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segunda-feira, 25 de março de 2024

Quinta Pregação da Quaresma do cardeal Cantalamessa (II)

5ª Pregação da Quaresma 2024 (Vatican News)

Quinta Pregação da Quaresma do cardeal Cantalamessa

Que, nesta Páscoa, o Senhor ressuscitado faça, ele mesmo, ressoar em nosso coração algum daqueles seus divinos “Eu Sou”, sobre os quais meditamos nesta Quaresma! Principalmente aquele que proclama a sua vitória pascal: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá".

Fr. Raniero Card. Cantalamessa, OFMCap
“EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA”
Quinta Pregação da Quaresma de 2024

O problema mais delicado, acerca das inspirações, foi sempre o de discernir aquelas que vêm do Espírito de Deus daquelas que provêm do espírito do mundo, das próprias paixões, ou do espírito maligno. O tema do discernimento dos espíritos tem passado nos séculos por uma notável evolução. À origem, era concebido como o carisma que servia para distinguir – entre as palavras, orações e profecias pronunciadas na assembleia – quais provinham do Espírito de Deus e quais não. Em seu exercício comunitário, o carisma da profecia deve ser acompanhado, para o Apóstolo, por aquele do discernimento dos espíritos: “A outro, (é dada) a profecia; a outro, o discernimento dos espíritos” (1Cor 12,10).

O sentido originário do carisma, entendido por Paulo, parece ser muito preciso e limitado. Refere-se à recepção da própria profecia, a sua avaliação, da parte de um ou mais membros da assembleia, também eles dotados de espírito profético. Também isto, porém, não em base a uma análise racional, mas a uma inspiração do mesmo Espírito. O sentido de discernir (diakrisis) oscila, portanto, entre distinguir e interpretar: distinguir se quem falou foi o Espírito de Deus ou um espírito diverso, interpretar o que o Espírito quis dizer em uma situação concreta. A este mesmo dom do discernimento, refere-se a conhecida recomendação do Apóstolo: “Não apagueis o Espírito, não desprezeis as profecias, mas examinai tudo e guardai o que for bom. Afastai-vos de toda espécie de mal” (1Ts 5,19-22).

Se devemos levar em conta a experiência atual dos movimentos pentecostais e carismáticos, devemos pensar que este carisma consistisse na capacidade da assembleia, ou de alguns nela, de reagir ativamente a uma palavra profética, a uma citação bíblica, ou a uma oração, expressando – com a exclamação “confirmo!”, ou com outros pequenos sinais de cabeça e voz – aprovação pela palavra escutada, ou mostrando, ao contrário – com o silêncio e passando a outro – um juízo negativo. Desta forma, a verdadeira e a falsa profecia passam a ser julgadas “pelos frutos” que produzem ou não, como justamente recomendava Jesus (cf. Mt 7,16). Este significado originário do discernimento dos espíritos – aliás – poderia de grande atualidade ainda hoje em debates e reuniões, como aqueles que começamos a experimentar no diálogo sinodal.

Em época sucessiva, na espiritualidade tanto oriental quanto ocidental, o carisma do discernimento dos espíritos tem servido sobretudo para discernir as inspirações do discípulo da parte de um ancião (como no monaquismo) e, mais geralmente, para discernir as próprias inspirações. A evolução não é arbitrária; trata-se, de fato, do mesmo dom, mesmo se aplicado a sujeitos e em contextos diversos: o contexto comunitário no primeiro caso, o pessoal no segundo.

Há critérios de discernimento que poderíamos chamar objetivos. No campo doutrinal, eles se resumem para Paulo no reconhecimento de Cristo como Senhor: “Ninguém, falando pelo Espírito de Deus, vai dizer: ‘Jesus seja maldito’, como também ninguém será capaz de dizer: ‘Jesus é Senhor’, a não ser pelo Espírito Santo” (1Cor 12,3); para João, resumem-se na fé em Cristo e na sua encarnação:

Caríssimos, não creiais em qualquer espírito, mas examinai os espíritos para verdes se são de Deus, pois muitos falsos profetas vieram ao mundo. Nisto conheceis o Espírito de Deus: todo espírito que confessa Jesus Cristo vindo na carne, é de Deus. E todo espírito que não confessa Jesus, não é de Deus (1Jo 4,1-3).

No campo moral, um critério fundamental é dado pela coerência do Espírito de Deus consigo mesmo. Ele não pode pedir algo que seja contrário à vontade divina, tal como é expressa na Escritura, no ensinamento da Igreja e nos deveres do próprio estado. Uma inspiração divina jamais pedirá para cumprir atos que a Igreja considera imorais, por mais que a carne seja capaz de sugerir argumentos ilusórios contrários nestes casos; por exemplo, que Deus é amor e, por isso, tudo o que se faz por amor vem de Deus.

Contudo, às vezes estes critérios objetivos não bastam, porque a escolha não é entre o bem e o mal, mas é entre um bem e um outro bem, e se trata de ver qual é a coisa que Deus quer, em uma circunstância precisa. Foi sobretudo para responder a esta exigência que Santo Inácio de Loyola desenvolveu a sua doutrina sobre o discernimento.

Sinto quase vergonha de falar sobre este tema nesta sede..., mas vamos falar pelo menos alguma coisa. O santo nos convida a observar as intenções – ele as chama de “espíritos” – que estão por trás de uma escolha e as reações que ela provoca. Sabe-se que o que vem do Espírito de Deus traz consigo alegria, paz, tranquilidade, doçura, simplicidade, luz. O que provém do espírito do mal, ao contrário, traz consigo perturbação, agitação, inquietação, confusão, trevas. O Apóstolo o põe em evidência contrapondo os frutos da carne (inimizades, contenda, ciúmes, iras, intrigas, discórdias, invejas) e os frutos do Espírito, que são, ao contrário, amor, alegria, paz, paciência, amabilidade, bondade, lealdade, mansidão, domínio próprio (Gl 5,22).

Na prática, as coisas, é verdade, são mais complexas. Uma inspiração pode vir de Deus e, apesar disso, causar uma grande perturbação. Mas isto não é devido à inspiração doce e pacífica, como tudo o que provém de Deus; antes, nasce da resistência à inspiração ou do fato de ela nos pedir algo que não estamos prontos a lhe dar. Se a inspiração for acolhida, o coração logo se encontrará em uma profunda paz. Deus recompensa cada pequena vitória neste campo, fazendo com que a alma sinta a sua aprovação, que é a alegria mais pura que existe no mundo.

Um campo no qual é importante praticar o discernimento – além daquele das intenções e das decisões – é o âmbito dos sentimentos. Nada é mais traiçoeiro do que o amor. A natureza é habilíssima em deixar passar, como proveniente do espírito, o que ao invés provém da carne. Neste campo, é mais do que nunca necessário levar em conta o conselho que o poeta latino Ovídio dava justamente a propósito dos males do amor: “Principiis obsta. Sero medicina paratur cum mala per longas convaluere moras: “Opõe-te aos começos. Tarde toma-se o remédio quando os males, pelos muitos adiamentos, ganharam força”[6].

*    *    *

O fruto concreto desta meditação deve ser uma decisão renovada de nos confiarmos em tudo e por tudo à guia interior do Espírito Santo, como uma espécie de “direção espiritual”. Devemos todos nos abandonar ao Mestre interior que nos fala sem tumulto de palavras. Como bons atores, devemos ter o ouvido voltado, nas grandes e pequenas ocasiões, à voz deste “sugeridor” escondido, para interpretar fielmente a nossa parte na cena da vida. É o que se entende com a expressão “docilidade ao Espírito”.

É mais fácil do que pensamos, porque ele fala dentro de nós, ensina-nos tudo, instrui-nos sobretudo. Às vezes, basta um simples olhar interior, um movimento do coração, um momento de recolhimento e oração. João escreve em sua Primeira Carta:

Quanto a vós, a unção que dele recebestes permanece convosco, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine. A sua unção vos ensina tudo, e ela é verdadeira e não mentirosa (1Jo 2,27).

Sobre estas palavras, Santo Agostinho instaura um debate inusitado e vivaz com o Apóstolo. Em seu comentário à Primeira Carta de João, escreve:

Pergunto a João: “Aqueles aos quais dirigias estas palavras já tinham a unção... Por que então escreveste a eles esta carta? Por que instruí-los?”... Aqui há um grande mistério sobre o qual é preciso refletir, irmãos. O som das nossas palavras atinge os ouvidos, mas o verdadeiro mestre está dentro... Nós podemos exortar com o som da voz, mas, se dentro não está quem ensina, trata-se de um barulho inútil[7].

Se acolher as inspirações é importante para todo o cristão, é vital para quem tem funções de governo na Igreja. Só assim se permite ao Espírito de Cristo guiar a sua Igreja mediante seus representantes humanos. Em um navio, não é necessário que todos os passageiros estejam com os ouvidos grudados no rádio de bordo, para receber sinais sobre a rota, sobre eventuais icebergs e sobre as condições do tempo, mas é indispensável que os responsáveis de bordo estejam. De uma “inspiração divina”, acolhida corajosamente pelo Papa São João XXIII, nasceu o Concílio Vaticano II. Da mesma forma, depois dele, nasceram outros gestos proféticos, que aqueles que vierem depois de nós perceberão.

Que, nesta Páscoa, o Senhor ressuscitado faça, ele mesmo, ressoar em nosso coração algum daqueles seus divinos “Eu Sou”, sobre os quais meditamos nesta Quaresma! Principalmente aquele que proclama a sua vitória pascal: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá (11,23-26).

Santo Padre, irmãos e irmãs, Feliz Páscoa!

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Tradução Fr. Ricardo Farias, OFMCap
[6] Cf. Ovídio, Remedia amoris, V,91.
[7] Cf. Agostinho, Tratado sobre a Primeia Epístola de João, 3,13.

https://www.vaticannews.va/pt

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt.html

Ofício das trevas

Ofício das trevas (diocesedesaojoaodelrei)

OFÍCIO DAS TREVAS

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
 

A partir do Domingo de Ramos iniciamos a Semana Santa, a semana maior para nós católicos, por isso, temos oportunidade de participar ao máximo de todas as celebrações, pois só existe uma Semana Santa ao longo de todo o ano. Façamos que essa semana seja santa de fato. Todas as igrejas estão abertas ao longo da semana para ouvir a confissão dos fiéis, abrindo a possibilidade para que possam rezar e se aproximar mais do Senhor, e celebrando a noite preparando os momentos litúrgicos propostos para essa semana. Temos celebrações litúrgicas, eventos da piedade popular e momentos culturais nessa semana. 

Ao longo desta semana, acompanhamos Jesus entrando em Jerusalém e ser aclamado como rei, (Domingo de Ramos), contemplamos as trevas tomando conta do mundo, pois a luz está sendo tirada de nós (ofício de trevas e sermão do depósito) na segunda-feira ou terça-feira.  Contemplamos o encontro de Jesus (Senhor dos Passos) com sua mãe (Nossa Senhora das dores), no caminho ao calvário na terça-feira ou quarta-feira. A seguir, meditamos as dores de uma mãe ao ver o seu filho sendo entregue à morte, como uma ovelha em direção ao matadouro (meditação das dores de Nossa Senhora), em alguns lugares na quarta-feira Santa. A partir da Quinta-feira Santa tem início o tríduo Pascal, uma única celebração que tem início na quinta-feira ao entardecer e vai concluir na Vigília Pascal e no Domingo com a celebração da Páscoa da Ressurreição.  

Se participarmos bem de toda a semana a Santa, desde o Domingo de Ramos até o Domingo de Páscoa chegaremos renovados a Páscoa do Senhor. Podemos ainda, ao longo da Semana Santa intensificarmos o nosso jejum e a nossa abstinência conformando a nossa vida com a entrega de Jesus na Cruz por nós.  

Iniciamos a Semana Santa com o mundo envolto em trevas, pois o grande “rei” está sendo entregue à morte, a “luz” está sendo retirada do mundo, e terminamos irradiados novamente por essa “luz”, através da ressurreição de Nosso Senhor.  

Nessa Noite das trevas meditamos o momento em que Nosso Senhor foi preso, e a oração que Jesus proferiu no momento de sua agonia no Horto das Oliveiras, que inclusive meditamos nos mistérios do rosário. Jesus profere essa oração quando se sente sozinho, todos os discípulos o abandonam. Eles fogem, pois ficam com muito medo, pensando que poderia acontecer o mesmo com eles. Jesus tinha consciência que tinha chegado o seu momento como já tinha dito aos discípulos, e os soldados lhe prendem.  

Celebramos nessa noite o ofício de trevas e o “sermão do depósito”, o mesmo acontece quando Jesus é crucificado e morre, uma escuridão tomou conta de toda a terra das 12 às 15 horas. O Filho da luz está sendo entregue ao filho das trevas, nesse momento o mal está aparentemente vencendo, mas no Sábado Santo a luz ressurgirá e o bem vencerá o mal. Nessa noite podemos fazer uma reflexão e ver quantas vezes preferimos o caminho das trevas, ao invés do caminho da luz. Todas as vezes que nos afastamos de Deus e optamos pelo pecado caminhamos nas trevas. Por isso que ao longo da Quaresma somos chamados a realizar a nossa confissão sacramental, para que possamos ser alcançados e iluminados pela luz de Cristo, e dessa forma poder iluminar aqueles que se aproximam de nós.  

Durante a noite as trevas tomam conta do mundo, conforme rezamos na oração das completas (liturgia das horas): “Agora que o clarão da luz se apaga” e ainda pedimos: “da noite a pavorosa escuridão com vossa claridade iluminai”. Ou seja, durante a noite (em seus diversos significados) é mais comum cairmos no pecado, mas devemos pedir que luz de Cristo nos ilumine para que o mal não nos vença para sempre. Por isso, a importância de rezarmos antes de dormir, pedindo a proteção divina. A luz divina deve sempre continuar acesa em nossos corações.  

Nessa noite, ao mesmo tempo que celebramos a entrega de Jesus, e as trevas se apoderando do mundo, devemos rezar pedindo que ao final a luz vença as trevas. Por isso que ao final dessa celebração volta para o centro do altar (ou permanece no candelabro) uma vela acesa, após todas as outras terem se apagado, pois a luz de Cristo não deve ser apagada, ela vence as trevas. Recordamos ainda que a luz de Cristo continua viva no meio de nós através da ação do Espírito Santo, e ainda, há uma luz na Igreja que nunca se apaga, representando que Cristo está vivo e que sua luz permanece iluminando o mundo, é a luz do sacrário. Que da luz do sacrário de nossas igrejas, Cristo ilumine o mundo inteiro.  

Jesus não tinha motivos para ser condenado à morte, foi condenado injustamente. Recordemos nesta noite de tantas pessoas que são condenadas à morte ou presas injustamente. Recordemos das guerras que vivemos atualmente, quantos inocentes que já perderam as suas vidas. E ainda, as “guerras civis” que vivenciamos em nossas cidades através da violência urbana.  

Neste mês de março em especial, o Papa Francisco pediu para que cada um de nós rezássemos pelos novos mártires (intenção do apostolado da oração), ou seja, aqueles que morrem em defesa da fé nos tempos atuais. Os missionários que estão espalhados pelo mundo anunciando o Evangelho e são perseguidos. “Rezemos para que aqueles que, em várias partes do mundo, arriscam a vida pelo Evangelho contagiem a Igreja com sua coragem e seu impulso missionário. E estejamos abertos à graça do martírio.” (Papa Francisco).  

Rezando nessas intenções peçamos que a luz de Cristo prevaleça acesa nesse mundo tão conturbado e que apesar das dificuldades e perseguições persistamos até o fim no anúncio do Evangelho. Que a luz de Cristo ressuscitado ilumine o mundo com a sua ressurreição.  

Celebremos com fé e piedade a Semana Santa, fazendo o máximo possível para participarmos de todas as celebrações. Através das celebrações é possível acompanhar os últimos passos de Jesus até a morte de cruz e posteriormente a alegria da Ressurreição. Lembremos que a Semana Santa tem início no Domingo de Ramos e vai até o Domingo de Páscoa, são oito dias. Aproveite ainda essa semana maior para realizar a confissão sacramental, se ainda não teve oportunidade.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Papa aos jovens: vós sois a esperança viva de uma Igreja em caminho

Papa Francisco durante a JMJ 2023, em Lisboa (VATICAN MEDIA Divisione Foto)

Por ocasião do quinto aniversário da publicação da exortação apostólica pós-sinodal "Christus Vivit", o Papa envia uma mensagem aos jovens de todo o mundo. “Cristo vive e ama-te infinitamente. E o seu amor por ti não está condicionado pelas tuas quedas ou pelos teus erros. Ele que deu a sua vida por ti, não espera pela tua perfeição para te amar”, enfatiza Francisco.

Thulio Fonseca – Vatican News

“Queridos jovens, Cristo vive e quer-vos vivos! Queria, antes de mais nada, que as minhas palavras reavivassem em vós a esperança. De fato, no atual contexto internacional marcado por tantos conflitos, tantos sofrimentos, posso imaginar que muitos de vós se sintam desanimados. Por isso desejo começar, juntamente convosco, do anúncio que está no alicerce da esperança para nós e toda a humanidade: Cristo vive!” Essas são as palavras iniciais do Papa Francisco em sua mensagem direcionada aos jovens, cinco anos após a publicação da Exortação apostólica Christus Vivit, fruto da Assembleia do Sínodo dos Bispos que teve como tema: “Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”.

No texto, o Santo Padre volta-se para a juventude, convidando-os a não se deixarem dominar pelo medo e pelo desânimo, mas a serem motores para o mundo:

“Recomendo-vos que nunca nos deixeis faltar o vosso barulho bom, o vosso impulso como o de um motor limpo e ágil, o vosso modo original de viver e anunciar a alegria de Jesus Ressuscitado!”

Compartilhar com Cristo as alegrias e os sofrimentos

Em sua mensagem, o Papa parte do querigma, a proclamação da salvação que é o fundamento da esperança para toda a humanidade: “Cristo vive e ama-te infinitamente. E o seu amor por ti não está condicionado pelas tuas quedas ou pelos teus erros. Ele que deu a sua vida por ti, não espera pela tua perfeição para te amar”.

"Olha os seus braços abertos na cruz e «deixa-te salvar sempre de novo», caminha com Ele como com um amigo, acolhe-O na tua vida e deixa-O compartilhar as alegrias e as esperanças, os sofrimentos e as angústias da tua juventude. Verás que o teu caminho se iluminará e até os fardos maiores se hão de tornar menos pesados, porque estará Ele a carregá-los contigo."

"Fazei-vos ouvir!"

O desejo do Pontífice é que todos percebam este anúncio como "vivo e verdadeiro" em suas próprias vidas e sintam o impulso de compartilhá-lo com seus amigos. "Sim, porque vocês têm esta grande missão: testemunhar a todos a alegria que vem da amizade com Cristo", enfatiza Francisco.

O Papa então recorda o seu primeiro contato, logo que foi eleito, com jovens de todo o mundo durante a JMJ no Rio de Janeiro, em 2013:

"Ao início do meu Pontificado, durante a JMJ do Rio de Janeiro, disse-vos alto e bom som: fazei-vos ouvir! “Hagan lio!”. E o mesmo continuo a pedir-vos hoje: fazei-vos ouvir, gritai, não tanto com a voz mas sobretudo com a vida e o coração, esta verdade: Cristo vive! Para que toda a Igreja seja impelida a levantar-se e pôr-se incessantemente a caminho a fim de levar a sua Boa Nova a todo o mundo."

Artesãos do futuro

O Papa Francisco também lembra que no próximo dia 14 de abril será o 40º aniversário do primeiro grande encontro de jovens em 1984, por ocasião do Ano Santo da Redenção. Foi o "desdobramento" das futuras Jornadas Mundiais da Juventude e, no final daquele ano jubilar, João Paulo II entregou uma Cruz aos jovens com "a missão de levá-la ao mundo inteiro como sinal e lembrança de que somente em Jesus morto e ressuscitado há salvação e redenção".

"Contemplai Jesus assim: vivo e transbordante de alegria, vencedor da morte, um amigo que vos ama e quer viver em vós. Só assim, à luz da sua presença, é que será fecunda a memória do passado e tereis a coragem de viver o presente e enfrentar o futuro com esperança. Podereis livremente assumir a história das vossas famílias, dos vossos avós, dos vossos pais, das tradições religiosas dos vossos países, para serdes, por vossa vez, construtores do amanhã, “artesãos” do futuro."

Sinodalidade, fruto do contato com os jovens

Ao refletir especificamente sobre a exortação "Christus Vivit", que retrata a imagem de uma Igreja que quer caminhar junto e, portanto, escuta, dialoga e discerne constantemente a vontade do Senhor, Francisco recorda que há mais de cinco anos, muitos jovens de várias partes do mundo foram convidados a compartilhar suas expectativas e desejos em vista do Sínodo sobre os Jovens.

"Centenas de jovens vieram a Roma e trabalharam juntos durante alguns dias, recolhendo as ideias a propor: graças ao seu trabalho, os Bispos puderam conhecer e aprofundar uma visão mais ampla do mundo e da Igreja. Foi um verdadeiro “experimento sinodal”, que produziu muitos frutos e preparou a estrada também para um outro Sínodo, aquele que estamos vivendo nos últimos anos, precisamente sobre a sinodalidade."

Na conclusão da mensagem, o Papa se dirige diretamente aos jovens expressando sua gratidão: “Queridos jovens, vós sois a esperança viva de uma Igreja em caminho! Por isso agradeço a vossa presença e contribuição para a vida do Corpo de Cristo”.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

domingo, 24 de março de 2024

A alegria no seguimento de Cristo

Cristianismo sem seguir a Cristo não existe (diocesecg)

A ALEGRIA NO SEGUIMENTO DE CRISTO

Dom João Santos Cardoso 
Arcebispo de Natal (RN)

Frequentemente, enfatizamos apenas o aspecto da cruz, da renúncia, do sacrifício e doação de si no seguimento a Nosso Senhor Jesus Cristo. É verdade que Jesus não enganou seus discípulos a respeito das consequências do seguimento e, claramente, afirmou: “Se alguém quer vir após mim, negue a si mesmo, dia a dia tome a sua cruz e siga-me” (Lc 9, 23). Entretanto, o discipulado cristão não implica apenas o aspecto da cruz, mas também a alegria de estar com Jesus e de comunicá-la aos outros, pois, como afirma o Documento de Aparecida (DA, n. 23), “ser cristão não é uma carga, mas um dom”. 

O Documento de Aparecida recupera a alegria no seguimento de Jesus Cristo. De fato, Jesus não é uma ameaça para o homem, pelo contrário, é condição de sua realização e felicidade. Também o Papa Francisco, na “Evangelii Gaudium” (EG), resgata a importância da alegria no anúncio do Evangelho, propondo uma nova etapa evangelizadora marcada pela alegria (EG 1). Essa alegria, que preenche os corações daqueles que encontram Jesus, é transformadora e nos liberta do pecado, da tristeza, da acídia, do vazio interior e do isolamento. Por isso, o cristão não deve assumir o discipulado como um peso, como um fardo difícil de suportar, mas viver com leveza e suavidade, pois Nosso Senhor nos garante que seu jugo é suave e seu fardo é leve (Mt 11, 30). 

Consequentemente, como diz o Papa Francisco, “um evangelizador não deveria ter constantemente uma cara de funeral” (EG, 10). É preciso recuperar o fervor de espírito e “a suave e reconfortante alegria de evangelizar, mesmo quando for preciso semear com lágrimas! […] E que o mundo do nosso tempo possa receber a Boa Nova dos lábios, não de evangelizadores tristes e descoroçoados, impacientes ou ansiosos, mas sim de ministros do Evangelho cuja vida irradie fervor, pois foram quem recebeu primeiro em si a alegria de Cristo” (EG 10). 

Mas, então, de que se trata essa alegria?  Ela nasce da experiência de sentir-se amado por um Deus, que de fato, nos ama incondicionalmente. Ou ainda como afirma o Documento de Aparecida: “A alegria do discípulo não é um sentimento de bem-estar egoísta, mas uma certeza que brota da fé, que serena o coração e o capacita para anunciar a boa nova do amor de Deus. Conhecer a Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (DA 32). 

A alegria do Evangelho não é um sentimento passageiro ou superficial, mas uma fonte de vida que brota do encontro pessoal com Jesus. É uma alegria que nasce da missão e transcende as circunstâncias externas e se manifesta mesmo nas situações mais difíceis da vida. Como discípulos de Cristo, somos chamados a viver essa alegria em todos os momentos, mesmo quando enfrentamos tribulações e desafios (EG, n. 2-4). 

No entanto, o Papa Francisco reconhece que muitos cristãos estão perdendo essa alegria e caindo na armadilha da acídia, do mundanismo espiritual e das divisões internas na comunidade. A acídia, como a tristeza interior que resulta da recusa dos bens espirituais, pode levar à inação ou a um ativismo desenfreado, impedindo-nos de viver plenamente nossa vocação cristã. O mundanismo espiritual, por sua vez, se disfarça sob uma aparência de religiosidade, mas na verdade busca apenas a própria glória e o bem-estar pessoal (EG 81-84; 94). 

Também, as divisões e ódios entre os cristãos são uma triste realidade que compromete o testemunho, a credibilidade e a missão da Igreja. Em vez de nos unirmos para anunciar o Evangelho, muitas vezes nos encontramos em conflito uns com os outros, alimentando ressentimentos e divisões que enfraquecem a comunidade cristã. “Além disso, alguns deixam de viver uma adesão cordial à Igreja por alimentar um espírito de contenda. Mais do que pertencer à Igreja inteira, com a sua rica diversidade, pertencem a este ou àquele grupo que se sente diferente ou especial” (EG 98). 

Tais desafios nos impelem a cultivar a alegria do Evangelho, mesmo nas situações difíceis, promovendo a reconciliação, o perdão e a comunhão fraterna, resistindo à tentação da inveja, do julgamento e do ódio. É uma alegria missionária que nos convoca a ser testemunhas do amor de Deus, irradiando a luz de Cristo nas trevas do mundo e compartilhando essa alegria com todos que cruzamos em nosso caminho.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

A celebração do Domingo de Ramos na Praça de São Pedro

A procissão que precedeu a missa (Vatican Media)

O Papa presidiu a celebração deste domingo (24), o último antes da Páscoa, na Praça São Pedro. A comemoração da entrada festiva do Senhor em Jerusalém precedeu a missa, cujo trecho do Evangelho narrou a história da sua Paixão. No final da liturgia, Francisco recitou o Angelus.

https://youtu.be/jVyCc2pfd3o

Vatican News

Em uma Praça de São Pedro lotada, cerca de 60 mil fiéis, sob um céu em que os raios de sol se alternavam com as nuvens, a celebração do Domingo de Ramos, presidida pelo Papa Francisco, foi aberta com a comemoração da entrada do Senhor em Jerusalém, da qual se lê o relato do evangelista Marcos, que precedeu a celebração da missa. O Papa abençoou e aspergiu com água benta os ramos de oliveira, o símbolo deste domingo (24), que os presentes seguravam na mão. Em seguida, foi realizada uma procissão com mais de 400 pessoas que levavam os ramos, que se dirigiram do centro da praça para o sagrado. Os cardeais, bispos e sacerdotes concelebrantes tomaram seus lugares ao lado do altar.

A Paixão de Cristo

A mudança de cena foi radical: a Liturgia da Palavra da celebração eucarística incluiu a leitura cantada da Paixão de Jesus, extraída novamente do Evangelho segundo Marcos. Por meio das palavras do evangelista, as passagens do sofrimento de Cristo foram revividas. A reencenação da Paixão foi seguida por um momento de silêncio. Um sofrimento, o de Cristo, que contém as dores de todos os tempos e de toda a humanidade; e a humanidade, com suas fragilidades, foi apresentada ao Senhor na oração universal dos fiéis que concluiu a Liturgia da Palavra. Foram feitas orações pela Igreja, para que "busque sempre a unidade, a reconciliação e a comunhão"; pelos governantes "chamados a cultivar a paz e o bem dos povos"; por todos os homens e mulheres que sofrem; pelos cristãos perseguidos; por toda comunidade cristã, para que "seja testemunha de sua própria fé, na oração e na caridade".

Ao final da celebração, diretamente do sagrado da Basílica, Francisco pronunciou o Angelus, antes de dar a bênção e fazer um amplo percurso em seu papamóvel para saudar os fiéis e peregrinos que o aplaudiam na praça.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

ALEGRIA

Alegria (A12)

ALEGRIA

O povo da Bíblia é um povo alegre: em qualquer circunstância é capaz de encontrar motivos para cantar, tocar música, dançar.

ANTIGO TESTAMENTO

A água  que jorra do poço (Nm 21, 17), a chuva que chega na hora oportuna (Jl 2, 23-24), a riqueza da colheita (Sl 126, 5-7), o primeiro cacho de uva (Is 65, 8), a abundância da vindima (Sl 4, 8), o sabor do vinho (Sl 104, 15; Eclo 31, 27) são ocasiões para cantos que ressoam nas colinas (Sl 65, 10-14), à porta da cidade (Sl 9, 15; 73, 28), nas casas.

Mais abundantes são as canções de amor (Jr 7, 34; 16, 9; 25, 10; 33, 11). São acompanhadas por harpas, cítaras, tamborins, flautas (Is 5, 12) e dança (Jr 31, 13). Exprimem a alegria dos esponsais (Sl 45). Pois a vida conjugal é fonte de alegria (Ecl 8, 15; 9, 9) e a reunião dos membros da família é doce para os participantes (Sl 133, 1).

A Bíblia proclama sobretudo a alegria que brota da celebração cultural (Dt 12, 7.12). Toda festa litúrgica é momento de alegria (Dt 16, 11.14). A reunião das tribos (Sl 122, 4), a presença do Senhor no santuário, no meio do seu povo (Sf 3, 14-18), a celebração do Nome do Senhor (Sl 89, 16) despertam a alegria dos peregrinos (Sl 84; 122; Ne 8, 10).

Quase não há salmo que não seja perpassado de alegria; ou ao menos marcado, nas entrelinhas, por alguma explosão de alegria. Mesmo as súplicas, até as mais patéticas, suscitadas pelas situações mais dolorosas, terminam em uma espécie de antecipação da alegria que Deus vai dar a seu povo (Sl 79, 13; 22, 23-32).

O culto exprime, em cantos, música (Sl 150) e dança (Sl 68, 26; 87, 7), alegria que o povo já possui; é a mesma alegria que há de vir e será certamente outorgada por Deus.

Pois a alegria é característica da era messiânica; alegria abundante (Is 9, 2), universal (Is 35, 1; 44, 23; 49, 13); alegria da liberdade recuperada (Is 35, 9-10; 51, 11) na Jerusalém-cidade-da-alegria (Is 65, 14-19; 66, 10; Br 4, 22-37).

NOVO TESTAMENTO

O nascimento de Jesus significa a irrupção da alegria. Lucas sublinhou este aspecto dos tempos messiânicos (1, 24.41.44; 2, 10.13.14). Jesus, cujo Dia alegrava os Patriarcas (Jo 8, 56), é o Esposo que traz a alegria (Jo 3, 29; Mc 3, 19-20). É a graça concedida aos pecadores (Lc 4, 19), cuja conversão enche o céu de alegria (Lc 17, 7.10.32).

Seus discípulos devem alegrar-se (Lc 10, 20). Até a perseguição é fonte de alegria, pois garante uma “grande recompensa” (Mt 5, 12). Aparentemente oposta à felicidade, a cruz é fonte de alegria. Os Apóstolos devem alegrar-se com a partida de Jesus (Jo 14, 28; 16, 5-7). Sua tristeza se converterá em alegria (Jo 16, 19-22) Se a Ressurreição os deixa desconcertados (Lc 24, 41), a Ascensão lhes restitui a alegria (Lc 24, 52), de tal sorte que chegam a se alegrar por sofrer por seu Senhor (At 5, 41).

A pregação da Boa-Nova é acolhida com alegria (At 13, 52), a vista dos sinais de sua eficácia provoca o mesmo sentimento (At 8, 8). E até na prisão Paulo e Silas cantam cheios de alegria (At 16, 25)

Em suas cartas, Paulo associa sofrimento e alegria (2Cor 7, 4; Fl ; Cl 1, 11.24). Tão surpreendente alegria não pode ser reação humana; é fruto do Espírito Santo; decorre da esperança (1Ts 1, 6; Gl 5, 22; Rm 12, 12; 14, 17;15, 13).

A alegria escatológica, anunciada e esperada pelo Antigo Testamento, e cuja realização se inaugura em Jesus, será plenamente dada aos homens, no fim dos tempos. Depois das provações suportadas pelos discípulos de Jesus, todos encontrarão a alegria. O Apocalipse anuncia esta alegria definitiva pelos alegres aleluias que ressoam ao longo de todo o seu texto. Essa alegria se inaugura com o triunfo do Cordeiro (Ap 19, 1-8).

Fonte: Dicionário Bíblico Universal 1997 - Pág. 17 - Ed. Aparecida-SP/Ed. Vozes, Petrópolis-RJ - (L. Monloubou/F. M. Du Buit).

Reflexão para o Domingo de Ramos (B)

Evangelho do domingo (c. BAT Vat . lat. 39, f. 67v)

Do mesmo modo que os discípulos, também nós queremos seguir Jesus, por amor. Mas como esse seguimento está sendo feito?

Padre Cesar Augusto, SJ - Vatican News

“Meu Deus, por que me abandonastes?”

A paixão segundo Marcos é a mais antiga das quatro e, certamente um dos textos evangélicos mais antigos. Ela tem como ideia central o silêncio de Jesus e sua absoluta confiança no Pai.

 

Quando Judas o beijou, Jesus não reagiu, como também não o fez em relação às demais agressões sofridas na Paixão e nem ao aparente silêncio do Pai.

Aqueles que desejam seguir Jesus deverão abandonar tudo, até a própria vida. Tudo em favor da vontade do Pai e de seu Reino. É necessário, como o Mestre estar só, vivenciar a solidão.

Do mesmo modo que os discípulos, também nós queremos seguir Jesus, por amor. Mas como esse seguimento está sendo feito? Através do seguimento de ideias cristãs, de sua ética ou através do seguimento da pessoa de Jesus?

O batismo nos proporcionou esse seguimento, mas no transcorrer de nossa vida, de nosso dia a dia: abandonamos nossa vida, nossas primeiras opções, e nos deixamos às mãos do Pai, como Jesus e como Santa Terezinha do Menino Jesus gostava de fazer? E se somos submetidos às provações, qual é ou qual será nossa reação?

O abandono de Jesus e o sentir-se abandonado pelo Pai foi ultra forte; ele clamou: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?” E isso na hora da morte em que lutava pela justiça, pelos interesses do Pai!

Qual a reação de Jesus? Ele chorou, pediu conforto ao Pai e que o consolasse. Marcos apresenta um Jesus fraco e que experimentou quão é exigente e difícil obedecer ao Pai.

Por que Jesus não discutiu? Ele sabia que a sentença já estava decidida. Por isso seu silêncio não demonstra covardia e sim, superioridade, não se perturbando com a calúnia, não se colocando no mesmo nível de seus acusadores, mas confiando na vitória final da verdade. Jesus não temeu a derrota, mas confiou plenamente no Pai.

A entrega de Jesus ao Pai já começou a dar frutos no próprio ato. Um pagão, o centurião romano fez sua profissão de fé imediatamente à morte de Jesus: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus”. Ele respondeu às perguntas que eram feitas no início do evangelho. Somente após a morte e ressurreição é que se pode compreender quem é Jesus. O que fez o centurião crer, um pagão crer, foi a entrega de Jesus, por amor, até a morte e morte na cruz. O amor rasgou o véu do templo e, desse momento em diante, todos os homens poderão ser feitos filhos de Deus.  Tudo dependerá da fé em Jesus, da crença nele, da qual o centurião, segundo Marcos, foi o primeiro. Jesus compartilhou conosco as experiências dramáticas da vida!

Queridos ouvintes, entramos na Semana Santa, onde aprofundaremos nosso conhecimento no amor de Cristo por nós e, consequentemente seremos agraciados com mais amor. Que possamos chegar à Páscoa da Ressurreição mais assemelhados ao Cristo obediente!

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Quinta Pregação da Quaresma do cardeal Cantalamessa (I)

5ª Pregação da Quaresma - Cardeal Cantalamessa (Vatican News)

Quinta Pregação da Quaresma do cardeal Cantalamessa

Que, nesta Páscoa, o Senhor ressuscitado faça, ele mesmo, ressoar em nosso coração algum daqueles seus divinos “Eu Sou”, sobre os quais meditamos nesta Quaresma! Principalmente aquele que proclama a sua vitória pascal: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que tenha morrido, ainda que tenha morrido, viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá".

Fr. Raniero Card. Cantalamessa, OFMCap
“EU SOU O CAMINHO, A VERDADE E A VIDA”
Quinta Pregação da Quaresma de 2024

Em nosso itinerário em meio ao Quarto Evangelho, à descoberta de quem é Jesus para nós, chegamos à última etapa. Entramos naqueles que se costuma definir “os discursos de adeus” de Jesus e aos seus apóstolos. Desta vez, não tento nem mesmo fazer um resumo do contexto e trazer à luz as diversas unidades e subdivisões. Seria como querer traçar quadros e distinguir setores em uma lava fundida que desce da cratera. Por isso, vamos diretamente à palavra que queremos captar nesta meditação:

“Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se não fosse assim, eu vos teria dito, porque vou preparar-vos um lugar. E depois que eu tiver ido preparar-vos um lugar, voltarei e vos levarei comigo, a fim de que, onde eu estiver, estejais vós também. E para onde eu vou, sabeis o caminho”. Tomé disse: “Senhor, não sabemos para onde vais. Como podemos saber o caminho?”. Jesus respondeu: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vai ao Pai senão por mim” (Jo 14,2-6).

“Eu sou o caminho, a verdade e a vida”: palavras que apenas uma pessoa no mundo poderia pronunciar e pronunciou de fato. Cristo é o caminho e é a meta da viagem. Como Verbo eterno do Pai, é a verdade e a vida; como Verbo feito carne, é o caminho.

Tivemos ocasião para contemplar Cristo como Vida, comentando a sua palavra “Eu sou o pão da vida”, como Verdade comentando outra sua palavra “Eu sou a luz do mundo”. Concentremo-nos, por isso, em Cristo Caminho. Após ter contemplado Cristo como dom, temos a ocasião para contemplá-lo como modelo. “Como – escreve Kierkegaard – a Idade Média se desviara sempre mais ao acentuar o lado de Cristo como modelo, Lutero acentuou o outro lado, afirmando que ele é dom e que este dom, compete à fé aceita-lo”. Mas agora – acrescentava o mesmo autor – deve-se insistir também em Cristo modelo, se não quisermos que a doutrina sobre a fé se resuma a uma folha de figo que cubra as omissões mais anticristãs[1].

Jesus continua a dizer àqueles que encontra – isto é, a nós, neste momento – o que dizia aos apóstolos e àqueles que encontrava durante a sua vida terrena: “Vinde após mim”, ou mesmo ao simples “Segue-me!”. O seguimento (em grego, acolouthia) de Cristo, é um tema ilimitado. Sobre ele, foi escrito o livro mais amado e mais lido na Igreja, após a Bíblia, ou seja, a Imitação de Cristo. Limita-nos em dizer sobre ele o tanto que nos serve para passar a algumas aplicações práticas, sempre de caráter espiritual e pessoal, como nos determinamos nestas meditações.

O tema do seguimento de Cristo ocupa um lugar relevante no IV Evangelho. Seguir Jesus é quase sinônimo de crer nele. Crer, contudo, é uma atitude da mente e da vontade; a imagem do “caminho” e do “caminhar” evidencia um aspecto importante do crer, que é o “caminhar”, isto é, o dinamismo que deve caracterizar a vida do cristão e a repercussão que a fé deve ter na conduta de vida. O seguimento – ao contrário da fé e do amor – não indica apenas uma atitude particular da mente e do coração, mas delineia ao discípulo um programa de vida que implica um compartilhamento total: do modo de viver, do destino e da missão do Senhor.

*    *    *

Com a relevância dada ao episódio da lavagem dos pés, João quis sublinhar um âmbito particular e prioritário do seguimento de Cristo, o do serviço (Jo 13,12-15). Mas não falarei do serviço. A este tema, dediquei a última pregação da Quaresma passada, e não é o caso de me repetir. Também porque creio ser o menos qualificado para falar de serviço, tendo exercido, em minha vida, quase que apenas “o serviço da Palavra” que, por mais importante que seja, é também relativamente fácil e mais gratificante do que muitos outros serviços na Igreja.

Gostaria mais de falar do que caracteriza o seguimento de Cristo e o distingue de todo outro tipo de seguimento. De um artista, de um filósofo, de um letrado, diz-se que se formou na escola deste ou daquele renomado mestre. Também de nós, religiosos, diz-se que nos formamos na escola, de Bento, de Domingos, de Francisco, de Inácio de Loyola e de outros homens ou mulheres. Mas, entre este seguimento e o de Cristo há uma diferença essencial. Ela é expressa, como melhor não se poderia fazer, pelas palavras do próprio João, no final do Prólogo do seu Evangelho: “A Lei foi dada por meio de Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo (Jo 1,17).

Para nós, religiosos, isto significa: a regra nos foi dada por meio do nosso Fundador ou Fundadora, mas a graça e a força para colocá-la em prática só nos vêm de Jesus Cristo. Para nós e para todos os cristãos, do mesmo modo, esta palavra significa também uma outra coisa, ainda mais radical: o Evangelho nos foi dado pelo Jesus terreno, mas a capacidade de observá-lo e pô-lo em prática só nos vem de Cristo ressuscitado, mediante o seu Espírito!

A respeito, Santo Tomás de Aquino escreveu palavras que, nos lábios de um doutor menos fidedigno do que ele, deixar-nos-iam perplexos. Comentando a frase paulina “a letra mata, mas o Espírito faz viver” (2Cor 3,6), ele escreve: “Por letra, entende-se toda lei escrita que permanece fora do homem, mesmo os preceitos morais contidos no Evangelho; por isso, também a letra do Evangelho mataria, se não fosse acrescentada a graça da fé que cura”[2].E pouco antes disse explicitamente que “a graça que nos cura” não é outra coisa senão “a mesma graça do Espírito Santo que dada aos crentes”[3]. Entendera-o por experiência pessoal Santo Agostinho e, por isso, inventou aquela sua extraordinária oração: “Senhor, tu me ordenas ser casto. Pois bem, dá-me o que me ordenas e de pois ordena-me o que quiseres”[4].

Eis porque boa parte dos discursos de Jesus na última ceia tem por assunto o Espírito Paráclito que ele enviaria sobre os apóstolos. Recordemos algumas das promessas a respeito:

Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não sois capazes de suportá-las agora. Quando ele vier, o Espírito da Verdade, então ele vos guiará a toda a verdade. Ele não falará de si mesmo, mas dirá tudo quanto tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir. Ele me glorificará, porque receberá do que é meu, para vo-lo anunciar (16,12-14).

Se Jesus é “o Caminho” (em grego, odòs), o Espírito Santo é “o Guia” (em grego, odegòs, ou odegìa). Assim já o definia São Gregório de Nissa[5], e assim o invoca a Igreja Latina no Veni Creator. Os dois versículos “Ductore sic te praevio – vitemus omne noxium”, de fato significam, “assim guiados (ductor) por Vós evitaremos todo mal”.

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Entre as várias funções que Jesus atribui ao Paráclito nesta sua obra em nosso favor, aquela sobre a qual queremos nos deter é a de Sugeridor: “Ora, o Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, ele vos recordará tudo o que eu vos tenho dito” (14,26). “Ele vos recordará”: a Vulgata Latina traduzia com ipse suggeret vobis: ele vos sugerirá.

O sugeridor, no teatro, está escondido dentro de uma cavidade e está invisível ao público: justamente como o Espírito Santo que ilumina tudo, permanecendo ele invisível e, por assim dizer, nos bastidores. O sugeridor pronuncia as palavras em voz baixa para não ser ouvido pelo público, e também o Espírito fala “em baixa voz”, suavemente. Contudo, diferente dos sugeridores humanos, ele não fala aos ouvidos, mas ao coração; não sugere mecanicamente as palavras do Evangelho, como de um roteiro, mas as explica, adapta, aplica às situações.

Estamos falando, naturalmente, das “inspirações do Espírito”, as chamadas “boas inspirações”. A fidelidade às inspirações é o caminho mais breve e seguro à santidade. Não sabemos em princípio qual é concretamente a santidade que Deus quer de cada um de nós; só Deus a conhece e no-la desvela à medida que o caminho prossegue. Não basta, por isso, ter um programa de perfeição bem claro, para assim realizá-lo progressivamente. Não há um modelo de perfeição idêntico para todos. Deus não faz os santos em série, não ama a clonagem. Cada santo é uma invenção inédita do Espírito. Deus pode pedir a alguém o contrário do que pede a outro. A consequência, daí, é que para alcançar a santidade, o homem não pode se limitar em seguir regras gerais que valem para todos. Deve também entender o que Deus lhe pede, e somente a ele.

Ora, o que Deus quer de diverso e particular de cada um, descobre-se mediante os acontecimentos da vida, a palavra da Escritura, a guia do diretor espiritual, mas o meio principal e ordinário são as inspirações da graça. Estas são solicitações interiores do Espírito no profundo do coração, perlas quais Deus não só dá a conhecer o que deseja de nós, mas dá a força necessária e, frequentemente, também a alegria para cumpri-lo, se a pessoa consentir.

Pensemos no que teria acontecido se Madre Teresa de Calcutá se obstinasse em observar as regras canônicas então vigentes nos institutos religiosos. Até a idade de 36 anos, ela era uma irmã de uma congregação religiosa, certamente fiel à sua vocação e dedicada ao seu trabalho, mas nada que fizesse prever nela algo de extraordinário. Foi durante uma viagem de trem de Calcutá a Darjeeling para seu retiro espiritual anual que aconteceu o fato que mudou a sua vida. O Espírito Santo lhe “sussurrou” ao ouvido do coração um claro convite: deixa a tua ordem, a tua vida precedente, e põe-te à minha disposição para uma obra que te indicarei. Entre as filhas de Madre Teresa, este dia – 10 de setembro de 1946 – é recordado com o nome de “Dia da Inspiração”.

Quando se trata de decisões de importância para nós mesmos ou para outros, a inspiração deve ser submetida e confirmada pela autoridade, ou pelo próprio padre espiritual. Assim fez, de fato, Madre Teresa. Nós nos expomos ao perigo se nos confiarmos unicamente à nossa própria inspiração pessoal.

As boas inspirações têm algo em comum com a inspiração bíblica, à parte, naturalmente, a autoridade e o alcance que são essencialmente diversos. “Deus disse a Abraão...”, “O Senhor falou a Moisés”: este falar do Senhor não era, do ponto de vista da fenomenologia, algo de diverso do que aconteceu nas inspirações da graça. A voz de Deus, também no Sinai, não ressoava ao exterior, mas dentro do coração sob forma de clareza, de impulsos, originados pelo Espírito Santo. Os dez mandamentos não foram inscritos pelo dedo de Deus em tábuas de pedra (é-nos difícil até de imaginá-lo!), mas no coração de Moisés, que depois inscreveu em tábuas de pedra. “Foi sob o impulso do Espírito Santo que alguns falaram da parte de Deus (2Pd 1,21); eram eles a falar, mas movidos pelo Espírito Santo; repetiam com a boca o que escutavam no coração. Deus, diz o profeta Jeremias, grava a sua lei nos corações (Jr 31,33).

Toda fidelidade a uma inspiração é recompensada por inspirações sempre mais frequentes e mais fortes. É como se a alma se exercitasse para chegar a uma percepção sempre mais clara da vontade de Deus e a uma maior facilidade ao cumpri-la.

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Tradução Fr. Ricardo Farias, OFMCap

[1] Cf. Diário, X 1 A 154.
[2] Cf. Tomás de Aquino, Summa theologiae, I-IIae, q. 106, a. 2.
[3] Cf. Ibid., q. 106, a. 1; cf. Agostinho, De Spiritu et littera, 21, 36.
[4] Cf. Agostinho, Confissões, X, 29.
[5] Cf. Gregório de Nissa, De fide (PG, 45, 141C).

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt.html

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF