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segunda-feira, 6 de março de 2023

Preparação para o Sacramento do Matrimônio (4/6)

Sacramento do Matrimônio | Presbíteros

CONSELHO PONTIFÍCIO PARA A FAMÍLIA

PREPARAÇÃO PARA O SACRAMENTO DO MATRIMÔNIO

B. Preparação próxima

32. A preparação próxima desenrola-se durante o período do noivado. Articula-se em cursos específicos e é distinta da imediata, que geralmente se concentra nos últimos encontros entre os noivos e os agentes de pastoral, antes da celebração do matrimônio. Parece oportuno que, durante a preparação próxima, seja dada a possibilidade de verificar a maturidade dos valores humanos próprios da relação de amizade e de diálogo que caracterizam o noivado. Em vista do novo estado de vida que será vivida como casal, dê-se oportunidade para aprofundar a vida de fé e, sobretudo, aquilo que se refere ao conhecimento da sacramentalidade da Igreja. É esta uma etapa muito importante de evangelização, em que a fé deve incluir a dimensão pessoal e comunitária tanto dos noivos quanto de suas famílias. Nesse aprofundamento será também possível perceber as suas eventuais dificuldades em viver uma autêntica vida cristã.

33. O período desta preparação vem a coincidir em geral com a época da juventude; pressupõe-se portanto tudo o que é próprio da pastoral juvenil propriamente dita, que se ocupa do crescimento integral da fé. A pastoral juvenil não se pode separar do âmbito da família, como se os jovens formassem uma espécie de « classe social » separada e independente. Ela deve reforçar o sentido social dos jovens, em primeiro lugar com os membros da sua família, orientando os seus valores para a futura família que formarão. Os jovens terão já sido coadjuvados no discernimento da sua vocação através do empenho pessoal, e com a ajuda da comunidade, principalmente dos pastores. Isto deve iniciar-se ainda antes do compromisso do noivado. Quando a vocação se concretiza em direção ao matrimônio, será apoiada, em primeiro lugar, pela graça e depois por uma preparação adequada. A dita pastoral juvenil terá contudo presente que, por dificuldades de vários géneros, como o fato duma « adolescência prolongada » e, portanto, duma mais longa permanência na família – fenómeno novo e preocupante -, o compromisso matrimonial dos jovens de hoje, é, não poucas vezes, excessivamente adiado.

34. Tal preparação próxima deverá basear-se, antes de mais, numa catequese alimentada pela escuta da Palavra de Deus, interpretada com a orientação do Magistério da Igreja, em vista de uma compreensão cada vez mais plena da fé, e de um testemunho na vida concreta. O ensinamento deverá ser proposto no contexto de uma comunidade de fé entre famílias, especialmente no âmbito da paróquia, que – para tal fim – participam e colaboram segundo os próprios carismas e as próprias funções, para a formação dos jovens, alargando a sua influência a outros grupos sociais.

35. Os noivos deverão ser instruídos sobre as exigências naturais ligadas ao relacionamento interpessoal homem-mulher no plano de Deus sobre o matrimônio e sobre a família: o conhecimento em ordem à liberdade de consentimento como fundamento da sua união, a unidade e indissolubilidade matrimonial, a reta concepção de paternidade-maternidade responsável, os aspectos humanos da sexualidade conjugal, o ato conjugal com as suas exigências e finalidades, a reta educação dos filhos. Tudo isto orientado para o conhecimento da verdade moral e para a formação da consciência pessoal.

A preparação próxima deverá certamente prever que os noivos possuam os elementos basilares de carácter psicológico, pedagógico, legal e médico, concernentes ao matrimónio e à família. Todavia, especialmente no que se refere à doação total e à procriação responsável, a formação teológica e moral deverá ter um aprofundamento particular. De facto, o amor conjugal é amor total, exclusivo, fiel e fecundo (cf. Humanae Vitae, 9).

Hoje está firmemente reconhecida a base científica (2) dos métodos naturais de regulação da fertilidade. É útil o seu conhecimento; o seu emprego, quando existam causas justas, não deve permanecer mera técnica de comportamento, mas deve ser inserido na pedagogia e no processo de crescimento do amor (cf. EV 97). É então que a virtude da castidade entre os cônjuges leva a viver a continência periódica (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 2366-2371).

Esta preparação deverá contudo garantir que os noivos cristãos tenham ideias exatas, e um sincero « sentire cum ecclesia », sobre o próprio matrimónio, sobre os papéis mútuos da mulher e do homem no casal, na família e na sociedade, sobre a sexualidade e a abertura aos outros.

36. É também óbvio que se deverão ajudar os jovens a tomar consciência de eventuais carências psicológicas e ou afetivas, especialmente da incapacidade de abrir-se aos outros e de formas de egoísmo que possam tornar vão o empenho total da sua doação. Tal ajuda levará contudo a descobrir as potencialidades e exigências de crescimento humano e cristão da sua existência. Por isso, os responsáveis preocupar-se-ão também de formar solidamente a consciência moral dos noivos para que estejam preparados para a livre e definitiva escolha do matrimônio que se exprimirá no consentimento mutuamente dado diante da Igreja, por meio do pacto conjugal.

37. Durante este momento do itinerário serão necessários encontros frequentes, num clima de diálogo, de amizade, de oração, com a participação de pastores e de catequistas. Estes deverão sublinhar que « a família celebra o Evangelho da vida com a oração diária, individual e familiar: nela, agradece e louva o Senhor pelo dom da vida e invoca luz e força para enfrentar os momentos de dificuldade e sofrimento, sem nunca perder a esperança ». (EV 93). E, além disso, os casais de esposos cristãos apostolicamente empenhados, numa visual de são optimismo cristão, podem contribuir para iluminar cada vez melhor a vida cristã no contexto da vocação ao matrimônio e na complementaridade de todas as vocações. Este período, portanto, não será somente de aprofundamento teórico, mas antes um caminho de formação, no qual os noivos, com o auxílio da graça e fugindo a qualquer forma de pecado, se preparam para se doar a si mesmos, como casal, a Cristo que sustém, purifica, nobilita o noivado e a vida conjugal. Adquire assim sentido pleno a castidade pré-matrimonial, e outras expressões como o mariage coutumier no processo de crescimento do amor.

38. Segundo os sãos princípios pedagógicos da gradualidade e globalidade do crescimento da pessoa, a preparação próxima não deve desatender a formação para as tarefas sociais e eclesiais próprias daqueles que deverão, com o seu matrimónio, dar início às novas famílias. A intimidade familiar não seja concebida como intimismo fechado em si mesmo, mas antes como capacidade de interiorizar as riquezas humanas e cristãs, ingénitas na vida matrimonial em vista de uma cada vez maior doação aos outros. Por isso, a vida conjugal e familiar, numa concepção aberta da família, exige dos cônjuges que se reconheçam sujeitos que têm direitos mas também deveres para com a sociedade e a Igreja. A este respeito, será muito útil convidar a ler, e a refletir, os seguintes documentos da Igreja que são uma densa e encorajante fonte de sabedoria humana e cristã: a Familiaris Consortio, a Carta às Famílias Gratissimam Sana, a Carta dos Direitos da Família, a Evangelium Vitae e outros.

39. Assim, a preparação próxima dos jovens fará compreender que o empenho que vão assumir dando o seu consentimento « diante da Igreja », exige já no período do noivado que se inicie – abandonando, se tal for o caso, práticas contrárias – um caminho de fidelidade recíproca. Este empenho humano será valorizado pelos dons específicos que o Espírito Santo concede aos noivos que o invocam.

40. Visto que o amor cristão é purificado, aperfeiçoado e elevado pelo amor de Cristo para com a Igreja (cf. GS 49), os noivos imitem este modelo progredindo na consciência da doação, sempre ligada ao respeito mútuo e à renúncia de si que ajudam a crescer nele. Portanto, a doação recíproca envolve cada vez mais o intercâmbio de dons espirituais e apoio moral, para um crescimento no amor e na responsabilidade. « O dom da pessoa exige ser duradouro e irrevogável. A indissolubilidade do matrimônio deriva primariamente da essência de tal dom: dom da pessoa à pessoa. Nesta doação recíproca, manifesta-se o carácter esponsal do amor » (Gratíssimam Sane, 11).

41. A espiritualidade esponsal, envolvendo a experiência humana, nunca separada da vida moral, tem as suas raízes no Baptismo e na Confirmação. O itinerário de preparação dos noivos deverá, portanto, incluir uma recuperação dos dinamismos sacramentais com um papel particular dos sacramentos da Reconciliação e da Eucaristia. O sacramento da Reconciliação glorifica a misericórdia divina para com a miséria humana, faz crescer a vitalidade baptismal e os dinamismos próprios da Confirmação. Daqui o poder da pedagogia do amor redimido que faz descobrir com assombro a grandeza da misericórdia de Deus diante do drama do ser humano, criado por Deus e mais maravilhosamente remido. A Eucaristia, celebrando a memória da doação de Cristo à Igreja, desenvolve o amor afetivo próprio do matrimônio na doação quotidiana ao cônjuge e aos filhos, sem esquecer e deixar de atender a que « a celebração que dá significado a qualquer forma de oração e de culto é a que se exprime na existência quotidiana da família, quando esta é uma existência feita de amor e doação » (EV 93).

42. Para esta múltipla e harmônica preparação, é preciso encontrar e formar adequadamente encarregados « ad hoc ». Será oportuno, portanto, criar um grupo, a diversos níveis, de agentes que saibam ser enviados pela Igreja, constituído especialmente por casais de esposos cristãos, entre os quais não faltem, possivelmente peritos em medicina, em leis, em psicologia, com um presbítero, para que sejam preparados para as funções a desempenhar.

43. Por isso, os colaboradores e responsáveis sejam pessoas de doutrina segura e fidelidade indiscutível ao Magistério da Igreja, de modo que possam transmitir, com um conhecimento suficiente e aprofundado e com o testemunho de vida, as verdades de fé e as responsabilidades ligadas ao matrimónio. É mais do que óbvio que estes agentes pastorais, enquanto educadores, deverão estar também providos de capacidade de acolhimento aos noivos, qualquer que seja o seu estrato sociocultural, a sua formação intelectual e capacidades concretas. Além disso, o seu testemunho de vida fiel e de alegre doação é uma condição indispensável para desempenharem o seu cargo. Estas experiências de vida e os seus problemas humanos poderão ser ponto de partida para iluminar os nubentes com sabedoria cristã.

44. Isto implica um adequado programa de formação dos agentes. Tal preparação destinada aos formadores torná-los-á idóneos para expor, com adesão clara ao Magistério da Igreja, com metodologia idónea e com sensibilidade pastoral, as linhas fundamentais da preparação para o matrimónio, de que falámos, e levar também o contributo específico, segundo a sua competência, à preparação imediata, conforme os nn. 50-59. Os agentes deverão receber a sua formação em Institutos Pastorais expressamente para esse fim, e deverão ser cuidadosamente escolhidos pelo Bispo.

45. Assim, o resultado final deste período de preparação próxima será constituído por um claro conhecimento das notas essenciais do matrimônio cristão: unidade, fidelidade, indissolubilidade, fecundidade; a consciência de fé sobre a prioridade da Graça sacramental, que associa os esposos, sujeitos e ministros do sacramento, ao Amor de Cristo Esposo da Igreja; a disponibilidade em viver a missão própria das famílias no campo educativo social e eclesial.

46. Como recorda a Familiaris Consortio, o itinerário formativo dos jovens noivos deverá, por isso, prever: o aprofundamento da fé pessoal e a redescoberta dos valores dos sacramentos e experiência de oração; a preparação específica para a vida a dois « que, apresentando o matrimônio como uma relação interpessoal do homem e da mulher em contínuo desenvolvimento, estimule a aprofundar os problemas da sexualidade conjugal e da paternidade responsável, com os conhecimentos médico-biológicos essenciais que lhe estão anexos, e os leve à familiaridade com métodos adequados de educação dos filhos, favorecendo a aquisição dos elementos de base para uma condução ordenada da família » (FC 66); a « preparação para o apostolado familiar, para a fraternidade e colaboração com as outras famílias, para a inserção ativa nos grupos, associações, movimentos e iniciativas que têm por finalidade o bem humano e cristão da família » (ibid.).

Além disso, os nubentes sejam ajudados preventivamente, de modo a poderem depois manter e cultivar o amor conjugal; a comunicação interpessoal-conjugal; as virtudes e dificuldades da vida conjugal; e como superar as inevitáveis « crises » conjugais.

47. Todavia, o centro de tal preparação deverá ser constituído pela reflexão na fé, através da Palavra de Deus e da orientação do Magistério, sobre o sacramento do Matrimônio. Dar-se-ão portanto aos nubentes a consciência de que o tornar-se « una caro » (Mt 19, 6) em Cristo, na força do Espírito, com o matrimônio cristão, significa imprimir à própria existência uma nova conformação da vida batismal. O seu amor tornar-se-á, com o sacramento, expressão concreta do amor de Cristo pela sua Igreja (cf. LG 11). À luz da sacramentalidade, os próprios atos conjugais, a procriação responsável, a ação educativa, a comunhão de vida, a apostolicidade e a missionaridade ligadas à vida dos cônjuges cristãos, são considerados momentos válidos de experiência cristã. Cristo, embora de modo não ainda sacramental, sustenta e acompanha o itinerário de graça e de crescimento dos noivos para a participação no seu mistério de união com a Igreja.

48. A propósito de um eventual diretório, que recolha as melhores experiências em ordem à preparação para o matrimônio, parece oportuno recordar o que o Santo Padre João Paulo II disse no discurso de conclusão da Assembleia Plenária do Conselho Pontifício para a Família, realizada de 30 de Setembro a 5 de Outubro do ano de 1991: « É indispensável que à preparação doutrinal sejam dados o tempo e os cuidados necessários. A segurança do conteúdo deve ser o centro e o objetivo essencial dos cursos, numa perspectiva que torne mais consciente a celebração do Matrimônio e tudo o que dele brota em relação à responsabilidade da família. As questões relativas à unidade e à indissolubilidade do matrimônio, e aquilo que se refere ao significado da união e da procriação da vida conjugal e do seu ato específico, devem ser tratadas com fidelidade e diligência, segundo o ensinamento claro da Encíclica Humanae Vitae (cf. 11-12). Igualmente, tudo o que se refere ao dom da vida, que os pais devem acolher de maneira responsável, com alegria, como colaboradores do Senhor. É bom que nos cursos seja privilegiado não só o que se refere a uma liberdade madura e vigilante daqueles que desejam contrair matrimônio, mas também à missão própria dos pais, primeiros educadores dos filhos e primeiros evangelizadores ».

Este Conselho Pontifício constata, com profunda satisfação, que cresce a corrente que leva a um maior empenho e consciência da importância e dignidade do noivado. De forma semelhante exorta que a duração dos cursos específicos não seja de tal modo breve que se reduzam a uma simples formalidade. Deverá, pelo contrário, dar-se o tempo suficiente para uma boa e clara apresentação dos assuntos fundamentais acima indicados.3

O curso pode ser realizado nas paróquias se o número de noivos for suficiente e se houver colaboradores preparados, ou nas Vigararias episcopais ou Vigararias forâneas, formas ou estruturas de coordenação paroquial. Às vezes podem ser realizados por encarregados dos Movimentos familiares, Associações ou grupos apostólicos orientados por um sacerdote competente. É um campo que deveria ser coordenado pelo organismo diocesano, que opere em nome do Bispo. Os conteúdos, sem esquecer aspectos vários da psicologia, da medicina e de outras ciências humanas, devem ser centrados sobre a doutrina natural e cristã do matrimônio.

49. Nesta preparação, especialmente hoje, é necessário formar e fortalecer os nubentes nos valores que se referem à defesa da vida. De modo peculiar pelo facto de se tornarem igreja doméstica e « Santuário da vida » (EV 92-94) farão parte a novo título do « povo da vida e pela vida » (EV 6, 101). A mentalidade contraceptiva, que hoje impera em tantos lugares, e as legislações permissivas espalhadas, com tudo o que comportam de desprezo pela vida desde o momento da concepção até à morte, constituem um conjunto de ataques múltiplos a que a família está exposta, ferindo-a no mais íntimo da sua missão e impedindo o seu desenvolvimento segundo as exigências de um autêntico crescimento humano (cf. Centesimus Annus, 39). Portanto, hoje mais do que nunca, é necessária uma formação da mente e do coração dos componentes e novos lares domésticos para não se conformarem com as mentalidades dominantes. Poderão assim contribuir um dia, com a sua vida de novas famílias, para criar e desenvolver a cultura da vida, respeitando e acolhendo, no íntimo do seu amor, as novas vidas como testemunho e expressão do anúncio, celebração e serviço para com cada vida (cf. EV 83-84, 86, 93).

Alfonso Card. López Trujillo
Presidente do Conselho Pontifício
para a Família

+ S.E.R. Mons. Francisco Gil Hellín
Secretário

Fonte: https://presbiteros.org.br/

O Papa aos futuros sacerdotes: sejam sempre sinal de uma Igreja em saída

O Papa Francisco com a comunidade do Seminário Diocesano
"Saint Mary" da Diocese de Cleveland, EUA  (Vatican Media)

Ao receber em audiência, nesta segunda-feira, a comunidade do Seminário Diocesano “Saint Mary” de Cleveland, Francisco destacou três características do caminho sinodal que são essenciais para a formação dos futuros sacerdotes e ministros do Evangelho: escuta do Senhor, caminhar juntos e testemunho.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira (06/03), na Sala Clementina, no Vaticano, a comunidade do Seminário Diocesano “Saint Mary” da cidade de Cleveland, Estado de Ohio, nos Estados Unidos.

A visita da comunidade a Roma se realiza no âmbito dos 175 anos de fundação desse seminário. "Alegra-me saber que o Seminário continua respondendo às necessidades atuais da Igreja, educando e formando diáconos e ministros leigos para ajudar os membros do Santo Povo de Deus a viverem o seu chamado a serem discípulos missionários. Este apelo assume uma importância cada vez maior à luz do caminho sinodal que toda a Igreja empreendeu", disse Francisco em seu discurso.

A seguir, o Papa partilhou com os membros do Seminário “Saint Mary” algumas reflexões sobre três características do caminho sinodal que são essenciais para a formação dos futuros sacerdotes e ministros do Evangelho.

Escutar a voz de Deus e discernir é indispensável

"A primeira característica é a escuta do Senhor", sublinhou o Papa. Portanto, é necessário "abrir espaço todos dias da nossa vida ao Senhor, meditar a sua Palavra, passar tempo com Ele em oração, escutando-O em silêncio diante do Tabernáculo".

Com efeito, escutar a voz de Deus no fundo do coração e discernir a sua vontade é indispensável para o nosso crescimento interior, sobretudo quando nos deparamos com tarefas urgentes e difíceis. A este propósito, a vida no seminário lhes oferece a possibilidade de cultivar o hábito da oração que os servirá no futuro ministério. Ao mesmo tempo, a escuta do Senhor envolve também responder com fé a tudo o que Ele revelou e que a Igreja transmite, para que se possa ensinar e anunciar aos outros a verdade e a beleza do Evangelho de modo autêntico e alegre.

Caminhar com o rebanho significa com todos

A segunda característica do caminho sinodal proposta pelo Papa é caminhar juntos. Segundo Francisco, o tempo de formação no seminário é ocasião para aprofundar o espírito de comunhão fraterna, não só entre seus membros, mas também com o bispo, com o clero local, com os consagrados e leigos, e com a Igreja universal. "Devemos nos reconhecer como parte de um único grande povo que recebeu as promessas de Deus como um dom, não como um privilégio", frisou o Papa, ressaltando que "o bom pastor caminha junto com o rebanho: às vezes à frente, para indicar o caminho; às vezes no meio, para incentivar, e às vezes atrás, para acompanhar os que estão em dificuldade. Lembrem-se sempre de que é importante caminhar com o rebanho, nunca separados dele."

Ser sempre sinal de uma Igreja em saída

Por fim, a terceira característica: o testemunho. "A escuta de Deus e o caminhar junto com os outros dão fruto ao se tornarem sinais vivos de Jesus presente no mundo. Que os anos passados ​​no seminário preparem vocês para uma entrega total a Deus e ao seu povo santo, no amor celibatário e com o coração indiviso", disse ainda Francisco, acrescentando:

A Igreja precisa do seu entusiasmo, da sua generosidade e do seu zelo para mostrar a todos que Deus está sempre conosco, em todas as circunstâncias da vida. Rezo para que, nas várias formas de apostolado educativo e caritativo em que vocês estão engajados, vocês sejam sempre sinal de uma Igreja em saída, testemunhando e partilhando o amor misericordioso de Jesus com todos os membros da família humana, especialmente os pobres e necessitados.

Santa Rosa de Viterbo

Santa Rosa de Viterbo | arquisp
06 de março

Santa Rosa de Viterbo

Rosa viveu numa época de grandes confrontos, entre os poderes do pontificado e do imperador, somados aos conflitos civis provocados por duas famílias que disputavam o governo da cidade de Viterbo. Ela nasceu nesta cidade num dia incerto do ano de 1234. Os pais, João e Catarina, eram cristãos fervorosos. A família possuía uma boa propriedade na vizinha Santa Maria de Poggio, vivendo com conforto da agricultura.

Envolta por antigas tradições e sem dados oficiais que comprovem os fatos narrados, a vida de Rosa foi breve e incomum. Como sua mãe, Catarina, trabalhava com as Irmãs Clarissas do mosteiro da cidade, Rosa recebeu a influência da espiritualidade franciscana, ainda muito pequena. Ela era uma criança carismática, possuía dons especiais e um amor incondicional ao Senhor e a Virgem Maria. Dizem que com apenas três anos de idade transformava pães em rosas e aos sete, pregava nas praças, convertendo multidões. Aos doze anos ingressou na Ordem Terceira de São Francisco, por causa de uma visão em que Nossa Senhora assim lhe determinava.

No ano de 1247 a cidade de Viterbo, fiel ao Papa, caiu nas mãos do imperador Frederico II, um herege, que negava a autoridade do Papa e o poder do Sacerdote de perdoar os pecados e consagrar. Rosa teve outra visão, desta vez com Cristo que estava com o coração em chamas. Ela não se conteve, saiu pelas ruas pregando com um crucifixo nas mãos. A notícia correu toda cidade, muitos foram estimulados na fé, e vários hereges se converteram. Com suas palavras confundia até os mais preparados. Por isto, representava uma ameaça para as autoridades locais.

Em 1250, o prefeito a condenou ao exílio. Rosa e seus pais foram morar em Soriano onde sua fama já havia chegado. Na noite de 5 de dezembro 1251, Rosa recebeu a visita de um anjo, que lhe revelou que o imperador Frederico II, uma semana depois, morreria. O que de fato aconteceu. Com isto, o poder dos hereges enfraqueceu e Rosa pode retornar a Viterbo. Toda a região voltou a viver em paz. No dia 6 de março de 1252, sem agonia, ela morreu.

No mesmo ano, o Papa Inocêncio IV, mandou instaurar o processo para a canonização de Rosa. Cinco anos depois o mesmo pontífice mandou exumar o corpo, e para a surpresa de todos, ele foi encontrado intacto. Rosa foi transladada para o convento das Irmãs Clarissas que nesta cerimônia passou a se chamar, convento de Santa Rosa. Depois desta cerimônia a Santa só foi "canonizada" pelo povo, porque curiosamente o processo nunca foi
promulgado. A canonização de Rosa ficou assim, nunca foi oficializada.. Mas também nunca foi negada pelo Papa e pela Igreja. Santa Rosa de Viterbo, desde o momento de sua morte, foi "canonizada" pelo povo.

Em setembro de 1929, o Papa Pio XI, declarou Santa Rosa de Viterbo a padroeira da Juventude Feminina da Ação Católica Italiana . No Brasil ela é A Padroeira dos Jovens Franciscanos Seculares. Santa Rosa de Viterbo é festejada no dia de sua morte, mas também pode ser comemorada no dia 4 de setembro, dia do seu translado para o mosteiro de Clarissas de Santa Rosa, em Viterbo, Itália.

*Fonte: Pia Sociedade Filhas de São Paulo Paulinas http://www.paulinas.org.br

https://arquisp.org.br/

domingo, 5 de março de 2023

“Procedei como filhos da luz. E o fruto da luz é toda espécie de bondade e de justiça e de verdade.” (Ef 5,9)

Palavra de Vida - Março 2023 | Focolares

“Procedei como filhos da luz. E o fruto da luz é toda espécie de bondade e de justiça e de verdade.” (Ef 5,9) | Palavra de Vida Março 2023

por Letizia Magri com a comissão da Palavra de Vida   publicado em 24/02/2023

Paulo escreve à comunidade de Éfeso, uma grande e imponente cidade da Turquia, onde tinha vivido, batizando e evangelizando. 

Agora, por volta do ano 62, provavelmente ele está em Roma, como prisioneiro. Sua situação é de sofrimento. Mesmo assim, ele escreve a esses cristãos, não tanto para resolver os problemas da comunidade, quanto para anunciar-lhes a beleza do projeto de Deus para a Igreja nascente.

Ele lembra aos efésios que, pelo dom do batismo e da fé, eles passaram da situação de “ser trevas” para a de “ser luz”, e os encoraja a se comportarem de forma coerente.

Para Paulo, trata-se de percorrer um caminho, de crescer constantemente no conhecimento de Deus e da sua amorosa vontade. É recomeçar, dia após dia.

Portanto, quer exortá-los a viverem na vida cotidiana de acordo com o chamado que receberam: serem “imitadores de Deus como filhos queridos”1: santos, misericordiosos.

“Procedei como filhos da luz. E o fruto da luz é toda espécie de bondade e de justiça e de verdade.” 

Também nós, cristãos do século XXI, somos chamados a “sermos luz”. Mas podemos nos sentir inadequados, condicionados pelas nossas limitações ou dominados pelas circunstâncias externas.

Como, então, caminhar com esperança, apesar das trevas e das incertezas que às vezes parecem nos dominar?

Paulo continua nos encorajando: é a Palavra de Deus vivida que nos ilumina e nos torna capazes de “brilhar como luzeiros”2 nesta humanidade desnorteada.

“Como um outro Cristo, cada homem e cada mulher pode dar a sua contribuição [...] em todos os campos da atividade humana: na ciência, na arte, na política. […] Se acolhermos a sua Palavra, estaremos cada vez mais sintonizados com os seus pensamentos, com os seus sentimentos, com os seus ensinamentos. A Palavra ilumina todas as nossas atividades, retifica e corrige todas as expressões da nossa vida. [...] O nosso “homem velho” (cf. Rm 6,6) está sempre pronto a se fechar no seu próprio mundo, a cultivar os pequenos interesses pessoais, a se esquecer das pessoas que passam ao nosso lado, a ficar indiferente diante do bem público, das exigências da humanidade que nos rodeia. Portanto, vamos reacender em nosso coração a chama do amor, e assim teremos olhos novos para ver o que acontece ao nosso redor.3

“Procedei como filhos da luz. E o fruto da luz é toda espécie de bondade e de justiça e de verdade.”

A luz do Evangelho vivido por indivíduos e comunidades traz esperança e fortalece os laços sociais, inclusive quando calamidades como a Covid-19 causam sofrimento e agravam as situações de pobreza.

Nas Filipinas, como nos conta Júlio, no auge da pandemia, uma comunidade foi devastada por um incêndio e muitas famílias perderam tudo: “Apesar de sermos pobres, minha esposa Florinda e eu sentíamos um grande desejo de ajudar. Então compartilhei essa situação com o grupo de motociclistas do qual faço parte, mesmo sabendo que eles estavam sofrendo como nós. Isso não impediu que meus amigos arregaçassem as mangas: arrecadamos sardinha em lata, macarrão, arroz e outros alimentos, que doamos às vítimas dos incêndios.

Muitas vezes, minha esposa e eu nos sentimos desencorajados ao pensar naquilo que o futuro reserva para nós, mas sempre nos lembramos da frase do Evangelho que diz: ‘Quem quiser salvar sua vida a perderá; mas quem perder sua vida por causa de mim e do Evangelho, a salvará’4. Embora não sejamos ricos, acreditamos que sempre temos algo a compartilhar por amor a Jesus no outro. É esse amor que nos impulsiona a continuar a doar com sinceridade e a confiar no amor de Deus”.

Resumindo, portanto, é deixar-se iluminar no fundo do coração. Os bons frutos deste caminho – bondade, justiça e verdade – agradam aos olhos do Senhor e se tornam testemunho da vida sublime do Evangelho, mais do que qualquer discurso.

E não esqueçamos o apoio que recebemos de todos aqueles com os quais compartilhamos esta “Santa Viagem” da vida. O bem que recebemos, o perdão mútuo que experimentamos, a partilha de bens materiais e espirituais que podemos viver: tudo isso são ajudas preciosas, que nos abrem à esperança e nos tornam testemunhas.

Jesus prometeu: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim dos tempos”5.

Ele, o Ressuscitado, fonte de nossa vida cristã, está sempre conosco na oração comum e no amor recíproco, aquecendo nosso coração e iluminando nossa mente.

Por Letizia Magri com a comissão da Palavra de Vida 

1) Cf. Ef 5,1.

2) Cf. Fl 2,15.

3) LUBICH, Chiara, Cidadania de amor, Palavra de Vida, setembro de 2005. 

4) Cf. Mc 8,35.

5) Cf. Mt 28,20.

A Escritura precisa ser procurada

A Escritura precisa ser procurada | arquicascavel

A ESCRITURA PRECISA SER PROCURADA

Dom Adelar Baruffi
Arcebispo de Cascavel (PR)

A Escritura precisa ser procurada! Vejamos o Capítulo 3, Animação Bíblica da Pastoral a partir das comunidades eclesiais missionárias, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, 2022, n.38 a 89. Já falei sobre a necessidade de procurar a Palavra de Deus, onde ela se encontra. Você já pensou o motivo que levou tanta gente a buscar a Leitura Orante da Palavra? Foram, de fato, muitas pessoas. Porque é que nós, cristãos católicos, temos menos amor pela Sagrada Escritura quanto temos pela Eucaristia? Então, temos os dois: a Palavra de Deus e a Eucaristia.

O Papa Francisco, na Evangelii Gaudium, retoma um pensamento de Bento XVI: “Ao início do ser cristão , não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo” (EG, n.8). O mais importante numa Escritura é Ele, é Jesus Cristo. Sua vida, sua pessoa e seus ensinamentos. Tudo dele. Nenhuma outra pessoa ou acontecimento é maior do que Jesus Cristo na Bíblia. E, nele, a Trindade Santa: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Aliás, quando fores começar a ler a Escritura, atenção, não comece pelo Gênesis. Inicie pelos quatro evangelistas, (Mateus, Marcos, Lucas e João) pois eles nos falam de Jesus Cristo. Este anúncio fundamental, precisa ser reconhecido e ligado com todos os santos e a Virgem Maria, nossa mãe querida. “Toda a pessoa tem o direito de receber explicitamente o primeiro anúncio, para realizar então o seu encontro pessoal com o Cristo Senhor” (n.52). É nele que nos é dito que somos filhos amados por Deus, salvos por Ele, conduzidos até Ele no dia de nossa salvação. Isto tudo está na Sagrada Escritura, a Palavra de Deus conosco.

A Igreja nos oferece várias contribuições, quanto ao fundamentalismo. “O princípio é esse: Deus nos falou, na Escritura, por seres humanos. A Palavra foi dita por palavras” (n. 63). Sempre o centro de toda a Escritura é o evangelho, por isso, ele é proclamado na Eucaristia, após as leituras e depois explicado. “Nestes últimos anos, temos assistido a um fenômeno que causa profunda preocupação: a relação entre Bíblia e pensamento da prosperidade. (…) Tudo isso tem sido justificado por uma atitude de troca com Deus” (n.65). O desejo de ter Deus nas mãos é muito grande. “Esta atitude não gera pertença a uma comunidade eclesial. Gera contínua migração ou trânsito religioso, em busca de propriedade, onde quer que ela esteja. Quando isso acontece, a própria comunidade vira empresa que explora” (n.67).

Enfim, a espiritualidade bíblica, centrada na pessoa de Jesus Cristo. Nele, a dimensão pessoal, afetiva, fé e vida, interior e exterior, eclesial, societária e cósmica. “Estimule-se uma hermenêutica bíblica que consiga reconciliar a Palavra de Deus com a Escritura; costurar Palavra de Deus e Eucaristia; unir verdade, beleza e bondade; integrar estudo, oração e pregação; coligar escuta, discernimento e vivência; (…)” (n.77). Repetindo, Jesus Cristo é o centro da Escritura. A Sagrada Escritura foi escrita durante mil anos, passou pela evolução de pensamentos, teologia e costumes. Muitas e muitas pessoas envolvidas. Ao menos três línguas usadas. E tudo, até chegar a Jesus Cristo!

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES (12/16)

O cristianismo e as religiões | Politize!

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL

O CRISTIANISMO E AS RELIGIÕES

(1997)

III. CONSEQÜÊNCIAS PARA UMA TEOLOGIA CRISTÃ DAS RELIGIÕES

80. Uma vez estudada a mediação universal de Cristo, a universalidade do dom do Espírito, a função da Igreja na salvação de todos, temos os elementos para esboçar uma teologia das religiões. Diante da nova situação criada pelo pluralismo religioso, retoma-se a pergunta pela significação universal de Jesus Cristo também em relação com as religiões e a função que estas podem ter no desígnio de Deus, que não é outro senão o de recapitular todas as coisas em Cristo (cf. Ef 1,10). Não é de estranhar que velhos temas da tradição sejam utilizados para iluminar as novas situações. Positivamente, é necessário ter presente a significação universal de Jesus e de seu Espírito e também da Igreja. Com efeito, esta última anuncia o evangelho, está a serviço da comunhão entre todos e representa toda a humanidade mediante seu serviço sacerdotal na celebração litúrgica do mistério pascal. Negativamente, esta universalidade é exclusiva: nem há um Logos que não seja Jesus nem há um Espírito que não seja o Espírito de Cristo. Nessas coordenadas se inscrevem os problemas concretos que a seguir serão tratados. Estudaremos alguns dos pontos já indicados no status quaestionis.

III. 1. O valor salvífico das religiões

81. Atualmente não é objeto de discussão a possibilidade de salvação fora da Igreja daqueles que vivem segundo sua consciência. Tal salvação, como se viu na exposição precedente, não se produz com independência de Cristo e de sua Igreja. Funda-se na presença universal do Espírito, que não pode se desligar do mistério pascal de Jesus (cf. GS 22; RM 10 etc). Alguns textos do Vaticano II tratam especificamente das religiões não-cristãs: os que ainda não receberam o evangelho estão ordenados de diversos modos ao povo de Deus, e a pertença às diversas religiões não parece indiferente aos efeitos dessa "ordenação" (cf. LG 16). Reconhece-se que nas diversas religiões existem raios da verdade que ilumina todo homem (cf. NA 2),sementes do Verbo (cf. AG 11); pela disposição de Deus há nelas coisas boas e verdadeiras (cf. OT 16); encontram-se elementos de verdade, de graça e de bem não somente nos corações dos homens, mas também nos ritos e nos costumes dos povos, não obstante tudo deva ser "sanado, elevado e completado" (AG 9;LG 17). Se as religiões como tais podem ter valor em ordem à salvação é um ponto que fica aberto.

82. A encíclica Redemptoris missio, seguindo e desenvolvendo a linha do Concílio Vaticano II, salientou com mais clareza a presença do Espírito Santo não só nos homens de boa vontade considerados individualmente, mas também na sociedade e na história, nos povos, nas culturas, nas religiões, sempre com referência a Cristo (cf. RM 28; 29). Existe uma ação universal do Espírito, que não pode separar-se nem tampouco confundir-se com a ação peculiar que desenvolve no corpo de Cristo que é a Igreja (ibid.). Da disposição do capítulo III da encíclica intitulado "O Espírito Santo como protagonista da missão", parece deduzir-se que essas duas formas de presença e ação do Espírito derivam do mistério pascal. Com efeito, fala-se da presença universal nos números 28-29, depois de se ter desenvolvido a idéia da missão impulsionada pelo Espírito Santo (nn. 21-27). No final do número 28, afirma-se claramente que é Jesus ressuscitado o que atua no coração dos homens em virtude de seu Espírito, e que é o mesmo Espírito que distribui as sementes do Verbo presentes nos ritos e nas religiões. A diferença entre os dois modos de ação do Espírito Santo não pode levar à sua separação, como se só o primeiro estivesse em relação com o mistério salvífico de Cristo.

83. Novamente se fala da presença do Espírito e da ação de Deus nas religiões em RM55-56, no contexto do diálogo com os irmãos de outras religiões. As religiões constituem um desafio para a Igreja, pois a estimulam a reconhecer os sinais da presença de Cristo e da ação do Espírito. "Deus chama a si todos os povos em Cristo, querendo comunicar-lhes a plenitude de sua revelação e de seu amor; e não deixa de fazer-se presente de muitas maneiras não só aos indivíduos concretos, mas também aos povos mediante suas riquezas espirituais, das quais as religiões são expressão principal e essencial, embora contenham 'lacunas, insuficiências e erros'" (RM55). Também nesse contexto se assinala a diferença com a presença de Deus que Cristo traz com seu evangelho.

84. Dado esse explícito reconhecimento da presença do Espírito de Cristo nas religiões, não se pode excluir a possibilidade de que essas exerçam, como tais, certa função salvífica, isto é, ajudem os homens a alcançar seu fim último, apesar de sua ambigüidade. Nas religiões se tematiza explicitamente a relação do homem com o Absoluto, sua dimensão transcendente. Seria dificilmente pensável que tivesse valor salvífico o que o Espírito Santo opera no coração dos homens considerados como indivíduos e não o tivesse o que o mesmo Espírito faz nas religiões e nas culturas. O magistério recente não parece autorizar uma diferenciação tão drástica. Por outro lado, é preciso notar que muitos dos textos a que nos referimos não falam só das religiões mas junto a elas mencionam as culturas, a história das povos etc. Todas elas também podem ser "tocadas" por elementos de graça.

85. Nas religiões atua o mesmo Espírito que guia para a Igreja. Porém, a presença universal do Espírito não pode ser equiparada à sua presença peculiar na Igreja de Cristo. Embora não se possa excluir o valor salvífico das religiões, isso não significa que tudo nelas seja salvífico. Não se pode olvidar a presença do espírito do mal, a herança do pecado, a imperfeição da resposta humana à ação de Deus etc. (cf. Diálogo e Anúncio, 30-31). Só a Igreja é o corpo de Cristo, e só nela se dá em toda sua intensidade a presença do Espírito. Assim, para ninguém pode ser indiferente a pertença à Igreja de Cristo e a participação na plenitude dos dons salvíficos que só nela se encontram (RM 55). As religiões podem exercer a função de praeparatio evangelica, podem preparar os diversos povos e culturas para a acolhida do acontecimento salvador que já teve lugar. Nesse sentido sua função não pode se equiparar à do Antigo Testamento, que foi a preparação do próprio evento de Cristo.

86. A salvação se obtém pelo dom de Deus em Cristo, não porém sem a resposta e a aceitação humana. As religiões podem também auxiliar a resposta humana, enquanto impelem o homem à busca de Deus, a agir segundo sua consciência, a levar uma vida reta (cf. LG 16; cf. Veritatis splendor 94, o senso moral dos povos e as tradições religiosas põem em relevo a ação do Espírito de Deus). Em última análise, a busca do bem é uma atitude religiosa (cf. Veritatis splendor 9. 12). E a resposta humana ao convite divino que se recebe sempre em e por meio de Cristo1. Parece que essas dimensões objetivas e subjetivas, descendentes e ascendentes, devem se dar em unidade, como se dão no mistério de Cristo. As religiões podem ser, portanto, nos termos indicados, um meio que auxilie a salvação de seus adeptos, mas não podem se equiparar à função que a Igreja realiza para a salvação dos cristãos e dos que não o são.

87. A afirmação da possibilidade da existência de elementos salvíficos nas religiões não implica em si mesma um juízo sobre a presença desses elementos em cada uma das religiões concretas. Por outro lado, o amor de Deus e do próximo, tornado possível em última instância por Jesus o único mediador, é o caminho para se chegar ao próprio Deus. As religiões podem ser portadoras da verdade salvadora apenas enquanto conduzem os homens ao verdadeiro amor. Se é verdade que este pode ser encontrado também nos que não praticam religião alguma, parece que o verdadeiro amor a Deus deve levar à adoração e à prática religiosa em união com os demais homens.

Fonte: https://www.vatican.va/

Dom Edson Damian: “Com os povos indígenas aprendi a viver com sobriedade, com o estritamente necessário”

Dom Edson Damian, bispo da Diocese de São Gabriel da
Cachoeira | Vatican News

Nesta entrevista, dom Edson faz um repasse de sua caminhada episcopal na Diocese de São Gabriel da Cachoeira, iniciada em 24 de maio de 2009.

Padre Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Todos os Bispos, ao completar 75 anos tem que apresentar sua renúncia ao Papa, que depois dessa data é aceita no momento que ele considera mais oportuno. Dom Edson Damian, Bispo da Diocese de São Gabriel da Cachoeira completou essa idade neste 04 de março de 2023.

Nesta entrevista, Dom Edson faz um repasse de sua caminhada episcopal, sempre na mesma Diocese, iniciada em 24 de maio de 2009. Ele diz apresentar sua renúncia “com o humilde sentimento do dever cumprido”, após vivenciar seu ministério na Diocese mais extensa e com maior porcentagem de população indígena do Brasil.

No dia 04 de março o senhor completa 75 anos, idade em que todos os Bispos têm que apresentar sua renúncia ao Papa. O que representa em sua vida como Bispo este momento?

O primeiro sentimento que me vem neste momento é de gratidão a Deus por me permitir chegar aos 75 anos.  Agradeço mais ainda por ter me concedido a graça do ministério presbiteral, recebido das mãos de Dom Ivo Lorscheiter, um autêntico Padre da Igreja, no dia 20 de dezembro de 1975. Com maior gratidão e também redobrado temor, aceitei também o múnus episcopal, atendendo ao chamado do Papa Bento XVI para ser bispo missionário no coração da Amazônia desde o dia 24 de maio de 2009.

 “Com Jesus amar e servir” é o lema episcopal que me orientou nesta caminhada. À luz do carisma São Charles de Foucuald, procurei “gritar o Evangelho com a vida”, a partir dos últimos lugares que me exigiam a missão para chegar às comunidades ribeirinhas mais distantes e abandonadas. Em todas as atividades missionárias contei sempre com a colaboração generosa dos presbíteros, das religiosas, dos cristãos leigos e leigas que exercem gratuitamente vários ministérios nas comunidades.

Por isso, no momento de apresentar minha renúncia, faço-o com o humilde sentimento do dever cumprido. Se não fiz mais, devo à minha limitação humana e os meus pecados. Porém, em tudo o que realizai sempre acreditei que o “amor supplet”, pois Deus é amor e misericórdia. “A arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia” (MV 10).

Assumiu a Diocese de São Gabriel da Cachoeira em 24 de maio de 2009, uma diocese com um rosto indígena. Depois de quase 14 anos o que o senhor aprendeu dos povos originários?

São Gabriel de Cachoeira é a diocese mais extensa do Brasil: tem 294.000 quilômetros quadrados. É também a mais indígena, pois 90% da população é constituída por Povos Indígenas de vinte e três etnias e ainda são faladas dezoito línguas. Tive a graça de conferir a ordenação presbiteral a treze jovens indígenas de diferentes etnias.

Quando o Núncio Apostólico me chamou para comunicar a nomeação, além do susto, apresentei vários motivos pelos quais julgava que não deveria aceitar, mas ele refutou a todos. Por fim, deu-me uma semana para conversar com pessoas que me conheciam. O primeiro bispo que consultei, tinha sido meu orientador espiritual. Simplesmente ofereceu-me um báculo, uma cruz peitoral, rezou por mim e disse que a ordenação deveria ser em São Gabriel.

Além do estímulo de todos, encontrei vários motivos para aceitar: em primeiro lugar, temos uma dívida social imensa com os povos indígenas que sofrem tantas violências e injustiças; segundo, o que sou hoje devo à Igreja que me acolheu e me formou desde os 12 anos, por isso seria injusto se fugisse desta missão; terceiro, o amor a Jesus, o seguimento do Evangelho e o testemunho de São Charles de Foucauld, sempre me levaram a servir os pobres, a buscar o último lugar. Como sinal de amor aos Povos Indígenas fui ordenado bispo no meio deles, inclusive com alguns ritos e símbolos próprios da sua cultura.  

O Padre Justino Rezende SDB, indígena Tuyuka, primeiro padre desta Diocese, escreveu um texto que me inspirou muito: “A boa nova das culturas indígenas acolhe a Boa Nova de Jesus”. As sementes do Verbo estão presentes em todos os povos e culturas. É a partir delas que cada povo realiza a enculturação do Evangelho. Desde as primeiras visitas às comunidades fiquei encantado com alegria da vida comunitária, a partilha dos alimentos como prolongamento da celebração eucarística, a sobriedade das casas, a acolhida fraterna aos visitantes.

Os Povos Indígenas são também mestres em ecologia, verdadeiros guardiões da floresta. Menos de 3% da mata foi destruída nesta região. “Os povos originários vão salvar a Amazônia”, disse-nos o Papa Francisco”, na visita ad limina. O jeito indígena de cultivar as roças no Alto Rio Negro, em 2010, foi declarado patrimônio cultural do Brasil pelo IPHAN. Há duas instituições que prestam imensos benefícios aos rionegrinos: a FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro) e o ISA (Instituto Sócio-Ambiental). Apoio e, na medida do possível, também participo de algumas das muitas atividades que realizam.

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O Sínodo para a Amazônia pode ser considerado um momento importante em sua caminhada episcopal. Como o senhor vivenciou esse processo sinodal e em que lhe tem ajudado em sua missão como Bispo?

O Sínodo foi um verdadeiro kairós para a Amazônia. Convidado do Cardeal Hummes, que era presidente da REPAM, participei desde o primeiro momento quando o Papa Francisco visitou Puerto Maldonado, no Peru. Lá acompanhei a primeira reunião para indicar os temas que deveriam ser abordados e também sugerir os assessores. O processo de escuta realizado nas comunidades indígenas apresentou excelentes propostas que foram sintetizadas pelo Pe Justino Rezende, escolhido para participar da comissão de peritos do Sínodo.

A etapa final realizada em outubro de 2019, em Roma, foi um acontecimento inesquecível: a convivência com representantes de 09 países da Pan-Amazônia, a presença do Papa Francisco em todos os momentos, as sessões iniciais quando cada participante, em quatro minutos, apresentava um tema que considerava fundamental para as conclusões do Sínodo. Falei sobre a importância da Teologia Índia no processo de enculturação do Evangelho.

Evento histórico foi também o “Pacto das Catacumbas pela Casa Comum” que grande número de participantes do Sínodo assinamos nas Catacumbas de Santa Domitila. Finalmente, a alegria geral ao ver aprovadas por unanimidade todas as propostas. E para completar, pouco tempo depois, o Papa nos ofereceu a Exortação pós Sinodal “Querida Amazônia”, que confirma e enriquece nossas propostas em forma de quatro sonhos: social, cultural, ecológico e eclesial. “Sonho com comunidades cristãs capazes de se devotar e de se encarnar na Amazônia, a tal ponto que deem à Igreja rostos novos com traços amazônicos” (QA 7). Em São Gabriel queremos construir uma Igreja amazônica com rosto e cultura indígenas.

O senhor sempre mostrou grande admiração pelo Papa Francisco, que neste mês de março completa 10 anos de pontificado. Como definiria o caminho percorrido pelo Papa neste tempo?

Encantei-me pelo Papa Francisco desde seus primeiros gestos e palavras quando se apresentou no dia 13 de março de 2013. Ele grita o Evangelho com sua vida. Com paciência, coragem e fidelidade está colocando em prática o Concílio Vaticano II. Quem o critica, talvez sem dar-se em conta de sua incoerência, está rejeitando o próprio Evangelho.

Destaco 10 marcos do caminho percorrido nesses 10 anos de seu ministério: 1. Conversão e reforma eclesial (EG 27 e 34); 2; Igreja “em saída” (EG 20); 3. Redescobrir a dimensão pessoal de encontro com Cristo (EG 1, 265, 265); 4. A santidade ao alcance de todos (GE 7 e 19); 5.  O discernimento; 6. O nome de Deus é misericórdia (MV 10); 7. A fraternidade e amizade social (FT 8); 8. A casa comum (LS 156) e sínodo para Amazônia; 9. Pacto educativo global (FT 1); 10. Economia Solidária (Livro “Vamos Sonhar juntos”).

Por fim, a convocação do Sínodo sobre a Sinodalidade é o maior acontecimento eclesial depois do Vaticano II cujo objetivo principal é colocar em prática as decisões mais importantes que foram sendo bloqueadas pela Cúria Romana. Foram necessários 10 anos para realizar esta reforma que mostrou sua abrangência e profundidade na Constituição Apostólica Praedicate Evangelium publicada no dia19 de março de 2022.

A Diocese de São Gabriel da Cachoeira é uma Diocese com grande extensão e pouca população, com poucos recursos e grandes despesas. Como o senhor enfrenta esses desafios?

Com os Povos Indígenas aprendi a viver com sobriedade, com o estritamente necessário. As entradas da diocese são provenientes de aluguéis de algumas escolas administradas pela SEDUC, aluguéis de vários apartamentos adaptados junto ao prédio da Cúria, doações de algumas Dioceses, de pessoas generosas e do próprio Papa Francisco. A despesa maior é com os combustíveis utilizados nas voadeiras para percorrer longas distâncias nas visitas às comunidades.

Com inspiração do Sínodo, estamos passando das visitas rápidas para uma permanência mais prolongada nas comunidades maiores ou também reunindo algumas comunidades vizinhas. Além da celebração dos sacramentos, realiza-se a formação das lideranças e também da comunidade. O padre sempre viaja acompanhado de agentes pastorais que colaboram nos encontros formativos. Investimento maior está sendo a Escola de Formação Teológica para leigos e leigas.  Acontece na segunda quinzena de janeiro e julho reunindo aproximadamente 90 representantes das 11 paróquias. Cada etapa aborda dois temas diferentes.

Sabendo que seu sucessor será nomeado pelo Papa, se o senhor fosse consultado, quais deveriam ser os elementos presentes no futuro Bispo de São Gabriel da Cachoeira?

Acredito da ação do Espírito Santo que anima e conduz a Igreja. Ele age através dos dons e carismas que concede a todos os batizados. Ao longo dos 23 anos em que sou missionário da Amazônia participei de muitas assembleias e encontros de nosso Regional. Sempre realizados com significativa representação de cristãos leigos e leigas, irmãos e irmãs de vida consagrada, diáconos, presbíteros e bispos.

Sempre admirei o clima de fraternidade, liberdade de expressão e verdadeira sinodalidade que reinam nestas assembleias. Todos são escutados e as propostas assumidas através do voto de todos.  Por isso, acredito que através de ampla consulta, os irmãos e irmãs que serão consultados saberão indicar o presbítero ou bispo já ordenado que tenha o carisma para ser pastor do santo e fiel Povo de Deus da querida Igreja do Rio Negro.

Quando um Bispo fica emérito tem mais liberdade em seu trabalho pastoral, que certamente não para. Como quer continuar sua missão episcopal quando o Papa aceitar sua renúncia?

Quando entreguei a vida a Deus para servir o seu povo, através do ministério ordenado, procurei seguir sempre ação do Espírito através da orientação dos sucessores dos apóstolos. Procuro seguir Jesus que disse: “Quem guarda a vida para si vai perdê-la, mas quem a perde por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la” (Mc 8, 34). A vida não é um capital para ser acumulado, mas um dom de Deus para ser partilhado a serviço dos irmãos para que todos tenham vida.

Quando aceitei ser bispo em São Gabriel, consciente dos desafios que me aguardavam, imaginei que renunciaria se chegasse aos 70 anos. Mas, Deus me livrou de muitos perigos, também da malária e de tantas outras enfermidades que atingem muitas pessoas nesta região. Assim tive condições de permanecer até os 75. Agora devo esperar com paciência o sucessor.  Depois gostaria de conviver um tempo, em Jaguarí-RS, com minha família que sempre me apoiou e na companhia de meu pai que vai completar 101 anos. Depois, se ainda tiver saúde e forças, permanecerei disponível para colaborar onde a Igreja precisar de mim. Tudo é graça. “De graças recebestes, de graça deveis dar” (Mt 10,8).

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF