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quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Conheça o santo apelidado de “ladrão do purgatório”

São JoãoMacias (Lawrence OP | Flickr CC BY-NC-ND 2.0)

Por Philip Kosloski

São João Macías, amigo de São Martinho de Lima, é frequentemente retratado "roubando" almas do purgatório com o seu rosário.

Leigo dominicano do século XVI, São João Macías era amigo de São Martinho de Lima e o ajudava nas tarefas diárias. Uma das principais funções de João, ou Juan, era ir ao encontro dos pobres que chegavam ao seu convento peruano em busca de assistência material ou espiritual – muitas vezes, mais de duzentas pessoas por dia.

Além da sua disposição alegre e do seu ânimo incentivador, João Macías se tornou conhecido pela natureza às vezes milagrosa de seu serviço aos pobres. Todos sabiam que ele trabalhava muito para angariar donativos e depois distribuí-los. De fato, muitas vezes voltava de mãos vazias quando ia tentar obter ajudas, mas ainda assim, de alguma forma, conseguia jamais negar ajuda a ninguém.

São JoãoMacias
São JoãoMacias

Oração entre santos

A sua amizade com São Martinho de Lima (também chamado de São Martinho de Porres), outro santo da ordem dominicana, acabaria por levá-los a uma cerimônia de beatificação conjunta.

Os dois se encontravam frequentemente nas rondas diárias pela cidade e se tornaram grandes amigos espirituais. Eram fonte constante de incentivo um para o outro. Em 1837, foram beatificados juntos, pelo Papa Gregório XVI.

Durante a sua vida, São João Macías rezou frequentemente o rosário pelas almas do purgatório, como explica a Confraria dos Intercessores pelas Almas do Purgatório no seu site.

A iconografia, de fato, representa São João Macías libertando as almas do purgatório com o terço, que ele sempre manteve consigo como herança da mãe. Devido à sua constante oração mariana pelas almas do purgatório, seus biógrafos o chamam de “ladrão do purgatório” – e os artistas católicos frequentemente o retratam “roubando” almas do purgatório com o seu rosário.

Seu exemplo nos recorda a necessidade de orar por essas almas, bem como nos lembra do poder desta oração de intercessão.

No mês de outubro, dedicado ao santo rosário, temos uma excelente oportunidade para exercer esta magnífica obra de misericórdia. As almas que chegarem ao céu certamente retribuirão, intercedendo por nós que ainda estamos neste mundo.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

Agostinho e a liberdade (6/6)

Agostino encontra os notáveis ​​milaneses (30Giorni)

Arquivo 30Dias – 06/2002

Agostinho e a liberdade

O relatório do Arcebispo de Argel da Universidade de Pádua de 24 de maio, no final da série de conferências sobre a atualidade de Santo Agostinho.

por Henri Teissier

Livre arbítrio, onipotência divina e salvação pela graça

O tema teológico da “liberdade em Agostinho” seria o ponto central do debate proposto nesta conferência. Na realidade localizei este aspecto da nossa reflexão no final da minha intervenção, pois trata-se de um problema filosófico-teológico. Deve-se esclarecer também que, por enquanto, a reflexão sobre Agostinho na Argélia não atingiu este nível. As questões de identidade dominaram o campo com seus argumentos históricos.

Pode Agostinho ser considerado um ancestral da Argélia apesar de ser cristão e de se expressar em latim? Ele poderá encarnar a figura de um herói nacional quando toda a sua vida se passa dentro do Império Romano? Como vimos, até agora o interesse da Argélia está fora da reflexão teológica de Agostinho. A nossa busca pela relevância de Agostinho neste campo será, portanto, limitada; no entanto, podemos partir da conferência pública realizada pelo Cardeal Duval em 1987.

A primeira parte do seu texto intitulava-se “Livre arbítrio, prerrogativa essencial do homem”. O cardeal assumiu brevemente as posições de Agostino no De libero ordininio, um tratado iniciado, como se sabe, em Roma, mas terminado em África. Ele esclareceu algumas posições de Agostinho a respeito das ideias dos astrólogos, tema que foi retomado na conversa de Argel. Sabe-se, de facto, que a visão tradicional muçulmana permanece caracterizada por uma certa submissão ao destino. Duval relatou a Evodius a frase de Agostinho: "Existe alguma coisa que dependa mais da vontade do que a própria vontade?" ( De livre arbítrio I, 12, 26).

Posteriormente, o Cardeal Duval passou a outro nível, não mais filosófico como o problema do livre arbítrio, mas sim teológico, com a questão da graça e da liberdade. Ele abordou a questão a partir de sua concepção espiritual, que era uma concepção agostiniana: «Em que consiste sobretudo a atividade daquilo que Agostinho chama libertas ? No fato de que Deus que é amor transforma a vida do homem para que seja um exercício de amor”.

A distinção de níveis entre o nível filosófico e o nível teológico de uma questão nem sempre é fácil de perceber nas análises da imprensa argelina. É por esta razão que a reportagem sobre a conferência dos cardeais sobre Algérie Actualité, Mustafa Cherif disse: «A defesa dos direitos humanos, crentes ou não, baseia-se na ideia fundamental do livre arbítrio. Princípio que faz do homem quando realiza a vontade divina através da liberdade que se exerce pela graça segundo a teoria cristã”(21).

Neste julgamento vemos que é difícil, num contexto muçulmano, distinguir o problema do “livre arbítrio” enfrentado por Agostinho no início da sua vida, especialmente devido ao maniqueísmo, do problema da graça e da liberdade que surgiria da crise pelagiana. O primeiro problema deve ser colocado a um nível fundamentalmente filosófico e, até certo ponto, é um problema comum às sociedades de cultura muçulmana e de cultura cristã. O segundo é um problema teológico mais especificamente cristão, pois se situa num nível que deveria ser definido como o nível do sobrenatural. Um dos jornalistas que cobriu este tema traduz a palavra “graça” para o árabe como “perdão”, sintoma da dificuldade de entrar no vocabulário teológico propriamente cristão.

A conversa sobre Santo Agostinho incluiu também um debate sobre livre arbítrio, graça e liberdade. Deveria ser introduzido por uma conferência sobre este problema abordado a partir de uma perspectiva islâmica. O discurso foi apresentado pelo professor Bouamrane Cheikh com o título “Predestinação e livre arbítrio no Islã”. Mas esta questão não suscitou qualquer debate nem na sala nem na imprensa.

O professor Otto Wermelinger abordou o mesmo tema a partir de uma perspectiva cristã com o título “Decisões do Conselho Africano de 418 sobre Graça e Liberdade Apresentadas por Agostinho a Bonifácio, Bispo de Roma”. Ele colocou a ação da graça onde o Cardeal Duval a colocou: a inspiração do amor divino. Para Agostinho, diz Wermelinger, «a graça é uma ajuda eficaz que ilumina o intelecto e transforma. O amor divino é tal que Deus toca o coração do homem”. Conclusões Assim, uma sociedade muçulmana começou a assimilar uma figura cristã emblemática na sua herança. É um ponto de partida. Muitos argelinos ainda não se sentem suficientemente livres em relação à sua história, a ponto de nela incluir um cristão de cultura latina.

Mas, aos poucos, personalidades corajosas conseguiram restaurar a liberdade de Agostinho na sociedade de suas origens. Este é um trabalho longo, ainda em andamento. Com efeito, é necessário libertar Agostinho dos preconceitos que alteram a sua imagem e fazem dele um agente do Estado romano e da sua expansão cultural. Uma vez iniciado este trabalho, a reflexão na Argélia deverá libertar-se apenas dos problemas de identidade para olhar para as questões fundamentais que Agostinho coloca e que têm significado para todos os homens: o problema do mal, a relação entre o homem e Deus, o, a ação de Deus na história e na história das ações do homem, e muitos outros temas que Agostinho aborda com sua típica paixão e rigor intelectual.

Agostinho e liberdade, do ponto de vista da Argélia, significa antes de tudo a liberdade dos argelinos diante de Agostinho, da sua pessoa, da sua mensagem. Muitos ainda não têm essa liberdade. Mas muitos também, usando a sua liberdade, reconhecem Agostinho como mestre para a sua vida, na sua identidade de muçulmanos e expressam a alegria de saber que este Mestre é originário do seu país.

Um belo testemunho neste sentido é-nos oferecido por Kamal Mellouk, este cidadão de Tagaste-Souk Ahras de quem já falámos várias vezes. Afirma «que quer aprofundar a sua relação com Agostinho para um melhor conhecimento, através do seu itinerário espiritual, do seu próprio itinerário rumo Àquele para quem fomos feitos, Aquele que nos orientou para Ele». Depois acrescenta: «Santo Agostinho é hoje e sempre será nosso companheiro de viagem. Senti que ele tinha um sentido de interioridade e sobretudo a agudeza das suas respostas a problemas que ainda hoje são os nossos. Quando descobri que as Confissões são o diálogo que Agostinho estabelece com Deus, fiquei particularmente impressionado. As Confissões, o livro que está sempre na minha mesa de cabeceira, está repleto, do começo ao fim, da presença do Criador. É também uma longa e comovente carta aberta a Deus, que Agostinho deixa a quem quiser lê-la, para que todos possam ver a graça divina em ação”.

Aqui está um aspecto notável da relevância de Agostinho na Argélia de hoje e um testemunho da liberdade de um argelino muçulmano na sua relação com a mensagem de Agostinho.

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21 M. Cherif, Religion et liberté selon l'Augustin algérien , em Algérie Actualité , 5-11 de fevereiro de 1987.

Fonte: http://www.30giorni.it/

Papa: se deixarmos espaço para o Espírito Santo, o Sínodo correrá bem

Papa Francisco no Sínodo (Vatican Media)

Na abertura dos trabalhos da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo sobre a Sinodalidade, que começou hoje (04) no Vaticano, o Papa Francisco recordou que “se o Espírito Santo estiver no comando, será um bom sínodo, e se Ele não estiver, não será”.

https://youtu.be/bacTpEKS5mQ

Thulio Fonseca – Vatican News

Na tarde desta quarta-feira, 04 de outubro, na Sala Paulo VI, no Vaticano, teve inicio a primeira Congregação Geral da 16ª Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, com a presença do Papa, que de forma espontânea discursou aos participantes.

Francisco iniciou recordando “que foi São Paulo VI quem disse que a Igreja no Ocidente tinha perdido esta ideia de sinodalidade, e por isso criou o secretariado do Sínodo dos Bispos, que realizou muitos encontros, muitos sínodos sobre temas diferentes”.

Ao discorrer sobre o conceito de sinodalidade, o Santo Padre observou que este ainda não atingiu pleno amadurecimento e não é amplamente compreendido dentro da Igreja. No entanto, ele destacou que ao longo de quase seis décadas, a Igreja tem gradualmente trilhado esse caminho, "e hoje podemos chegar a este Sínodo com este tema”. De acordo com o Pontífice, esse enfoque surgiu através dos bispos de todo o mundo. Após o Sínodo da Amazônia, um questionário foi enviado às dioceses, e a questão da sinodalidade emergiu como um tema amplamente evidenciado e apoiado pela grande maioria dos bispos.

Não somos um parlamento

“O Sínodo não é um parlamento, é outra coisa; o Sínodo não é uma reunião de amigos para resolver algumas questões atuais ou dar opiniões, é outra coisa. Não esqueçamos, irmãos e irmãs, que o protagonista do Sínodo não somos nós: é o Espírito Santo”, enfatizou Francisco.

O Papa então sublinhou a importância da presença do Espírito Santo, que traz harmonia a comunidade eclesial, e que deve guiar o Sínodo. E em seguida fez um alerta aos participantes: “se entre nós houver outras formas de avançar pelos interesses humanos, pessoais, ideológicos, não será um Sínodo, será uma reunião parlamentar”.

A harmonia do Espirito Santo

“Se neste Sínodo chegarmos a uma declaração que é tudo igual, sem nuances , o Espírito não está aqui, ficou do lado de fora” destacou o Santo Padre ao afirmar que  a Igreja é composta de uma única harmonia de vozes que são conduzidas pelo Espírito Santo: “é assim que devemos conceber a Igreja, cada comunidade cristã, cada pessoa tem a sua peculiaridade, mas estas particularidades devem ser incluídas na sinfonia da Igreja, e esta sinfonia é criada somente pelo Espírito”.

Francisco destacou ainda que o Espírito Santo nos conduz pela mão e nos consola: “a presença do Espírito é assim – permitam-me a palavra – quase materna, como uma mãe nos conduz, nos dá esta consolação. Devemos aprender a ouvir as vozes do Espírito: são todas diferentes. Aprendamos a discernir”.

Atenção às palavras

Outro alerta do Papa foi sobre as palavras vazias e mundanas: "a tagarelice é contrária ao Espírito Santo e é uma doença muito comum entre nós. Palavras vazias entristecem o Espírito Santo, e se não permitirmos que Ele nos cure dessa enfermidade, será difícil seguir um caminho sinodal adequado. Pelo menos aqui: se você discorda do que um bispo, uma freira ou um leigo estão dizendo, seja franco com eles. Isso é o que significa um Sínodo: falar a verdade, não ter conversas por baixo da mesa."

“Cuidado com isso: não devemos ocupar o lugar do Espírito Santo com coisas mundanas, mesmo que sejam boas, como o bom senso. Isso é útil, mas o Espírito Santo vai além. Devemos aprender a viver em nossa Igreja com a orientação do Espírito Santo.”

Mensagem aos jornalistas

Francisco relembrou como a controvérsia e a pressão da mídia se sobrepuseram às discussões em Sínodos anteriores. "Quando ocorreu o Sínodo sobre a família, houve uma opinião pública de que a comunhão deveria ser concedida aos divorciados, e isso influenciou o Sínodo. Quando aconteceu o Sínodo para a Amazônia, havia pressão e opiniões públicas sobre a ordenação de homens casados."

Agora", disse o Papa, "existem algumas suposições sobre este Sínodo: 'O que eles vão fazer? Talvez permitir o sacerdócio para as mulheres.' Eu não sei, essas são as coisas que estão sendo ditas lá fora. E essas coisas são ditas com tanta frequência que os bispos às vezes têm medo de comunicar o que está acontecendo." Por isso, o Pontífice se dirigiu diretamente aos "comunicadores", pedindo que desempenhem bem o seu papel, com integridade e imparcialidade.

“Portanto, peço a vocês, comunicadores, que cumpram bem o seu papel, com integridade, para que a Igreja e as pessoas de boa vontade, compreendam que também na Igreja a prioridade é a escuta. Transmitam essa mensagem, pois é de extrema importância.”

Francisco encerrou seu discurso expressando profunda gratidão a todos que contribuem para este momento de pausa e reflexão, onde a Igreja se dedica à escuta durante o Sínodo, enfatizando que, em sua perspectiva, isso representa o aspecto mais significativo e essencial do processo sinodal.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

quarta-feira, 4 de outubro de 2023

A intercessão de Maria e Papa Francisco

Papa Francisco reza diante da imagem de Nossa Senhora de Fátima, 12/05/17 (Vatican Media)

“Retira o sol e onde estaria o dia? Tira Maria e o que restará, senão a noite mais escura?”; “Lembre-se que neste mundo te jogam para um mar agitado; você não está caminhando sobre terra firme. Lembre-se que se não quiser se perder no mar, você deve manter os olhos fixos na estrela brilhante e chamar Maria”. (São Bernardo de Claraval)

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

“E assim começamos a rezar a Ela com algumas expressões que lhe são dirigidas, presentes nos Evangelhos: “cheia de graça”, “bendita sois vós entre as mulheres”. Em breve, à oração da Ave-Maria seria acrescentado o título “Theotokos”, “Mãe de Deus”, sancionado pelo Concílio de Éfeso. E, analogamente ao que acontece no Pai-Nosso, depois do louvor acrescentamos a súplica: pedimos à Mãe que reze por nós, pecadores, para que interceda com a sua ternura, “agora e na hora da nossa morte”. Agora, nas situações concretas da vida, e no momento final, a fim de que nos acompanhe - como Mãe, como primeira discípula - na passagem para a vida eterna. (Papa Francisco)”

"Rezar em comunhão com Maria": este foi o tema da catequese do Papa Francisco na Audiência Geral de 24 de março de 2021, transmitida da Biblioteca do Palácio Apostólico devido à pandemia. "Maria- reiterou ele -  está sempre presente, ao nosso lado, com a sua ternura maternal". E recordava, que "da mediação única de Cristo adquirem significado e valor as outras referências que o cristão encontra para a sua oração e devoção, em primeiro lugar à Virgem Maria, Mãe de Jesus. Ela ocupa um lugar privilegiado na vida e, portanto, também na oração do cristão, porque é a Mãe de Jesus (...). Na iconografia cristã a sua presença está em toda a parte, às vezes até com grande destaque, mas sempre em relação ao Filho e em função d'Ele. As suas mãos, o seu olhar, a sua atitude são um “catecismo” vivo e indicam sempre o âmago, o centro: Jesus. Maria está totalmente voltada para Ele".

Depois de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje uma reflexão sobre "Intercessão de Maria e Papa Francisco":

"O Capítulo oitavo da Lumen Gentium é dedicado a Maria, mergulhada na identidade e missão da Igreja. Nesse capitulo, em relação à Maria, o documento conciliar usa o termo “multiforme intercessão”. No número 62 da Lumen Gentium fala dessa intercessão de Maria Santíssima com as seguintes palavras: “Esta maternidade de Maria na economia da graça perdura sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente deu na anunciação e que manteve inabalável junto à cruz, até à consumação eterna de todos os eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão salvadora, mas, com a sua multiforme intercessão, continua a alcançar-nos os dons da salvação eterna. Cuida, com amor materno, dos irmãos de seu Filho que, entre perigos e angústias, caminham ainda na terra, até chegarem à pátria bem-aventurada”. Maria, portanto, continua a alcançar aos seus filhos os dons da salvação eterna, pelos méritos não dela, mas de seu único Filho Salvador.

O Papa Francisco, em seu primeiro livro, ensaiando alguns temas de suas encíclicas e seu Pontificado, escreve assim sobre a Intercessão de Maria, num subtítulo em que dá esse destaque: “Na cruz, quando Cristo suportava em sua carne o dramático encontro entre o pecado do mundo e a misericórdia divina, pode ter a seus pés a presença consoladora da Mãe e do amigo. Naquele momento crucial, antes de declarar consumada a obra que o Pai lhe havia confiado, Jesus disse à Maria: “Mulher, eis o teu filho”. E logo a seguir, disse ao amigo bem amado: “Eis a tua mãe”. Essas palavras de Jesus, no limiar da morte, não exprimem primeiramente uma terna preocupação com sua mãe; mas são, antes, uma fórmula de revelação que manifesta uma missão salvadora especial. Jesus nos deixava a Sua mãe como nossa mãe. Esó depois de fazer isso é que pode sentir que “tudo se consumara”. Ao pé da cruz, na hora suprema da nova criação, Cristo nos conduz a Maria; nos conduz a Ela, porque não quer que caminhemos sem uma mãe; e, nesta imagem materna, o povo lê todos os mistérios do Evangelho. Não é do agrado do Senhor que falte à sua Igreja o ícone feminino”(p. 108).

Há um fato bíblico inegável onde vemos claramente a intercessão de Nossa Senhora para que o primeiro milagre de Cristo acontecesse, ou seja, nas bodas de Caná da Galileia, onde por intermédio do pedido da mãe, Cristo antecipa a sua hora de agir transformando água em vinho. O primeiro milagre de Jesus foi realizado depois de um pedido de Sua mãe. Foi numa festa de casamento e o olhar atento e feminino de Maria percebeu que o vinho estava no fim (João 2, 1-12). A princípio Jesus respondeu que sua hora ainda não havia chegado, mesmo assim ela disse aos que estavam servindo: “Fazei o que Ele vos disser”. Como ela intercedeu naquelas bodas da festa de um casamento, continua a interceder pela sua Igreja e por todos os seus filhos, recebidos ao pé da cruz por Jesus que entregou sua Mãe como Mãe da Igreja e da humanidade inteira. Nas Catacumbas de São Pedro e São Marcelino há uma pintura de Pedro e Paulo com Maria ao centro com as mãos erguidas ao céu em oração, sugerindo a intercessão da Mãe pela Igreja Primitiva, fundada nessas colunas de Pedro e Paulo.

Nas palavras de São Bernardo de Claraval: “Retira o sol e onde estaria o dia? Tira Maria e o que restará, senão a noite mais escura?”; “Lembre-se que neste mundo te jogam para um mar agitado; você não está caminhando sobre terra firme. Lembre-se que se não quiser se perder no mar, você deve manter os olhos fixos na estrela brilhante e chamar Maria”. Santo Afonso de Ligório, um grande doutor da Igreja e conhecido pela sua profunda devoção à Santíssima Mãe, escreveu uma obra importantíssima: As glórias de Maria. Nela, ele disse: “Se Assuero salvou os judeus porque amava Ester, como pode Deus, que ama Maria imensamente, não ouvi-la quando ela ora pelos pecadores que se recomendam a ela?” Que a resposta a essa pergunta possa fazer questionar a nossa mente e coração."

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

O tema do Círio de Nossa Senhora de Nazaré 2023 em Marabá

43º Círio de Nazaré (cnbb)

O TEMA DO CÍRIO DE NOSSA SENHORA DE NAZARÉ 2023 EM MARABÁ

 Dom Vital Corbellini / Bispo de Marabá – PA

O quadragésimo terceiro Círio de Nossa Senhora de Nazaré em Marabá, 2023, tem um tema muito importante para a vida cristã e para todas as pessoas de boa vontade que seguem o Senhor Jesus, caminho, verdade e vida (Jo 14,6): “Ó Maria, ajudai-nos a partilhar a Palavra e o Pão”. Ele está relacionado à presença de Jesus, como a Palavra do Pai e da Campanha da Fraternidade 2023, cujo lema é: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16). O tema delineia a vida de todo o Círio, o sentido litúrgico, o Simpósio Mariano realizado, as visitas nas comunidades, nas paróquias, o Círio Missionário, o Círio Fluvial e os dias propriamente ditos como no sábado e no domingo, 14 e 15 de Outubro.

Ó Maria, ajudai-nos a partilhar a Palavra.

A vida de todo o seguidor e seguidora está ligada a Jesus Cristo, por intercessão de Maria, a sua Mãe. Maria leva os pedidos das pessoas até o seu Filho Jesus Cristo. Nesta primeira parte, o lema é uma prece confiante que o fiel faz, pedindo a Maria para que ela ajude a todo o povo fiel cristão, seguidor de Jesus Cristo, a partilhar a Palavra, entendida como uma Pessoa, Jesus Cristo. Ele é o enviado do Pai, é o Verbo feito carne (Jo 1,14) que assumiu a realidade humana em tudo menos o pecado. A Palavra não é um balbuciar de coisas, mas é a Pessoa de Jesus de Nazaré, como Salvador e Redentor. É a Palavra eterna, gerada desde toda a eternidade pelo Pai e que se tornou Pessoa humana, entrando na realidade humana para a salvação de toda a humanidade.

Maria, mulher meditativa.

O evangelista São Lucas colocou um dado importante na vida de Maria santíssima, de mulher meditativa. No nascimento de Jesus à humanidade, os anjos cantaram aos pastores: “Glória a Deus no mais alto dos céus, e na terra, paz a todos por ele amados”(Lc 2, 14). Os pastores foram ver em Belém as maravilhas do Senhor que entrou na realidade humana, encontraram Maria e José e o recém-nascido deitado na manjedoura (Lc 2, 16). Eles relataram as manifestações, as coisas divinas a respeito do menino Jesus, e, Maria guardava todos aqueles acontecimentos, meditando-os em seu coração (Lc 2, 18-19). Maria foi uma pessoa que meditava as coisas de Deus na sua vida intima, em seu coração. A palavra meditar vem do latim meditari, cujo significado é curar, permanecer por um longo tempo e com intensa concentração a mente sobre uma afirmação, palavra sagrada1. A meditação faz a pessoa viver o mistério do Senhor em seu coração com maior vivacidade, em vista de uma atuação caritativa.

Ouvir a Palavra de Deus e guardá-la.

O evangelista São Lucas também disse que uma mulher no meio da multidão levantou a voz para afirmar a Jesus que era bem-aventurado o ventre que o gerou e os seios que o amamentaram. Mas Jesus respondeu àquela mulher que eram bem-

aventurados antes as pessoas que ouvem a Palavra de Deus e a guardam (Lc 11, 27-28). Esta bem-aventurança era dirigida sem dúvida à sua mãe, Maria, como mulher que ouviu a Palavra de Deus e a guardou em seu coração. Jesus realçou a maternidade messiânica que fez Maria uma ouvinte da Palavra e operadora da mesma, guardando-a em seu coração.

Ó Maria, ajudai-nos a partilhar o Pão.

Na segunda parte do tema, a pessoa suplica a Maria para que ela ajude a partilhar o Pão. O tema está ligado à Campanha da Fraternidade 2023, da CNBB, que ressalta a fome e a partilha do Pão2. Jesus realizou a multiplicação dos pães para a multidão faminta. Diante da proposta dos discípulos para que o Senhor Jesus despedisse a multidão porque já era tarde e o lugar era deserto para que as multidões fossem aos povoados comprar comida, Jesus disse aos discípulos para que não fossem embora as multidões e eles mesmos dessem de comer (Mt 14, 15-16). Como uma pessoa trazia cinco pães e dois peixes, ele fez a multiplicação das poucas coisas de modo que todos se saciaram e ficaram felizes pela comida em abundância(Mt 14, 17-20). Jesus fez a ação maravilhosa da multiplicação dos pães, mas ele quer também que as pessoas façam o bem para os outros, sobretudo para todas aquelas que passam fome e necessidades.

O Pão e a caridade.

O Círio de Nossa Senhora de Nazaré estimula a práticas de caridade, porque é próprio da pessoa fiel viver o amor aos outros. A relação com Deus, para ser verdadeira passa pelo amor ao próximo. O Senhor Jesus Cristo nos disse que somos chamados a amar-nos uns aos outros (Jo 13,34). Ainda o Apóstolo São João diz que quem ama a Deus, mas não ama o próximo, o seu amor é mentiroso, porque se não ama o irmão que vê como pode amar a Deus a quem não vê? (1 Jo 4,20). A caridade é fundamental diante da realidade da fome. As pessoas passam por dificuldades de comer, de modo que a ajuda na comida ou em políticas públicas é essencial. A indiferença ou a omissão seriam coisas que não ajudariam em nada diante da possibilidade da caridade a ser percebida pela realidade da fome.

A caridade é o distintivo do discipulado do Senhor.

A caridade faz a pessoas seguir a Jesus Cristo. Ele deu a sua vida pela salvação da humanidade. Ele também disse que quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la, mas quem a perde por causa de Jesus a encontrará (Mt 16,25). É preciso perder algo de si mesmo para o bem das pessoas que passam fome. Quando se tem amor pelos pobres como Jesus teve na evangelização (Lc 4, 18), tudo tem sentido na ajuda aos famintos e famintas. É o amor-caridade3 que faz a pessoa sair de si mesma para ir ao encontro de quem passa fome ou possui a necessidade para comer.

Ó Maria, ajudai-nos a partilhar a Palavra e o Pão.

O tema do Círio de Nossa Senhora de Nazaré 2023 motiva a todos os fiéis a ler a Palavra de Deus e fazer obras boas de caridade, de amor. Com o pouco que se tem será possível fazer muitas coisas, o que foi feito pelo Senhor pela multiplicação dos pães e dos peixes. Ele saciou a multidão faminta, com responsabilidade mútua. Maria seja a intercessora junto a Jesus para que todas as pessoas vivam a Palavra de Deus, que é Jesus e a Palavra seja partilhada, assim como o Pão seja também partilhado para mais pessoas para uma vida digna conforme o Plano do Senhor.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

"Laudate Deum", o grito do Papa por uma resposta à crise climática

Terra e extrema seca (Vatican Media)

Publicada a exortação apostólica de Francisco que especifica e completa a encíclica de 2015: não estamos reagindo o suficiente, estamos perto do ponto de ruptura. Crítica aos negacionistas: indubitável a origem humana do aquecimento global. O compromisso de cuidar da casa comum nasce da fé cristã.

VATICAN NEWS

““Laudate Deum” é o título desta carta. Porque um ser humano que pretenda tomar o lugar de Deus torna-se o pior perigo para si mesmo". Com essas palavras, conclui-se a exortação apostólica do Papa Francisco, publicada em 4 de outubro. Um texto em continuidade com a encíclica Laudato si' de 2015. Em 6 capítulos e 73 parágrafos, olhando para a COP28 em Dubai daqui a dois meses, o Sucessor de Pedro pretende fazer um apelo à corresponsabilidade diante da emergência das mudanças climáticas, porque o mundo "está desmoronando e talvez se aproximando de um ponto de ruptura". É um dos "maiores desafios que a sociedade e a comunidade global enfrentam", "os efeitos das alterações climáticas recaem sobre as pessoas mais vulneráveis" (3).

Os sinais da mudança climática cada vez mais evidentes

No primeiro capítulo, o Papa explica que, por mais que tentemos negá-los, "os sinais da mudança climática estão aí, cada vez mais evidentes". Ele cita "fenômenos extremos, períodos frequentes de calor anormal, seca e outros gemidos da terra". Afirma: "é possível verificar que certas mudanças climáticas, induzidas pelo homem, aumentam significativamente a probabilidade de fenômenos extremos mais frequentes e mais intensos". E para aqueles que minimizam, responde: "aquilo que agora estamos a assistir é uma aceleração insólita do aquecimento". "Provavelmente, dentro de poucos anos, muitas populações terão de deslocar as suas casas por causa destes fenômenos" (6).

A culpa não é dos pobres

Para aqueles que culpam os pobres por terem muitos filhos e talvez tentem resolver o problema "mutilando as mulheres nos países menos desenvolvidos", Francisco lembra "que uma reduzida percentagem mais rica do planeta polui mais do que o 50% mais pobre". A África, que "alberga mais da metade das pessoas mais pobres do mundo, é responsável apenas por uma mínima parte das emissões no passado" (9). Em seguida, o Papa desafia aqueles que afirmam que o menor uso de combustíveis fósseis levará "à diminuição dos postos de trabalho". Na realidade, "milhões de pessoas perdem o emprego” devido às diversas consequências da mudança climática. Enquanto a transição para as energias renováveis, "bem administrada", é capaz de "gerar inúmeros postos de trabalho em diferentes setores. Por isso é necessário que os políticos e os empresários se ocupem disso imediatamente" (10).

Indubitável origem humana

"A origem humana - 'antrópica' - da mudança climática já não se pode pôr em dúvida", diz Francisco. "A concentração na atmosfera dos gases com efeito estufa... nos últimos cinquenta anos, o aumento sofreu uma forte aceleração" (11). Ao mesmo tempo, a temperatura "aumentou a uma velocidade inédita, sem precedentes nos últimos dois mil anos" (12). Isso resultou na acidificação dos mares e no derretimento dos glaciares. A coincidência entre esses eventos e o crescimento das emissões de gases de efeito estufa "não pode ser escondida. A esmagadora maioria dos estudiosos do clima defende esta correlação, sendo mínima a percentagem daqueles que tentam negar esta evidência". Infelizmente, a crise climática não é propriamente uma questão que “interesse às grandes potências econômicas, preocupadas em obter o maior lucro ao menor custo e no mais curto espaço de tempo possíveis" (13).

Em tempo para evitar danos mais dramáticos

" Vejo-me obrigado – continua Francisco - a fazer estas especificações, que podem parecer óbvias, por causa de certas opiniões ridicularizadoras e pouco racionais que encontro mesmo dentro da Igreja Católica. Mas não podemos continuar a duvidar que a razão da insólita velocidade de mudanças tão perigosas esteja neste facto inegável: os enormes progressos conexos com a desenfreada intervenção humana sobre a natureza" (14). Infelizmente, algumas manifestações dessa crise climática já são irreversíveis por pelo menos centenas de anos. É "urgente uma visão mais alargada... tudo o que se nos pede é uma certa responsabilidade pela herança que deixaremos atrás de nós depois da nossa passagem por este mundo" (18).

O paradigma tecnocrático: a ideia de um ser humano sem limites

No segundo capítulo, Francisco fala do paradigma tecnocrático que "consiste, substancialmente, em pensar como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia" (20) com base na ideia de um ser humano sem limites. "Nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, e nada garante que o utilizará bem, sobretudo se se considera a maneira como o está a fazer...É tremendamente arriscado que resida numa pequena parte da humanidade" (23). O Papa reitera que "o mundo que nos rodeia não é um objeto de exploração, utilização desenfreada, ambição sem limites" (25). Ele também lembra que estamos incluídos na natureza, e "isso exclui a ideia de que o ser humano seja um estranho, um fator externo capaz apenas de danificar o ambiente" (26).

Vídeo: https://youtu.be/Ay51_JGRe54

Decadência ética do poder: marketing e informações falsas

"Realizamos progressos tecnológicos impressionantes e surpreendentes, sem nos darmos conta, ao mesmo tempo, que nos tornámos altamente perigosos, capazes de pôr em perigo a vida de muitos seres e a nossa própria sobrevivência" (28). "A decadência ética do poder real é disfarçada pelo marketing e pela informação falsa, mecanismos úteis nas mãos de quem tem maiores recursos para influenciar a opinião pública através deles" (29). "Podemos notar como às vezes os próprios pobres, confundidos e encantados perante as promessas de tantos falsos profetas, caem no engano dum mundo que não é construído para eles" (31). Há "um domínio daqueles que nasceram com melhores condições de progresso" (32).

Política internacional fraca

No capítulo seguinte da exortação, o Papa aborda o tema da fraqueza da política internacional, insistindo na necessidade de favorecer "acordos multilaterais entre Estados" (34). Ele pede "organizações mundiais mais eficazes, dotadas de autoridade para assegurar o bem comum mundial". Essas organizações que "devem dotadas duma real autoridade que possa «assegurar» a realização de alguns objetivos irrenunciáveis" (35). Francisco lamenta "que as crises globais sejam desperdiçadas, assim como sucedeu na crise financeira de 2007-2008 e com a pandemia, que trouxeram "maior individualismo, menor integração, maior liberdade para os que são verdadeiramente poderosos e sempre encontram maneira de escapar ilesos" (36). O desafio atual é recriar um novo multilateralismo "à luz da nova situação global" (37), reconhecendo que tantas agregações e organizações da sociedade civil ajudam a compensar as fraquezas da Comunidade internacional.

Inúteis as instituições que preservam os mais fortes

Francisco propõe " um multilateralismo «a partir de baixo» e não meramente decidido pelas elites do poder" (38). Ele lembra que é necessário um "quadro diferente para uma cooperação eficaz" (42). Portanto, precisamos de "uma espécie de maior «democratização» na esfera global... Deixará de ser útil apoiar instituições que preservem os direitos dos mais fortes, sem cuidar dos direitos de todos". (43)

O que se espera da COP de Dubai?

No capítulo seguinte, analisando a COP28, Francisco escreve: "Não podemos renunciar ao sonho de que a COP28 leve a uma decidida aceleração da transição energética, com compromissos eficazes que possam ser monitorizados de forma permanente. Esta Conferência pode ser um ponto de viragem" (54). Infelizmente, "a necessária transição para energias limpas..., não avança de forma suficientemente rápida" (55).

Chega de ridicularizar a questão ambiental

Francisco pede o fim da "atitude irresponsável" daqueles que ridicularizam a questão ambiental por interesses econômicos: em vez disso, trata-se de "dum problema humano e social em sentido amplo e a diversos níveis. Por isso requer-se o envolvimento de todos". Com relação aos protestos de grupos radicalizados, o Papa afirma que "eles preenchem um vazio da sociedade", pois caberia "a cada família pensar que está em jogo o futuro dos seus filhos" (58) e exercer uma pressão saudável. O Pontífice espera que da COP28 surjam "formas vinculantes de transição energética" que sejam eficientes e "facilmente monitoráveis" (59). " Oxalá que, a intervir na COP28, sejam estrategas capazes de pensar mais no bem comum e no futuro dos seus filhos, do que nos interesses contingentes de algum país ou empresa. Possam assim mostrar a nobreza da política, e não a sua vergonha" (60).

Um compromisso que brota da fé cristã

Por fim, o Papa recorda as razões desse compromisso que brota da fé cristã, incentivando "os irmãos e irmãs de outras religiões a fazerem o mesmo" (61). "A cosmovisão judaico-cristã defende o valor peculiar e central do ser humano no meio do maravilhoso concerto de todos os seres... formamos uma espécie de família universal, uma comunhão sublime que nos impele a um respeito sagrado, amoroso e humilde" (67). " Isto não é um produto da nossa vontade... pois Deus uniu-nos tão estreitamente ao mundo que nos rodeia" (68). O que é importante, escreve Francisco, é lembrar que "não há mudanças duradouras sem mudanças culturais... e não há mudanças culturais sem mudança nas pessoas" (70). "Os esforços das famílias para poluir menos, reduzir os esbanjamentos, consumir de forma sensata estão a criar uma nova cultura" (71). O pontífice conclui lembrando "que as emissões pro capite nos Estados Unidos são cerca do dobro das dum habitante da China e cerca de sete vezes superiores à média dos países mais pobres". E afirma "que uma mudança generalizada do estilo de vida irresponsável ligado ao modelo ocidental teria um impacto significativo a longo prazo. Assim, juntamente com as indispensáveis decisões políticas, estaríamos no caminho do cuidado mútuo" (72).

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Paquistão e os 800 anos do encontro de São Francisco com o Sultão do Egito

São Francisco de Assis e o Sultão do Egito AL-Kamil em 1219 (Vatican Media)

Há 800 anos realizava-se o histórico encontro entre São Francisco de Assis e o sultão do Egito, AL-Kamil, um pilar na esteira do diálogo inter-religioso islâmico-cristão. O presidente dos bispos paquistaneses, Sebastian Shaw reitera que também hoje devemos ser embaixadores da paz.

Cecilia Sepia - Cidade do Vaticano

Era o ano de 1219 quando Francisco de Assis, em meio às Cruzadas e ao clima de violência e conflito delas decorrente, decidiu dar a sua contribuição para promover a paz,  com a bênção e permissão do Papa Honório III.

Assim, enquanto as duas margens do Mediterrâneo eram marcadas pelo ódio, o “Pobre de Assis” foi a Damietta, a poucos quilômetros de distância do Cairo para conversar com o Sultão do Egito Malik al Kamil, fazendo com que o Evangelho se encontrasse com o Alcorão. Um gesto inesperado, forte nas intenções e implicações, mas que permaneceu por muito tempo "pouco glorioso", sendo considerado até mesmo pela maioria como um fracasso.

Mas desejo do próprio Francisco de Assis em ir até os muçulmanos, sem bolsa nem alforje, com a única arma do respeito, que se coloca como caminho ainda hoje para buscar o entendimento e harmonia entre Oriente e Ocidente.

O Pobrezinho de Assis, com sua visão de evangelização e com suas ações, faz parte de toda outra lógica, desconhecida na época, e acaba até mesmo por prever a derrota aos cruzados.

Celebrações no Paquistão

Oitocentos anos mais tarde,  toma forma no Paquistão - por iniciativa da Comissão Nacional para o Diálogo Inter-religioso e o Ecumenismo, no seio da Conferência dos Bispos do Paquistão - uma série de importantes iniciativas e celebrações, voltadas a relançar a mensagem universal de tolerância, de amizade, do compromisso comum pela paz.

A inauguração deste ano especial dedicado ao diálogo ocorreu nos dias passados em Lahore, na presença de Dom Sebastian Shaw, arcebispo da cidade, e presidente da Conferência Episcopal do Paquistão e padre Francis Nadeem, Custódio dos Frades Capuchinhos paquistaneses, e secretário executivo da Comissão. Presentes  numerosos franciscanos, religiosas, sacerdotes, leigos e eminentes estudiosos muçulmanos que também foram para a ocasião partindo de cidades como Sialkot, Gujranwala e Islamabad.

Da parte do diálogo

Os dois grandes líderes, Francisco e Al-Kamil, "uniram-se em favor da paz e da tolerância em meio à atmosfera de guerra e conflito durante as Cruzadas. Deram um exemplo de diálogo inter-religioso e compreensão recíproca", disse o padre Nadeem.

No início da cerimônia, também foi desvelada uma pintura - como relatado pela Ag. Fides - que retrata o encontro entre São Francisco de Assis e Al- Kamil, enquanto pombas eram soltas, simbolizando a esperança de difundir a mensagem de paz no Paquistão e em todos aqueles lugares onde há conflitos religiosos e políticos.

O capuchino Shahzad Khokher a seguir,  apresentou  o contexto histórico e o significado deste encontro, narrado também em um livro da Livraria Editora Vaticana (LEV), intitulado "Bento XVI e São Francisco", de Gianfranco Grieco, que investiga justamente a teologia, a catequese e a espiritualidade do Papa emérito sobre o Pobrezinho de Assis, toda focada no fortalecimento do diálogo inter-religioso, tema caro também ao Papa Bergoglio, que do Frade Santo, escolheu o nome.

Embaixadores da paz

O arcebispo Shaw encorajou todos os presentes a "serem embaixadores da paz", inspirando-se no exemplo demonstrado por esses grandes líderes em um tempo em que falar sobre a paz parecia quase inoportuno.

Padre Nadeem, por sua vez, anunciou que em 2019 o evento será celebrado em todo o Paquistão, com diversas atividades: seminários para crianças, jovens, estudantes universitários, envolvendo sempre mais  cristãos e muçulmanos.

"Pretendemos alcançar - disse ele - também aqueles 30% de líderes religiosos muçulmanos que são hostis em relação aos cristãos.  Como São Francisco, sem medo, com a ajuda dos muçulmanos que estão do nosso lado, desejamos encontrá-los para promover a paz e a harmonia no Paquistão".

Muhammad Asim Makhdoom, famoso estudioso entre os muitos líderes islâmicos presentes, concordou: "Promoveremos juntos a missão de São Francisco e do Sultão. Cabe a nós enfrentar os que espalham ódio e preconceito entre as religiões. Cabe a nós comprometemo-nos seriamente este ano para convencer outras pessoas a unirem-se a este movimento que promove o diálogo inter-religioso, a paz e a harmonia social, enquanto nós celebramos o 800º aniversário daquele encontro histórico."

 A cerimônia foi concluída com a oração comum pela paz recitada pela assembleia.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Agostinho e a liberdade (5/6)

Agostino encontra os notáveis ​​milaneses (30Giorni)

Arquivo 30Dias – 06/2002

Agostinho e a liberdade

O relatório do Arcebispo de Argel da Universidade de Pádua de 24 de maio, no final da série de conferências sobre a atualidade de Santo Agostinho.

por Henri Teissier

A liberdade de Agostinho comparada ao prestígio de Roma

Agostinho foi educado para conhecer toda a herança da cultura clássica. Toda a sua obra restaura esse conhecimento e mostra a sua extensão, por exemplo, em De civitate Dei , quando revê o panteão romano e critica os seus mínimos detalhes ( De civitate Dei IV, 8). Agostinho inseriu-se no Império Romano do seu tempo e soube apreciar a sua grandeza. E, no entanto, sabe distinguir os planos da Cidade de Deus: o da obra divina que, pela graça, toca o coração do homem e o das forças humanas que constroem o Império.

Tem a coragem de realçar o desejo de dominação que, com guerras incessantes, submeteu o mundo mediterrânico ao poder de Roma. «Este resultado», diz Agostinho, «foi alcançado com muitas guerras enormes, com grande matança de homens e grande derramamento de sangue humano» ( De civitate Dei XIX, 7).

Sabe-se que Agostinho foi espectador do saque de Roma por Alarico em 410, sem ceder ao desespero, como fez seu contemporâneo São Jerônimo. Negou o nome de república ao Estado Romano porque este não nasceu da justiça que a Cidade de Deus proporciona: «Se, portanto, o Estado ( res publica) é coisa do povo, se a definição for verdadeira, o Estado Romano nunca existiu, porque nunca foi coisa do povo, e ele [Cícero] demonstrou que essa é a definição do Estado. Na verdade, ele definiu o povo como a união de um certo número de indivíduos, ocasionada pela conformidade da lei e pela comunhão de interesses. No debate explica o que entende por conformidade do direito, pois demonstra que sem justiça o Estado não pode ser administrado; é, portanto, impossível ter direitos num Estado onde não existe verdadeira justiça" ( De civitate Dei XIX, 21).

Estes princípios levaram-no ao seguinte juízo (de liberdade absoluta em relação aos poderes terrenos) expresso no famoso texto onde os impérios sem justiça são comparados a bandos de bandidos: «Se a justiça não for respeitada, o que são os Estados senão grandes bandos de ladrões? ? Porque mesmo as gangues de bandidos, o que são elas senão pequenos estados?" ( De civitate Dei IV, 4). «Travar a guerra contra os vizinhos, continuar com outras guerras, derrotar e subjugar povos que não os perturbaram por simples ambição de domínio, o que mais devemos considerar senão um grande ato de banditismo?» ( De civitate Dei IV, 6).

No mesmo espírito, Agostinho opôs-se à tortura que o juiz utilizou contra pessoas inocentes para tentar descobrir os culpados: «E o que podemos dizer quando alguém sofre tortura num julgamento e é dilacerado quando se investiga se ele é culpado e um pessoa inocente sofre punições muito certas por um crime incerto?” ( De civitate Dei XIX, 6). Todos estes textos importantes foram recordados durante a reunião de Argel ou nos comentários da imprensa.

Parece-me que estas citações são suficientes para ilustrar a liberdade de Agostinho em relação ao sistema social em que cresceu e viveu. Quão distantes estão estas reflexões dos julgamentos categóricos que lhe são atribuídos pelos seus atuais adversários na Argélia!

A liberdade de se reconhecer filho de sua própria cultura

Agostinho é o maior médico latino de sua época. Mas este prestígio da língua latina, que utiliza com total maestria, não o leva a desprezar a cultura particular do povo númida de onde provém.

É bem conhecida sua famosa resposta ao gramático Máximo de Madaura, lembrada, entre outras coisas, pelo professor Kevin Coyle em seu discurso. O interlocutor de Agostinho brincou sobre as consonâncias púnicas dos nomes dos mártires africanos Miggin, Namphano e outros. Agostinho respondeu: «Você é tão esquecido de si mesmo, a ponto de pensar que tem que criticar os nomes púnicos, você, africano, no ato de escrever aos africanos e nós dois que vivemos na África?» ( Carta 17, 2)(19).

A igualmente famosa resposta a Juliano de Eclano durante a questão pelagiana também segue a mesma linha. O oponente de Agostinho o define como “poenus disputator” ou “poenus tratador” ou “poenus orator” ou, finalmente, “poenus scriptor”. Agostinho não contesta a referência à sua identidade “púnica”, mas responde ao seu oponente dizendo-lhe que não consegue livrar-se de uma discussão com sarcasmo que não consegue refutar com argumentos dignos do assunto em discussão (Ad Tururbantium, fr. 52 ) (20) .

É digno de nota, por outro lado, que Agostinho, depois da sua conversão em Cassiciacum e do batismo em Milão, quis regressar à sua terra natal para não a abandonar novamente e inscrever toda a sua obra na Igreja da África. Agostinho também exerce esta liberdade para se situar dentro da sua própria cultura dentro da Igreja. Combateu o particularismo donatista aproveitando o tema da inscrição da Igreja da África na Igreja universal. Mas, ao mesmo tempo, afirmou também a liberdade da Igreja de África nas suas relações com a Igreja de Roma. A crise pelagiana e as dificuldades da Igreja da África com o Papa Zózimo puseram em evidência a liberdade da Igreja da África quando defende a sua tradição teológica.

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19 K. Coyle, “L'identité du christianisme nord-africain aux temps d'Augustin”, Anais do Colóquio de Argel.
20 Ver M. Lamberigts, “O Italiano Juliano de Aeclanum versus o Africano Agostinho de Hipona”, Proceedings of the Algiers colloquium.

Fonte: http://www.30giorni.it/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF