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segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

Quaresma: uma travessia!

Quaresma (CNBB)

QUARESMA: UMA TRAVESSIA!

Dom Pedro Cipollini
Bispo de Santo André (SP)

O tempo da quaresma está relacionado a Jesus. Ele é o Filho de Deus que, para salvar a humanidade, deu a prova maior de amor, doando sua vida. Foi crucificado mas ressuscitou ao terceiro dia. O núcleo da fé cristã está aí, no “mistério pascal”, ou seja na paixão, morte e ressureição de Jesus. 

A cada ano a Igreja celebra este acontecimento cuja preparação se dá no tempo da quaresma. O próprio nome já indica quarenta dias, antes do tríduo pascal no fim da Semana Santa, o qual inicia-se na tarde da quinta-feira santa, Sexta-Feira Santa, sábado santo terminando na tarde do Domingo de Páscoa. 

Este costume da quaresma começou no século II do cristianismo. Algo bem pequeno, como alguns dias de jejum que precediam a Páscoa. Mas foi desenvolvendo e crescendo até chegar aos quarenta dias. Estes quarenta dias simbolizam os quarenta anos, nos quais o Povo de Deus, liberto da escravidão do Egito, percorreu atravessando o deserto, até chegar à terra prometida. Sinalizam ainda os quarenta dias que Jesus passou no deserto, jejuando e rezando antes de iniciar sua missão. A quaresma é uma travessia! 

A quaresma inicia-se com a Quarta-Feira de Cinzas. Um costume antigo que faz referência ao gesto bíblico de penitência que, no tempo de Jesus, consistia em colocar cinzas na cabeça, recordando que o ser humano é pó e voltará ao pó. Em consequência deve converter-se para Deus, abandonando o pecado e praticando o bem. Neste período todos os fiéis são convidados a intensificar a escuta da Palavra de Deus, fazer orações fervorosas, jejuar e dar esmolas como forma de partilhar com os mais necessitados.  

A quaresma alerta para a vigilância cristã, ou seja para estarmos vigilantes contra o mal que nos ronda. Mais que nunca há o convite a pedir como Jesus ensinou: “Não nos deixeis cair em tentação, mas livra-nos do maligno”. O espírito do mal tenta o ser humano para desvia-lo do caminho correto para Deus. Em primeiro lugar levando a pessoa a procurar somente  bens materiais, consumismo e abundância. Em seguida  a vaidade, que empenha a vida na busca da fama e por fim, o desejo de poder para dominar os outros. 

A quaresma lembra sobretudo que o caminho de Jesus é outro, bem diferente deste caminho de loucura, proposto pelo egoísmo humano e pelo espírito do mal. O caminho de Jesus é o caminho do amor, amor que se faz serviço e cria comunhão e fraternidade. 

É neste sentido que a Igreja do Brasil propõe como tema de reflexão quaresmal a fraternidade e a fome. O lema desta 60ª Campanha da Fraternidade é “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt. 14,16). A campanha da fraternidade somente pode ser aceita por quem vê o apelo quaresmal como apelo à conversão pessoal e coletiva, dado que a fé tem uma dimensão social. Na nossa sociedade a fome é uma tragédia, um escândalo, uma ofensa a Deus porque contraria seu projeto de vida plena para todos. 

Na quaresma, preparando para celebrar a vitória de Cristo na Páscoa,  contemplemos seu sofrimento na cruz. Ao mesmo tempo, contemplemos o sofrimento do mundo. Nele Jesus Cristo entra com o seu, para redimir tudo e iluminar a vida, garantindo que vale a pena esperar. Quando na noite a escuridão não pode aumentar mais, começa a clarear e se faz dia.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Diaconisas: quem eram?

Crédito: Presbíteros)

Diaconisas: quem eram? 

Em síntese: São Paulo e antigos documentos da Igreja referem-se a diaconisas. Eram mulheres de conduta irrepreensível chamadas a participar dos serviços que a Igreja prestava a pessoas do sexo feminino, principalmente por ocasião do Batismo (ministrado por imersão). Recebiam o seu ministério pela imposição das mãos do Bispo, que não conferia caráter sacramental. – Com a rarefação do Batismo de adultos, foi-se extinguindo a figura da diaconisa na Igreja a partir do século VI.

Pensando na promoção da mulher em nossos dias, há quem proponha seja ela chamada ao diaconato, como parece ter acontecido nos primeiros séculos da Igreja, quando havia diaconisas. Torna-se assim necessário investigar quem eram as diaconisas da Antigüidade.

1. Fundamentação bíblica

É São Paulo quem se refere às diaconisas em três passagens:

1.1. Rm 16, 1

O Apóstolo está em Corinto, onde escreve uma carta que a diaconisa Febe da vizinha cidade de Cencréia deverá levar a Roma. Recomenda-a nestes termos:

“Recomendo-vos Febe, nossa irmã, diaconisa da igreja de Cencréia, para que a recebais no Senhor de modo digno, como convém a santos e lhe assistais em tudo de que precisar, porque também ela ajudou a muitos, a mim inclusive”.

O Apóstolo não fornece indicação alguma sobre o ministério diaconal de Febe.

1.2. 1Tm 3,11

“Também as mulheres devem ser respeitáveis, não maledicentes, sóbrias, fiéis em todas as coisas”.

O contexto mostra que São Paulo não fala das mulheres em geral mas da categoria das diaconisas, que vêm a propósito na exortação dirigida aos diáconos Há quem prefira dizer que se trata aí das esposas dos diáconos – o que parece pouco provável, pois em tal caso o Apóstolo teria escrito: “As suas esposas…”

1.3. 1Tm 5, 9-11

“Uma mulher só será inscrita na categoria das viúvas com não menos de sessenta anos, se tiver sido esposa de um só marido, se tiver em seu favor o testemunho de suas boas obras, criado os filhos, sido hospitaleira, lavado os pés dos santos, socorrido os atribulados, aplicada a toda obra boa. Rejeita as viúvas mais jovens; quando os seus desejos se afastam do Cristo, querem casar-se, tornando-se censuráveis por terem rompido o seu primeiro compromisso”.

Pergunta-se se tais viúvas eram diaconisas. A resposta mais provável distingue-as; ao lado das diaconisas (para as quais não havia limite de idade), estariam viúvas de boa conduta auxiliando a Igreja em funções diversas.

Na tradição encontram-se as duas interpretações: ora viúvas e diaconisas são identificadas entre si, ora distintas umas das outras, sendo mais freqüente esta última sentença. Assim, por exemplo, se lê nas Constituições Apostólicas VI 17, obra datada do século IV:

“Seja assumida como diaconisa uma virgem pura ou ao menos uma viúva fiel honrada, que se tenha casado uma só vez”.

Ao passo que a diaconisa e instituída pela imposição das mãos, tal gesto não se aplica às viúvas; cf. ibid. VIII 24.

O apócrifo Testamento de Nosso Senhor Jesus Cristo também distingue das diaconisas as viúvas: estas recebem a bênção d Bispo e as incumbências de louvar a Deus nos sábados e domingos, nas festas da Epifania, da Páscoa e Pentecostes, instruir as catecúmenas, visitar as enfermas, ungir as mulheres por ocasião do seu Batismo. – Para as diaconisas, resta como principal função levar a S. Eucaristia aos enfermos.

São estes traços entre outros, que levam a distinguir das diaconisas as viúvas.

2. A Tradição

O mais antigo testemunho é o de Plínio o Jovem, governador da Bitínia (Ásia Menor), que, tendo recebido a ordem de prender os cristãos em 112 escrevia ao imperador Trajano ter submetido à tortura duas cristãs honradas com o título de ministras (ministrae).

Cinqüenta anos mais tarde terá escrito o Papa Sotero (166-175) aos Bispos da Itália:

“Foi comunicado a esta Sé Apostólica que algumas mulheres consagradas a Deus e religiosas tomam a liberdade, nas vossas regiões, de tocar nos vasos sagrados e nas santas palas e de incensar o altar ao redor. Tal prática abusiva e digna de censura merece a rejeição de todo homem sábio.

Conseqüentemente, no exercício da autoridade desta Santa Sé ordenamos que essas coisas sejam radicalmente supressas dentro de um prazo mínimo e, a fim de que não se repitam, mandamos que quanto antes sejam banidas das vossas províncias” (citado pelo pseudo-Isidoro, Coletânea de leis do século IV).

3. Sacramento: sim ou não?

Para responder a tal pergunta, examinaremos a prece de investidura de uma diaconisa conforme as Constituições Apostólicas VIII 19s:

“Bispo, tu lhe imporás as mãos com a assistência do presbítero, dos diáconos e das diaconisas e dirás: Deus eterno, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, Criador do homem e da mulher, Vós que enchestes com vosso espírito Maria, Débora, Ana e Holda, Vós que não quisestes deixar de fazer que o vosso Filho único nascesse de uma mulher, Vós que no tabernáculo da Aliança e no templo estabelecestes mulheres como  guardiãs de vossas santas portas, lançai agora um olhar sobre vossa serva que aqui está, destinada ao diaconato. Dai-lhe o Espírito Santo, purificai-a de toda mancha corporal e espiritual, a fim de que exerça dignamente o ofício que lhe será confiado, para a glória vossa e o louvor do vosso Cristo com o qual e com o Espírito Santo Vos seja dada toda honra e adoração, santamente pelos séculos sem fim”.

Neste texto é importante a referência à imposição das mãos. Esta vem a ser um gesto polivalente, podendo significar transmissão de graça, de faculdades, de saúde, de bênção… ou a investidura de uma diaconisa não tem valor sacramental neste caso, pois nunca na Liturgia e no Direito antigos a diaconisa foi equiparada ao diácono; a contrario sempre lhe foram vedadas as funções do diácono e do presbítero, apesar das investidas para exerce-las. Observa S. Epifânio (+ 403):

“Se no Novo Testamento as mulheres fossem chamadas a exercer o sacerdócio ou algum outro ministério canônico, a Maria deveria ter sido confiado, em primeiro lugar, o ministério sacerdotal; Deus, porém, dispôs as coisas diversamente; não lhe conferiu nem mesmo a faculdade de batizar. Quanto à categoria das diaconisas, existente na Igreja, não foi destinada a cumprir funções sacerdotais ou outras similares. As diaconisas são chamadas a salvaguardar a decência que se impõem no tocante ao sexo feminino, seja cooperando na administração do sacramento do Batismo, seja examinando as mulheres afetadas por alguma enfermidade ou vítimas de violência, seja intervindo todas as vezes que se trate de descobrir o corpo de outras mulheres a fim de que o desnudamento não seja exposto aos olhares dos homens que executam as santas cerimônias, mas seja considerado unicamente pelo olhar das diaconisas” (Panarion LXXIX 3).

Como se vê, S. Epifânio, representando a tradição, vê nas diaconisas auxiliares no trato pastoral das mulheres. Tal ministério fica  portanto claramente distinto do ministério dos diáconos.

Ademais é de notar: o próprio São Paulo estima e recomenda a diaconisa Febe (Rm 16, 1), mas não queria que a mulher falasse em público na igreja (o que é incompatível com o diaconato propriamente dito). Ver 1Cor 14, 34s:

“Como acontece em todas as assembleias dos Santos estejam caladas as mulheres na Igreja, pois não lhes é permitido tomar a palavra. Devem ficar submissas como diz também a Lei. Se desejam instruir-se sobre algum ponto, interroguem os maridos em casa; não é conveniente que uma mulher fale nas assembleias”.

Em 1Tm 2, 11s volta a advertência:

“Durante a instrução a mulher conserve o silêncio com toda submissão. Não permito que a mulher ensine ou domine o homem”.

Quem escreveu tais sentenças, não teria tolerado ver uma diaconisa pregar o Evangelho. Não há dúvida as restrições feitas pelo Apóstolo às mulheres são a expressão de uma cultura já ultrapassada; hoje em dia não têm mais vigência; como quer que seja, contribuem para corroborar a interpretação que vê, antes do mais, nas diaconisas colaboradoras no serviço pastoral às mulheres.

Nem por isto a mulher é menos apreciada do que o homem por parte da Igreja. Tenham-se em vista as palavras do Papa João Paulo II em sua Carta Apostólica sobre a Dignidade da Mulher nº 26s:

“É de notar que Cristo só chamou homens para serem seus Apóstolos. Fazendo isto, o Senhor agiu de maneira livre e soberana; não se creia que Jesus, assim procedendo tenha apenas procurado conformar-se à mentalidade discriminatória dominante em sua época; Ele não fazia accepção de pessoas (cf. Mt 22, 16). Em conseqüência somente os doze Apóstolos receberam o mandato: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 19; 1Cor 11, 24). Somente eles na tarde da Ressurreição receberam o Espírito Santo para perdoar os pecados (cf. Jô 20, 22s). Daí se pode deduzir que o sacramento da Ordem, que perpetua a ação redentora de Cristo mediante seus ministros, é destinado aos homens apenas, como aliás já observou a Congregação para a Doutrina da Fé na Declaração Inter Insigniores de 15/10/76.

O Dom da Esposa

A mulher participa do sacerdócio universal de todos os fiéis, derivado dos sacramentos do Batismo e da Crisma. Assim todos têm parte na grande oblação que Cristo fez de Si mesmo ao Pai no Calvário e que Ele perpetua na Eucaristia.

Na Igreja o que valoriza alguém não é o seu grau hierárquico (embora tenha significado importante), mas é a santidade. O Concílio do Vaticano II recordou que na linha da santidade precisamente a mulher Maria de Nazaré é figura da Igreja Contemporaneamente a Maria e depois dela, numerosas mulheres – ao lado dos homens – se destacaram por sua santidade ou por seu amor esponsal a Cristo. Tais foram, entre outras: as mulheres que acompanhavam Jesus durante a sua vida mortal e estiveram presentes no Cenáculo de Pentecostes (cf. Lc 8, 1-3 At 1, 14; 2, 1-3); as mulheres que tiveram parte na vida da Igreja nascente (a diaconisa Febe, de Cêncreas, cf. Rm 16, 1; Prisca, cf. 2Tm 4, 19; Evódia e Síntique, cf. Fl 4, 2; Maria, Trifena, Pérside Trifosa cf. Rm 16, 6-12)… Em todas as épocas houve mulheres perfeitas (Pr 31, 10), que corajosamente participaram da missão da Igreja: Mônica mãe de Agostinho, Macrina, Olga de Kiev, Matilde da Toscana, Edviges da Silésia, Edviges de Cracóvia, Elisabete da Turíngia, Brígida da Suécia, Joana d’Arc, Rosa de Lima, Elisabete Seaton, Mary Ward… além das doutoras Santa Catarina de Sena, Santa Teresa de Ávila e Santa Teresinha de Lsieux.

Também em nossos dias a Igreja não cessa de enriquecer-se com o testemunho de numerosas mulheres que realizam a sua vocação à santidade. As mulheres santas são uma personificação do ideal feminino e um modelo para todos os cristãos”.

Em poucas palavras: o que dá valor a alguém não é o cargo que ocupa, mas a santidade de vida que essa pessoa leva.

Em suma, tendo em vista ainda outros documentos da Tradição, pode-se dizer que as diaconisas exerciam funções concernentes às mulheres, especialmente por ocasião do Batismo, que era ministrado por imersão; era-lhes atribuído igualmente o encargo de atender aos pobres, aos peregrinos e aos enfermos, cujas casas elas visitavam; preparavam outrossim os cadáveres de mulheres para o sepultamento. Embora muito próximas dos diáconos, eram subordinados a estes; só podiam agir com a aprovação destes. Nas Constituições Apostólicas VIII 28 lê-se:

“A diaconisa não dá a bênção, nem faz o que fazem os presbíteros e os diáconos; apenas ela guarda as portas e, quando as mulheres são batizadas, ela assessora o sacerdote, tendo em vista a decência”.

Registraram-se no decorrer dos tempos tentativas de burlar tais normas. Daí os numerosos decretos pontifícios e conciliares que proíbem às mulheres fazer homilias no culto sagrado, o serviço do altar, a administração do sacramento do Batismo, Ver Didascalia III 5, 6 (obra do início do século III).

As diaconisas eram solteiras ou viúvas; não lhes era lícito casar-se.

Na medida em que foi declinado o costume de batizar adultos, foi também perdendo sua razão de ser o diaconato feminino; a partir do século VI no Ocidente foi-se extinguindo tal instituição; no Oriente a extinção foi mais lenta visto que aí as diaconisas gozavam de grande estima principalmente em Constantinopla. Famoso é o caso de Olimpíada no século IV: viúva aos dezoito anos de idade, recusou todas as propostas do imperador Teodósio; tornou-se amiga de São João Crisóstomo, que ela muito ajudou, compartilhando suas labutas e distribuindo aos pobres da diocese elevada quantia de dinheiro; foi-lhe solidária as tribulações, aceitando ser perseguida com ele reconfortou-o no exílio, vindo a falecer em 410, discípulas e colaboradoras de São João Crisóstomo foram também as diaconisas Prócula e Pentádia, a quem ele dirigiu várias cartas. Sejam citadas ainda Anastácia, que manteve intercâmbio epistolar com o Patriarca Severo de Antioquia; Macrina, irmã de São Basílio e São Gregório de Nissa (mulher tida como muito bela, que recusou quanto se lhe oferecia, para dedicar-se totalmente ao serviço do Senhor); tinha uma amiga chamada Lampádia, que lhe seguiu as pegadas. No século VI foi muito estimada a diaconisa Basilina.

Acontecia que as esposas de altos dignitários eclesiásticos eram obrigadas pelos cânones sagrados a receber o diaconato ou, ao menos, a não contrair novas núpcias em caso de viuvez (recebiam então o diaconato); tal foi o caso de Teosébia, esposa de S. Gregório de Nissa (que se casara com ela antes de receber o presbiterato).

Ultimamente têm-se realizado Cursos destinados a preparar mulheres para uma eventual ordenação. – A Santa Sé, porém, declarou não terem propósito tais Cursos, visto que a Igreja não pensa em satisfazer a tal objetivo.

Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
D. Estevão Bettencourt, osb.
Nº 500, Ano 2004, Página 76.
Fonte: http://www.pr.gonet.biz/index-catolicos.php

https://presbiteros.org.br/

Montini e Agostino

Gianpaolo Romanato (30Giorni)

Revista 30Dias – 02/03 – 2010

Montini e Agostino

Santo Agostinho nas notas inéditas de Paulo VI.
Aula magna, Palazzo del Bo, Pádua Terça-feira, 25 de novembro de 2008.

por Gianpaolo Romanato

Apenas duas palavras para vos transmitir as boas-vindas e a calorosa saudação do reitor, bem como o seu pesar por compromissos anteriores o terem impedido de estar presente esta noite; Lamento muito sincero, porque todos vocês sabem o quanto o Professor Milanesi está ligado à iniciativa das conferências sobre a atualidade de Santo Agostinho desde o seu nascimento, há mais de dez anos. O reitor teve pelo menos dois bons motivos, além do facto de ser o maior responsável da nossa Universidade, para apresentar esta noite. Ele é um filósofo, e esta noite falamos de um grande filósofo como Agostinho, e ele é bresciano, e esta noite falamos de um Papa de Brescia como Paulo VI. Não sou filósofo, nem bresciano, nem reitor, e portanto as razões que legitimaram a presença do professor Milanesi não são válidas para mim.

No entanto, permita-me lembrar-lhe que também tenho uma ligação com o tema que irão discutir, o que tenho o prazer de recordar. Destaco-o, mesmo que me afaste alguns minutos de você, porque proporciona uma pequena contribuição para a sua reflexão. Há muitos anos, no início da minha carreira, escrevi um ensaio, publicado na revista A Escola Católica em 1983, intitulado As leituras do jovem Montini . Esse ensaio consistiu na transcrição e comentário de dois documentos de Montini. O primeiro documento foi a bibliografia que utilizou nos cursos de religião que ministrou aos universitários de Fuci no período de 1925 a 1933. Realizou cinco cursos de religião, publicados na revista Fuci da época, Azione fucina , e depois republicados em volumes independentes. da editora Studium, fundada justamente naqueles anos também por sua iniciativa. Juntamente com o falecido Franco Molinari, então professor de História Moderna na Universidade Católica de Brescia, obtive todas as referências bibliográficas das notas e do texto, ordenei-as e publiquei-as como apêndice ao ensaio, com o objetivo de reconstruir , através desta fonte então ainda desconhecida, a marca cultural e os interesses do futuro Pontífice.

O segundo documento que transcrevi e examinei, mais ligado a Pádua, foi um documento inédito que me foi fornecido pelo professor Marino Gentile, professor de Filosofia Teórica desta Universidade, do qual os mais velhos presentes certamente se lembram. Marino Gentile fez parte dos Fuci nos anos em que Montini foi seu assistente espiritual e lhe foi muito próximo, tinha dele uma lembrança esplêndida, feita de estima e quase diria de veneração. Eu havia me formado com Gentile e após a formatura, apesar de ter passado do campo filosófico para o histórico, mantive boas relações com ele. O professor Gentile contou-me que Montini, que de várias maneiras demonstrou a sua consideração por ele, então nada mais do que um jovem universitário promissor, o encarregou de realizar um estudo bibliográfico sobre a cultura católica. A obra não foi aprovada e não foi publicada. Porém, Gentile tinha quatro ou cinco páginas manuscritas de Montini, nas quais lhe dava algumas informações bibliográficas, muito rápidas, rápidas, mas muito precisas. Indicações de orientação, sem pretender ser exaustivas ou completas, mas significativas da cultura de cada um precisamente porque são atuais , não sem também algum julgamento preciso. O documento, sem data, pode ser datado do final da década de 1920. Ele me deu esse trabalho inédito e eu publiquei junto com o texto que lhe falei antes, precedido de um ensaio ilustrativo e indicativo.

Por que me lembro desse meu trabalho distante? Porque o autor que Montini mais citou nessas duas bibliografias foi Santo Agostinho. Ele citava muito os seus contemporâneos, muitos, lembro que também indicava autores que nenhum eclesiástico da época teria coragem de apontar. Citou Ernesto Buonaiuti, personagem que havia sido excomungado e até declarado “vitando”, ou seja, a ser evitado por todo bom católico. Este homem que se tornaria papa, porém, era tão livre que listou Buonaiuti entre suas fontes. Mas o autor que mais cita, de fato, é Santo Agostinho, e não apenas A Cidade de Deus ou As Confissões , mas também muitas obras, se assim podemos dizer, menores, testemunhando um conhecimento, uma familiaridade, uma atenção para Hiponate que evidentemente fazia parte de sua bagagem cultural mais íntima.

Também tentei chegar ao fundo do interesse de Montini por Agostino e descobri que o intermediário muito provavelmente foi o padre Bevilacqua, o padre oratoriano que foi seu professor, e que então, como todos nos lembramos, Montini recompensou, uma vez que se tornou papa, elevando-o ao cardinalato: Bevilacqua aceitou, mas na condição de permanecer pároco. Acredito que seja o único caso de um cardeal pároco na história da Igreja.

Encerro e peço desculpas se tomei alguns minutos de seus discursos. Queria apenas assinalar-vos como na vasta e também, digamos, algo desorganizada cultura montiniana, feita de leituras em todos os sentidos, um lugar de absoluta importância foi ocupado pela figura de Santo Agostinho, que será discutido esta noite.
Obrigado.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Onde Deus se esconde

Onde Deus se esconde (Opus Dei)

Onde Deus se esconde

Na discrição e no silêncio dos sacramentos Jesus nos espera para que lhe abramos nossa alma livremente.

Há um grande alvoroço no Monte das Oliveiras. Levam até lá, aos empurrões, uma mulher que tinha sido encontrada com um homem que não era seu marido. É fácil imaginar a dor de Jesus pensando no sofrimento daquela pobre mulher e na cegueira daqueles homens: Como conhecem pouco seu Pai Deus! Na verdade, eles a arrastaram para lá numa armadilha para Jesus: “Moisés, na Lei, nos mandou apedrejar tais mulheres. E tu, que dizes?” (Jo 8,5).

No fundo, não estão interessados na resposta. Usando as leis de Deus, esses homens querem uma justificativa para a sua sentença pessoal já aprovada. Por isso, não serão capazes de compreender o primeiro gesto eloquente que o Senhor lhes oferece: “Mas Jesus, inclinando-se, começou a escrever no chão, com o dedo” (Jo 8,6). Depois, Ele se levanta e lhes diz claramente: “Quem dentre vós não tiver pecado, atire a primeira pedra!” (Jo 8,7). E, ao final, inclina-se novamente e escreve na areia sob seus pés.

Ações e gestos discretos

Nesta passagem vemos que, ainda que Jesus se levante para falar publicamente, quando Ele quer escrever algo que responda pessoalmente à vida daquela mulher, inclina-se sobre o chão. Esta é geralmente a forma como Ele se comunica conosco: agachado, escondido, como se estivesse ocultando a sua divindade em ações discretas e pequenos gestos. Às vezes temos dificuldade para valorizar o que está escrito na terra. Em várias ocasiões não somos capazes de reconhecer o Senhor aí.

Isso passa tão despercebido que o evangelista nem mesmo nos contou o que Jesus escreveu. O Filho de Deus aparece na cena – da mesma forma que também aparece em nossas vidas – mas não quer impor a sua presença, nem a sua opinião, nem mesmo quer especificar de forma clara uma interpretação correta da lei de Moisés, como eles lhe pediam. Jesus “não mudou a história forçando alguém ou à força de palavras, mas com o dom da sua vida. Não esperou que nos tornássemos bons para nos amar, mas deu-Se gratuitamente a nós. Por nossa parte, não esperemos que o próximo se torne bom para lhe fazermos bem, que a Igreja seja perfeita para a amarmos, que os outros tenham consideração por nós para os servirmos. Comecemos nós. Isto é acolher o dom da graça. E a santidade consiste precisamente em preservar esta gratuidade”[1].

Talvez tenhamos nos perguntado muitas vezes por que Deus não se manifesta mais claramente, por que não fala mais alto. Talvez, inclusive, já desejamos nos rebelar diante desta sua forma de ser e, ingenuamente, procuramos corrigi-la. Bento XVI nos prevenia diante dessa tentação, fazendo-nos ver o que se repete constantemente ao longo da história: “Cansado de um caminho com um Deus invisível, agora que também Moisés, o mediador, desapareceu, o povo pede uma presença tangível, palpável, do Senhor, e encontra no bezerro de metal fundido, construído por Aarão, um deus que se torna acessível, manobrável, ao alcance do homem. Trata-se de uma tentação constante no caminho de fé: eludir o mistério divino, construindo um deus compreensível, correspondente aos próprios esquemas, aos próprios programas”[2].

Não queremos cair nessa tentação. Gostaríamos de nos maravilhar e adorar ao Deus escondido nas situações que vivemos cada dia, nas pessoas que nos rodeiam, nos sacramentos aos que acudimos com frequência, como a confissão e a santa Missa. Queremos encontrar Jesus nesta terra onde escreve, com sua própria mão, palavras de carinho e esperança. Por isso pedimos a Ele para compreender as suas razões para agir desta forma, pedimos que tenhamos a sabedoria para valorizar o mistério desse refinado respeito que Ele tem pela nossa liberdade. Na cena evangélica vemos que Jesus não fica com raiva da mulher que pecou nem dos acusadores que lhe montaram uma armadilha. Coloca-se no meio de ambos e toma para si as pedras, os gritos, a condenação. Pode-nos vir à mente o que o livro dos Reis narra quando nos diz que Deus não está no vento forte que quebra os rochedos, nem no terremoto, nem no fogo. Deus é um sussurro de brisa suave. Aí o encontrou Elias e aí queremos, também nós, descobri-lo (cfr. 1 R 19,11-13).

Quando Deus parece muito vulnerável

Pode ser que este modo de ser de Deus nos inquiete. Podemos pensar que esse silêncio facilita que os seus direitos sejam pisoteados, pode nos passar pela cabeça que esse mecanismo é bastante arriscado, que o torna muito vulnerável. De fato, Deus nos deu um grau tão alto de liberdade que podemos realmente escolher os nossos caminhos, tão diferentes uns dos outros, usando a vontade ajudada pela graça. Mas se alguma vez podemos ofender a Deus não é porque Ele seja demasiadamente suscetível. Ao contrário, Ele tem muita confiança, é muito livre nas relações que estabelece conosco. Pode parecer fácil passar por cima do amor que na realidade Ele merece, mas isso acontece porque Ele quis colocar o seu coração no chão, para que nós pisássemos no macio. O Senhor não sofre, nem se sente ofendido pelo que isso supõe para Si, mas pelo dano que causa a nós mesmos. Jesus adverte às mulheres que choravam no caminho do Calvário: “Mulheres de Jerusalém, não choreis por mim! Chorai por vós mesmas e por vossos filhos! Porque dias virão em que se dirá: ‘Felizes as estéreis, os ventres que nunca deram à luz e os seios que nunca amamentaram’. Então começarão a pedir às montanhas: ‘Caí sobre nós!’, e às colinas: ‘Escondei- nos!’ Pois, se fazem assim com a árvore verde, o que não farão com a árvore seca?” (Lc 23,28-31).

No entanto, o mais surpreendente é que o Senhor não se queixa, não se zanga, não se cansa. Inclusive, se alguma vez deixamos pouco espaço para Ele em nosso coração, não se afasta batendo a porta. Deus sempre fica por perto, sem fazer ruído, como oculto nos sacramentos, com a esperança de que voltemos a permitir o quanto antes que Ele se hospede plenamente na nossa alma.

É verdade que, como Jesus nos oferece uma e outra vez o seu amor, podem ser muitas as vezes que tenhamos falhado com Ele. Mas Ele não se preocupa com o imenso tamanho da chaga de seu coração se isso a converte na porta pela que entremos e descansemos em seu amor. Deus não é ingênuo e, por isso, nos disse que faz isso com todo amor: “Meu jugo é suave e a minha carga é leve” (Mt 11,30). No entanto, nós, seres humanos, podemos achar que tanta bondade é exagerada e, inclusive inconscientemente, reagir com certa descrença. Podemos não chegar a compreender a verdadeira magnitude desse presente que Deus nos dá. São Josemaria dizia que os homens podem quebrar “o jugo suave, sacodem das costas a sua carga, maravilhosa carga de santidade e justiça, de graça, de amor e paz. Enfurecem-se diante do amor, riem-se da bondade inerme de um Deus que renuncia ao uso das suas legiões de anjos para se defender”[3].

A proximidade da confissão

Voltando à cena do Monte das Oliveiras, onde montaram a armadilha para Jesus, podemos ver que, ainda que aquela mulher não tivesse se respeitado a si mesma, seus acusadores não foram capazes de reconhecer nela uma filha de Deus. Mas Cristo a olha de outra forma. Que diferença entre o olhar de Jesus e o nosso! “Hoje diz a mim, a ti, a cada um de nós: ‘Amo-te e sempre te amarei; és precioso aos meus olhos’”[4]. Santa Teresa de Jesus, de alguma forma, experimentou esse olhar divino com frequência: “Considero muitas vezes, Cristo meu, quão cheios de graça e de delícias se mostram os vossos olhos a quem vos conhece e ama, e a quem vós, meu Bem, quereis fitar para sempre com amor. Parece-me que, às almas que tendes por Vossas, um só desses olhares tão suaves basta por prêmio de muitos anos de serviço”[5]. O olhar de Jesus não é ingênuo, mas profundo, e, por isso mesmo, compreensivo, cheio de futuro. “Ouve como foste amado enquanto não eras amável. Ouve como foste amado sendo torpe, antes que houvesse em ti algo que fosse digno de se amar. Vais sendo amado antes, para que te tornes digno de ser amado”[6].

No sacramento da confissão comprovamos que o arrependimento é suficiente para que Jesus acredite firmemente que o amamos. Foi-lhe suficiente o arrependimento de Pedro e basta-lhe também o nosso: “Senhor, Tu sabes tudo. Tu sabes que eu te amo” (Jo 21,17). Quando nos aproximamos do confessionário, naquelas palavras e gestos que dão forma ao sacramento, estamos dizendo a Jesus: “Ofendi-te de novo, voltei a buscar a felicidade fora de ti, desprezei teu carinho, mas Senhor, sabes que eu te amo”. Então ouvimos claramente, como aquela mulher: “Eu também não te condeno” (Jo 8,11). E enchemo-nos de paz. Se às vezes podemos pensar que Deus tomou poucas precauções para não ser ofendido por nós, ele tornou tudo mais fácil ainda para podermos ser perdoados por Ele. Um padre da Igreja coloca essas palavras nos lábios de Jesus: “Esta cruz não me feriu a mim, mas feriu a morte. Estes cravos não me provocam dor, mas cravam mais profundamente em mim o amor por vós. Estas chagas não me fazem soltar gemidos, mas vos introduzem ainda mais intimamente em meu coração. O meu corpo, ao ser estendido na cruz, não aumenta o meu sofrimento, mas dilata os espaços do coração para vos acolher. Meu sangue não é uma perda para mim, mas é o preço do vosso resgate”[7].

Por tudo isso desejamos ser muito respeitosos com esta delicadeza com que Deus nos trata. Preocupa-nos a mera possibilidade de abusar de tanta confiança. Não gostamos de rebaixar o sagrado, transformando-o somente numa rotina para cumprir a cada certo tempo. Ganhamos o sacramento da confissão pelo sangue de Jesus e não queremos deixar de agradecer-lhe por isso, também com obras. Queremos ouvir sempre este perdão divino, pelo qual fica mais fácil retirar qualquer obstáculo que impeça saber-nos outra vez olhados e empurrados por Deus em direção ao futuro.

A missa de Jesus é nossa Missa

São Tomás de Aquino explica o valor que tem a salvação realizada por Jesus no Calvário: “Cristo, sofrendo por obediência e caridade, ofereceu a Deus um bem maior do que o exigido pela recompensa da ofensa total do gênero humano”[8]. E podemos oferecer essa mesma oferenda sanadora como se fosse a nossa própria oferenda: ela nos é presenteada por Cristo cada dia na celebração da Eucaristia. Por isso, são Josemaria gostava de dizer que é “a nossa Missa”[9], de cada um de nós e de Jesus. Se quisermos, como é fácil ser corredentores! Como é fácil mudar o curso da história junto d’Ele!

Santo Agostinho, ao contemplar a cena do evangelho que meditamos, notava que “somente dois ficam aí: a miserável e a Misericórdia. Quando todos foram embora e só ficou a mulher, Cristo levantou os olhos e fixou-os nela. Já ouvimos a voz da justiça. Ouçamos agora também a voz da mansidão”[10]. Com que suavidade Jesus a convida para a santidade! Ela já não estará sozinha em sua luta. Saberá sempre que o olhar de Jesus a acompanha. Depois de termos saboreado essa suavidade já não desejamos viver de outra maneira: “Eu te saboreei, e agora, tenho fome e sede de Ti”[11]. Como é natural então relacionar-se com Jesus na Eucaristia com essa suavidade e respeito! Não supõe distância, nem é mera educação ou cortesia protocolar. É carinho verdadeiro, feito de liberdade e de admiração. Até na maneira de aproximar-nos para comungar, no silêncio diante do Sacrário ou nas genuflexões pausadas descobrimos uma oportunidade de corresponder a tanto amor derramado por cada um. Não são mais que amostras da pureza interior que desejamos e que tantas vezes já pedimos a Nossa Senhora, ao rezar a comunhão espiritual.

Na Santa Missa comprovamos de maneira especial que “quando Ele pede alguma coisa, na realidade está oferecendo um dom. Não somos nós que lhe fazemos um favor: é Deus quem ilumina a nossa vida, enchendo-a de sentido”[12]. Como gostaríamos de agradecer a Deus por fazer a santidade tão acessível! Assim torna-se fácil ver-nos, como aquela mulher, lançados por Jesus à esperança: “Vai, e de agora em diante não peques mais” (Jo 8,11). Essa é a melhor notícia possível. Jesus a convenceu de que o pecado não é inevitável, não é o seu destino, não é a última palavra. Há uma luz no fim do túnel que, no nosso caso, chega vigorosamente por meio dos sacramentos. Se já ninguém a condena, por que ela se condenaria? Agora sabe que, fortalecida por Jesus, pode voltar, fazer o seu marido feliz e ser, ela mesma, muito feliz.

Diego Zalbidea/ Tradução: Mônica Diez


[1] Francisco, Homilia na Missa de Natal, 24/12/2019.

[2] Bento XVI, Audiência, 1/06/2011.

[3] São Josemaria, É Cristo que passa, n. 185;

[4] Francisco, Homilia na Missa de Natal, 24/12/2019

[5] Santa Teresa de Jesus, Exclamações, 14.

[6] Santo Agostinho, Sermão 142.

[7] São Pedro Crisólogo, Sermão 108: PL 52, 499-500.

[8] São Tomás de Aquino, Suma Teológica, III, q. 48, a. 2, co.

[9] São Josemaria, Caminho, n. 533.

[10] Santo Agostinho, Tratado sobre o evangelho de São João, 33, 5-6.

[11] Santo Agostinho, Confissões, X, 38.

[12] Fernando Ocáriz, Luz para ver, força para querer (“O São Paulo”, página 16, edição 3218).

Fonte: https://opusdei.org/pt-br

Um olhar de esperança para o futuro das crianças

Experiência pedagógica de conscientização sobre cuidados ambientais (Vatican News)

Três jovens religiosas pertencentes à Congregação das Irmãs Dominicanas Missionárias do Sagrado Coração de Jesus partiram para o sul de Bogotá (Colômbia) e ali deram início à sua missão no meio das comunidades locais. Assim, nasceu a FISDECO — Fundação para a integração social e o desenvolvimento comunitário — uma obra de pastoral social a serviço da Igreja liderada pelas religiosas, que ao longo dos anos conseguiu transformar a vida de milhares de famílias da região.

Ir. Regina Häufele o.p.

Há cinquenta anos, em 8 de setembro de 1973, ouvindo o apelo do Papa Paulo VI às Congregações religiosas missionárias a evangelizar a América Latina, nós, três jovens religiosas pertencentes à Congregação das Irmãs Dominicanas Missionárias do Sagrado Coração de Jesus, partimos para o sul de Bogotá (Colômbia), uma área marginalizada com grande carência de infraestruturas e de desenvolvimento social.

Situação das crianças na chegada das religiosas 50 anos atrás (Vatican News)

Demos início à nossa obra no meio das comunidades locais, com o pároco daquela época, procurando consolidar um trabalho “comunitário” que permitisse a dignificação da vida, a formação integral da pessoa humana e a construção de comunidades cristãs. Assim nasceu a FISDECO — Fundação para a integração social e o desenvolvimento comunitário — uma obra de pastoral social ao serviço da Igreja liderada pelas religiosas, que ao longo dos anos conseguiu transformar a vida de milhares de famílias da região, tornando visíveis e possíveis a experiência de fé e a construção do Reino entre os mais necessitados.

Alunos da escola FISDECO criam desenhos para enviar ao Papa (Vatican News)

Responder às necessidades

Quando chegamos àquela área, deparamo-nos com uma realidade que ultrapassava em grande medida a ideia que tínhamos do que teria sido a nova missão: famílias numerosas com os filhos mais velhos que tomavam conta dos mais novos enquanto os pais trabalhavam nas rudimentares fábricas de tijolo ou no cultivo de flores no extremo norte da cidade. Estradas não pavimentadas, casas construídas com tijolos, postes de madeira e plástico, sem água nem luz. As famílias cozinhavam em fogões a gasolina, que muitas vezes provocavam queimaduras nas crianças. Também não havia estruturas educativas na área. No entanto, apesar das condições difíceis, vimos um profundo desejo por parte dos habitantes de viver a fé de acordo com as tradições que tinham aprendido localmente.

Diante dessa realidade, o grupo de religiosas, com alguns leigos, decide começar a realizar uma mudança a partir do cuidado integral das crianças, jovens, mulheres e idosos, oferecendo serviços educativos, espirituais, médicos e apoio material para as necessidades básicas. Este esforço conjunto para gerar processos de mudança, desenvolvimento e dignificação da vida foi, desde o início, a essência da nossa ação missionária, levando cada beneficiário a tornar-se agente do próprio desenvolvimento e, com outras pessoas, a contribuir para a transformação do seu ambiente e da sociedade.

Hoje, os nossos principais pilares são a creche e a escola básica (atualmente com 500 alunos), a assistência às mulheres e aos idosos da comunidade, bem como às bibliotecas.

Atividade lúdica na escola FISDECO (Vatican News)

Um olhar de esperança para o futuro

A obra missionária das religiosas através da FISDECO desenvolve-se atualmente nos campos da educação e da gestão comunitária em seis Centros integrais situados em vários bairros de Ciudad Bolívar, que conta com uma população de mais de um milhão de habitantes. Devemos recordar também que a difícil situação do país nos planos político, económico e social se reflete em Ciudad Bolívar, fazendo com que problemas como a pobreza, a deslocação, a migração, o desemprego, a marginalização, a droga e a violência se tornem um flagelo para os habitantes da região.

Programa de gestão comunitária: “Quem educa uma mulher educa uma família” (Vatican News)

Além disso, a elevada taxa de analfabetismo e o baixo nível de educação primária e secundária marcam a população, sem permitir que saiam da sua condição vulnerável. Uma das nossas iniciativas atuais para enfrentar esta situação é a atuação de um plano-piloto de alfabetização, recorrendo ao método “IntraAct” (concebido na Alemanha) para melhorar o processo de aprendizagem da leitura, a fim de aperfeiçoar e facilitar a capacidade nos estudos.

A primeira infância, a infância e a juventude são a nossa prioridade. Ao longo dos anos, pudemos averiguar que, até em circunstâncias difíceis, a educação transforma o contexto social e que uma educação de qualidade leva a mudanças significativas nas famílias e nos seus contextos sociais. Todos os anos, cerca de 100 alunos completam o ciclo de cinco anos do ensino básico e terminam com um bom fundamento para o seu crescimento intelectual, ético e religioso.

As crianças da escola FISDECO escrevem cartas ao Papa Francisco (Vatican News)

Hoje, o nosso grande sonho — tanto dos alunos como de todas as pessoas que participam na FISDECO — é construir uma sede para a escola, do sexto ao décimo primeiro ano, a fim de que os jovens possam continuar o processo de educação e formação até à conclusão do ensino secundário. Estamos persuadidos de que assim poderão tornar-se agentes do seu desenvolvimento individual e das suas famílias, gerando um impacto sustentável sobre o bem comum das respetivas comunidades.

O ensino secundário é um projeto e um grande investimento que, aparentemente, vai além das nossas possibilidades atuais. Mas quem, há 50 anos, teria imaginado tudo o que conseguimos edificar até agora? Por isso — com a ajuda de Deus — olhamos para o futuro com esperança e determinação a fim de continuar a transformar sonhos em realidade!

Entrega de cartas dos alunos da escola FISDECO ao Papa (Vatican News)
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF