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domingo, 16 de junho de 2024

Inteligência artificial: 3 pontos inegociáveis ​​do Papa Francisco

Fundo de fotografia R | Obturador
Camille Dalmas – publicado em 14/06/24

No dia 14 de junho, o Papa Francisco participou numa sessão do G7 dedicada à Inteligência Artificial, tema sobre o qual o Pontífice tem falado muito nos últimos meses. Aqui estão as principais recomendações do Papa.

1DESMISTIFICAR A IA

Para o Papa, “o próprio uso da palavra ‘inteligência’ é enganoso”, como afirma na sua última mensagem para o Dia das Comunicações Sociais.

“É verdade que as máquinas têm uma capacidade incomensuravelmente maior do que os humanos para memorizar dados e relacioná-los entre si, mas só cabe aos humanos decifrar o seu significado”, insiste.

Por isso, exorta a “despertar o homem da hipnose em que cai em consequência do seu delírio de omnipotência, acreditando ser um sujeito totalmente autónomo e autorreferencial, separado de todos os laços sociais e alheio à sua condição de uma criatura."

Na sua mensagem pela paz de 2024, o Pontífice também sublinhou os limites destas novas tecnologias: “nem tudo pode ser previsto, nem tudo pode ser calculado”. E acrescentou que “a representação da realidade em megadados, por mais funcional que seja para a gestão das máquinas, implica uma perda substancial da verdade das coisas”.

2PROTEJA A INTELIGÊNCIA HUMANA

Embora o Papa rejeite qualquer postura tecnofóbica, considerando que as novas tecnologias, incluindo a Inteligência Artificial, têm a capacidade de melhorar muito a vida das pessoas, lamenta que “os dados recolhidos até agora pareçam indicar que as tecnologias digitais contribuíram para aumentar as desigualdades no mundo”.

Por exemplo, mostrou-se muito preocupado com a utilização da Inteligência Artificial no domínio militar – por exemplo com a utilização de robôs assassinos – ou no domínio da informação, alertando para erros graves e possíveis manipulações. Ele também apontou o dedo para as formas de discriminação e até mesmo de “controle social” derivadas do uso massivo de IA em “processos automáticos que categorizam indivíduos”. Ele manifestou preocupação, por exemplo, com o facto de esta tecnologia poder determinar se uma pessoa tem ou não direito a um empréstimo bancário.

Noutra área, o Pontífice alertou para a rápida destruição de empregos devido às aplicações industriais da Inteligência Artificial, sinal de uma sociedade em que as desigualdades estão a agravar-se. Fundamentalmente oposto a estes excessos, fruto de uma visão anónima da tecnologia, defende uma IA capaz de atribuir a “cada ser humano o papel de sujeito”. E quando foi convidado para falar sobre IA na cimeira do G7, disse aos padres que queria fazer esta pergunta aos chefes de Estado: “Como está a sua inteligência natural?”

3LEGISLAR

O Papa Francisco saudou os recentes esforços de algumas organizações internacionais para regular estas tecnologias “para que promovam o verdadeiro progresso, isto é, para que contribuam para um mundo melhor e para uma qualidade de vida totalmente superior”.

Ele enfatizou a necessidade de chegar a um acordo universalmente vinculativo. Reconhecendo que “não será fácil chegar a um acordo nestas áreas”, pediu à Santa Sé que preparasse uma carta ética que servisse para estabelecer princípios essenciais, que deu origem em 2020 ao Apelo de Roma à Ética da Inteligência Artificial. , assinado pelos gigantes digitais IBM, Microsoft (acionista da OpenAI, nota do editor) e Cisco. Este texto apela à criação de sistemas transparentes, imparciais, inclusivos e fiáveis, à proteção da privacidade dos utilizadores e à necessidade de os criadores de IA assumirem as suas responsabilidades.

Fonte: https://es.aleteia.org/

O Papa: Deus cuida de nós com a confiança de um Pai, e espera de nós boas obras

Audiência Geral de 16 de junho de 2024 com o Papa Francisco (Vatican News)

O Senhor coloca em nós as sementes de sua Palavra e de sua graça, sementes boas e abundantes, e depois, sem nunca deixar de nos acompanhar, espera pacientemente. Ele continua a cuidar de nós, com a confiança de um Pai, mas nos dá tempo, para que as sementes se abram, cresçam e se desenvolvam para dar frutos de boas obras: disse Francisco na oração mariana do Angelus deste XI Domingo do Tempo Comum.

Raimundo de Lima – Vatican News

Saber esperar com confiança! Foi a exortação do Santo Padre na alocução que precedeu a oração do Angelus ao meio-dia deste domingo (16/06), com milhares de fiéis e peregrinos reunidos na Praça São Pedro.

Francisco deteve-se sobre o Evangelho deste XI Domingo do Tempo Comum, que nos fala do Reino de Deus por meio da imagem da semente, usada várias vezes por Jesus e nos convida a refletir particularmente sobre uma atitude importante – destacou o Pontífice: a espera confiante.

Saber esperar com confiança

De fato, na semeadura, por mais que o agricultor espalhe ótima e abundante semente, e por melhor que prepare o solo, as plantas não brotam imediatamente: leva tempo! Por isso, é necessário que, após a semeadura, ele saiba esperar com confiança, para permitir que as sementes se abram no momento certo e os brotos brotem do solo e cresçam, fortes o suficiente para garantir, no final, uma colheita abundante.

Sob a terra, o milagre já está acontecendo, há um grande desenvolvimento, mas é invisível, é preciso paciência e, enquanto isso, é necessário continuar cuidando dos torrões, regando-os e mantendo-os limpos, apesar do fato de que, na superfície, nada parece estar acontecendo, ressaltou o Papa, explicando que o Reino de Deus também é assim.

O Senhor quer que todos nós possamos crescer

O Senhor coloca em nós as sementes de sua Palavra e de sua graça, sementes boas e abundantes, e depois, sem nunca deixar de nos acompanhar, espera pacientemente. Ele continua a cuidar de nós, com a confiança de um Pai, mas nos dá tempo, para que as sementes se abram, cresçam e se desenvolvam para dar frutos de boas obras. E isso porque não quer que nada se perca em seu campo, que tudo atinja a plena maturidade; quer que todos nós possamos crescer como espigas cheias de grãos.

Francisco observou que ao fazer isso, o Senhor nos dá um exemplo: também nos ensina a semear com confiança o Evangelho onde quer que estejamos e depois esperar que a semente lançada cresça e dê frutos em nós e nos outros, sem desanimar e sem deixar de apoiar e ajudar uns aos outros, mesmo quando, apesar de nossos esforços, nos parece não ver resultados imediatos. “Na verdade - prosseguiu o Pontífice -, muitas vezes, mesmo entre nós, além das aparências, o milagre já está em andamento e, no devido tempo, produzirá frutos abundantes”!

Sejamos semeadores generosos e confiantes do Evangelho

Concluindo, o Santo Padre propôs algumas interpelações para nossa reflexão pessoal:

Deixo semear em mim a Palavra? Semeio com confiança a Palavra de Deus nos ambientes em que vivo? Sou paciente na espera ou fico desanimado porque não vejo os resultados imediatamente? E sou capaz de confiar tudo serenamente ao Senhor, enquanto faço o melhor que posso para proclamar o Evangelho?”

Por fim, confiou à Virgem Maria, que acolheu e fez crescer dentro de si a semente da Palavra, que nos ajude a sermos semeadores generosos e confiantes do Evangelho.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

A devoção da Igreja Ambrosiana

Santo Ambrósio (Canção Nova)

Arquivo 30Dias 06/07 - 2010

História do Prego Sagrado

A devoção da Igreja Ambrosiana

por Lorenzo Bianchi

O documento histórico mais antigo que se refere com absoluta certeza à relíquia do Santo Prego hoje conservada na Catedral de Milão data de 18 de janeiro de 1389. Nesse ano, o Registro do Tribunal Provisório, órgão administrativo máximo da cidade, anotou um pedido feito pelo tenente do vigário provisório Paolo de Arzonibus a Giangaleazzo Visconti para promulgar as festividades da Madonna della Neve e de San Gallo, estabelece que nestas festividades o Município fará generosas ofertas, destinadas sobretudo à igreja de Santa Tecla, por ser a Catedral subterrânea, e porque um dos pregos com que o Salvador foi crucificado ali está colocado ab antiquo . Por quanto tempo, o Register não diz. Mas se recuarmos quase mil anos, até 25 de Fevereiro de 395, é novamente em Milão que encontramos o primeiro testemunho sobre a descoberta dos pregos da Cruz do Senhor. É Santo Ambrósio quem fala disso longamente, detalhadamente, diante da corte e dos soldados reunidos para o funeral do imperador Teodósio em Milão que, durante cerca de trinta anos, se tornou a capital ocidental do Império. Segundo a história de Ambrósio ( De obitu Theodosii 41-48), Helena, mãe de Constantino, nos últimos anos do império de seu filho, entre 333 e 337, também havia encontrado os pregos da crucificação junto com a Verdadeira Cruz. Com um deles, ainda segundo a história de Ambrósio, mandou forjar o freio do cavalo do imperador, para dar um presente ao filho e garantir sua proteção inter proelia , enquanto inseriu outro no diadema imperial. Na opinião de Marta Sordi (ver M. Sordi, A tradição da inventio Crucis em Ambrogio e em Rufino , em Rivista di Storia della Chiesa in Italia , 46, 1990, pp. 1-8), a insistência de Ambrósio nos pregos não é acidental, estando ligado a uma ocasião muito específica e ao local onde foram pronunciadas as suas palavras: «O seu é um discurso oficial», escreve o estudioso, «proferido perante a corte de Milão e os soldados, e ele está a falar de uma coroa real , aquele que Teodósio usara e do qual pode dar uma descrição precisa, um diadema adornado de pedras preciosas, com um círculo de ferro mais precioso que qualquer pedra preciosa, porque provém da cruz da redenção divina: uma coroa-diadema, ancestral de a famosa coroa de "ferro", que na verdade é uma coroa de ouro, composta por seis peças unidas por dobradiças e decoradas com pedras preciosas, tendo no seu interior um círculo de ferro, tradicionalmente considerado um dos pregos da cruz." Portanto, Ambrose está descrevendo objetos reais, que ele vê e conhece.

É plausível que a presença dos pregos da Cruz em Milão remonte à segunda metade do século IV e ao desejo de Valentiniano I de "consagrar" a nova capital que escolheu em 364 para o Ocidente como um Cidade cristã, como já havia acontecido com Constantinopla. «A tradição Constantinopolitana», escreve novamente Sordi, «colocou entre os ritos de fundação da cidade por Constantino a inserção de fragmentos da cruz na estátua colocada na coluna de pórfiro do fórum da cidade, de modo a garantir a sua proteção, como narra o historiador Sócrates do século IV." Valentiniano pode ter feito o mesmo, mandando trazer os pregos da Cruz para Milão, para reafirmar o caráter cristão renovado e definitivo do Império, ainda mais depois do breve reinado de Juliano, o Apóstata (361-363).

Se o outro prego, usado, segundo a história de Ambrósio, para forjar o freio do cavalo de Constantino, deve ser identificado com o Prego Sagrado hoje guardado em Milão, não é possível dizer com certeza, precisamente porque não existem fontes que datam do final do século IV ao final do século XIV. Mas a partir de então a veneração da preciosa relíquia não conheceu interrupção.

Foi em 1461 que o Prego Santo foi solenemente transferido de Santa Tecla, destinado à demolição, para a Sé Catedral, e colocado no alto, a poucos metros do topo da abside, segundo a tradição ambrosiana de colocar o crucifixo no frontão do arco triunfal da igreja.

Durante a peste de 1576, São Carlos Borromeu transportou pessoalmente o Prego Sagrado em procissão desde a Catedral até São Celso, deixando-o exposto no altar para a celebração do Quarantore, com o objetivo de implorar o fim do flagelo que atingiu Milão. San Carlo mandou construir uma cruz de madeira especialmente para transportar o Santo Prego em procissão, cruz que hoje se encontra na igreja paroquial dos Santos Gervásio e Protásio em Trezzo d'Adda.

San Carlo atribuiu a atenuação da epidemia ao Prego Santo, que ocorreu imediatamente após a procissão. Desde então estabeleceu que a cerimónia solene se repetisse todos os anos no dia 3 de maio, festa da Invenção da Santa Cruz.

Nem mesmo a Revolução Francesa impediu a prática, que ainda hoje envolve a evocativa subida da máquina chamada Nivola , que, puxada por cordas, permite chegar ao Santo Chiodo a quarenta metros acima do nível do mar. O rito de tomada e exibição do Prego Santo foi suspenso apenas entre 1969 e 1982, na sequência do surgimento de instabilidade na situação estática dos pilares da lanterna e das consequentes obras de restauro.

Depois de terem sido tomadas medidas para recuperar o Prego Santo com meios improvisados ​​em 1982, no ano seguinte recomeçou a sua exposição na Sé Catedral por ocasião da festa da Exaltação da Santa Cruz que se celebra a 14 de Setembro (tendo entretanto sido abolida a celebração de 3 de maio).

 O Cardeal Martini, por ocasião do Ano Santo da Redenção, quis que o Prego Santo e a cruz construída por São Carlos fossem novamente reunidos para serem transportados em procissão. Procissão que o próprio cardeal conduziu pelas ruas de Milão na Sexta-feira Santa de 1984, segurando pessoalmente a cruz com o Prego Santo. Desde 1986, concluídas as obras de restauro, o Santo Chiodo foi novamente colocado na sua posição original.

 Fonte: https://www.30giorni.it/

Reflexão para o XI Domingo do Tempo Comum (B)

Evangelho do domingo (BAV, Vat.lat39, f 67v) | Vatican News

O Evangelho de Marcos nos recorda a verdade de que a semente cresce sozinha, no silêncio e no escondimento e vira uma grande árvore. Também a Palavra de Deus semeada em nossa vida cresce silenciosamente.

Padre Cesar Augusto, SJ - Vatican News

Existe uma imagem muito bonita que compara a Igreja a uma grande árvore, alta e copada. Em seus galhos se aninham todo tipo de pássaro, pois nela se sentem seguros.

A liturgia deste domingo explora essa imagem, começando por Ezequiel profetizando sobre um cedro que terá seu broto mais alto transplantado para uma alta montanha e se tornará uma árvore majestosa. No Evangelho, Marcos nos fala da mostarda como a maior das hortaliças e originada pela menor das sementes.

A profecia de Ezequiel quer amenizar a dor do povo, após uma gravíssima derrota em que o rei foi deportado, dizendo que o Senhor suscitará um herdeiro no estrangeiro que irá restaurar a monarquia em Israel com grandiosidade jamais vista. Acontece que os anos passam e essa restauração não acontece logo. Na verdade, nem Ezequiel tinha noção total do que profetizava. Ele falava de Jesus Cristo, a restauração do homem total através de sua ressurreição. Evidentemente, falava também de seu Corpo Místico, falava da Igreja!

O Evangelho de Marcos nos recorda a verdade de que a semente cresce sozinha, no silêncio e no escondimento e vira uma grande árvore. Também a Palavra de Deus semeada em nossa vida cresce silenciosamente e só perceberemos isso com a transformação de uma vida estéril ou mesmo mediana, em uma vida fecunda, plena de frutos que atraem e saciam todos.

Na Parábola, Jesus dá um recado: a semente do Reino cresce por si só. Não importa o tamanho da semente, do que foi semeado, importa a qualidade da semente, se ela aceita morrer e brotar como uma planta nova, proporcionando mais vida.

A Carta de São Paulo aos Coríntios nos ajuda a concluir a reflexão deste domingo. Ele nos fala de quando seremos transplantados para o céu, para morarmos juntos com o Senhor. “Caminhamos na fé e não na visão clara”, lemos em 2Cor 5,7. Enquanto não somos transplantados, deveremos trabalhar para que nossa vida seja bela e propensa a se tornar maravilhosa quando formos morar na glória do Pai.  Naquele momento, poderemos dizer ao Senhor: “Você me deu a vida e, com a Redenção de Seu Filho, com a Sua Graça, pude vivê-la bem, mesmo nos sofrimentos e perseguições, e trazê-la alegremente como sinal de Sua Presença em meu caminhar”.

Assim, uma vida vivida na terra em união a Cristo só poderá ter um desfecho feliz ao ser transplantada para a Vida plena no seio da Trindade.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Santos Julita e Ciro, mártires

Santos Julita e Ciro (Templário de Maria)
16 de junho
Santos Julita e Ciro

Mártires (+304)

Julita vivia na cidade de Icônio, na Licaônia, atualmente Turquia. Ela era uma senhora riquíssima, da alta aristocracia e cristã, que se tornara viúva logo após ter dado à luz um menino. Ele foi batizado com o nome de Ciro, mas também atendia pelo diminutivo Ciríaco ou Quiríaco. Tinha três anos de idade quando o sanguinário imperador Diocleciano começou a perseguir, prender e matar cristãos.

Julita, levando o filhinho Ciro e algumas servidoras, fugiu para a Selêucia e, em seguida, para Tarso, mas ali acabou presa. O governador local, um cruel romano chamado Alexandre, tirou-lhe o filho dos braços e passou a usá-lo como um elemento a mais para sua tortura. Colocou-o sentado sobre seus joelhos, enquanto submetia Julita ao flagelo na frente do menino, com o intuito de que renegasse a fé em Cristo.

Como ela não obedeceu, os castigos aumentaram. Foi então que o pequenino Ciro saltou dos joelhos do governador, começou a chorar e a gritar junto com a mãe: ‘Também sou cristão! Também sou cristão!’ Foi tamanha a ira do governador que ele, com um pontapé, empurrou Ciro violentamente, fazendo-o rolar pelos degraus do tribunal, esmigalhando-lhe, assim, o crânio.

Conta-se que Julita ficou imóvel, não reclamou, nem chorou, apenas rezou para que pudesse seguir seu pequenino Ciro no martírio e encontrá-lo, o mais rápido possível, ao lado de Deus. E foi o que aconteceu. Julita continuou sendo brutalmente espancada e depois foi decapitada. Era o ano 304.

Os corpos foram recolhidos por uma de suas fiéis servidoras e sepultados num túmulo que foi mantido oculto até que as perseguições cessassem. Quando isso aconteceu, poucos anos depois, o bispo de Icônio, Teodoro, resolveu, com a ajuda de testemunhas da época e documentos legítimos, reconstruir fielmente a dramática história de Julita e Ciro. E foi assim, pleno de autenticidade, que este culto chegou aos nossos dias.

Ciro tornou-se o mais jovem mártir do cristianismo, precedido apenas dos santos mártires inocentes, exterminados pelo rei Herodes em Belém. Por isso é considerado o santo padroeiro das crianças que sofrem de maus-tratos. A festa de santa Julita e de são Ciro é celebrada pela Igreja no dia 16 de junho, em todo o mundo católico.

Fonte: https://templariodemaria.com/

sábado, 15 de junho de 2024

O medo nas cidades modernas

Confiança e Medo na Cidade (Zygmunt Bauman)

O MEDO NAS CIDADES MODERNAS

Dom João Santos Cardoso 
Arcebispo de Natal (RS)

Recentemente, em uma reunião com o clero e os fiéis leigos da Arquidiocese de Natal, discutimos sobre a pastoral urbana e a evangelização na cidade. O tema do medo urbano foi recorrente, manifestado em falas que expressavam receio de ir a determinados bairros e realizar atos litúrgicos em certos horários. Esse medo impacta a evangelização, retraindo a audácia pastoral para difundir o evangelho em todas as periferias, comprometendo o mandato de Jesus: “Ide pelo mundo inteiro e pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). 

A cidade fascina e amedronta. Muitos que vivem no interior aspiram morar na cidade grande, e a migração para as regiões metropolitanas é comum, inclusive entre padres que desejam exercer seu ministério na grande cidade. No entanto, o medo afeta a evangelização, levando as pessoas a preferirem o isolamento dos condomínios fechados. Muitos padres também trocam a casa paroquial próxima da matriz pela residência em condomínios fechados, comprometendo a proximidade com suas comunidades, como pede o Papa Francisco: “sede pastores com o cheiro das ovelhas” (Homilia Missa Crismal de 2013). 

Essa situação me faz lembrar do artigo “A cidade como exigência de sociabilidade” na coletânea “Dilemas da Sociabilidade, Pensar a Cidade Hoje”, onde discuto o medo como um desafio para a convivência urbana, com base nas contribuições de Zygmunt Bauman em “Confiança e medo na cidade” (2009). Bauman afirma que a insegurança e o medo comprometem a vida urbana, mesmo sendo as cidades mais seguras do que nas sociedades do passado. Subjetivamente, as pessoas sentem-se ameaçadas e obcecadas por segurança, esvaziando o espaço público e as interações humanas. 

É urgente repensar a noção de espaço público para recuperar a sociabilidade urbana, pois a urbanização é irreversível e a vida nas cidades será o modo predominante de habitar o planeta. Portanto, é necessário que o espaço urbano promova interação humana, encontro com o desconhecido e convivência com a diferença, sem que a insegurança e o medo impeçam essa função. 

Cidades antigas e medievais eram protegidas por muros contra inimigos externos, oferecendo segurança interna. Hoje, o medo e a insegurança deslocaram-se para dentro das cidades. “Hoje, nossas cidades, em vez de constituírem defesas contra o perigo, estão se transformando em perigo” (BAUMAN, 2009, p. 35). O perigo agora está dentro da cidade e a guerra à insegurança foi transferida para o seu interior. 

Urbanistas projetam construções para manter os estranhos distantes, minando a ideia de espaço público em favor do espaço privado e suas ilhas de segurança. A arquitetura do medo, exemplificada por condomínios fechados e sistemas de vigilância, atende ao desejo de segurança dos moradores, mas compromete a essência do espaço público. “A arquitetura do medo e da intimidação espalha-se pelos espaços públicos das cidades, transformando-os em áreas extremamente vigiadas” (BAUMAN, 2009, p. 36). 

A guerra à insegurança e ao medo tem esvaziado o espaço público, essencial à vida urbana. É nos locais públicos que a vida urbana atinge sua mais completa expressão, com suas alegrias, dores, esperanças e pressentimentos. O espaço público carrega a ideia de liberdade e interação com o estranho. Contudo, o medo que alimenta a obsessão pela segurança remove a possibilidade de livre movimento e encontro com o estranho. “Com a insegurança, estão destinadas a desaparecer das ruas da cidade a espontaneidade, a flexibilidade, a capacidade de surpreender e a oferta de aventura, em suma, todos os atrativos da vida urbana” (BAUMAN, 2009, p. 39). 

O espaço público é vulnerável e exposto a ataques, mas também é onde a atração pode superar a rejeição, onde se descobrem e se praticam os costumes de uma vida urbana satisfatória e onde o futuro da vida urbana é decidido (BAUMAN, 2009, p. 40). Para evangelizar, é necessário não temer a cidade e superar a obsessão por segurança que gera segregação e privatização dos espaços. É preciso recuperar a ideia do espaço público, tornando-o um lugar onde as diferenças são valorizadas e onde é possível o encontro e mover-se livremente. Revitalizar o espaço público é uma estratégia para combater o isolamento e gerar encontros e comunhão entre estranhos, superando a tendência de buscar refúgio em ilhas privadas de segurança. 

A tendência de retirar-se dos espaços públicos para refugiar-se em ilhas de “uniformidade” transforma-se no maior obstáculo para conviver com a diferença, enfraquecendo diálogos e pactos. A exposição à diferença torna-se um fator decisivo para uma convivência feliz, secando as raízes urbanas do medo (BAUMAN, 2009, p. 41). 

A humanização da cidade através da recuperação do espaço público é a resposta mais razoável contra o perigo de um espaço urbano residual onde as interações humanas se reduzem a conflitos entre automóveis e pedestres, possuidores e despossuídos, tornando-se locais de tensão e violência. Para que a sociabilidade encontre expressão na cidade, Bauman defende um planejamento urbano que se desloque dos espaços privados para os públicos, tornando-os amplos, atraentes e estimulantes. Isso deve acentuar a “conexão, comunicação e celebração”, respondendo à tarefa de construir cidades que alimentem comunidades e o ambiente que as sustentam (BAUMAN, 2009, p. 41). 

 Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Inteligência artificial e fator humano

Papa Francisco com líderes do G7 e Chefes de Estado em Brindisi, Itália, em 14 de junho de 2024 ANSA /GIUSEPPE LAMI (ANSA)

Em 1983, um homem salvou o mundo de uma guerra nuclear que poderia ter sido desencadeada pelo erro de uma máquina.

Andrea Tornielli

Os sistemas de armas autônomos nunca poderão ser sujeitos moralmente responsáveis: a exclusiva capacidade humana de julgamento moral e de decisão ética é mais do que um conjunto complexo de algoritmos, e tal capacidade não pode ser reduzida à programação de uma máquina que, por mais «inteligente» que seja, permanece sempre uma máquina. Por esta razão, é imperioso garantir uma supervisão humana adequada, significativa e coerente dos sistemas de armas". O Papa Francisco escreveu isso na Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2024.

Há um episódio, ocorrido há quarenta anos, que deveria se tornar um paradigma sempre que se fala de inteligência artificial aplicada à guerra, às armas, aos instrumentos de morte. E é a história do oficial soviético cuja decisão, contrariando o protocolo, salvou o mundo de um conflito nuclear que teria tido consequências catastróficas. Aquele homem se chamava Stanislav Evgrafovich Petrov, era um tenente-coronel do exército russo e, em 26 de setembro de 1983, prestava serviço noturno no bunker "Serpukhov 15", monitorando a atividade de mísseis dos EUA. A Guerra Fria estava em um ponto de inflexão crucial, o presidente americano Ronald Reagan estava investindo grandes somas nos armamentos e acabara de definiar a URSS de "império do mal", a OTAN estava envolvida nos exercícios militares que recriavam cenários de guerra nuclear. No Kremlin, Jurij Andropov havia falado recentemente de uma "escalada sem precedentes" da crise e, em 1º de setembro, os soviéticos haviam derrubado um avião da Korean Air Lines sobre a península de Kamchatka, matando 269 pessoas.

Naquela noite de 26 de setembro, Petrov viu que o elaborador Krokus, o cérebro considerado infalível em monitorar a atividade inimiga, havia relatado de uma base em Montana, a partida de um míssil em direção à União Soviética. O protocolo exigia que o oficial alertasse imediatamente os superiores, que dariam o sinal verde para uma resposta lançando mísseis em direção aos Estados Unidos. Mas Petrov esperou, também porque, segundo lhe disseram, qualquer ataque teria sido maciço. Portanto, ele considerou aquele míssil solitário um alarme falso. E fez o mesmo com os quatro seguintes que apareceram nos seus monitores pouco tempo depois, perguntando-se por que não havia confirmação do radar terrestre. Ele sabia muito bem que os mísseis intercontinentais levavam menos de meia hora para chegar ao destino, mas decidiu não dar o alarme, deixando os outros militares presentes petrificados.

Na verdade, o cérebro eletrônico estava errado; não houve nenhum ataque de míssil. Krokus havia sido enganado por um fenômeno de refração da luz solar em contato com nuvens em alta altitude. Em suma, a inteligência humana havia visto além da máquina. A decisão providencial de não decidir foi tomada por um homem cujo julgamento foi capaz de enxergar além dos dados e protocolos.

A catástrofe nuclear foi evitada, embora ninguém soubesse disso na época até o início da década de 1990. Petrov, que faleceu em setembro de 2017, disse o seguinte sobre aquela noite no bunker "Serpukhov 15": "o que eu fiz? Nada de especial, apenas meu trabalho. Eu era o homem certo no lugar certo e na hora certa". Ele foi o homem capaz de avaliar o possível erro da máquina considerada infalível, o homem capaz - voltando às palavras do Papa - "de fazer julgamentos morais e tomar decisões éticas", porque uma máquina, por mais "inteligente" que seja, continua sendo uma máquina.

A guerra, repete Francisco, é uma loucura, uma derrota da humanidade. A guerra é uma grave violação da dignidade humana. Fazer a guerra escondendo-se atrás de algoritmos, confiando na inteligência artificial para determinar os alvos e como atingi-los e, assim, limpar a consciência porque, no final, a máquina escolheu, é ainda mais grave. Não vamos nos esquecer de Stanislav Evgrafovich Petrov.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Chamei-vos amigos (2): Para iluminar a terra

Foto: Maksim Shutov, disponível em Unsplash.

Chamei-vos amigos (2): Para iluminar a terra

O “mandamento novo” que Jesus nos confiou no fim da sua vida terrena revelou uma nova dimensão da amizade humana: trata-se de autêntico apostolado.

23/06/2020

Os grandes rios geralmente nascem de uma pequena fonte situada no alto das montanhas. Ao longo de seu percurso, vão recebendo água de mananciais e afluentes até que, no final, desembocam no mar. De modo semelhante, um afeto espontâneo ou um interesse em comum constituem as fontes das quais pode brotar uma amizade. Pouco a pouco essa relação segue o seu curso, recebendo correntes que a nutrem: tempo vivido em comum, conselhos de um lado e outro, conversas, risadas, confidências... Da mesma forma que, à sua passagem, os rios fecundam campos, enchem poços e fazem florescer as árvores, a amizade embeleza a vida, cumula-a de luz, “multiplica as alegrias e oferece conforto nas dores”[1]. Além disso, para um cristão, a amizade também fica repleta da “água viva” que é a graça de Cristo (cfr. Jo 4, 10). Esta força dá um novo impulso à corrente: transforma o afeto humano em amor de caridade. Assim, no final do seu curso, esse rio penetra no vasto mar do amor de Deus por nós.

Um coeficiente de dilatação enorme

Nas primeiras páginas da Bíblia, o relato da criação do homem diz-nos que ele foi formado à “imagem” de Deus, feito à sua “semelhança” (cfr. Gn. 1, 26). Este modelo divino está sempre presente na parte mais íntima da alma e, se treinarmos o nosso olhar, poderemos vislumbrar Deus em cada homem e em cada mulher. Por esta altíssima dignidade, todas as pessoas que encontrarmos no caminho – no trabalho, no estudo, no esporte, no nosso ir de um lado para outro – são dignas de ser amadas, embora somente com algumas delas poderemos estabelecer um relacionamento de amizade. Intuímos que, na prática, não é possível ter infinitos amigos, entre outros motivos porque o tempo é limitado; mas o nosso coração, movido por Deus, pode permanecer sempre aberto, oferecendo sua amizade ao maior número de pessoas, “dando mostras de compreensão com todos os homens” (Tt 3. 2).

“O CORAÇÃO HUMANO TEM UM COEFICIENTE DE DILATAÇÃO ENORME” (SÃO JOSEMARIA)

Procurar ter na alma tal disposição, que não “exclui ninguém”, que permanece “intencionalmente aberta a todas as pessoas, com um coração grande”[2], tem certamente um preço. A mãe de São Josemaria, por exemplo, ao ver como seu filho se entregava sem medida às pessoas que o rodeavam, advertiu-o: “Você vai sofrer muito na vida, porque põe todo o coração no que faz”[3]. Abrir-se à amizade tem o seu preço e, no entanto, todos já experimentamos como é um caminho seguro de felicidade. Ao mesmo tempo, a nossa capacidade de amar a cada vez mais amigos pode crescer continuamente. São Josemaria sentiu esta inquietação em seu coração, com o aumento do número de pessoas no Opus Dei: poderei amar a todos os que vierem ao Opus Dei com o mesmo carinho que sinto pelos primeiros? Preocupação que a graça divina resolveu: o seu coração foi sendo continuamente dilatado por Deus, a tal ponto que ele chegou a confessar: “O coração humano tem um coeficiente de dilatação enorme. Quando ama, dilata-se com um crescendo de carinho que ultrapassa todas as barreiras”[4].

Nisto vos conhecerão

Nas páginas do Gênesis revelava-se o amor de Deus ao criar-nos à sua “imagem”, mas com a encarnação do seu Filho, receberíamos revelações mais impressionantes. Os apóstolos de Jesus viveram durante três anos com aquele que era o seu melhor amigo, sem sair do seu lado. Chamavam-no Rabbi – que quer dizer “mestre” – porque além de amigos, eram e se sentiam seus discípulos. Antes de padecer, o Mestre quis que compreendessem que os amava com uma amizade que ia além da morte, que os amava “até o fim” (Jo 13, 1). Este segredo da radicalidade da sua amizade é uma das confidências íntimas que Cristo lhes fez durante a Última Ceia. Lá manifestou também o seu desejo de que esta força se perpetuasse durante os séculos através de todos os cristãos com a proclamação de um novo mandamento: “Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo, 13, 34). E acrescentou: “Nisto conhecerão todos que sois os meus discípulos” (Jo 13, 35); isto é: os meus amigos serão reconhecidos pelo seu modo de amar aos outros.

Há um acontecimento na história do Opus Dei muito unido a este mandamento. Ao terminar a guerra civil, São Josemaria volta a Madri e se dirige imediatamente à rua Ferraz. No número 16 dessa rua, dias antes do começo do conflito, tinha-se terminado de instalar a nova Residência DYA. Quase três anos depois, encontra tudo destruído pelos saques e bombardeios. Está inutilizável. Entre os escombros, coberto de pó, descobre um quadro que havia estado pendurado na parede da biblioteca. Na tela, que tinha aspecto de pergaminho, estão escritas em latim essas mesmas palavras do mandamento novo que Jesus, como vimos, confiou aos seus apóstolos: “Mandatum novum do vobis...”, “Eu vos dou um novo mandamento...” (cfr. Jo 13, 34-35). Tinham-no pendurado ali porque era uma síntese do ambiente que São Josemaria desejava para os centros da Obra: ”Lugares onde muitas pessoas encontrem um amor sincero e aprendam a ser amigas de verdade”[5]. Depois do desastre da guerra, quando era preciso recomeçar praticamente do zero, o importante continuava de pé: uma das bases fundamentais para reconstruir seria deixar-se guiar por esse doce mandamento de Cristo.

Deste jeito é mais fácil subir

Vemos que o modelo da nova lei é o amor de Jesus: “Como eu vos amei” (Jo 13, 34). Mas, como é este amor? Quais são as suas características? O amor de Cristo pelos seus apóstolos – disse-o Ele mesmo – é precisamente como o amor o que os amigos têm entre si. Eles foram testemunhas e destinatários da intensidade deste amor. Sabem que Jesus cuidava das pessoas com quem convivia. Eles o viram alegrar-se com as suas alegrias (cfr. Lc 10, 21) e sofrer com sua dor (cfr. Jo 11, 35). Sempre encontrou tempo para estar com os outros: com a samaritana (cfr. Jo 4, 6), com a hemorroíssa (cfr. Mc 5, 32) e inclusive com o bom ladrão quando já estava na cruz (cfr. Lc 23, 43). O carinho de Jesus manifestava-se em coisas concretas: preocupava-se com o alimento dos que o seguiam (cfr. Lc 9, 13) e também com seu descanso (cfr. Mc 6, 31). Como nos recorda o Papa Francisco, Jesus “cuidou da amizade com seus discípulos, e inclusive nos momentos críticos permaneceu fiel a eles”[6].

JESUS QUER QUE SEUS AMIGOS SEJAM RECONHECIDOS PELO SEU MODO DE AMAR AOS OUTROS

A amizade é, ao mesmo tempo, um bálsamo para a vida e um dom de Deus. Não é apenas um sentimento fugaz e sim um verdadeiro amor “estável, firme, fiel, que amadurece com o passar do tempo”[7]. É considerada por alguns a expressão mais alta do amor, já que nos permite valorizar a outra pessoa por si mesma. A amizade “é olhar o outro não para servir-se dele, mas para servi-lo”[8]. É essa a sua preciosa gratuidade. Entende-se então, que o “ser desinteressada” é inerente à amizade, porque a intenção de quem ama não é buscar nenhum benefício, nem um possível efeito boomerang.

Descobrir isto em sua autêntica profundidade sempre surpreende, pois parece chocar com uma ideia da vida como competição, que costuma ser comum em alguns ambientes. Por isso, quem experimenta a amizade o faz habitualmente como um dom imerecido; com amigos os problemas da vida parecem mais leves. Como diz um provérbio kikuyu do qual o bem-aventurado Álvaro del Portillo gostou muito quando foi ao Quênia: “quando há um amigo no cume da montanha, é mais fácil subir”[9]. Os amigos são absolutamente necessários para conseguir uma vida feliz. É, sem dúvida, possível ter uma vida plena sem participar do amor conjugal – como acontece, por exemplo, com quem recebeu o dom do celibato – mas não se pode ser feliz sem experimentar o amor de amizade. Quanto consolo e alegria encontramos numa boa amizade! Como as tristezas se aliviam!

Mais amigos para Jesus

Conhecendo a vida de Jesus e crescendo em intimidade com Ele, podemos aprender as características de uma amizade perfeita. Vimos no princípio que a amizade cristã é especial porque se nutre de uma corrente divina, a graça de Deus, e por isso adquire uma nova “dimensão cristológica”. Esta força impulsiona a olhar e a amar a todos – especialmente os mais próximos – “por Cristo, com Ele e n’Ele”, como diz o sacerdote na Missa ao erguer Jesus no pão eucarístico. Aprenderemos assim a “ver os outros com os olhos de Cristo, descobrindo sempre e novamente o seu valor”[10]. São Josemaria nos animava a ser o próprio Cristo que passa ao lado das pessoas, a dar aos outros o mesmo amor de Cristo amigo. Por isso é lógico que alimentemos em nossa oração a expectativa humana e sobrenatural de ter sempre novos amigos, porque “Deus muitas vezes se serve de uma amizade autêntica para realizar a sua obra salvadora”[11].

A amizade de Jesus com Pedro, com João e com todos os seus discípulos identifica-se com um ardente desejo de que vivam perto do Pai; a sua amizade está unida ao desejo de que descubram a missão à qual foram chamados. Do mesmo modo, em meio às tarefas que o Senhor nos confiou, “não se trata de ter amigos para fazer um apostolado, mas de que o Amor de Deus informe nossas relações de amizade para que elas sejam um autêntico apostolado”[12]. São Josemaria costumava dizer que na vida espiritual chega um momento em que não se distinguem a oração e o trabalho, porque se vive numa contínua presença de Deus. Algo similar acontece com a amizade, porque ao desejar o bem do amigo queremos que esteja o mais perto possível de Deus, fonte segura de alegria. Assim, “não há tempos compartilhados que não sejam apostólicos: tudo é amizade e tudo é apostolado, sem nenhuma distinção”[13].

“NÃO HÁ TEMPOS COMPARTILHADOS QUE NÃO SEJAM APOSTÓLICOS” (MONS. FERNANDO OCÁRIZ)

Por isso, no coração dos santos, sempre havia lugar para um novo amigo. Ao ler livros que contam as suas vidas descobrimos um interesse sincero pelos problemas dos outros, pelas suas angústias e alegrias. Dom Álvaro cultivou esta disposição até o fim da sua vida; quis levar a amizade de Cristo inclusive às pessoas que o acompanharam durante as horas da sua última viagem nesta terra. Um dia depois do seu falecimento, “na mesinha de cabeceira encontrou-se o cartão de visita de um dos pilotos do avião que o tinha levado da Terra Santa a Roma. Ele tinha se interessado pelo piloto e pela sua família, especialmente durante o tempo de espera no aeroporto de Tel Aviv. O relacionamento foi breve, mas, profundo: aquele piloto foi rezar diante dos restos mortais de dom Álvaro assim que soube do seu falecimento”[14]. Em um encontro casual tinha se gerado uma amizade que continuava entre a terra e o céu.

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O cristão tem um grande amor – um dom – a compartilhar. As nossas relações com os outros dão a Cristo a possibilidade de oferecer a sua amizade a novos amigos. “Iluminar os caminhos da terra”[15] implica estender pelo mundo a preciosa realidade do amor de amizade. Às vezes, pensar só em nossos interesses, ter muita pressa ou ficar em certa superficialidade ao conhecer as pessoas, coloca em perigo este presente que Deus quer dar a todos os homens. Grande parte da nossa missão evangelizadora é justamente devolver à amizade o seu autêntico brilho, colocando-a em relação com Deus, com os outros, com o nosso desejo de ser melhores... em suma, com a felicidade.

José Manuel Antuña

Foto: Maksim Shutov, disponível em Unsplash.

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[1] Fernando Ocáriz, Carta Pastoral 1/11/2019, n. 23.

[2] Fernando Ocáriz, Carta Pastoral 1/11/2019, n. 7.

[3] Andrés Vázquez de Prada, El fundador del Opus Dei, Rialp, Madri 1997, tomo I, p. 164.

[4] São Josemaria, Via Crucis, VIII estação, 5.

[5] Fernando Ocáriz, Carta Pastoral 1/11/2019, n. 6.

[6] Francisco, Christus vivit, n.31

[7] Ibid., n.152.

[8] São João Paulo II, Ângelus 13-II-1994.

[9] Salvador Bernal, Recuerdo de Álvaro del Portillo, Rialp, Madri 1996, p. 278. Veja aqui o vídeo da tertúlia em que Dom Álvaro fala sobre este provérbio:

[10] Fernando Ocáriz, Carta Pastoral 1/11/2019, n.16.

[11] Ibid. , n.5.

[12] Ibid., n. 19.

[13] Ibid., n. 19.

[14] Salvador Bernal, Recuerdo de Álvaro del Portillo, Rialp, Madri 1996, p. 179.

[15] Fragmento da oração pública para pedir a intercessão de São Josemaria.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF