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domingo, 24 de dezembro de 2023

Segunda Pregação do Advento 2023 do cardeal Cantalamessa (3/3)

2ª Pregação do Advento (Vatican Media)

Segunda Pregação do Advento 2023 do cardeal Cantalamessa

"O presépio é, portanto, uma tradição útil e bela, mas não podemos nos contentar com os tradicionais presépios externos. Devemos montar para Jesus um presépio diverso, um presépio do coração. Corde creditur: crê-se com o coração. Christum habitare per fidem in cordibus vestris: que Cristo venha habitar em vossos corações pela fé (Ef 3,17). Maria e o seu Esposo continuam, misticamente, a bater às portas, como fizeram naquela noite em Belém."

Fr. Raniero Card. Cantalamessa, OFMCap
“BEM-AVENTURADA AQUELA QUE ACREDITOU!”
Segunda Pregação do Advento de 2023

Voltar ao coração!

Voltemos, para terminar, à palavra de Pascal sobre Deus que “se sente com o coração”. Não mais para fazer disso objeto de considerações históricas e teológicas, mas pessoais e práticas. Pascal foi um fervoroso discípulo de Santo Agostinho, até, infelizmente, a compartilhar também algum excesso e erro, como aquele, reproposto pelos Jansenistas, da dupla predestinação divina, à glória ou à danação! Também o apelo de Pascal ao coração ressoa a influência do Doutor de Hipona. Comentando o versículo de Isaías: “Lembrai-vos disso e envergonhai-vos, guardai-o no coração, ó rebeldes (redite, praevaricatores ad cor)” (Is 46,8, Vulgata), em um discurso ao povo, Santo Agostinho dizia:

Voltai ao vosso coração!... Voltai de vossa errância que vos levou para fora do caminho; voltai ao Senhor. Ele está pronto. Volta antes ao teu coração, tu que te tornaste estranho a ti mesmo, por força de ir afora: não te conheces a ti mesmo, e buscas aquele quem te criou! Volta, volta ao coração, separa-te do corpo... Volta ao coração: lá, examina o que talvez percebas de Deus, pois lá se encontra a imagem de Deus; na interioridade do homem habita Cristo[10].

O homem envia as suas sondas até a periferia do sistema solar e além, mas ignora o que acontece a milhares de metros sob a crosta terrestre, daí a dificuldade em prever os terremotos. É uma imagem do que acontece no âmbito do espírito, em nossa própria vida. Vivemos todos projetados ao exterior, ao que acontece ao nosso redor, desatentos ao que acontece dentro de nós. O silêncio causa medo.

Greccio, 1223

No Natal deste ano recorre o VIII centenário da primeira realização do presépio em Greccio. É o primeiro dos três centenários franciscanos, o qual seguirão, em 2024, o dos Estigmas do santo e, em 2026, o da sua morte. Também esta circunstância pode nos ajudar a voltar ao coração. O seu primeiro biógrafo, Tomás de Celano, refere as palavras com que o Pobrezinho explicava a sua iniciativa: “Quero lembrar o menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num presépio, e contemplar com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro”[11].

Infelizmente, com o passar do tempo, o presépio se afastou daquilo que representava para Francisco. Tornou-se, frequentemente, uma forma de arte ou de espetáculo do qual se admira a montagem externa, mais do que o significado místico. Ainda assim, contudo, ele desempenha a sua função de sinal e seria tolo renunciar a ele. Em nosso Ocidente, multiplicam-se as iniciativas para eliminar das solenidades natalinas toda referência evangélica e religiosa, reduzindo-o a uma mera e simples festa humana e familiar, com tantas fábulas e personagens inventados no lugar dos verdadeiros personagens do Natal. Alguém gostaria de mudar até mesmo o nome da festa.

Um dos pretextos é favorecer, deste modo, a convivência pacífica com fiéis de outras religiões, na prática, com os muçulmanos. Na realidade, este é o pretexto de um certo mundo laicista que não quer estes símbolos, não dos muçulmanos. No Alcorão, há uma Sura dedicada ao nascimento de Jesus que vale a pena conhecer. Diz:

E quando os anjos disseram: “Ó Maria, por certo que Deus te anuncia o seu Verbo, cujo nome será o Messias, Jesus [‘Isà], filho de Maria, nobre neste mundo e no outro... Falará aos homens, ainda no berço, bem como na maturidade, e se contará entre os virtuosos”. Perguntou: “Ó Senhor meu, como poderei ter um filho, se mortal algum jamais me tocou?”. Disse-lhe o anjo: “Assim será, Deus cria o que deseja, posto que quando decreta algo, diz: ‘Seja!’. E é[12].

Uma vez, no tempo que, no sábado ao entardecer, eu explicava o Evangelho dominical no programa da RAI “A Sua Immagine”, pedi esta sura fosse lida por um muçulmano, que se disse feliz em contribuir, desse modo, para dissipar um equívoco que os prejudica, com o pretexto de favorecê-los. A veneração com que o Alcorão recorda o nascimento de Jesus e o lugar que a Virgem Maria nela ocupa teve, há alguns anos, um reconhecimento inesperado e clamoroso. O Emir de Abu Dhabi decidiu dedicar a Mariam, Umm Eisa, “Maria, Mãe de Jesus”, a belíssima mesquita do emirado, que antes portava o nome do seu fundador, o Xeique Mohammad Bin Zayed.

O presépio é, portanto, uma tradição útil e bela, mas não podemos nos contentar com os tradicionais presépios externos. Devemos montar para Jesus um presépio diverso, um presépio do coração. Corde creditur: crê-se com o coração. Christum habitare per fidem in cordibus vestris: que Cristo venha habitar em vossos corações pela fé (Ef 3,17). Maria e o seu Esposo continuam, misticamente, a bater às portas, como fizeram naquela noite em Belém. No Apocalipse, é o Ressuscitado em pessoa que diz: “Eis que estou à porta e bato” (Ap 3,20). Abramos-lhe a porta do nosso coração. Façamos dele um berço para o Menino Jesus. Que sinta, no frio do mundo, o calor do nosso amor e da nossa infinita gratidão de redimidos!

Esta não é uma bela e poética ficção; é a mais árdua empresa da vida. Em nosso coração, de fato, há lugar para muitos hóspedes, mas apenas para um dono. Deixar Jesus nascer significa deixar morrer o próprio “eu”, ou ao menos renovar a decisão de não mais viver para nós mesmos, mas por Aquele que nasceu, morreu e ressuscitou por nós (cf. Rm 14,7-9). “Onde nasce Deus, morre o homem”, afirmou um certo existencialismo ateísta. É verdade! Morre, porém, o homem velho, corrompido e destinado, em todo caso, a terminar com a morte, e nasce o homem novo, “criado em justiça e santidade da verdade” (Ef 4,24). É uma empresa que não terminará com o Natal, mas pode começar com ele.

Que a Mãe de Deus, que “concebeu Cristo no seu coração antes que no seu corpo”, nos ajude a realizar este propósito.

Feliz aniversário a Jesus – e Feliz Natal a todos: Santo – e amado – Padre, Papa Francisco, venerados Padres, irmãos e irmãs!

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Tradução de Fr. Ricardo Farias, OFMCap.

Notas
[10] Cf. Agostinho, Tratados sobre o Evangelho de João, 18,10.
[11] Cf. Tomás de Celano, Primeira Vida, 84-86.
[12] Alcorão, Sura III, 45-47.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Por que Jesus nasceu em Belém?

Foto: reprodução (Crédito: Guadium Press)

Tudo o que aconteceu com o Verbo de Deus encarnado, Nosso Senhor Jesus Cristo, possui uma altíssima razão de sabedoria, inclusive o fato de Ele ter nascido numa fria gruta de Belém.

Redação (23/12/2023 19:09, Gaudium Press) Por critérios deformados, é comum encontrarmos pessoas para as quais a ideia de superioridade significa ostentar os sinais do poder e/ou da fama, não carecer de bens materiais, enfim, receber diariamente o “sorriso da sorte”.

Entretanto, exatamente para romper com esta mentalidade, o Salvador do mundo, “por quem e para quem todas as coisas foram feitas” (Cf. Cl 1,16) desejou começar a sua vida nesta Terra nascendo numa gruta, deitado numa manjedoura e envolto em faixas.

O próprio São João escreve no prólogo de seu Evangelho que o Verbo “veio para os que eram seus e os seus não o receberam” (Jo 1,11), e, por esta falta de acolhida, o Menino-Deus teve que nascer escondido e rejeitado na cidadezinha de Belém. “Desastre!” – pensam os superficiais; “maravilha!” – bradam os homens de fé.

Com efeito, como reza o provérbio, “Deus escreve reto em linhas retas; somos nós que as vemos tortas…”

Tudo o que é feito por Deus tem uma razão de ser. Portanto, todos os fatos da vida de Nosso Senhor deram-se em decorrência de uma imensa – ou, a bem dizer, divina – Sabedoria. Exemplo frisante e sublime desta verdade é o próprio nascimento do Menino Jesus, mais detalhadamente narrado por São Lucas (cf. 2,1-20), cujas circunstâncias, à primeira vista incompatíveis ao nascimento de um Deus, foram permitidas pela Providência Divina.

Ora, como discernir tal perfeição no nascimento de Jesus Cristo? São Tomás de Aquino explica: “Cristo quis nascer em Belém por dois motivos. Primeiro, porque ‘é da descendência de Davi segundo a carne’ (Rm 1,3), como se diz na Carta aos Romanos. Por isso quis nascer em Belém, onde nascera também Davi, para que, pelo lugar mesmo do nascimento, aparecesse a realização da promessa que lhe tinha sido feita. É o que mostra o evangelista ao dizer: ‘Porque era da casa e da família de Davi’(Lc 2,4). E em segundo lugar, porque, como diz Gregório: ‘Belém quer dizer ‘casa do pão’. E o próprio Cristo afirma: ‘Eu sou o pão vivo, que desceu do céu’”.[1]

Se deitarmos o olhar por um instante no primeiro livro de Samuel, veremos o ilustre fato da escolha e unção do rei Davi. Vendo o Senhor que Samuel se afligia com Saul por causa dos pecados deste, dirigiu-lhe a palavra e ordenou-lhe que fosse a Belém: “Enche teu corno de óleo e vai; envio-te a Jessé de Belém, porque escolhi um rei entre os seus filhos, ungirás para mim aquele que eu mandar” (Cf. 2Sm 16,1.3). A história já é por nós conhecida. Mas dentre os detalhes da narração, algo muito simbólico é que, dentre todos os filhos de Jessé, o escolhido foi o único que estava apascentando as ovelhas de seu pai: “Davi vem do meio das ovelhas que apascenta e é constituído pastor de Israel (Cf. 2Sm 5,2). Já o profeta Miqueias fixa o olhar num futuro distante e anuncia que de Belém sairia Aquele que haveria de apascentar um dia o povo de Israel (Cf. Mq 5,1-3): Jesus nasceu entre os pastores; Ele é o grande Pastor dos homens (1Pd 2,25; Hb 13,20)”.[2]

Por que não em Jerusalém?

Por outro lado, nós não devemos nos esquecer de que a cidade por excelência para o povo eleito era Jerusalém. Lá estava o Templo, a casa de Deus. Encontramos no livro do profeta Isaías uma curiosa passagem que, aparentemente, poderia parecer uma refutação ao argumento de São Tomás quanto à conveniência de Cristo ter nascido em Belém. O próprio Doutor Angélico recorda tal trecho, à guisa de objeção: “A lei virá de Sião e a palavra de Deus de Jerusalém”. Ora, Cristo é a verdadeira Palavra de Deus. Logo, tinha de vir ao mundo em Jerusalém.[3]

Ao que ele mesmo responde: “Deve-se dizer que Davi nasceu em Belém, mas escolheu Jerusalém para ser a sede de seu reino e ali edificar o Templo de Deus. Assim, Jerusalém viria a ser ao mesmo tempo a cidade real e sacerdotal. Mas o sacerdócio de Cristo, e o seu reino, se realizaram principalmente em sua paixão. Por isso era conveniente que, para nascer, escolhesse Belém e para a paixão, Jerusalém.

“Além disso, desmascarava assim a glória dos homens que se orgulham de ter nascido em cidades famosas, nas quais querem principalmente ser honrados. Cristo, pelo contrário, quis nascer numa cidade sem nome e padecer opróbrios numa cidade famosa”.[4]

Finalmente, de tais ensinamentos decorrem uma eminente lição, transmitida por São Paulo: “O que é estulto no mundo, Deus o escolheu para confundir os sábios; e o que é fraco no mundo, Deus o escolheu para confundir os fortes; e o que é vil e desprezível no mundo, Deus o escolheu, como também aquelas coisas que nada são, para destruir as que são” (1Cor 27-28).

Por João Pedro Serafim


[1] Cf. TOMÁS DE AQUINO. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, v. 8, 2002, III, q. 35, a. 7, co. (trad. Loyola).

[2] BENTO XVI. Jesus de Nazaré. Dois Irmãos: Minha Biblioteca Católica, 2021, p. 61.

[3] STh., III, q. 35, a. 7, ad 1.

[4] Ibid.

Fonte: https://gaudiumpress.org/

Mensagem de Natal: Renovar a esperança

Luz do Senhor (Vatican News)

O Natal nos convida a renovar a esperança, pois “Um menino nasceu, um filho nos foi dado” (Is 9,6) e a vida renasce sempre que uma criança vem ao mundo.

Padre Edvino Sicuro

No mundo em guerra em que estamos vivendo, a nossa mensagem de Natal não pode ser outra, senão uma prece como fizeram os anjos na noite em Belém: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”. Que haja paz! Que a humanidade aprenda a vier em paz, em harmonia.

Como cristãos temos duas grandes festas que marcam  a nossa fé: Encarnação e Ressurreição. A mais importante é a Ressurreição,- a Páscoa - mas devido ao aspecto comercial o Natal ganha destaque. Todavia se Jesus não tivesse ressuscitado, “vã seria a nossa fé” (1Cor 15, 18).

No tempo natalino, muitas pessoas se preocupam com o exterior: a decoração das casas, ruas, parques e se esquecem de preparar o seu interior, purificando seu modo de agir, fazendo uma revisão de vida e retomando os verdadeiros valores cristãos.

O Natal nos convida a renovar a esperança, pois “Um menino nasceu, um filho nos foi dado” (Is 9,6) e a vida renasce sempre que uma criança vem ao mundo. O pessimismo e o medo devem desaparecer do meio de nós. Não há mais lugar para o individualismo, nem para as ideologias. O Evangelho é agora uma pessoa: Jesus. “Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens” (Jo 1,4)

Em minha vida o Natal é um tempo de alegria que se prolonga nos dias do novo ano, pois creio na ressurreição e na presença de Jesus em nossa história, iluminando nosso caminhar, incentivando-nos a lançar as redes em águas mais profundas e não temendo as ondas do mar do mundo que querem nos afundar.

Ter fé é não deixar que os problemas e obstáculos do caminho nos impeçam de ir adiante e olhar o futuro com os olhos de Deus, porque “Ele é maior que todos e ninguém pode nos arrebatar de suas mãos”.

Sempre é Natal quando fazemos atos de bondade porque damos esperança a alguém, que necessita de nós. Há sempre mais alegria em dar do que em receber. Baseando-me nessa afirmação, minha mensagem de Natal é que apressadamente nos dirijamos a Belém,(que hoje é o nosso mundo) como foram os pastores, os magos e ofereçamos o melhor de nós para Jesus que está presente nos irmãos e irmãs mais necessitados. O Natal de verdade vai acontecer porque Ele nascerá nos gestos de fraternidade.

Feliz e Santo Natal!

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Natal: eu espero

ALBERTO PIZZOLI | AFP

Por Carlos Padilla Esteban - publicado em 24/12/23

Aquela noite em que esperamos que aconteça o que sonhamos, que tudo mude, que algo novo comece.

A noite está quieta no Natal. Será uma noite quieta e silenciosa. Eu olho, penso e paro meus passos. Se eu tivesse um pincel, gostaria de pintar esta noite de estrelas, ou de luzes caindo e subindo. De estrelas. Assim, com um pincel.

Mas às vezes os pincéis mentem. Eles coletam vagamente em cores uma pequena parte da verdade. Apenas um pequeno esboço, um trecho da beleza mais profunda, uma pequena parte de toda a vida. Os pincéis mentem. Ou melhor, eles não dizem toda a verdade.

Porque a verdade, toda a verdade, não pode ser capturada em uma pintura, com um pincel. Os pincéis só param o tempo por um instante no fluxo da vida. Eles retratam o que acontece em uma tentativa de imortalizá-lo. Eles têm sucesso de forma desajeitada. Eles tentam manter na tela todo o mistério que não pode ser explicado com palavras.

A vida não pode ser retida com pincéis. Ela não tem valor. A vida é um vagão silencioso, escondido no tempo, puxado por Deus. Uma carruagem em movimento.

Uma carruagem cheia de mistérios que não podem ser pintados. De olhares que não falam e não podem ser retidos. De olhares cheios de palavras e emoções. De olhares profundos e lágrimas. Lágrimas cheias de alegria ou tristeza. Porque as lágrimas nem sempre contêm tristeza. Muitas vezes elas exalam alegria, esperança, emoção. Esses são os paradoxos que as lágrimas contêm.

A noite santa é um vagão carregado de silêncios. De estrelas e vida. Uma carruagem que para novamente em nossa vida. Porque a vida sempre acontece em um vagão. Qual deles é o meu? Um vagão de primeira classe? Um de segunda classe?

Talvez seja mais importante saber com quem estamos no vagão do que onde estamos no trem. Afinal de contas, todos chegam ao seu destino. Primeiro o primeiro, depois o último, mas todos chegam.

Talvez o silêncio do meu vagão seja importante. Porque é verdade que as palavras às vezes quebram o mistério sagrado dos olhares.

O silêncio da noite sagrada de Belém. Sim, especialmente o silêncio daquela noite. Maria estava em silêncio olhando para Jesus. José estava em silêncio olhando para Maria. A criança adormecida. Silêncios. Estrelas. Paz. Sorrisos.

Não quero negar que a palavra tem a beleza de uma semente lançada no deserto ou no campo. Ela carrega em seu peito oculto um mundo inteiro, uma vida inteira, um milagre prestes a nascer. É verdade que as palavras também são importantes. Escritas ou faladas. Ditas em voz baixa ou gritadas ao vento.

João falou suas palavras no deserto, foi um grito que quebrou o silêncio. A vida surgiu. Jesus passou por ali falando palavras. Às vezes em voz baixa, às vezes em voz alta.

Ele também guardava silêncios. Aqueles silêncios misteriosos, escrevendo na areia, recebendo ofensas. Às vezes um olhar é suficiente, às vezes apenas um silêncio. Um gesto claro e um silêncio, para entender o que é importante.

Na vida, há muitos encontros cheios de silêncios. Quando estou emocionado, fico em silêncio. Olho para o horizonte e fico em silêncio. Surpreso. Atônito, cheio de vida, esperando.

Como nesta noite sagrada. Esta noite em que esperamos que o que sonhamos aconteça, que tudo mude, que algo novo comece. É o silêncio sagrado de Deus diante de meus olhos. Ajoelhado em frente a um estábulo. Isso sempre me comove.

Vou me ajoelhar novamente. Não por hábito, mas porque não quero deixar de ser uma criança. Vou me ajoelhar com surpresa. O que eu espero? O que eu temo? O silêncio. O silêncio de Deus cheio de respostas.

Deus pronuncia uma palavra e eu vivo. A Criança nasce em meus braços. Fico em silêncio e vivo. Ele olha para mim e eu vivo. Espero em silêncio em meu vagão cheio de silêncios. Ele nasce novamente para me dizer que me ama. E eu o amo. A misteriosa vida de Deus entre os homens.

A vida cotidiana dos homens sem Deus. Como encontrá-lo escondido na violência, na divisão, no ódio? Como descobrir seu rastro esquivo entre as vidas em busca de significado? Fico em silêncio.

Volto-me para tantas vidas misteriosas que não buscam respostas. Elas observam o tempo passar. Elas têm muitas perguntas. O trem da vida segue em frente.

Espero com os olhos entreabertos. Estarei pronto? Direi sim a Jesus em meio ao meu silêncio? Rompê-lo-ei com aquela palavra que marca nossa vida?

Octavio Paz disse: “A liberdade é simplesmente a diferença entre dois monossílabos: sim e não”. Eu escolho a liberdade novamente. Sim, quero seguir seus passos.

Vou me ajoelhar como uma criança. Eu confio. Espero. Sonho. De joelhos, é mais fácil estar no nível da criança. E de sua mãe. Estarei pronto? Nunca estou. Ele sempre me pega de surpresa. Quando menos espero, ele nasce de novo. Isso quebra minha rotina. Isso me dilacera por dentro.

Quero que ele venha e coloque minha vida em ordem. Parece fácil. Pelo menos para Ele, que pode fazer tudo. Eu espero. Eu quero.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

25 de dezembro, uma data histórica (2/4)

Abside central da igreja de Sancta Maria Foris Portas em Castelserpio, na província de Varese (séculos VII-VIII). Preserva os restos de um afresco, inspirado nos Evangelhos apócrifos (30Giorni)

Arquivo 30Dias – 11/2000

25 de dezembro, uma data histórica

Não foi uma escolha arbitrária suplantar os antigos festivais pagãos. Quando a Igreja celebra o nascimento de Jesus na terceira década de dezembro, inspira-se na memória ininterrupta das primeiras comunidades cristãs sobre os acontecimentos evangélicos e os lugares onde aconteceram. Tommaso Federici, professor emérito de teologia bíblica, faz um balanço de pistas e descobertas recentes que confirmam a historicidade da data do Natal.

por Tommaso Federici

A «virada Abia» com data certa

Em 1953 a grande especialista francesa Annie Jaubert, no artigo Le calendrier des Jubilées et de la secte de Qumran. Ses origines bibliques , em Vetus Testamentum , Supl. 3 (1953) pp. 250-264, havia estudado o calendário do Livro dos Jubileus , um apócrifo judaico muito importante, que datava do final do século. Século 2 a.C. C. Ora, numerosos fragmentos de texto deste calendário, encontrados nas cavernas de Qumran, demonstraram não só que ele havia sido criado pelos essênios que ali viviam (por volta do século II a.C. - século I d.C.), mas que ainda estava em uso . O referido calendário é solar e não dá nomes aos meses, mas os chama pelo número de sucessão. O estudioso publicou então vários outros artigos importantes sobre o assunto; veja também sua entrada Calendário de Qumran, na Enciclopédia da Bíblia 2 (1969) pp. 35-38. E numa famosa monografia, La date de la Cène Calendrier biblique et liturgie chrétienne , Études Bibliques, Paris 1957, ele também reconstruiu a sucessão de eventos da Semana Santa, identificando de forma convincente (exceto pela dissidência de alguns) terça-feira, e não quinta-feira, data da Ceia do Senhor. Por sua vez, o especialista Shemarjahu Talmon, da Universidade Hebraica de Jerusalém, também trabalhou nos documentos de Qumran e no calendário do Jubileu , e conseguiu especificar o desdobramento semanal da ordem dos 24 turnos sacerdotais no templo, depois ainda em funcionamento. Suas descobertas foram apresentadas no artigo The Calendar Reckoning of the Sect from the Judean Desert. Aspectos dos Manuscritos do Mar Morto, in Scripta Hierosolymitana , vol. IV, Jerusalém 1958, pp. 162-199; é um estudo preciso e importante, mas, é preciso dizer, passou quase despercebido pelo grande circuito, mas não por Annie Jaubert. Ora, a lista que o professor Talmon reconstrói indica que a «virada de Abia ( Ab-Jah )», prescrita duas vezes por ano, ocorria da seguinte forma: I) a primeira vez, do dia 8 ao dia 14 do terceiro mês do calendário e II) pela segunda vez, do dia 24 ao dia 30 do oitavo mês civil. Agora, de acordo com o calendário solar (e não lunar, como é o atual calendário judaico), este segundo horário corresponde aproximadamente aos últimos dez dias de setembro. Como também nota Antonio Ammassari, Nas origens do calendário natalino, em Euntes Docete 45 (1992) pp. 11-16, Lucas, com a indicação da "volta de Abia", remonta a uma preciosa tradição judaico-cristã de Jerusalém, que como narrador fiel da história ( Lc 1, 1-4) ele traçou, e oferece a possibilidade de reconstruindo algumas datas históricas.

Assim, o rito bizantino de 23 de setembro comemora o anúncio a Zacarias e preserva uma data histórica certa e quase precisa (talvez com um atraso de um ou dois dias). 

Datas históricas do Novo Testamento 

A principal datação histórica da vida do Senhor centra-se no acontecimento principal: a sua ressurreição no relato unânime dos quatro Evangelhos (e o resto da Tradição Apostólica do Novo Testamento, ver 1 Cor 15, 3-7) ocorreu na madrugada de domingo, 9 de abril do ano 30 d. C., uma determinada data astronômica e, portanto, sua morte ocorreu por volta das 15h da sexta-feira, 7 de abril do mesmo ano 30. De acordo com os dados obtidos na investigação recente mencionada acima, há uma mistura impressionante de outras datas históricas. O ciclo de João Batista tem como data histórica estabelecida (aproximadamente) 24 de setembro do nosso calendário gregoriano do ano 7-6 AC. C. pelo anúncio divino concedido a seu pai Zacarias. No cálculo atual, seria no outono de 1h. C., mas sabe-se que a partir do século VI houve um erro de cerca de seis ou cinco anos na data real do ano do nascimento do Senhor. O nascimento de João Batista nove meses depois ( Lc 1, 57-66), (aproximadamente) em 24 de junho, é uma data histórica. Mas depois, no ciclo de Cristo Senhor, que Lucas coloca em forma de díptico espelhado com o de Baptista, a anunciação à Virgem Maria de Nazaré «no sexto mês» depois da concepção de Isabel (Lc , 28) aparece como uma “outra data histórica”. E consequentemente, e por último, o nascimento do Senhor no dia 25 de dezembro é uma data histórica, ou seja, 15 meses depois do anúncio a Zacarias, nove meses depois da anunciação à sempre virgem Mãe, seis meses depois do nascimento de João, o Batista. A santa circuncisão oito dias após o nascimento, segundo a lei de Moisés ( Lv 12, 1-3), é uma data histórica. E assim, quarenta dias após o nascimento, no dia 2 de fevereiro, acontece a “apresentação” do Senhor no templo sempre segundo a lei de Moisés ( Lv 12, 4-8), que marca o hipapantê, o encontro com o seu povo, é uma data histórica.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Reflexão para o IV Domingo do Advento (B)

IV Domingo do Advento (Vatican Media)

Deixemo-nos tocar por Deus. Cabe a Ele a conduzir Seu plano de amor para nós e nosso papel no mundo. Digamos como Maria, “Faça-se em mim segundo a tua palavra.”

Padre Cesar Augusto, S J – Vatican News

A leitura do Segundo Livro de Samuel nos dá um alerta de que não poderemos enquadrar Deus dentro dos nossos esquemas e, até, deveremos desconfiar de nossas “boas intenções”.

O rei Davi tem uma idéia que aparentemente é santa –construir um belo templo para guardar a Arca da Aliança - mas na verdade seu inconsciente deseja justificar a grandiosidade de seu palácio e posicionar Deus em um local.

Ora, Deus não se enquadra e, menos ainda pode ser usado para justificar nossos caprichos e veleidades. O Senhor, ao contrário, diz a Davi que será Ele -Deus- quem edificará uma casa para Davi, mas não será algo que poderá envelhecer e precisar de reparos.

Deus dará a Davi uma importantíssima descendência, uma casa no sentido mais nobre, e da qual nascerá o Salvador. E esse Salvador, Jesus, mais tarde ao ser interrogado pela samaritana sobre qual o local apropriado para se reverenciar Deus, responderá que Deus deve ser adorado em qualquer parte por pessoas autênticas e que buscam a verdade.

Após essa reflexão poderemos nos perguntar sobre qual visão temos de Deus, qual nosso modo de nos relacionar com Ele? Queremos manipulá-lo, trazê-lo para justificar nossos interesses ou estamos abertos para a novidade que Ele é, sem tentar ajustá-lo ao nosso modo de ser, pelo contrário, adaptando-nos ao Seu querer?

Essa será a reação dos personagens de Nazaré. Deus vai buscar uma virgem, em Nazaré, um lugar social e economicamente desprezável. Ora, virgem na mentalidade da época era uma pessoa desprezível, que não havia atraído sobre si o olhar de nenhum homem. No entanto é exatamente aí, em um povoado abjeto e em uma pessoa sem importância que Deus irá se encarnar.

Por outro lado, Maria e José terão suas vidas totalmente mudadas por Deus. Eles haviam planejado um casamento comum e uma vida tranquila. Deus entrou na vida dos noivos dizendo a Maria que Ele gostaria que ela fosse mãe de Seu Filho e que a ação seria por conta do Espírito Santo.

Maria, generosamente deu o seu sim, sem exigir maiores explicações, mas apenas obedecendo a Deus e confiando em Seu amor.

José, de repente, percebeu que sua noiva estava e que ele não era o responsável. Ele nada entendeu, mas não quis difamar aquela que, a seus olhos, era honesta. Não entendeu e procedeu de modo justo. Deus foi a seu socorro e o fez entender o que se passava.

Porque Maria e José foram abertos à vontade de Deus, acolhendo a missão dada a eles, a Humanidade foi redimida e eternamente lhe é grata, ao sim de Maria e ao sim de José.

Deixemo-nos tocar por Deus. Cabe a Ele a conduzir Seu plano de amor para nós e nosso papel no mundo. Digamos como Maria, “Faça-se em mim segundo a tua palavra.”

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Santa Tarsila, Monja

Santa Tarsila (Coisas de Santos)

24 de dezembro

Santa Tarsila

Tarsila era uma das tias paternas do Papa Gregório Magno, pontífice que conduziu a Igreja de 590 a 604. Tinha duas irmãs: Emiliana e Jordana. Pertenciam a uma das famílias mais ilustres de Roma: entre os ancestrais há também um imperador, Olibrio, do século V, e o Papa Félix III (526-530).

Sabe-se muito pouco sobre Tarsila. Seu nome aparece apenas no século XI num martirológio local e depois, após o Concílio de Trento, no Martirológio Romano, o oficial de toda a Igreja Católica. A única fonte autorizada sobre sua vida é a do sobrinho o papa, Gregório, o Grande. O papa Gregório era conhecido por contar histórias de parentes apenas quando elas lhe serviam de exemplos concretos e atuais, para tornar seu ensino eficaz.

Tarsila e suas irmãs certamente ajudaram a cunhada Sílvia a criar o pequeno Gregório, cuja saúde sempre foi frágil. Então, enquanto viviam, elas o seguiram nos estudos e na carreira profissional.

Gregório, ainda jovem, tornou-se chefe da administração civil em Roma: uma Roma então sem o imperador, que residia em Constantinopla, e com um Senado pouco ativo. Em seguida, encontramos Gregório embaixador do Papa Pelágio II e ao mesmo tempo monge, diretor espiritual de uma pequena comunidade reunida em sua residência. De lá, Gregório sairá para ser papa.

Tarsila que já havia se tornado monja, acabou influenciando as irmãs que a acompanharam. Eram monjas ocidentais, isto é, não viviam isoladas na solidão, mas dedicadas à vida comum, devotadas à castidade e à oração contínua. Mas não só.

Neste terrível século VI, marcado por inundações, epidemias, guerra entre godos e bizantinos, invasão lombarda e Roma é tomada por grande afluência de imigrantes em miséria. “A carestia”, escreveu Gregório, “manteve a cidade nas garras da fome”. A caridade torna-se assim também a tarefa habitual daquelas monjas, nunca alheias à vida do próximo. Tarsila as liderava em tudo, começando com a oração: quando faleceu foram constatados calos na pele que cobria seus joelhos e cotovelos por causa de sua contínua oração.

A memória de Tarsila, mesmo sem ter tido eventos prodigiosos, perdurará discreta e tenazmente no tempo, pois também foi enriquecida por um conto singular de Gregório Magno. Ele conta que essa tia morreu pouco antes do Natal (o ano, entretanto, permanece desconhecido). E acrescenta que sua irmã Emiliana, uma sobrevivente, um dia ouviu sua voz dizer-lhe: “Eu passei o Natal sem você, mas vamos celebrar a Epifania juntas”. Segundo uma tradição, de fato, Emiliana morreu no dia 5 de janeiro seguinte à morte de Tarsila. E sua festa ainda é nesta data.

Fonte: https://pt.aleteia.org/

sábado, 23 de dezembro de 2023

25 de dezembro, uma data histórica (1/4)

Abside central da igreja de Sancta Maria Foris Portas em Castelserpio, na província de Varese (séculos VII-VIII). Preserva os restos de um afresco, inspirado nos Evangelhos apócrifos (Giorni)

Arquivo 30Dias – 11/2000

25 de dezembro, uma data histórica

Não foi uma escolha arbitrária suplantar os antigos festivais pagãos. Quando a Igreja celebra o nascimento de Jesus na terceira década de dezembro, inspira-se na memória ininterrupta das primeiras comunidades cristãs sobre os acontecimentos evangélicos e os lugares onde aconteceram. Tommaso Federici, professor emérito de teologia bíblica, faz um balanço de pistas e descobertas recentes que confirmam a historicidade da data do Natal.

por Tommaso Federici

Um preâmbulo

Geralmente foi assumido e é assumido sem questionar as já antigas notícias segundo as quais a celebração do Nascimento do Senhor na primeira metade do século IV foi introduzida pela Igreja de Roma por razões ideológicas. Na verdade, teria sido colocado em 25 de dezembro para neutralizar uma perigosa festa pagã, o Natal Solis invicti (seja Mitras, como é provável, ou seja um título de um imperador romano). Esta celebração foi marcada para o solstício de inverno (21-22 de dezembro), quando o sol retomou o seu curso triunfal em direção ao seu brilho cada vez maior. Portanto, no contexto cristão, há nove meses, a celebração do anúncio do Anjo à Virgem Maria de Nazaré e da sua Imaculada Conceição do Filho e Salvador foi marcada para o dia 25 de março. Consequentemente, seis meses antes do nascimento do Senhor houve também a memória do nascimento do seu precursor, profeta e batizador João.

Por outro lado, o Ocidente cristão não celebrou o anúncio do nascimento de João ao seu pai, o sacerdote Zacarias. Que, ao contrário, e há muito tempo, é comemorado no Oriente Sírio no primeiro domingo do "Tempo da Anunciação ( Sûbarâ )" que inclui em outros cinco domingos a anunciação à Virgem Maria, a visitação, a nascimento do Batista, o anúncio a José, a genealogia do Senhor segundo Mateus.
O Oriente bizantino, e sempre desde uma data imemorial, também celebra o anúncio a Zacarias no dia 23 de setembro.

Existem quatro datas evangélicas sucessivas que se cruzam, a saber: I) o anúncio a Zacarias e II) seis meses após a anunciação a Maria, III) respectivamente nove e três meses após as duas primeiras datas, o nascimento do Batista, e IV) respectivamente seis meses após esta última data, e naturalmente nove meses após a anunciação, Nascimento do Senhor e Salvador.

O referente dito "litúrgico" de tudo isto seria, portanto, o Natal do Senhor, no dia 25 de Dezembro, com base no qual, presume-se, foram organizadas nove meses antes as festas da Anunciação, e do nascimento de o Batista seis meses antes. Historiadores e liturgistas apresentam várias hipóteses mais ou menos aceitas sobre isso. O problema é que já nos séculos II e IV foram apresentadas várias datações, que levaram em conta cálculos astronômicos ou ideias teológicas.

Ainda não era conhecida uma data “histórica” externa, isto é, que não fosse bíblica, patrística e litúrgica, e que trouxesse confirmação aos estudiosos. 

Uma referência: o anúncio a Zacarias 

Lucas toma alguns cuidados na colocação da história. Assim, por exemplo, ele cita “o édito de César Augusto” para o longo censo de Quirino (cerca de 7-6 a.C.), durante o qual ocorreu o nascimento do Senhor ( Lc 2, 1-2). Refere-se também ao décimo quinto ano de Tibério César (cerca de 27-28 d.C.), quando João Baptista iniciou a sua pregação preparatória do Senhor ( Lc 3, 1). E observa: «E o próprio Jesus começou [o seu ministério depois do Batismo, Lucas 3, 21-22] com quase 30 anos» ( Lucas 3, 23), tendo de fato cerca de 33 ou 34 anos. Segundo a sua sugestiva narrativa evangélica, o mesmo Anjo do Senhor, Gabriel, seis meses antes da anunciação a Maria ( Lc 1, 26-38), no final da solene celebração sacrificial diária, ele anunciou no santuário ao idoso sacerdote Zacarias que a sua esposa estéril e idosa, Isabel, conceberia um filho, destinado a preparar um povo para Aquele que estava por vir ( Lucas 1, 5-25). Luca tem o cuidado de situar este fato com uma precisão que remete a um fato conhecido por todos. Assim ele narra que Zacarias pertencia «à classe [sacerdotal, ephêmería ] de Abias» ( Lc 1, 5), e enquanto Gabriel lhe aparece «praticou o sacerdócio na volta [ táxis ] de sua ordem [ ephêmería ]» ( Lc 1, 8). Assim se refere a um fato geral sem dificuldade, e a um fato específico e específico, que apresenta um problema. 

O primeiro fato, do conhecimento de todos, foi que no santuário de Jerusalém, segundo a narração do cronista, o próprio Davi havia providenciado que os "filhos de Arão" fossem divididos em 24 táxeis, hebraico sebaot , as "voltas" perenes ( 1 Cr 24, 1-7.19). Estas “turmas”, alternando-se numa ordem imutável, deviam realizar serviço litúrgico durante uma semana, “de sábado a sábado”, duas vezes por ano. A lista das classes sacerdotais até a destruição do templo (ano 70 d.C.) segundo o texto da Septuaginta foi estabelecida por sorteio, sendo: I) Iarib, II) Ideia, III) Charim, IV) Seorim, V) Mechia , VI) Miamin, VII) Kos, VIII Abijah , IX) Joshua, ) Afessi, XIX) Fetaia, XX) Ezekil, XXI) Iachin, XXII) Gamoul, XXIII) Dalaia, XXIV) Maasai (a lista, em 1 Cr 24, 7-18)

O segundo fato é que Zacarias pertencia, portanto, à “volta de Abias”, VIII. O problema que isso representa é que Lucas escreve quando o templo ainda está ativo e, portanto, todos poderiam conhecer suas funções, e não anota “quando” a “mudança de Abia” estava em operação. Além disso, não diz em qual das duas rotações anuais Zacarias recebeu o anúncio do Anjo no santuário. E parece que ao longo dos séculos ninguém teve o cuidado de relembrar a memória, ou de fazer qualquer pesquisa. A mesma Comunidade-mãe, a Igreja de Jerusalém, judaico-cristã de língua aramaica, que tradicionalmente (pelo menos durante dois séculos) foi liderada pelos parentes consanguíneos de Jesus, Tiago e seus sucessores, não parece ter se importado com este detalhe, o que para os contemporâneos era desnecessário dizer.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Em direção a Belém com as palavras dos Papas

O presépio montado na Praça São Pedro, inspirado no presépio franciscano de Greccio (Vatican Media)

De Pio XII a Francisco, as reflexões de seis Pontífices desenham um presépio ideal, centrando-se nos elementos-chave que caracterizam o mistério e a poesia do Natal.

Amedeo Lomonaco – Vatican News

O caminho para Belém abre-se olhando para o céu. Uma estrela guia os Magos até chegarem a esta pequena cidade da Judéia. Aqui, uma gruta os espera. Uma criança foi colocada numa manjedoura.

A estrela

A estrela de Belém brilha em todos os tempos, para cada homem. O Papa Pio XII, na mensagem radiofónica de 24 de dezembro de 1941, sublinha que esta estrela indica “o berço do recém-nascido Redentor” e “brilha no céu da cristandade”.

Desta Roma, centro, fortaleza e mestra do cristianismo, cidade mais para Cristo do que para os Césares, eterna no tempo, nós, movidos pelo desejo ardente e muito vivo do bem de cada povo e de toda a humanidade, dirigimos a nossa voz a todos, rezando e rogando para que não demore o dia em todos os lugares onde hoje a hostilidade contra Deus e Cristo arrasta os homens para a ruína temporal e eterna, prevaleçam mais conhecimentos religiosos e novos propósitos; o dia em que a estrela de Belém brilhe no berço da nova ordem dos povos.

Belém

Na peregrinação, tudo converge, portanto, para Belém. O Papa Bento XVI, no Angelus de 20 de dezembro de 2009, repercorre a história desta pequena cidade da Judeia, testemunha do grande acontecimento do nascimento de Jesus.

Mil anos antes de Cristo, Belém foi o berço do grande Rei Davi, que as Escrituras concordam em apresentar como o antepassado do Messias. O Evangelho de Lucas narra que Jesus nasceu em Belém porque José, esposo de Maria, sendo da "casa de Davi", teve que ir àquela cidade para o censo, e naqueles mesmos dias Maria deu à luz Jesus (ver Lucas 2 , 1-7). De fato, a própria profecia de Miquéias continua mencionando um nascimento misterioso: “Pois Deus os entrega só até que a mãe dê à luz, e o resto dos irmãos volte aos israelitas”. (Mi 5,2). Existe, portanto, um plano divino que inclui e explica os tempos e lugares da vinda do Filho de Deus ao mundo.

Os pastores

Os pastores estão lá para acolher Jesus. O Papa Francisco, na missa da Solenidade do Natal de 24 de dezembro de 2018, recorda que os pastores “foram sem demora”.

Os pastores de Belém também nos dizem como encontrar o Senhor. Eles vigiam durante a noite: não dormem, mas fazem o que Jesus pede várias vezes: vigiar (cf. Mt 25,13; Mc 13,35; Lc 21,36). Eles permanecem vigilantes, esperando acordados no escuro; e Deus “os envolveu de luz” (Lc 2,9). Isso vale também para nós.

A gruta

O lugar para onde converge o caminho dos pastores e dos Reis Magos é uma gruta. O Papa João Paulo II, na Audiência Geral de 23 de dezembro de 1992, sublinhou que esta simples cavidade natural é o ponto de convergência onde o amor de Deus e o destino do homem se encontram.

Na gruta de Belém, o céu e a terra se tocam, o infinito entrou no mundo e as portas da eterna herança divina se abriram para a humanidade. Com a presença do “Deus conosco”, até a noite mais escura de dor, angústia e perplexidade é superada e vencida para sempre. O Verbo encarnado, Emmanuel, “Deus conosco”, é a esperança de cada criatura frágil, o sentido de toda a história, o destino de todo o gênero humano.

A manjedoura

O Menino nascido em Belém é envolto em panos e colocado numa manjedoura. O Papa Paulo VI, na Missa de Natal de 25 de dezembro de 1969, se deteve no mistério da Encarnação, “uma realidade que não tem igual, surpreende e sempre nos exalta”.

Nasceu do Espírito Santo, Verbo de Deus que nasceu e foi um pequeno Menino pobre, imediatamente envolto em panos por causa do frio e pela dignidade da sua humanidade. E ele foi colocado numa manjedoura onde os animais comem. Ele poderia ter nascido mais pobre? Poderia ter nascido num local mais miserável? Poderia ter sido menor, mais baixo de todos?

As felicitações

O caminho do período natalino, que culmina com o nascimento do Senhor, é também um desejo que se renova a cada ano para que todo homem possa caminhar, em sua própria vida, seguindo os passos do Filho de Deus. O Papa João XXIII, em sua mensagem radiofônica de 22 de dezembro de 1960, dirige estas palavras, ainda hoje relevantes, "aos homens espalhados por todo o mundo:

Por favor, aceitem, como festivamente lhes oferecemos, as felicitações de um Feliz Natal". Ele se inspira na primeira página do Evangelho de São João, naquele prólogo que dá o motivo ao sublime poema, que canta o mistério e a realidade da união mais íntima e sagrada entre o Verbo de Deus e os filhos dos homens, entre o céu e a terra, entre a ordem da natureza e a da graça, que resplandece e se transforma em triunfo espiritual desde o início dos séculos até a sua consumação.

Que seja o Natal de Jesus

Este itinerário ao longo do Natal se entrelaça com outro itinerário marcado pelas vozes dos Pontífices: o do podcast do Vatican News - Rádio Vaticano intitulado "Papale papale" (Papal papal) e centrado neste período em palavras profundamente "natalinas", incluindo "expectativa", "festa", "presépio".

"Se quisermos que seja Natal, o Natal de Jesus e da paz", enfatiza o Papa Francisco na mensagem Urbi et Orbi de 25 de dezembro de 2022, "olhemos para Belém e fixemos o olhar no rosto do Menino que nasceu para nós! E naquele pequeno rosto inocente, reconheçamos o das crianças que em todas as partes do mundo anseiam pela paz ".

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

O que o Natal nos revela de mais importante?

Presépio (Crédito: Cléofas)

O que o Natal nos revela de mais importante?

 POR PROF. FELIPE AQUINO

Precisamos pedir a Deus, a graça de penetrar no grandioso mistério encerrado na Encarnação do Verbo, para que colhamos os frutos deste que é o maior ato de amor da história. O Natal de Jesus revela-nos um pouco do grande mistério, “escondido desde o princípio dos séculos em Deus” (Ef 3,9), e que agora foi revelado. Vamos mergulhar um pouco na beleza desse mistério que o Natal no revela.

O pecado gerou entre Deus e o homem uma distância infinita, um abismo insuperável, o rompimento da amizade. Mas, a misericórdia de Deus, que ama a sua criatura humana com amor eterno, sobre o abismo gerado pelo pecado, ergueu uma Ponte maravilhosa que une a terra ao céu e, que restabelece as relações de intimidade entre Deus e os homens.

Só a Mediação de Jesus tem todas as prerrogativas para ser perfeitamente agradável a Deus, pois Ele é verdadeiro Deus e satisfaz, da mesma maneira, as condições necessárias para pagar as dívidas da humanidade pecadora, pois é também verdadeiro homem e, como tal, representa o gênero humano inteiro. Na Pessoa do Verbo humanado, abraça-se a divindade e a humanidade de Cristo.

Jesus é esta Ponte maravilhosa, o Pontífice, o “único Mediador entre Deus e os homens, une de modo deveras admirável, a terra ao céu”, como disse Pio XII na Mystici Corporis Christi. Só Jesus pode ser o Mediador entre Deus e os homens, porque só Jesus é Deus e homem, e assim Ele pode oferecer um Sacrifício necessário e suficiente, de valor infinito, para reparar a ofensa infinita que o pecado da humanidade fere a Majestade Infinita de Deus. Por isso, disse São Pedro, “não nos foi dado outro Nome no qual tenhamos salvação” (At,12).

Nele e por Ele todos os homens são admitidos de novo à amizade com o Pai; Nele todos podem reencontrar o caminho para chegar à união com a Santíssima Trindade.

O Pai eterno dignou-Se revelar este admirável mistério a Santa Catarina de Sena:

“Eu desejo que olhes para a Ponte que construí no meu Unigênito Filho e observes a Sua grandeza que vai da terra ao céu, pois Nele a grandeza da divindade está unida à terra da vossa humanidade. Isto foi necessário para refazer o caminho que estava interrompido e para permitir chegar, através das amarguras deste mundo, à vida eterna” (Diálogos,22).

“Foi do agrado do Pai que residisse Nele toda a plenitude da divindade e que por Ele fossem reconciliadas consigo todas as coisas, pacificando pelo Sangue da sua cruz, tanto as coisas da terra como as coisas do céu” (Cl 1, 19-20).

Disse o Concílio Vaticano II: “Com efeito, o Verbo de Deus, por quem tudo foi feito, fez-se homem, para homem perfeito, a todos salvar e a todos recapitular” (GS,45).

A obra de Jesus Mediador completa-se no Calvário onde Ele derramou todo o Seu Sangue, preço do nosso resgate; mas esta obra começou na manjedoura de Belém, onde o Verbo, num gesto de amor infinito ao homem, desceu do céu à terra, e se fez homem e Deus.

O terrível abismo que o pecado tinha criado entre Deus e os homens já foi preenchido por este Menino que, no Presépio, nos estende os braços. Tudo aquilo que o pecado danificara e destruíra, é assim, por vontade de Deus, salvo e “restaurado em Cristo” (Ef, 1. 10). No Presépio à ternura se une uma imensa admiração, e surge espontaneamente a necessidade de louvar e adorar este Menino.

A graça que Adão havia recebido de Deus, e que não pode nos transmitir, recebemos só por meio de Jesus Mediador. Todas as graças, tudo o que de sobrenatural chega às nossas almas, vem-nos sempre das Suas mãos. E se quisermos alcançar a Deus, não temos outro meio senão agarrar-nos a Jesus, passar através Dele. O próprio Jesus disse: “Eu sou o caminho. Eu sou a porta; se alguém entrar por mim será salvo” (Jo 14, 6; 10, 9). Eis a única condição, o caminho único de salvação e santidade.

A Virgem Maria não é uma ponte medianeira que substitui a única que é Jesus. Ela apenas faz os seus filhos atravessarem a única Ponte essencial, insubstituível, que é Jesus. De Maria a Jesus, de Jesus ao Pai, sem confusão.

A grande guerra que o homem tinha com Deus transformou-se em grande paz; Jesus puniu no Seu corpo, a nossa iniquidade e a desobediência de Adão, fazendo-se obediente até a morte da cruz.

“Ó Cristo Deus, doce amante dos homens, eu Vos invoco, rogo e suplico a fim de que caminhe por Vós, chegue a Vós, descanse em Vós que sois o Caminho, a Verdade e a Vida; sem Vós ninguém chega ao Pai” (Santo Agostinho).

Como os grandes santos da Igreja, precisamos meditar longamente este santo mistério de nossa salvação e nos encantamos, como por exemplo, São Gregório de Nissa:

“Tu, Senhor, és verdadeiramente uma fonte de bondade pura e inesgotável; recusaste-nos e novamente nos acolheste com misericórdia; odiaste-nos e reconciliaste-Te conosco; expulsaste-nos do paraíso e nos devolveste a ele; tiraste-nos a roupagem e folhas silvestres para nos revestir com um manto real; abriste as portas da prisão para dares liberdade aos condenados… Para nós, herdeiros do pecado, tudo mudou em deslumbrante alegria e vemos abrir-se o paraíso. A criação – terra e céu – cuja unidade fora desfeita, entoam a nova amizade” (Orações dos primeiros cristãos).

Prof. Felipe Aquino

Fonte: https://cleofas.com.br/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF