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terça-feira, 12 de setembro de 2023

Os Mártires do Século XX (1/6)

Os mártires do Séculos XX (Crédito: Cléofas)

Os Mártires do Século XX

 POR PROF. FELIPE AQUINO

O presente artigo considera o fato do martírio no século XX, paralelo ao dos primeiros séculos. A igreja quer reconhecer e homenagear os heróis da fé, que sofreram em campos do concentração, prisões e outras ocasiões, e dos quais alguns ainda vivem, merecendo toda a estima dos contemporâneos.

A história se repete. O passado, que parecia definitivamente ultrapassado, retorna com modalidades novas. É o que se dá com a época dos mártires de 64 a 313, em que o Império Romano levou à morte muitos milhares de cristãos. O século XX fez que os cristãos revivessem a era do martírio não mais com anfiteatros e feras, mas em campos de concentração, masmorras solitárias, fuzilamento.., Conforme o Papa João Paulo II, é dever da igreja recordar este fato e comemorar os heróis que faleceram por fidelidade a Cristo em quatro continentes do mundo contemporâneo:

“Estes dois mil anos depois do nascimento de Cristo estão marcados pelo persistente testemunho dos mártires.

Também este século, que caminha para o seu ocaso, conheceu numerosíssimos mártires, sobretudo por causa do nazismo, do comunismo e das lutas raciais ou tribais. Sofreram pela sua fé pessoas das diversas condições sociais, pagando com o sangue a sua adesão a Cristo e à Igreja ou enfrentando corajosamente infindáveis anos de prisão e de privações de todo gênero, para não cederem a uma ideologia que se transformou num regime de cruel ditadura. Do ponto de vista psicológico, o martírio é a prova mais eloquente da verdade da fé, que consegue dar um rosto humano inclusive à morte mais violenta e manifestar a sua beleza mesmo nas perseguições mais atrozes.

Inundados pela graça no próximo ano jubilar, poderemos mais vigorosamente erguer ao Pai o nosso hino de gratidão, cantando: Te martyrum candidatus laudat exercitus (o exército resplandecente dos mártires canta os vossos louvores). Sim, é o exército daqueles que “lavaram as suas vestes e as branquearam no sangue do Cordeiro” (Ap 7, 14). Por isso, a Igreja espalhada por toda a terra deverá permanecer ancorada ao seu testemunho e defender zelosamente a sua memória. Possa o povo de Deus, revigorado na fé pelos exemplos destes autênticos campeões de diversa idade, língua e nação, cruzar confiadamente o limiar do terceiro milênio. À admiração pelo seu martírio associe-se, no coração dos fiéis, o desejo de poderem, com a graça de Deus, seguir o seu exemplo, caso o exijam as circunstâncias” (Bula Incarnationis Mysterium nº 13).

1. Martírio: que é?

A palavra mártir vem do grego mártys, mártyros, que significa testemunha. O mártir é uma testemunha qualificada que chega ao derramamento do próprio sangue. O Papa Bento XIV assim se exprime:

“O martírio é a morte voluntariamente aceita por causa da fé cristã ou por causa do exercício de outra virtude relacionada com a fé”.

O Catecismo da Igreja Católica § 2473 retoma o conceito:

“O martírio é o supremo testemunho prestado à verdade da fé; designa um testemunho que vai até a morte”.

O Concílio do Vaticano II desenvolve tal noção:

“Visto que Jesus, Filho de Deus, manifestou Sua caridade entregando Sua vida por nós, ninguém possui maior amor que aquele que entrega sua vida por Ele e seus irmãos (cf. 1Jo3, 16; Jo 15, 13). Por isso, desde o início alguns cristãos foram chamados e alguns sempre serão chamados para dar o supremo testemunho de seu amor diante de todos os homens, mas de modo especial perante os perseguidores. O martírio, por conseguinte pelo qual o discípulo se assemelha ao Mestre, que aceita livremente a morte pela salvação do mundo, e se conforma a Ele na efusão do sangue é estimado pela Igreja com exímio dom e suprema prova de caridade. Se a poucos é dado, todos, porém, devem estar prontos a confessar Cristo perante os homens, segui-lo no caminho da cruz entre perseguições, que nunca faltam à Igreja” (Lumen Gentium nº 42).

A propósito deve-se notar o seguinte: O martírio é uma graça que tem sua iniciativa em Deus. Não compete ao cristão procurar o martírio provocando os adversários da fé. A Igreja sempre condenou esse comportamento, pois seria presunçoso (quem pode Ter certeza de suportar corajosamente os tormentos do martírio?); além do quê, seria provocar o pecado do próximo ou dos algozes.

Para que haja martírio propriamente dito, requer-se que o cristão morra livremente, ou seja, aceite conscientemente o risco de morrer por causa da sua fé. A aceitação da morte pode ser explícita, como no caso em que o perseguidor deixa a escolha entre renegar a fé (ou uma virtude relacionada com a fé) e a morte. A aceitação livre pode ser implícita quando a pessoa sabe que o seu compromisso cristão pode levá-la até a morte e, não obstante, é fiel a esse compromisso.

Para que a Igreja declare oficialmente que alguém é mártir da fé, são efetuadas pesquisas a respeito de:

– a verdadeira causa da morte: pode ser que um cristão seja condenado à morte não por ser cristão, mas por estar envolvido em alguma campanha política ou de outra ordem;

– a livre aceitação da morte por parte da vítima;

– graças ou milagres obtidos por intercessão do(a) servo(a) de Deus.

O processo é iniciado na diocese à qual pertencia a vítima ou na qual ela foi levada à morte. Continua e termina em Roma, na Congregação para as Causas dos Santos.

O martírio é algo tão antigo quanto a pregação da Palavra de Deus. Já ocorreu na história dos Profetas do Antigo Testamento. No século II a.C. os irmãos macabeus sofreram a morte cruenta por causa da sua fé (cf. 2Mc 7, 1-42), assim como o escriba Eleazar (cf. 2MC 6, 18-31). O martírio teve seu ponto alto em Jesus Cristo. Santo Estêvão é o primeiro mártir do Cristianismo após Jesus Cristo (cf. At 7, 55-60). No fim do século I o Apocalipse fala de “imensa multidão, que ninguém pode numerar, daqueles que lavaram e alvejaram suas túnicas no sangue do Cordeiro” (cf. Ap 7, 9.14). Em síntese, São Paulo afirma que “todos aqueles que quiserem viver com piedade em Cristo Jesus, serão perseguidos” (2Tm 3, 12).

2. O Martírio no século XX

O martírio, tão presente em nosso século como em nenhum outro, tem suas características próprias, assaz paradoxais:

1) Este é o século em que as autoridades mais se preocuparam com não fazer mártires cristãos. Assim o nacional-socialismo alemão condenou muitos fiéis católicos não por causa da sua fé, mas por motivos políticos. Do lado marxista, Stalin recomendava aos chefes de regime comunistas que nunca pusessem a luta contra a Igreja no plano religioso, mas sempre no plano político, como fazia Himmler na Alemanha. O aparato jurídico soviético dispunha de dezenas de leis e decretos destinados a envolver os religiosos em tramas de ordem civil e política, e nunca de ordem religiosa.

O Cardeal Alexandre Todea, cabeça da Igreja Católica na Romênia, viu a liquidação da Igreja em 1948. Tornou-se pastor clandestino de seus fiéis. Em abril de 1952, em Bucarest, o general Nikolki, chefe da Securitate, chamou-o à sua presença depois que o Cardeal foi descoberto e preso, e disse-lhe:

“Já que ninguém no século XX morre por causa da sua fé, o Sr. Deve reconhecer que quis aniquilar os comunistas”.

Respondeu-lhe o Cardeal: “Antes disso, posso chamar um psiquiatra?”

– “Para quê?”

– “Para averiguar qual de nós dois é louco: o senhor ou eu?”

O Cardeal foi finalmente condenado à morte “como lacaio do Vaticano e inimigo do comunismo, constituindo uma ameaça para o novo estilo de vida que leva ao povo a felicidade”.

2) O martírio incruento… Muitos fiéis foram sujeitos à tortura física, psíquica e moral mais requintada possível sem chegar a morrer. O encerramento em campos de concentração, com todo tipo de maus tratos, podia durar dez, vinte, trinta ou mais anos, exigindo coragem e tenacidade sobre-humanas. E, apesar de tudo, não lograram o título de mártires (apesar de terem sofrido crudelíssimos tormentos). Conta um sacerdote sobrevivente de um campo de concentração:

“Se eu soubesse o que me aguardava no campo de concentração, eu teria preferido ser fuzilado. Mas, ao contrário, eu me alegrei! Se eu tivesse sido fuzilado como tantos outros sacerdotes, teria sido um mártir. Hoje trata-se de beatificar um ou outro deles, e eu, que sofri por muito mais tempo do que eles, ainda posso cometer desatinos sobre a terra”.

3) Há aqueles que morreram desconhecidos, como vítimas de violência e maus tratos. Ninguém o testemunhou para poder proclamar seu heroísmo e sua glória. Não tiveram a graça de confessar frente ao mundo o nome de Jesus, embora tenham morrido por causa dele.

Os mártires do século XX foram, muitas vezes, ignorados… na Alemanha, na URSS, na China, em Cuba… Em parte, isto se deu por causa da censura das notícias que saiam de tais países; não era (nem é hoje ainda) possível saber o que acontece nos bastidores de um país totalitário. Em parte, também se deve à onda de secularismo que tem passado pelas nações em que há liberdade religiosa: o consumismo e o bem-estar têm levado muitos cristãos a quererem atenuar a loucura e o escândalo da fé, afastando os homens de Cristo e da Igreja.

D. Estevão Bettencourt, osb
Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
Nº 456, Ano 2000, Pág. 194.

Fonte: https://cleofas.com.br/

Dos Sermões de São Bernardo, abade

Estarei no meu posto de sentinela (KYRIOS)

Dos Sermões de São Bernardo, abade

(Sermo 5 de diversis, 1-4: Opera Omnia, Edit. Cisterc. 6,1 [1970]98-103)     (Séc. XI)

Estarei no meu posto de sentinela

para ouvir o que me diz o Senhor


Lemos no Evangelho que, quando o Senhor em sua pregação convidava os discípulos a participarem do mistério de comer o seu corpo também os exortava a comungar de sua paixão, alguns disseram: É dura esta palavra; e já não mais ficaram com ele. Interrogados os discípulos se também eles queriam ir-se embora, responderam: Senhor, a quem iremos? Tu tens as palavras da vida eterna (Jo 6,68).


Digo-vos, irmãos, que até hoje para alguns é evidente serem as palavras faladas por Jesus espírito e vida e por isso seguem-no. Para outros parecem duras e vão em busca de outra miserável consolação. A Sabedoria as repete bem alto nas praças, na larga e espaçosa estrada que leva à morte, para chamar a si os que caminham por ela.

Até mesmo Quarenta anos estive próximo desta geração e disse: Sempre se extraviam pelo coração (Sl 94,10). Encontras também em outro salmo: Uma vez falou Deus (cf. Sl 61,12). Sim, uma vez, porque sempre. É um só e não alterado, mas contínuo e perpétuo seu falar.

Convida os pecadores a novamente entrarem em si, censura pelo erro do coração para que aí habite ele e aí fale, realizando aquilo que ensinou pelo profeta ao dizer: Falai ao coração de Jerusalém (Is 40,2).


Bem vedes, irmãos, como é proveitosa a exortação do Profeta a não endurecermos o coração, se ouvirmos hoje sua voz. Quase as mesmas palavras podeis ler no Evangelho e no Profeta. Ali diz o Senhor: Minhas ovelhas ouvem minha voz (Jo 10,27). E o santo Davi no salmo: Seu povo (do Senhor, sem dúvida) e ovelhas de suas pastagens, hoje se ouvirdes sua voz, não endureçais os vossos corações (Sl 94,7-8).


Escuta, por fim, o profeta Habacuc, como não disfarça a censura do Senhor, mas se entrega a contínua e solícita reflexão sobre ela: Estarei de atalaia, fincarei pé no meu reduto para ver o que me dirá e o que responderei a quem me repreende (Hab 2,1). Também nós, irmãos, suplico, estejamos de atalaia porque o tempo é de luta.  

Entremos em nossos corações, onde Cristo habita, comportando-nos com justiça e prudência, de tal forma, porém, que não ponhamos em nós mesmos a confiança nem nos apoiemos em tão frágil proteção.

Fonte: https://liturgiadashoras.online/

Questões mundiais emergentes no início do Terceiro Milênio (3/5)

G20 - Bandeiras (Vecteezy)

Arquivo 30Dias – 09/2001

Questões mundiais emergentes no início do Terceiro Milênio

Um ensaio do presidente do IOR faz um balanço dos processos de globalização em curso e das consequências políticas e sociais. Longe da demagogia global-antiglobal.

por Ângelo Caloia

A EXPLOSÃO DA CRIMINALIDADE

O risco de um desenvolvimento "selvagem", divorciado de regras ou em qualquer caso guiado por uma "autorregularão" inevitavelmente atenta apenas à lógica econômica ou de mercado, gera outras preocupações graves.

Estas são ameaças que são globais, ou seja, afetam múltiplos países e colocam novos problemas de gestão e partilha de riscos.

Não se trata apenas da passagem espontânea de fronteiras (poluição ambiental, epidemias, riscos ligados às grandes tecnologias), mas também das consequências que as políticas de outros Estados têm sobre aqueles que não estiveram envolvidos nas decisões (pense em: desvalorizações competitivas , volatilidade intrínseca dos mercados financeiros internacionais, alterações climáticas globais, agitação popular devido ao aumento das desigualdades e ao regresso do medo endémico da fome).

São necessárias políticas comuns, tanto em termos de padrões tecnológicos como de respeito pelos direitos humanos.

O mercado, congenitamente míope, não é capaz de assumir os efeitos negativos (poluição, criminalidade urbana) da atividade económica (quando ele próprio não os facilita).

Assim, o crime transnacional (corrupção, tráfico de drogas, tráfico de seres humanos, terrorismo e assim por diante) beneficia em grande parte das novas tecnologias e ferramentas de comunicação: sem encontrar uma sanção adequada na legislação nacional (nem ainda nas supranacionais).

Hoje o crime é um dos negócios mais prósperos, gerido por gestores moderno e especializado que explora os desequilíbrios económicos e sociais do mundo e os diferenciais regulamentares existentes entre os diferentes países. O êxodo dos países em guerra torna-se uma oportunidade ideal para as redes explorarem a emigração ilegal. A pobreza e a desigualdade social alimentam a prostituição, o tráfico de crianças e o trabalho ilegal. O desajustamento e a alienação tornam-se terreno fértil para redes e mercados de drogas.

As máfias atuais apresentam-se assim como novas estruturas de intermediação entre o mercado global e o território local. Fazem parte de um “capitalismo de grande altitude”, diferente do mercado livre e ligado à acumulação comercial. As drogas e as armas deslocam-se ao longo de rotas pelas quais outras especiarias e outros bens de luxo outrora transitaram; as atuais viagens de esperança, os imigrantes ilegais, tomaram o lugar do antigo comércio de escravos.

A escalada dos poderes mafiosos está ligada aos vários teatros de combate (Vietname, Afeganistão, etc.) que abriram imensos mercados negros e à "desregulamentação" do mercado financeiro internacional: com os mercados "offshore", que são locais de transição para fora da esfera sujeita ao controlo das economias nacionais, favorecem o desenvolvimento de poderes, os mafiosos, que são por definição invisíveis.

As investigações revelam a estipulação de verdadeiros acordos internacionais para estabelecer quem deve organizar a produção, quem deve organizar a venda e quem deve organizar a lavagem dos rendimentos.

Momentos decisivos de época, como o colapso do sistema soviético, favoreceram o crime organizado. A “máfia” russa geriu o processo de privatização das propriedades estatais e aproveitou a desmobilização de equipamento militar (através da venda de material físsil e componentes nucleares). A sua vantagem sobre o poder estabelecido é que podem ignorar os direitos sociais e civis e exercer ameaças vagas.

O conflito entre as legislações nacionais alimentou - e ainda alimenta - estes perigos: para combater os quais a cooperação - embora indispensável - entre as autoridades policiais e judiciárias dos vários países não é suficiente. O que é necessário é chegar a instituições comuns (pense na criação do PM Europeu), bem como a formas de cooperação reforçada, bem como continuar a luta contra os mercados "offshore" e o sigilo bancário. Mais do que tudo, precisamos de reconstruir a cultura cívica e procurar regras e instituições comuns. O problema da imigração demonstra, de facto, que é utópico pensar em poder distinguir os sectores da segurança interna e externa.

EM BUSCA DE UM DENOMINADOR COMUM

Embora os aspectos económicos e políticos continuem a ser sublinhados, nenhuma investigação abordou até agora as ligações e os efeitos da globalização a nível jurídico e, especificamente, a relação com os direitos humanos em geral.

O processo de fluidização das fronteiras, provocado pelas redes de comunicação globais (e, portanto, espontaneamente), só agora começa a exigir o estabelecimento de “fronteiras”. No entanto, a intervenção jurídica exige uma vontade específica: isto é, a superação de algumas regras, aquelas postas em crise pela globalização, só pode intervir através da imposição de outras regras (cuja preparação - aliás - é urgentemente necessária).

Num contexto que viu quebrado o tabu da relação entre Estado e direito (em favor de uma “ordem contratual privada”, compatível com o mercado e com as novas tecnologias que não conhecem fronteiras), torna-se essencial alcançar um denominador comum de justiça isso é válido para evitar o risco verdadeiramente delicado de que a globalidade (entendida como sociedade mundial, isto é, como um horizonte percebido - caracterizado pela multiplicidade de dimensões - ou como uma troca e osmose de experiências) transcenda para a globalização (isto é, para um processo baseado no qual os estados nacionais e as suas soberanias são condicionados e ligados transversalmente por atores transnacionais, pelas suas oportunidades de poder, a partir das suas orientações, identidades e redes): consolidando assim a mesma velha lei segundo a qual o mais forte se afirma e vence o mais fraco.

A solução deve ir além da reciprocidade nas relações entre Estados individuais; nem pode resultar numa espécie de universalização da norma que não tenha em conta as dinâmicas políticas, sociais e económicas dos vários Estados.

Num cenário em que estão presentes múltiplos atores (Estados, indivíduos, empresas multinacionais, organizações não governamentais, instituições supranacionais regionais e globais), o leque de respostas compatíveis com o desenvolvimento sustentável (e consistentes com os objetivos de solidariedade e proteção do ser humano) pessoa) passa então pela superação do monopolarismo e pela iniciação de um multipolarismo capaz de escapar ao contraste estéril entre uma espécie de império mundial e o ressurgimento contemporâneo de múltiplas soberanias e de um egoísmo nacionalista exasperado.

O multipolarismo deve significar a criação e integração das diversas instituições (Estados nacionais, organismos exponenciais da sociedade civil e da realidade econômica, instituições regionais e instituições globais), para que os indivíduos se sintam verdadeiramente sujeitos, porque estão plenamente envolvidos nos processos de tomada de decisão.

A proteção dos direitos humanos fundamentais é um pré-requisito para a criação de regras comuns que respeitem a pluralidade. Só em nome do homem se pode esperar superar as particularidades nacionais. A proclamação dos direitos humanos em 1948 foi um momento particularmente significativo também porque se baseou no consenso universal e não mais na procura de um fundamento filosófico, religioso, mitológico. Isto tem melhor garantido, também pela difusão cada vez mais generalizada de informação e pela percepção imediata de situações de violação, a efetividade (proteção) desses direitos. O reconhecimento da responsabilidade internacional dos Estados pela violação desses direitos, o nascimento do conceito de crime internacional (com as consequentes sanções económicas e/ou militares),

Fonte: http://www.30giorni.it/

Você precisa mudar hábitos prejudiciais? Comece hoje mesmo!

ViChizh - Shutterstock

Por Małgorzata Rybak

Repetimos constantemente promessas de que as coisas serão diferentes a partir de amanhã. Mas por que é tão difícil dizer adeus aos hábitos que podem comprometer nossa saúde física e emocional?

Ir para a cama tarde demais ou comer uma barra inteira de chocolate em vez de dois pedaços; ligar a televisão, quando finalmente pensamos em ler alguma coisa, navegar pelas redes sociais, quando havíamos prometido trabalhar concentrados; repetir tudo o que fazíamos, quando prometemos que, a partir de hoje, as coisas seriam diferentes. Por que é tão difícil dizer adeus aos hábitos prejudiciais à nossa saúde física e mental?

Lutar contra a corrente

A primeira resposta que pode vir à nossa mente é que muitas vezes já partimos de uma posição queimada. Acreditamos que o mais útil é lutar contra o que não gostamos em nós e nas nossas vidas.

Embora a nossa raiva de nós mesmos seja bastante justificada, usá-la como combustível para lutar contra nós não produzirá os resultados desejados. Pelo contrário, pode criar um efeito de círculo vicioso em que eu me castigo por aquilo de que não gosto. Infelizmente, a agressão desencadeada sobre nós só aumenta o fardo, deixando-nos ainda com menos forças para mudar as coisas.

Por sua vez, aquilo contra o que lutamos inevitavelmente cresce, deixando-nos com uma sensação de desamparo.

A agressão contra si mesmo (dizer frases desagradáveis, rebaixar-se ou considerar-se indigno de respeito) destrói a autoestima. E, sem ela, não podemos rearranjar o nosso modo de vida. Para que as coisas mudem precisamos de esperança, bem como de reconhecer que somos importantes e que merecemos ser bem tratados.

Aceitação é tão importante quanto empatia

As nossas possibilidades de mudança aumentam quando aceitamos que é difícil para nós mudar a forma como funcionamos até agora, além de vivermos com as consequências daquilo que não funciona.

Se estou perdendo muito tempo navegando pelo Facebook, então tenho que aceitar que, no momento, estou tendo dificuldade em descobrir como não fazer isso. E que estou vivenciando as consequências disso de uma forma que é dolorosa para mim.

É bom que a aceitação também seja seguida de empatia, ou seja, ver-se como um amigo próximo que precisa de apoio, que ficará incapaz de se recuperar de críticas esmagadoras. 

Graças à aceitação e à empatia poderei finalmente permitir-me ser honesto e ter a coragem de descobrir porque faço o que faço. Porque por trás de cada ação que realizamos existe uma motivação que nos dá algo e, ao mesmo tempo, nos protege de algo.

Ciclo de hábito

Charles Duhigg, autor de O Poder do Hábito, descreve as razões pelas quais repetimos o que nos prejudica em termos do “ciclo do hábito”. Todo hábito tem um “gatilho”, ou seja, as circunstâncias que o iniciam. Podemos pegar o telefone ou o chocolate quando sentimos uma onda de emoções difíceis:

  • Tristeza;
  • Raiva ou
  • Impotência

Assistimos a uma série de TV depois de uma noitada, quando estamos mental e fisicamente exaustos. O resultado é uma espécie de recompensa, mas também um prejuízo para a saúde.

Sair do ciclo de repetição de um hábito que não nos serve nos permite nomear as necessidades que estão por trás dele.

Pode ser uma necessidade de conexão ou de alívio mental (como no caso de navegar pelas redes sociais), de acalmar emoções difíceis ou aliviar o estresse ou de descanso (quando assistimos séries).

Reconheça a fome

Se nos aprofundarmos nas nossas necessidades profundas, podemos descobrir que todo o nosso dia a dia está estruturado de uma forma que não nos dá a oportunidade de viver em equilíbrio, porque estamos extremamente sobrecarregados, não planejamos descanso ou vivemos em um ambiente muito desfavorável.

Talvez seja necessário abordar exatamente aquilo que estamos sentido, em vez de comer batatas fritas ou jogar no computador.

Quando sabemos quais são as verdadeiras “fomes” que clamam por atenção em nós, podemos procurar melhores maneiras de enfrentá-las. Mais do que chocolate, vai me aliviar mentalmente entender o que me deixou com raiva, decepcionada ou envergonhada.

Cenouras no lugar de pipoca

Com algumas coisas podemos lidar facilmente: se você está comendo pipoca gordurosa na frente da TV, pode substituí-la cortando uma cenoura.

Para outras situações, é necessário que olhemos para dentro de nós mesmos com mais profundidade e amor, confrontando os sentimentos que evitamos porque são muito difíceis para nós. Mas quando embarcamos no caminho da mudança por amor a nós mesmos, e não por ódio, podemos alcançar lugares totalmente novos e surpreendentemente belos.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Maria e a Igreja Ortodoxa na Redemptoris Mater

Fiel ortodoxa beija ícone da Virgem Maria antes de uma missa para as 
celebrações ortodoxas da Assunção de Maria na Santa Maria Mãe de Deus 
em Skopje, em 28 de agosto de 2023. (Foto de Robert ATANASOVSKI/AFP) 
(AFP or licensors)

“Tamanha riqueza de louvores, acumulada pelas diversas formas da grande tradição da Igreja, poderia ajudar-nos a fazer com que a mesma Igreja torne a respirar plenamente «com os seus dois pulmões»: o Oriente e o Ocidente". (São João Paulo II)

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

“Desejo realçar, por outro lado, quanto a Igreja católica, a Igreja ortodoxa e as antigas Igrejas orientais se sentem profundamente unidas no amor e louvor à Theotókos. Não só «os dogmas fundamentais da fé cristã acerca da Trindade e do Verbo de Deus, que assumiu a carne da Virgem Maria, foram definidos nos Concílios ecuménicos celebrados no Oriente», mas também no seu culto litúrgico «os Orientais exaltam com hinos esplêndidos Maria sempre Virgem ... e Santíssima Mãe de Deus». (Redemptoris Mater, 31)”

São João Paulo II dedica a segunda parte da Carta Encíclica Redemptoris Mater à "Mãe de Deus no centro da Igreja que está a caminho", onde destaca inicialmente "a Igreja, Povo de Deus presente em todas as nações da terra", seguido pela "caminhada da Igreja e a unidade de todos os Cristãos" e por fim "o «Magnificat» da Igreja que está a caminho". Nesta parte do documento publicado em 25 de março de 1987, o convite a "olhar todos conjuntamente para a nossa Mãe comum, que intercede pela unidade da família de Deus e que a todos «precede», à frente do longo cortejo das testemunhas da fé no único Senhor, o Filho de Deus, concebido no seu seio virginal por obra do Espírito Santo".

No programa de hoje deste nosso espaço, padre Gerson Schmidt* nos propõe a reflexão "Maria e a Igreja Ortodoxa na Redemptoris Mater":

"Aprofundamos a rica tradição ortodoxa da devoção Mariana, em base a Carta Encíclica de São João Paulo II Redemptoris Mater, de 1987, referendando a LG (Cf. Const. dogm. sobre a Igreja Lumen gentium, 52) e também Decreto sobre o Ecumenismo Unitatis redintegratio(n. 14-15) do Concílio Vaticano II.  

Completa assim o Papa polonês no número 32 da Redemptoris Mater, dando destaque da devoção Mariana na Igreja bizantina: “Na liturgia bizantina, em todas as horas do Ofício divino, o louvor da Mãe anda unido ao louvor do Filho e ao louvor que, por meio do Filho, se eleva ao Pai no Espírito Santo. Na anáfora ou oração eucarística de São João Crisóstomo, imediatamente depois da epíclese (a invocação do Espírito Santo na consagração) a comunidade reunida canta desta forma à Mãe de Deus: «É verdadeiramente justo proclamar-vos bem-aventurada, ó Deípara, que sois felicíssima, toda pura e Mãe do nosso Deus. Nós vos magnificamos: a vós, que sois mais digna de honra do que os querubins e incomparavelmente mais gloriosa do que os serafins! A vós que, sem perder a vossa virgindade, destes ao mundo o Verbo de Deus! A vós, que sois verdadeiramente a Mãe de Deus»! Semelhantes louvores, que em cada celebração da liturgia eucarística se elevam a Maria Santíssima, forjaram a fé, a piedade e a oração dos fiéis. No decorrer dos séculos tais louvores impregnaram todas as expressões da sua espiritualidade, suscitando neles uma devoção profunda para com a «Santíssima Mãe de Deus»””.

Segundo o ensino dos santos Padres e segundo a tradição universal da Igreja, se podiam propor à veneração dos fiéis, conjuntamente com a Cruz, as imagens da Mãe de Deus, dos Anjos e dos Santos, tanto nas igrejas como nas casas ou ao longo dos caminhos[1] (cf. Redemptoris Mater, 33). “Este costume foi conservado em todo o Oriente e também no Ocidente: as imagens da Virgem Maria têm um lugar de honra nas igrejas e nas casas. Maria é representada: ou como trono de Deus, que sustenta o Senhor e o doa aos homens (Theotókos); ou como caminho que leva a Cristo e o mostra (Odigitria); ou como orante, em atitude de intercessão e sinal da presença divina nos caminhos dos fiéis, até ao dia do Senhor (Deisis); ou como protetora, que estende o seu manto sobre os povos (Pokrov); ou, enfim, como Virgem misericordiosa e cheia de ternura (Eleousa). Ela é representada, habitualmente, com o seu Filho, o Menino Jesus, que tem nos braços: é a relação com o Filho que glorifica a Mãe. Algumas vezes, ela abraça-o com ternura (Glykofilousa); outras vezes, está hierática e parece absorvida na contemplação daquele que é o Senhor da história (cf. Ap 5, 9-14)”. Nesse trecho, o Papa João Paulo II referenda a  constituição Lumen gentium, número 59.

No contexto dos tempos hodiernos da guerra triste e injustificável entre Ucrânia e Rússia, referendo aqui ainda o que João Paulo II escreve sobre a devoção dos ícones marianos na Ucrânia, e também na Rússia. Esse santo de nosso tempo diz assim: “As Ícones são veneradas ainda hoje na Ucrânia, na Bielo-Rússia (ou Rússia Branca) e na Rússia, sob diversos títulos: são imagens que atestam a fé e o espírito de oração daquele povo bondoso, que adverte a presença e a proteção da Mãe de Deus. Nessas Ícones a Virgem Maria resplandece como reflexo da beleza divina, morada da eterna Sabedoria, figura da orante, protótipo da contemplação e imagem da glória: tenta-se representar aquela que, desde o início da sua vida terrena, possuindo a ciência espiritual inacessível aos raciocínios humanos, com a fé alcançou o conhecimento mais sublime. Recordo, ainda, a Ícone da Virgem do Cenáculo, em oração com os Apóstolos, aguardando a vinda do Espírito: não poderia ela tornar-se sinal de esperança para todos aqueles que, no diálogo fraterno, querem aprofundar a própria obediência da fé?”. Essa pergunta deveria ter resposta diante dessa incompreensível e catastrófica guerra nesses países, suplicando a intercessão dessa que é tão carinhosamente venerada nesses países e protótipo de um diálogo urgente e necessário para o fim da guerra nesses povos, como Papa Francisco tanto insiste.

Finalmente, na temática da devoção mariana bizantina, nessa Carta Encíclica, João Paulo II conclui utilizando uma analogia com o Corpo humano da fé do Oriente e Ocidente. “Tamanha riqueza de louvores, acumulada pelas diversas formas da grande tradição da Igreja, poderia ajudar-nos a fazer com que a mesma Igreja torne a respirar plenamente «com os seus dois pulmões»: o Oriente e o Ocidente. Como já afirmei, por mais de uma vez, isso é necessário mais do que nunca, nos dias de hoje. Seria um valioso auxílio para fazer progredir o diálogo em vias de atuação entre a Igreja católica e as Igrejas e as Comunidades eclesiais do Ocidente[2]. E seria também a via para a Igreja que está a caminho poder cantar e viver de modo mais perfeito o seu «Magnificat»” (Redemptoris Mater, 34). Maria, portanto, é um caminho para a unidade de um ecumenismo cristão entre as igrejas.

[1] Conc. Ecum. Niceno II: Conciliorum Oecumenicorum Decreta, Bologna 1973 (3), 135-138 (DS 600-609).
[2] Conc. Ecum. Vat. II, Decr. sobre o Ecumenismo Unitatis redintegratio, 19.

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt/

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Seminário Missionário Arquidiocesano Redemptoris Mater

Seminário Redemptoris Mater - Brasília (Crédito: Nova News)

O que são os Seminários Redemptoris Mater?

        São um dos frutos mais importantes da renovação conciliar. Uma realidade completamente nova, desejada pelo Concílio Vaticano II, que na Presbyterarum Ordinis nº 10 diz: "Lembrem os presbíteros que devem ter a peito a solicitude de todas as Igrejas... E onde o exigirem razões de apostolado, aplainem-se os caminhos não apenas à adequada distribuição de presbíteros, mas também às obras pastorais especializadas, em favor dos diversos grupos sociais, que devem ser levadas a termo em algumas região ou nação ou em qualquer parte do mundo. Para tal fim poderão ser criados utilmente alguns seminários internacionais, em benefício de toda a Igreja, segundo normas a serem estabelecidas e resguardando os direitos do Ordináriio do lugar" (PO 10).

Seminário Redemptoris Mates - Brasília  (Crédito/ Drone do Cerrado/YouTube)

        No ano de 1991, a Comissão Internacional, formada pelo Papa João Paulo II para resolver a grave carência de sacerdotes em muitas partes do mundo, reconheceu "que esta ideia do Concílio achou atuação nos Seminários Redemptoris Mater que preparam presbíteros para a Nova Evangelização, segundo o programa do Caminho Neocatecumenal... Dar-se-ia, assim, atuação a uma nova forma de ministério: o missionário diocesano" (L'Osservatore Romano, 15/03/1991).

Seminário Redemptoris Mates - Brasília  (Crédito/ Drone do Cerrado/YouTube)

    Os Seminários Redemptoris Mater não são seminários do Caminho Neocatecumenal, mas como os "Estatutos" e a "Regra de Vida" dizem, são verdadeiros seminários diocesanos que dependem do Bispo. Os alunos deste Seminário recebem a mesma formação teológica de outros Seminários diocesanos. Fazem um ano de pastoral nas Paróquias como Diáconos e dois anos na Diocese como Presbíteros, antes que o Bispo possa enviá-los em missão. Mas se o Bispo tem urgência em alguma região particularmente difícil de sua Diocese pode dispor destes presbíteros, dado que foram ordenados sem qualquer condição.

Seminário Redemptoris Mater - Brasília (Crédito: Flickr)

   Uma das características dos Seminários Redemptoris Mater é a internacionalização, que faz visível de maneira concreta a nova realidade anunciada pelo Cristianismo, na qual não há mais nem judeu, nem branco, nem negro, mas uma nova criação, um homem celeste, disposto a ir até os confins da terra. A experiência tem demonstrado que unir a formação presbiteral a um itinerário de iniciação cristã, como é o Caminho Neocatecumenal, constitui uma grande ajuda para o amadurecimento psicológico, afetivo e humano dos candidados (antes de serem presbíteros, são cristãos e, no caminho da fé, aprendem a comunhão, a obediência, a oração, o sentido da cruz, etc.). E também, sobretudo, alia a missão ao serviço da Paróquia, já que o Caminho Neocatecumenal é um tempo de formação que se realiza na própria Paróquia, como comunidades vivas, adultas e missionárias, unidas ao pároco e ao Bispo.

COMO POSSO AJUDAR O SEMINÁRIO?

PIX (CNPJ) 02 195 777 0001 84 (Banco do Brasil)

Fonte: https://www.rmater.org.br/

Manuela Tulli, vaticanista: “A família Ulma encarna a santidade comum” [ENTREVISTA]

EpiskopatNews | Flickr CC

Por I. Media

Perseguidos pelos nazistas por abrigarem judeus, Jozef e Wiktoria Ulma e seus sete filhos - incluindo um bebê - foram executados em 24 de março de 1944. Essa é a primeira vez que uma família inteira é beatificada como uma só. Veja aqui:

A beatificação da família Ulma no domingo, 10 de setembro de 2023, em Markowa, Polônia, é um evento excepcional na história da Igreja, pois é a primeira vez que uma família inteira é beatificada e reconhecida coletivamente como mártir. Perseguidos pelos nazistas por abrigarem judeus, Jozef e Wiktoria Ulma e seus sete filhos – incluindo um bebê – foram executados em 24 de março de 1944, juntamente com os oito membros da família judia que eles abrigaram por um ano e meio, os Goldmanns.

Manuela Tulli, vaticanista da agência de notícias italiana ANSA, é coautora de um livro com o padre polonês Pawel Rytel-Andrianik, chefe da seção polonesa da Rádio Vaticano, intitulado Uccisero anche i bambini – Gli Ulma, la famiglia martire che aiuto gli ebrei (em italiano), publicado pela Ares (em francês: Ils tuèrent aussi les enfants – Les Ulma, la famiglia martire qui aiuto gli ebrei). Ela fala à I.MEDIA sobre o significado dessa beatificação incomum.


Como você ficou sabendo do destino trágico da família Ulma?

Nós, jornalistas, geralmente procuramos histórias para contar, mas eu não procurei essa história: costumo dizer que foi a família Ulma que me procurou. Eu estava na Polônia em dezembro de 2022, na diocese deles, como parte de uma viagem organizada para visitar as instalações de recepção de refugiados ucranianos. O padre que interpretou para nós em italiano era o postulador para esse caso. Antes de partirmos para Kiev, ele nos deu um livro de fotografias de Jozef Ulma, dizendo-nos que a história dessa família merecia ser contada por jornalistas.

Eu nunca tinha ouvido falar deles antes, então simplesmente coloquei o livro em minha mala quando parti para a Ucrânia com outros colegas. Mas logo após meu retorno, em 17 de dezembro de 2022, o Papa Francisco autorizou a publicação do decreto que abre caminho para a beatificação dessa família. Então, reabri esse livro, ricamente documentado com fotografias tiradas pelo pai dessa família, que era fazendeiro, mas também fotógrafo do vilarejo, e tentei descobrir mais.

Fiquei emocionado com as coincidências entre essas diferentes situações: a guerra na Ucrânia e a Segunda Guerra Mundial, a recepção dada pelos poloneses aos refugiados ucranianos hoje e a recepção dada por essa família a esse grupo de judeus na época… Então, decidi aprofundar esse assunto para tornar essa história conhecida na Itália.

Então, esse martírio compartilhado por judeus e cristãos é um testemunho muito atual sobre o significado de uma vida renunciada em favor dos outros?

Sem dúvida, sim, e é por isso que este livro foi apoiado pelo Centro de Diálogo Cristão-Judaico da Universidade de Lublin, onde Karol Wojtyla, o futuro João Paulo II, era professor. Esses católicos e judeus viveram juntos, sofreram juntos, mas também experimentaram momentos de alegria.

Aqueles que os conheceram diretamente dão testemunho disso, em especial um amigo da família Ulma que faleceu este ano, aos 102 anos. Sabemos que as crianças de ambas as famílias brincavam juntas. E muito antes de sua beatificação, os Ulma foram reconhecidos como “Justos entre as Nações” pelo Centro Yad Vashem, em Israel. Portanto, trata-se de uma família que une, em um mundo que divide.

O seu relato também revela que essa família era moderna e culta, um fato notável na Polônia rural da época…

De fato, ambos os pais eram instruídos, tinham muitos livros e conheciam idiomas estrangeiros. Wiktoria entendia alemão e, por isso, compreendia tudo o que os nazistas diziam uns aos outros antes da execução. O casal sabia que corria o risco de ser condenado à pena de morte por esconder judeus, mas não desistiu. Foi uma escolha inspirada pelo Evangelho, que eles colocaram em prática. Na Bíblia que foi encontrada em sua casa, seus parentes notaram que eles haviam sublinhado, com um lápis, a parábola do Bom Samaritano. Eles estavam vivendo sua fé de forma autêntica.

A reputação de santidade continuou a cercar essa família nos anos seguintes ao massacre?

Sim, havia uma forma de santidade popular em torno deles, mas a Igreja não teve tempo para realmente estudar o caso durante o período comunista, porque havia outros assuntos urgentes. Foi somente nos últimos vinte anos, aproximadamente, que a causa deles foi formalmente estudada. Mas, com a memória de seus entes queridos, a devoção popular manteve esse fio conectado até os dias atuais.

Uma das coisas que mais me comove, além desse massacre horrível, é a beleza dessa família que abriu a porta de sua casa. Você pode ver nas fotos que são pessoas muito simples, descalças, que demonstram a “santidade da porta ao lado” da qual o Papa Francisco fala com frequência. Eles deram suas vidas de forma heroica, mas em uma vida comum. O pai, Jozef Ulma, simplesmente queria ajudar alguns amigos; ele conhecia pessoalmente essa família judia. Então, eles se organizaram simplesmente para preparar as refeições, lavar a roupa juntos… Era uma família feliz.

O fato de que as sete crianças, incluindo um bebê natimorto, também foram beatificadas é também uma mensagem para as famílias de hoje, um lembrete do valor de toda a vida?

Essa é a primeira vez que uma família inteira é beatificada como uma só. O sétimo filho é um caso especial porque sua cabeça, que saiu do útero da mãe, foi identificada quando o corpo foi exumado. Ele não tem nome, mas também é considerado pela Igreja como um mártir, em virtude do “batismo de sangue”.

O fato de esse massacre ter ocorrido em 24 de março, na véspera da Festa da Anunciação, também é um sinal mantido pela Positio (o relatório do dicastério para as Causas dos Santos que estabeleceu o martírio da família Ulma, nota do editor). Hoje, o dia 25 de março é também o dia dedicado à “nova vida” na Polônia. Essa história da família Ulma também pode dar muita esperança às famílias que perderam um filho. Ela nos lembra do valor das vidas dos menores, das pessoas que tiveram as vidas mais curtas, cuja santidade a Igreja pode, portanto, reconhecer.

A família Ulma assassinada por ajudar judeus

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Papa Francisco: Enfrentar os erros dos outros ‘sem rancor’ requer bondade e coragem

Papa Francisco acena aos peregrinos reunidos na Praça de São Pedro no ângelus de hoje (10). | Crédito: Vatican Media

Por Matthew Santucci

Dialogar com alguém que nos ofendeu é um processo que requer “verdadeira coragem”, disse hoje (10) o papa Francisco ao refletir sobre o tema da “correção fraterna”.

Na leitura do Evangelho de hoje (Mt.18,15-20) Jesus diz: “Se o seu irmão pecar contra você, vá e conte-lhe a culpa dele entre você e ele somente. Se ele te ouvir, você conquistou seu irmão.”

A correção fraterna é “uma das mais altas expressões de amor, e também a mais exigente, porque não é fácil corrigir os outros”, observou o papa ao falar aos peregrinos reunidos na praça de São Pedro de uma janela do Palácio Apostólico.

“Quando um irmão na fé comete uma falta contra você, você, sem rancor, ajude-o, corrija-o: ajude ao corrigir.”

O papa condenou a fofoca, ou “tagarelice”, que “não é certa” e “não agrada a Deus”. Ele chamou a fofoca de “uma praga na vida das pessoas e das comunidades porque traz divisão, traz sofrimento, traz escândalo e nunca ajuda a melhorar, nunca ajuda a crescer”.

A correção fraterna, por outro lado, é um processo que nos permite ajudar a outra pessoa a “entender onde ela está errada. E faça isso para o bem dele, superando a vergonha e encontrando a verdadeira coragem, que não é falar mal, mas dizer as coisas diante dele com mansidão e bondade”, disse o papa Francisco. Mas alertou que “apontar o dedo” à culpa do outro “não é bom, aliás, muitas vezes torna mais difícil para quem errou reconhecer o seu erro”.

“Mas podemos perguntar: e se isso não for suficiente? E se ele não entender?", perguntou o papa.

“Então devemos procurar ajuda. Mas cuidado: não do grupo que fofoca! Jesus diz: 'Leve um ou dois outros com você', ou seja, pessoas que realmente querem dar uma mão a este irmão equivocado”, exortou Francisco.

“E se ele ainda não entender? Então, diz Jesus, envolva a comunidade. Mas também aqui isto não significa ridicularizar uma pessoa, envergonhando-a publicamente, mas antes unir os esforços de todos para ajudá-la a mudar”, disse o papa.

“E então, perguntemo-nos: como devo me comportar com uma pessoa que me faz mal? Mantenho isso dentro de mim e acumulo ressentimentos?” perguntou o Papa Francisco. “Eu falo sobre isso pelas costas deles? — Você sabe o que ele fez? e assim por diante. Ou sou corajoso, corajoso e tento falar sobre isso com ele ou ela? Rezo por ele ou ela, peço ajuda para fazer o bem? E as nossas comunidades cuidam daqueles que caem para que possam levantar-se e começar uma nova vida? Eles apontam o dedo ou abrem os braços?”

Fonte: https://www.acidigital.com/

Teologia do Corpo – O celibato por amor

Calamity Jane | Shutterstock

Por Julia A. Borges

Não crer na ação de Deus, em sua presença, em seu poder de transformar e capacitar o ser humano para o voo rumo ao céu, faz com que não se creia igualmente na possibilidade da vivência do celibato.

Em 1870, o Papa Pio IX iniciou com as chamadas Audiências Gerais, uma tradição que se prolonga até os dias de hoje. Elas acontecem às quartas-feiras, e são um modo do Sumo Pontífice relacionar-se mais de perto com os peregrinos. Nelas são proferidas as chamadas “catequeses”. Fato é que enquanto ainda era cardeal, o Papa João Paulo II iniciou a escrita de um livro que acabou não sendo terminado justamente em virtude de sua eleição. Tal livro, intitulado Homem e Mulher Ele o Criou, teve seus capítulos apresentados durante essas audiências entre os anos de 1979 e 1984.

Foram 129 catequeses a respeito da Teologia do Corpo, e ao longo de suas explicações, o Pontífice esclarece que a união de Adão e Eva no Paraíso, antes do projeto de Deus ser distorcido pela desobediência, reflete um outro enlace ainda mais importante: as núpcias do Cordeiro, o casamento entre Deus e o homem. É interessante notar o desejo de Deus em unir-se à humanidade, ou seja, o ser humano foi feito para este casamento último. É por isso que nenhum homem ou mulher encontrará em seu companheiro aqui na Terra o preenchimento do coração, porque somente em Deus será saciado o anseio do coração humano.

Mas é necessário ter em mente que o namoro ou o casamento não podem ser empecilhos para a aproximação com Deus, pelo contrário, o relacionamento de amor honesto, casto, de doação deve ser um trampolim para o Divino e o desejo que se sente pelo sexo oposto deve refletir a busca pela verdadeira felicidade que, como já foi dito, somente será saciada em Deus.

Durante sua explanação, o Papa afirma que “a revelação cristã reconhece duas formas específicas de realização completa da vocação do amor do ser humano: matrimônio e celibato”. E continua dizendo que “tanto uma quanto a outra, em suaforma própria, representa a realização da verdade mais profunda a respeito de o homem ter sido criado à imagem de Deus”.

O celibato por amor a Deus ilumina de forma extraordinária o matrimônio, pois recorda aos esposos que a finalidade de cada um é a vida eterna, o casamento eterno com Deus. Juntos, o casal deve caminhar rumo ao seu objetivo, sem colocar um no outro a razão da felicidade, pois isso seria destruidor para ambos. O sacerdote, por sua vez, à luz do matrimônio, deve se recordar que está despojado de si mesmo em função do outro, como um esposo deve ser. Por isso o celibato é uma grande riqueza da Igreja e aboli-lo seria, de certa forma, destruir o matrimônio, pois é ele que lança luz e recorda a verdadeira finalidade do ser humano: contemplar Deus face a face.

É a liberdade que move o homem na busca por algo. Se é através da liberdade que se encontra a luz da sabedoria sabedoria, e também a possibilidade de amar, assim também ocorre com a primeira característica fundamental do celibato. Na Igreja existem aqueles que têm a vocação divina para o matrimônio e aqueles que têm a vocação divina para o celibato. O que existe no mundo hoje é uma crise de ambas as vocações. Se faltam vocações sacerdotais, faltam também matrimoniais. A solução para as duas crises não é abolir o celibato dos padres, mas fazer com que todos vivam suas próprias vocações de maneira plena.

Por ser livre, o celibato é também sobrenatural, já que a matriz do que se entende por verdadeira liberdade é o condicionamento direto com o criador, e. por isso, o celibato é totalmente incompreensível para aqueles que não têm fé. Não crer na ação de Deus, em sua presença, em seu poder de transformar e capacitar o ser humano para o voo rumo ao céu, faz com que não se creia igualmente na possibilidade da vivência do celibato. Mesmo com uma vida apostólica é preciso ter oração, até para ter algo a oferecer aos irmãos. Não é possível viver o celibato sem a graça do Espírito Santo.

Viver o chamado de forma consciente e plena é viver a perfeita liberdade, e abolir o celibato, como muito se tem escutado, não é a solução para a pedofilia, nem a cura para transtornos de origem sexual. É preciso entender que a liberdade é consequência de uma vida ascética e mística e ao ser livre não é válida a escolha pela prisão em vícios, distúrbios e pecado. Portanto, estejamos prontos ao real matrimônio sem esvaziar o sentido verdadeiro que tal união significa.

Referências

  1. 1)  São João Paulo II, Teologia do Corpo – O amor humano no plano divino, Editora Ecclesiae, 2014.
  2. 2)  WEST, Christopher, Teologia do Corpo para principiantes: Uma introdução básica à revolução sexual por João Paulo II, Ed. Myrian, Porto Alegre, 2008, pag. 79-89.
  3. 3)  Site: https://padrepauloricardo.org/aulas/o-celibato-por-amor-ao-reino-dos-ceus.
Fonte: https://pt.aleteia.org/

Além das aparências

Pessoas com deficiência (Foto:acolher instituto)

ALÉM DAS APARÊNCIAS

Dom Leomar Antônio Brustolin 
Arcebispo de Santa Maria (RS) 

O ser humano é singular com uma dignidade sagrada. Cada um é diferente e tem suas características, capacidades e limites. Essa diversidade na forma de ser e agir é uma riqueza que precisa ser reconhecida.  Isso significa rever nossa cultura e nossa forma de ler a realidade sob a ótica do amor e não do julgamento, ou melhor, de pré-julgamento que comporta, na maioria das vezes, grandes preconceitos.  

Nasce, então, a necessidade de assumir a autenticidade e o valor das pessoas que têm alguma deficiência. O art. 1º da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela Assembleia Geral da ONU, no ano de 2006, e o art. 2º da Lei Brasileira de Inclusão para a Pessoa com Deficiência  do ano de 2015, conceituam a pessoa com deficiência como “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, a qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.  

São nossos irmãos em Cristo que têm uma diferença significativa em relação aos padrões generalizados pela sociedade. Nesse sentido, é preciso alargar nossa compreensão sobre a vida humana na Terra.  A humanidade encontra-se em sofrimento tentando alcançar ideais de aparência, valorização do status, do ter e da alta performance. Se ficarmos limitados a essas imposições cruéis, perderemos a capacidade de identificar e conhecer a real essência e valor de cada pessoa.  

Alguém pode ter uma limitação  para caminhar e ser ágil na empatia. Outro pode não falar,  e saber se comunicar com o olhar. Há quem não escute com os ouvidos, e sabe perscrutar os sentimentos mais ocultos do outro. Há quem possa ter deficiência intelectual ou atraso cognitivo, e se tornar um doador universal de atenção, carinho e amor.  Nesses e em outros casos, as pessoas com deficiência nos ensinam que todos têm potencialidades. Isolamento, discriminação e rejeição são deficiências maiores, pois nos desumanizam. A diversidade compõe a beleza, e a busca pela compreensão enriquece o ser humano. 

Penso, aqui, no quanto as mães e os pais de pessoas com deficiência poderiam nos ensinar a enxergar além das aparências e redescobrir as raízes de nosso ser. Elas compreendem que a vida é passageira e que grande é a ilusão de quem pauta sua existência apenas pelo ter, poder e aparecer. Tudo passa… 

Essas mães e esses pais, certamente, sofrem muito ao perceber o quanto a humanidade precisa caminhar para acolher o diferente, para superar a discriminação e para vencer a indiferença. Elas entendem que o termo deficiência pode ser alargado para aqueles que têm todas as condições aparentemente normais, mas têm coração duro, os ouvidos insensíveis à dor do outro, os olhos fechados para quem está ao seu lado e mãos que não se estendem para auxiliar o próximo. Como carecemos de espaços de reabilitação para quem sofre de desumanização!  

Seus filhos e filhas também são imagem do Criador, nasceram para se destacar. São um Evangelho vivo, um Evangelho aberto à família, à comunidade, ao mundo. São referenciais de coragem, resiliência e superação. Quem parece fraco, no fundo, é mais forte (2 Cor 12,10), porque não esconde a sua sensibilidade. 

Vivemos um tempo de políticas públicas e de inciativas que tendem a promover a inclusão das pessoas com deficiência. Além das estruturas de acessibilidade e adaptabilidade, é urgente uma educação para a inclusão que oportunize novas formas de interação, de modo que todos se sintam aceitos, compreendidos, respeitados e valorizados.  

Para todos os familiares que cuidam de alguém com deficiência, nossa comunhão, nossa prece e nossa amizade. Esperamos, com vocês, que nossa geração aprenda a ser mais empática e hospitaleira com todas as pessoas, sobretudo as que têm alguma deficiência.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF