndio expressa posições corajosas ao repropor o conteúdo da Tradição.

por Gianni Valente

«Não é dos teus bens, afirma Santo Ambrósio, que dás um presente aos pobres; você só dá a ele o que pertence a ele. Pois é aquilo que é dado em comum para o uso de todos que você se apega. A terra é dada a todos, e não apenas aos ricos”. Corria o ano de 1967 quando Paulo VI, na encíclica Populorum progressio , repetia as palavras do santo que fora seu predecessor na cátedra de Milão para denunciar o roubo da terra, forma primeva daquela opressão dos pobres que, como dizia o toda a Tradição da Igreja, "clama por vingança na presença de Deus". Mais de trinta anos depois, um documento elaborado por um dicastério vaticano retoma alguns dos temas abordados na grande encíclica social de Paulo VI.

Por uma melhor distribuição da terra: o desafio da reforma agrária. Este é o título do texto elaborado após três anos de trabalho do Pontifício Conselho Justiça e Paz, apresentado em 13 de janeiro passado pelo cardeal Roger Etchegaray, presidente do dicastério vaticano que se ocupa das questões sociais. Uma denúncia do latifúndio, causa do crescente empobrecimento de parcelas muito grandes da população nos países em desenvolvimento, que segue documentos semelhantes publicados por numerosos episcopados de países latino-americanos, onde a questão agrária iniciada em meados do século passado continua a ser a figura fundamental da exploração social.
A estrutura do novo pronunciamento vaticano retoma o método de trabalho do ver-julgar-agir, esquema inaugurado na França pela Juventude Operária Cristã (JOC) na década de 1930 e retomado nas últimas décadas pelas Igrejas latino-americanas na abordagem social, econômicos e políticos.
A primeira parte é, de fato, uma descrição próxima e realista dos mecanismos de concentração da propriedade da terra. Descrevem-se as estruturas de exploração, as conexões do poder político-econômico, os custos humanos, ambientais e econômicos envolvidos no fenômeno. As opções de política econômica são avaliadas criticamente, como a industrialização e a urbanização em etapas forçadas em detrimento da agricultura, na ilusão de "modernizar" as economias nacionais dessa forma. Entre as razões do fracasso de tantas reformas agrárias abortadas, não se pode deixar de mencionar "a presença de importantes interesses estrangeiros, preocupados com uma reforma de suas atividades econômicas". E também a política de exportação agrícola,
Nesta primeira seção, os trechos mais explícitos e incisivos concentram-se no parágrafo sobre a expropriação das terras dos povos indígenas, onde são descritos os trágicos cenários atuais do noticiário latino-americano. "Na maioria dos casos" está escrito no parágrafo 11 "a difusão de grandes empreendimentos agrícolas, a construção de usinas hidrelétricas, a exploração de recursos minerais, petróleo e massas lenhosas de florestas nas áreas de expansão da fronteira agrícola foram decidido, planejado e executado ignorando os direitos dos habitantes indígenas". O parágrafo 12 denuncia a violência que os indígenas continuam sofrendo nos processos de acumulação de terras: «A elite latifundiária e as grandes empresas de exploração de recursos minerais e madeireiros não hesitaram, em muitas ocasiões, em instaurar um clima de terror para reprimir os protestos dos trabalhadores, forçados a ritmos desumanos de trabalho e remunerados com salários muitas vezes não cobrem as despesas de viagem, alimentação e hospedagem. O mesmo clima foi estabelecido para vencer conflitos com pequenos agricultores que cultivam há muito tempo terras estatais ou outras terras, ou para se apropriar de terras ocupadas por povos indígenas. Nessas lutas são usados ​​métodos de intimidação, prisões ilegais são feitas e, em casos extremos, grupos armados são contratados para destruir bens arrecadados, desautorizar lideranças comunitárias, livrar-se de pessoas, incluindo aqueles que defendem os fracos, incluindo muitos líderes da Igreja. Muitas vezes, os representantes do poder público são cúmplices diretos dessa violência. A impunidade dos perpetradores e instigadores de crimes é garantida pelas deficiências na administração da justiça e pela indiferença de muitos Estados em relação aos instrumentos jurídicos internacionais relativos ao respeito dos direitos humanos". O documento vaticano traz a data de 23 de novembro de 1997, festa de Cristo Rei. No dia 22 de dezembro seguinte, no povoado de Acetal, em Chiapas, uma quadrilha paramilitar contratada pelo poder local massacrou 45 católicos reunidos para rezar o rosário em uma cabana.

São Tomás e a terra aos camponeses «Ai de vós, que acrescentais casa a casa e ajuntais campo a campo», exclama Isaías. O seu contemporâneo Miquéias faz-lhe eco: «Eles são ávidos por campos e usurpam-nos, por casas, e tomam-nos. Assim oprimem o homem e sua casa, o dono e sua herança”. Nas invectivas dos profetas contra os abusos dos ricos podemos encontrar a antiga raiz do julgamento da Igreja sobre a propriedade da terra, objeto da segunda parte do documento. Já o Antigo Testamento, com a prática judaica do Jubileu, é atravessado pelo apelo incessante a reconhecer que a terra pertence a Deus, e o homem não é o seu verdadeiro senhor, mas apenas um administrador: "A terra é minha e vós estais com me como estranhos e inquilinos" ( Lev
25, 23). No cristianismo, a ilegitimidade do latifúndio não é mais apenas um dado da ordem da Criação, mas decorre da preferência pelos pobres. Daquela real preferência histórica que toda a Tradição reconhece inscrita no próprio mistério da preferência de Jesus Cristo pelos seus. As passagens mais efetivas e realistas do documento são justamente aquelas em que se repropõem os conteúdos e ensinamentos da Tradição, que sempre reconheceu no grito dos pobres oprimidos o mesmo grito de Jesus Cristo na cruz. Populorum progressio é citado de Paulo VI a repetir que «a terra é dada a todos e não só aos ricos», de modo que «ninguém está autorizado a reservar para seu uso exclusivo o que excede as suas necessidades, quando aos outros falta o necessário». Repropõe-se também o critério definido por São Tomás de Aquino e reafirmado pelo último Concílio Ecumênico, segundo o qual: "Aquele que se encontra em extrema necessidade tem o direito de obter o necessário dos bens alheios". À luz destes ensinamentos, "as formas de usurpação da terra por proprietários ou empresas nacionais e internacionais, por vezes apoiadas por organismos do Estado, que, espezinhando todos os direitos adquiridos e, não raras vezes, os próprios direitos legais, são condenadas à posse da terra,
O novo documento vaticano expressa juízos e posições socialmente corajosas e interessantes justamente nas passagens em que se limita a repropor na situação atual os conteúdos e ensinamentos da Tradição, os mesmos já reafirmados em documentos do magistério anterior, como o Populorum progressio. Ao contrário, mostra-se tímido e abstruso nos parágrafos em que, talvez com a intenção de parecer credível a economistas e Insider, assume os critérios de julgamento, fatalmente marcados pela ideologia liberal que hoje é hegemónica. Por exemplo, no que diz respeito à forma de organização do sistema econômico, o documento vaticano também declara legítimas as formas de exploração coletiva da terra, como a propriedade comunitária, “que caracteriza a estrutura social de numerosos povos indígenas”. Mas depois corrige e amortece esse reconhecimento, acrescentando que modelos semelhantes estão destinados a evoluir: enfrentar as posições expressas pela Populorum progressio ainda mais marcante. A hipoteca social que pesa sobre a propriedade privada, afirmada como princípio, permanece pura teoria no trato dos casos concretos. Paulo VI, na Populorum Progressio , havia minado com Santo Ambrósio o dogma da propriedade privada "inviolável", reconhecendo a legitimidade das expropriações ("O bem comum às vezes requer expropriação se, por sua extensão, escassa exploração ou nula... posses são um obstáculo à prosperidade coletiva»). O desafio do sim… embora

Até o novo pronunciamento vaticano admite em tese a legitimidade das expropriações, “mediante indenização adequada aos proprietários”. Mas no caso mais controverso e atual, o das ocupações de terra que no Brasil e em toda a América Latina há anos marca o conflito social entre fazendeiros e massas de camponeses sem-terra, há uma condenação substancial dos métodos dos sem-terra, ainda que adoçada com a linguagem ambígua das distinções e das atenuantes sociológicas. Deste ponto de vista, este documento também é um índice da mudança que ocorreu nos pronunciamentos eclesiásticos destes vinte anos. Na idade ... idade O catolicismo, segundo o qual a aplicação consistente de um verdadeiro princípio leva a ter em conta todos os fatores, é substituído pelo sim ... princípio claramente expresso é evacuado por Santo Ambrósio e São Tomás e reproposto pela Populorum progressio. De fato, segundo o pronunciamento vaticano, a ocupação de terrenos baldios, «mesmo quando situações de extrema necessidade a induzem, continua sendo um ato que não se conforma com os valores e regras de convivência civil. O clima de emoção coletiva que ela gera pode facilmente levar a uma sucessão de ações e reações que escapam a todo controle. Os atos de exploração que podem facilmente ocorrer têm muito pouco a ver com o problema da terra. A este encerramento segue-se a constatação de que em todo o caso a ocupação dos terrenos “é um indicador alarmante que apela à implementação, a nível social e político, de soluções eficazes e equitativas”.
A última seção do documento reafirma que a superação do latifúndio é apenas a primeira parte de uma efetiva reforma agrária. Para que os resultados sejam efetivos e duradouros, é necessário apoiar a redistribuição de terras com a garantia de acesso ao crédito bancário, e depois com a criação de infraestruturas que favoreçam a otimização da produção e posterior comercialização dos produtos. Desmistificam-se as virtudes milagrosas da liberalização comercial: «Sob certas condições, o desenvolvimento do comércio pode também ter um efeito agravante nas condições de vida daqueles que são economicamente desfavorecidos. Isso acontece, por exemplo.

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES (2/16)

O cristianismo e as religiões | Politize!

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES

(1997)

I. TEOLOGIA DAS RELIGIÕES (status quaestionis)

1.1. Objeto, método e finalidade

4. A teologia das religiões ainda não apresenta um estatuto epistemológico bem definido — e esta é uma das razões determinantes da atual discussão. Na teologia anterior ao Vaticano II, constatam-se duas linhas de pensamento em relação com o problema do valor salvífico das religiões. Uma, representada por Jean Daniélou, Henri de Lubac e outros, considera que as religiões se fundam na aliança com Noé, aliança cósmica que comporta a revelação de Deus na natureza e na consciência, diversa da aliança com Abraão. Enquanto mantêm os conteúdos dessa aliança cósmica, as religiões contêm valores positivos; porém, como tais, não têm valor salvífico. São "marcos de espera" (pierres d’attenté), mas também "de tropeço" (pierres d’achoppement), devido ao pecado. De si vão do homem a Deus. Só em Cristo e em sua Igreja alcançam seu cumprimento último e definitivo. A outra linha, representada por Karl Rahner, afirma que a oferta da graça, na ordem atual, alcança todos os homens, e que estes têm certa consciência, não necessariamente reflexa, de sua ação e de sua luz. Dada a característica de socialidade própria do ser humano, as religiões, enquanto expressões sociais da relação do homem com Deus, ajudam seus adeptos a acolher a graça de Cristo (fides implicita) necessária para a salvação, e a se abrirem assim para o amor do próximo que Jesus identificou com o amor de Deus. Podem ter, nesse sentido, valor salvífico, embora contenham elementos de ignorância, de pecado e de perversão.

5. Atualmente ganha força a exigência de ura maior conhecimento de cada religião antes de se poder elaborar uma teologia. Uma vez que em cada tradição religiosa se encontram elementos de origem e alcance bem diversos a reflexão teológica deve limitar-se a considerar fenômenos concretos e bem definidos, para evitar juízos globais e apriorísticos. Desse modo, alguns defendem uma teologia da história das religiões; outros levam em consideração a evolução histórica das religiões, suas respectivas especificidades, às vezes incompatíveis entre si; outros reconhecem a importância do material fenomenológico e histórico, sem contudo invalidar o método dedutivo; outros, ainda, se negam a dar um reconhecimento positivo global das religiões.

6. Numa época em que se aprecia o diálogo, a compreensão mútua e a tolerância, é natural surgir tentativas de elaborar uma teologia das religiões a partir de critérios aceitos por todos, isto é, que não sejam exclusivos de determinada tradição religiosa. Por isso, nem sempre se distinguem claramente as condições para o diálogo inter-religioso e os pressupostos básicos de uma teologia cristã das religiões. Para fugir dos dogmatismos procuram-se padrões exteriores, que permitam avaliar a verdade de uma religião. Os esforços realizados nessa direção não chegam a convencer. Se a teologia é fides quaerens intellectum, não se vê como se pode abandonar o "princípio dogmático" ou refletir teologicamente prescindindo das próprias fontes.

7. Perante essa situação, uma teologia cristã das religiões tem diante de si diversas tarefas. Em primeiro lugar, o cristianismo deverá procurar compreender-se e avaliar-se a si mesmo no contexto de Uma pluralidade de religiões; considerar concretamente a verdade e a universalidade reivindicadas por ele. Em segundo lugar, deverá buscar o sentido, a função e o valor próprio das religiões na totalidade da história da salvação. Finalmente, a teologia cristã deverá estudar e examinar as religiões concretas, com seus conteúdos bem definidos, que deverão ser confrontados com os conteúdos da fé cristã. Para tanto é necessário estabelecer critérios que permitam uma discussão crítica desse material e uma hermenêutica que o interprete.

Fonte: https://www.vatican.va/

“Não somos gerentes nem patrões, somos pastores”, diz cardeal sobre papel de bispos e padres

Cardeal Gérald Lacroix / Daniel Ibáñez (ACI Prensa)

Vaticano, 14 Fev. 23 / 03:24 pm (ACI).- O arcebispo de Québec, Canadá, cardeal Gérald Cyprien Lacroix, disse que o principal papel dos padres e bispos é ser pastores e estar a serviço dos leigos para ajudá-los a alcançar a santidade.

“Nosso principal papel é ser pastores, não somos gerentes, não somos patrões, somos pastores”, disse o cardeal Lacroix, durante a entrevista coletiva de apresentação do Congresso Internacional sobre a corresponsabilidade dos leigos na missão da Igreja que vai acontecer na Sala Nova do Sínodo de quinta-feira (16) até sábado (18).

O arcebispo canadense, que também é membro do dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, disse que a missão dos bispos e padres é a de "ajudar os fiéis e a nossa Igreja a encontrar Deus e a crescer na relação com Ele. Com a comunidade dos fiéis, ajudá-los a crescer no amor de Deus e formar e ajudar os nossos irmãos a testemunhar com sua vida nos encontros do mundo”, acrescentou.

“A nossa missão não é estar entre nós mesmos, mas crescer juntos na santidade, cada dia mais enraizados em Cristo e na palavra, na mensagem de nosso Deus e compartilhá-la com o mundo”, disse.

Para o cardeal, é necessário “ajudar os fiéis a crescerem na consciência de sua vocação batismal para se tornarem discípulos missionários”.

“Vamos a Deus, crescemos em Deus, e Ele nos envia, como enviou seus apóstolos e discípulos, a um mundo que precisa desta boa notícia”, disse o cardeal aos jornalistas presentes na entrevista coletiva.

Segundo o arcebispo canadense, “como pastores, precisamos nos concentrar nesta missão, para conduzir as pessoas à santidade”.

Ele disse ainda que "obviamente estamos trabalhando nisso há muito tempo, cerca de 2 mil anos, posso dizer, e continuamos trabalhando nisso porque há muitos desafios".

Segundo o cardeal Lacroix, “o papel dos pastores é fazer com que todos caminhemos juntos rumo ao objetivo de sermos discípulos missionários”.

“A corresponsabilidade é possível se caminharmos juntos e isso exige escuta, respeito, abertura e saber que o Espírito Santo pode ouvir a todos nós”, disse.

Para o arcebispo, “este é o desafio da Igreja hoje, precisamos ser capazes de caminhar na mesma direção, embora sejamos muito diferentes”.

“E os pastores precisam ajudar o povo de Deus a descobrir isso. É um desafio que exige conversão, coração aberto e melhores ouvidos para escutar”.

“Os leigos não estão a nosso serviço, estamos juntos, na missão da Igreja. Precisamos uns dos outros e temos que aprender a caminhar melhor”, concluiu o cardeal Lacroix.

Fonte: https://www.acidigital.com/

O segredo da cidade bósnia onde jamais houve um divórcio

Aleteia
Por Aleteia Brasil

Pense em famílias que não se separam. Pense na ausência de crianças machucadas ou corações dilacerados.

Pense num mundo sem divórcio. Pense em famílias que não se separam. Pense na ausência de crianças machucadas ou corações dilacerados.

O casamento é a vocação mais desafiadora que existe, e o divórcio está aumentando em toda parte. Mas há uma cidadezinha na Europa que é uma exceção – uma notável exceção – a esta estatística perturbadora.

Na cidade de Siroki-Brijeg, na Bósnia e Herzegovina, nenhum divórcio ou família separada jamais foi registrado entre os seus mais de 26 mil habitantes! Qual seria o segredo de seu sucesso?

(Nota do autor: algumas fontes dizem que a população de Siroki-Brijeg é de somente 13 mil pessoas – e quase 100% católica! Mas, após pesquisar mais a fundo, creio que o número real de habitantes seja mais que o dobro desse valor).

A resposta é a bela tradição matrimonial do povo croata de Siroki-Brijeg. Na verdade, a tradição croata de casamento está começando a chegar ao resto da Europa e aos Estados Unidos, especialmente entre católicos devotos que perceberam as bênçãos que ela confere!

O povo de Siroki-Brijeg sofreu cruelmente durante séculos, pois a sua fé cristã sempre foi ameaçada: primeiro, pelos turcos muçulmanos; depois, pelos comunistas. Eles aprenderam, por experiência própria, que a fonte da salvação chega através da Cruz de Cristo. Ela não chega através da ajuda humanitária, dos tratados de paz ou dos planos de desarmamento – ainda que essas coisas possam trazer benefícios limitados.

Essas pessoas possuem uma sabedoria que não permite que elas sejam ludibriadas nas questões de vida e morte. É por isso que elas conectaram indissoluvelmente o casamento à Cruz de Cristo. Elas fundamentaram o casamento, que gera a vida humana, sobre a Cruz, que gera a vida divina.

Quando os noivos vão à igreja para se casar, carregam um Crucifixo com eles. O padre abençoa o Crucifixo e, em vez de dizer que os noivos encontraram o parceiro ideal com quem dividirão as suas vidas, ele diz: “Vocês encontraram a sua Cruz! É uma Cruz para ser amada, para ser carregada com vocês. Uma Cruz que não é para ser descartada, mas para ser guardada no coração”.

Quando o casal faz os votos matrimoniais, a noiva coloca a sua mão direita sobre o Crucifixo, e o noivo coloca a sua mão direita por cima da dela. Eles são unidos entre si e unidos à Cruz. O padre cobre as suas mãos com a estola, enquanto eles fazem as suas promessas de amar um ao outro na alegria e na tristeza, proclamando fielmente os seus votos de acordo com os ritos da Igreja.

Depois, os dois beijam primeiro a Cruz, e não um ao outro. Se um abandonar o outro, ele abandona o Cristo na Cruz. Eles perdem Jesus! Após a cerimônia, os recém-casados atravessam a porta de casa para entronizar aquele mesmo Crucifixo num lugar de honra. Ele se torna o ponto de referência de suas vidas, e o local de oração da família. O jovem casal crê firmemente que a família nasce da Cruz.

Nos tempos de dificuldade e de desentendimento, os quais surgem em todos os relacionamentos humanos em algum momento, não é ao astrólogo, ao advogado ou ao terapeuta de casal a quem eles imediatamente recorrem. Eles se voltam para a Cruz. Eles se ajoelham, choram lágrimas de arrependimento e abrem os seus corações, suplicando pela força de perdoar um ao outro, e implorando pela ajuda do Senhor. Essas práticas piedosas foram aprendidas desde a época da infância.

Aqui as crianças são ensinadas a beijar reverentemente o Crucifixo todos os dias, e a agradecer ao Senhor pelo seu dia antes de irem para a cama. Essas crianças vão dormir sabendo que Jesus as está segurando em Seus braços, e que não há nada a temer. Os seus medos e diferenças, às vezes tão comuns entre irmãos, desaparecem quando beijam Jesus na Cruz. Elas sonham em entronizar um Crucifixo na sua própria casa algum dia.

A família permanece indissoluvelmente unida à Cruz de Cristo. Seria essa simplesmente uma perspectiva mórbida para a vida conjugal e familiar? Ou seria isso um pedaço de sabedoria que poucos em nosso mundo moderno podem compreender?

O Catecismo ensina que o amor deve ser permanente, ou então não é amor verdadeiro. Ele não é um sentimento que vem e que vai, mas um poder de doação que sobrevive até mesmo ao término do sentimento.

No casamento, não podemos depender de nossas forças humanas. Se acharmos que podemos, nós fracassaremos. A tentação invade qualquer casamento, de um jeito ou de outro. No dia do nosso casamento, é difícil imaginar uma situação em que tudo não seja perfeito. Mal sabem os jovens corações que eles estão embarcando numa aventura que atingirá os picos mais elevados e os vales mais profundos. E é justamente nos momentos passados nestes vales que um esforço heróico será exigido do casal para manter-se no rumo. Às vezes, será preciso até que um dos esposos tenha disciplina mental para trazer o outro de volta para o casamento.

Aqueles que estão passando ou que já passaram por essa situação reconhecem a necessidade da graça para perseverar durante a tempestade ou o silêncio. Haverá dias em que tudo parecerá perdido. Mas, então, um momento de verdadeira graça pode renovar o amor e a vitalidade no relacionamento, renovando também o vínculo sacramental. E é nesses tempos de sérias dificuldades que os esposos podem praticar o real sentido daquelas palavras, aparentemente proféticas, que agora estão sendo adicionadas a algumas cerimônias de casamento: “Pode beijar a Cruz”.

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Texto original: Catholicism Pure & Simple
Traduzido por Rogério Schmitt, em Modéstia e Pudor

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF