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quarta-feira, 19 de junho de 2024

Caminhar para Jesus Cristo (1)

Jesus caminha sobre as águas (Opus Dei)

Caminhar para Jesus Cristo

Seguindo o ensinamento de São Josemaria, contemplamos nesse artigo, a passagem do Evangelho em que Jesus caminha sobre as águas. Entrando na cena, como se fôssemos um personagem a mais, compreenderemos que, junto dEle, superam-se as dificuldades, inseguranças e temores.

12/04/2017

Vários milhares de pessoas tinham escutado a pregação de Jesus Cristo e tinham se saciado com os pães e os peixes que Ele lhes tinha proporcionado, com tal abundância a ponto de ter sobrado uma boa quantidade[1]. Supõe-se que os apóstolos tenham ficado assombrados.

Juntamente com o assombro, estavam embargados de alegria. Tinham experimentado, uma vez mais, a proximidade do Senhor. Pode parecer que esta nova experiência não deveria ter maior importância para quem já estava habituado a conviver com Jesus Cristo. Porém, como esquecemos tão rapidamente os momentos em que apalpamos a presença de Deus ao nosso lado; e, por isso, como voltamos a nos surpreender e alegrar quando a percebemos de novo.

Quantas vezes notamos com clareza que Deus está junto de nós, que não nos abandonou num momento importante, e nos enchemos de uma alegria e de uma segurança que não se devem somente ao bom resultado do que nos interessava, mas também – e principalmente – à consciência de que vivemos com o Senhor.

E, no entanto, quantas vezes o perdemos de vista e deixamos que nos oprima o medo de que outro assunto importante não termine tão bem quanto; como se Deus pudesse se esquecer de nós ou como se a cruz fosse sinal de que Ele se afastou.

Dificuldades

Depois de despedir a multidão, Jesus pediu aos Apóstolos que passassem à outra margem do lago, enquanto Ele dedicava um tempo à oração[2]. Para eles, especialistas como eram, a travessia não apresentava uma particular dificuldade. E mesmo que apresentasse, depois do que acabavam de presenciar, que obstáculo poderia parecer-lhes insuperável?

Pouco a pouco, a barca foi se afastando da terra, e chegou um momento em que ficou muito lenta. Quando caiu a noite, já a boa distância da margem, a barca era agitada pelas ondas, pois o vento era contrário[3]: não podiam voltar atrás, mas tampouco parecia que avançavam; tinham a impressão de que as ondas e o vento – as dificuldades – tinham assumido o controle e o único que lhes restava era tentar manter-se flutuando.

Assustaram-se. Como parecia longínquo agora o milagre que tinham contemplado poucas horas antes! Se ao menos o Senhor estivesse com eles…, mas Ele tinha ficado em terra. Sim, tinha ficado, mas não os tinha deixado sós, não os esquecera: embora eles não o soubessem, contemplava do monte a sua dificuldade, o seu esforço e a sua fadiga[4].

É fácil que no início da vida interior se experimente com certa clareza o próprio progresso: aos olhos de quem começa a adentrar-se no mar, a margem se afasta rapidamente. Passa o tempo e, embora se continue lutando e avançando, não se percebe de modo tão patente. Sentem-se mais as ondas e o vento, a margem parece ter ficado fixa num mesmo ponto. É o momento da fé. É o momento de fomentar a consciência de que o Senhor não se desentendeu de nós. É o momento de recordar que as dificuldades – o vento e as ondas – formam, inevitavelmente, parte da vida, dessa existência que temos que santificar e com a qual lidamos sabendo que estamos muito acompanhados por Jesus Cristo.

A experiência da proximidade de Deus e do poder da sua graça não nos exime da tarefa de enfrentar as dificuldades. Não podemos pretender que a parte sensível dessa experiência seja permanente; não podemos pretender que, uma vez que estamos perto de Deus, os problemas não nos pesem. E tampouco podemos cair no erro de vê-los como uma manifestação de que o Senhor se afastou de nós, ainda que seja só um pouco e por um breve tempo.

As dificuldades são precisamente a ocasião de mostrar até que ponto amamos Deus, até que ponto somos bons, com a aceitação serena dos inconvenientes que não pudemos ou não soubemos superar.

Inquietações

Fazia tempo que Pedro e os demais lutavam contra o vento, as águas e com a sua própria angústia interior, quando o Senhor veio ajudá-los[5]. Podia tê-lo feito de muitas maneiras: podia ter anulado em seguida a dificuldade ou apresentar-se na barca sem que o vissem chegar; mas tinha outros ensinamentos para lhes transmitir. Aproximou-se deles caminhando sobre o mar.

Era noite, e não era fácil reconhecê-lo. O fato era, por si mesmo, espantoso, mas, além disso, eles já estavam assustados, e o medo rouba das pessoas que o sofrem a serenidade e a clareza de juízo sobre os acontecimentos que de algum modo as atinge. Nestas circunstâncias, é compreensível a reação deles: começaram a gritar.

O Senhor os tranquilizou: tranquilizai-vos, sou eu, não tenhais medo[6]. Ele não acalmou o vento e as ondas nesse momento, mas deu-lhes uma luz para que o coração deles não naufragasse: sei que estais atravessando dificuldades, mas não temais, continuai lutando, confiai em que Eu não vos esqueci e que continuo perto de vós.

Pedro teve uma reação impulsiva: Senhor, se és tu, manda-me ir sobre as águas até junto de ti[7]. Entre os Apóstolos é quase sempre Pedro quem se lança, para bem ou para mal: é ele que recebe as reprimendas mais fortes do Senhor[8] e é ele também quem o confessa com uma audácia que acaba arrastando os demais em momentos difíceis[9]. Mas a sua iniciativa de agora mostra-se surpreendente, inclusive num caráter impulsivo: Simão se encontraria no apuro de ter que descer da barca e apoiar-se numa superfície agitada, descontrolada, impossível de dominar e de prever.

À voz do seu Mestre, passou um pé pela borda, depois o outro e pôs-se a caminhar em direção ao Senhor: queria aproximar-se de Cristo e estava disposto a qualquer coisa para consegui-lo.

Oxalá os propósitos de maior generosidade que formulamos perante o Senhor em momentos de inquietação não fiquem só em palavras. Oxalá a nossa confiança em Deus seja mais forte que a indecisão ou o temor de pô-los em prática. Oxalá sejamos capazes de passar os nossos pés pela borda, embora suponha apoiá-los numa base aparentemente nada apta para sustentar-nos, e caminhemos em direção a Jesus Cristo. Porque para ir em direção a Deus é preciso arriscar, é preciso perder o medo das inquietações, é preciso estar disposto a pôr a vida em jogo.

Caminhando sobre as águas, Pedro sentia mais as ondas e o vento que os outros; a sua vida dependia da fé mais que a vida dos demais, precisamente porque tinha descido da barca e caminhava em direção a Jesus. Não é esta a arriscada situação do cristão? Não estamos também nós procurando caminhar em direção ao Senhor em meio a circunstâncias – externas e também interiores – que, em boa parte, fogem do nosso controle?

Estamos mais expostos às ondas do que quem, temendo enfrentar-se com a imensidão do sobrenatural, preferem a pobre e aparente segurança que lhes oferece o pequeno âmbito da sua barca. Por isso, é estranho que, às vezes, notemos que o chão se mexe, que tenhamos alguma inquietação? São precisamente nesses momentos que precisamos tomar consciência, uma vez mais, de que vivemos da fé; não de uma fé que acalma as ondas, que elimina a inquietação de caminhar sobre elas, mas sim de uma fé que, em meio a essa inquietação, nos dá uma luz e também dá um sentido a essas ondas.

Foi pela fé que fez [os israelitas] atravessarem o mar Vermelho, como por terreno seco, ao passo que os egípcios que se atreveram a persegui-los foram afogados[10]. Sem fé, as dificuldades da vida nos engolem, nos entristecem, afogamo-nos nelas. Com a fé, não as evitamos, mas temos mais recursos, sabemos que Deus pode voltá-las a nosso favor: pareceria inquietante e pavoroso ao povo eleito ter de caminhar pelo fundo do mar, com o perigo, ademais, de que os seus inimigos os alcançassem; mas, através dessa dificuldade e dessa inquietação, conseguiram a sua salvação. Ao final comprova-se que a inquietação de caminhar em direção a Deus proporciona uma base mais firme para edificar a própria vida do que a aparente segurança que a barca oferece.

_________

[1] Cf. Mt 14, 20-21.

[2] Cf. Mt 14, 22-23.

[3] Mt 14, 24.

[4] Cf. Mc 6, 48.

[5] Cf. Mt 14, 25.

[6] Mt 14, 27.

[7] Mt 14, 28.

[8] Cf. Mt 16, 23; Mc 8, 33.

[9] Cf. Mt 16, 15-16; Jo 6, 67-68.

[10] Hb 11, 29.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br

A democracia contemporânea

Democracia (Brainly)

A DEMOCRACIA CONTEMPORÂNEA

Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO) 

Como em nenhum outro domínio da ciência ou do discurso uma ideia tem envelhecido tão rapidamente e de maneira tão completa quanto na sociedade. 

O indivíduo contemporâneo está disposto a muitas coisas para se manter no limite da própria existência. O medo do isolamento foi substituído pelo medo do outro, e, no limiar do otimismo aristotélico, desconfia-se que viver em sociedade produz perplexidades capazes de concorrer com a felicidade que a associação produz. 

Assim como os impérios romano e medieval eram diferentes das cidades onde Aristóteles e Platão pensaram a política, os Estados democráticos contemporâneos muito se diferem do início da modernidade. Também o conceito político precisa se ajustar às democracias atuais. A liberdade do indivíduo foi legitimamente reivindicada e desenvolvida ao longo do tempo, mas parece necessitar de reformulações, principalmente a partir do século passado. 

Com bastante frequência John Rawls aborda o tema da religião para esclarecer o mecanismo atual da democracia. A exemplo de Locke, ele retoma a tolerância para explicar elementos que superam os limites da religião, mas encontram nela um caso típico que serve de parâmetro para uma adequada medida dos interesses que tendem a ser diferentes, sobretudo quando está em jogo os desejos de cada um. Pois, como já foi dito por Beccaria “numa reunião de homens, percebe-se a tendência contínua de concentrar no menor número os privilégios, o poder e a felicidade, e só deixar para a maioria miséria e debilidade”  

A teoria do Contrato “social”, tão presente em nossa tradição política, é apresentada como condição básica para corrigir as visões distorcidas quando os indivíduos se reúnem. Tomando como suficiente às observações operadas por Rawls na “posição original” quando os termos do Contrato são decididos, acentuo o fato, também já delineado, que o Contrato é hipotético, ou seja, não será a partir do Contrato que a sociedade começará. Ela já existe, e os termos postos servirão mais para resolver as questões atuais e futuras que propriamente gerar uma sociedade. 

O Contrato original, pensado hipoteticamente, reflete a situação contemporânea e demarca a linha principal das ações e das atividades sociais, razão pela qual ele deve ser constituído por princípios clássicos e prezados pela sociedade a qual se destina, e não por cláusulas e teses. Esta salvaguarda é importante, dado que parece inviável a possibilidade de qualquer Contrato conter e prevenir, em suas linhas gerais, todas as situações benéficas e impedir todos os malefícios que uma sociedade possa experimentar ao longo de sua infindável existência. 

Uma lista completa de cláusulas e artigos, mesmo no interior de uma sociedade específica, tende a criar uma série de conflitos que se anulam respectivamente por exclusão e contrariedade, causando um desequilíbrio severo em sua estrutura básica. O exemplo bastante atual refere-se à Constituição brasileira vigente desde 1988, que com pouco mais de 30 anos já conta com mais de 100 emendas. Assim, da euforia de texto perfeito, tão alardeado pelos constitucionalistas, passou-se a desilusão de um texto confuso, contraditório, que gera inúmeras batalhas jurídicas, quase sempre privilegiando os mais afortunados. 

A grande extensão dos contratos econômicos, até mesmo para a aquisição de bens relativamente simples, absolutizam-se em contratos de adesão, no qual os interesses das partes não são representados a contento. 

Desse modo, verifica-se que, quanto maior a extensão do contrato, menos ele parece ser capaz de evitar os conflitos. Isso se dá pelo fato de que, do mesmo modo como a sociedade evolui, as pretensões também evoluem, e o acordo precisa ser costurado ao longo do tempo. Ao se alongar excessivamente o Contrato precisa sofrer ajustamentos em sua estrutura. 

A própria apreciação que alguns juristas fazem a respeito da confusa distinção entre direitos e garantias, afirmando que os primeiros são ideais e norteadores e os segundo imperativos e concretos, joga sobre o peso da subjetividade dos indivíduos o dilema sobre as muitas partes de um Contrato. Essa distinção, tão comum na interpretação vulgar também dos textos bíblicos, onde cada um entende a parte citada como o todo e coloca em conflito o desenrolar do texto todo, também se verifica numa Constituição demasiadamente longa. 

A única explicação para assegurar os direitos daqueles que se tornaram prejudiciais para a maioria se sustenta no delicadíssimo limite entre garantias e direitos. Mas parece oportuno salientar, como em vários casos, que as garantias sem direitos terminam por não garantirem nada a ninguém ao longo do tempo. 

Para fugir dessa aporia, começo pela apreciação dos direitos e não pelas garantias. Pois, enquanto a segunda pode ser de qualquer espécie e tantas quantas necessárias na sociedade, os primeiros são de espécies restritas e se alinham em uma família historicamente reconhecida, entre as quais se destaca com eminente prioridade a condição da liberdade. Essa é uma razão pela qual Rawls aponta que “é […] urgente estabelecer os elementos essenciais que lidam com as liberdades fundamentais”. 

Observa-se ainda que na realidade política contemporânea, onde todas as pretensões estão juntas e postas lado a lado, os acordos devem ser de natureza prática e não ideal. Um acordo estável é essencial para que cada um desenvolva suas pretensões e realize a sua ideia de bem. Ao nos referirmos a dificuldade de conseguir acordos numa sociedade dividida por doutrinas filosóficas, religiosas e morais conflitantes, nota-se que “é muito mais fácil chegar a uma concordância sobre quais devem ser os direitos e liberdades fundamentais” que propriamente sobre as garantias. 

Postas as garantias dos acordos políticos, por força do pluralismo democrático, resulta que a justiça se torna o elemento determinante, e sobre ela se desenrolará os outros casos, inclusive as garantias advenientes dessa primeira condição. Começar com a elaboração de uma ideia de justiça é essencial para qualquer tentativa de Contrato. 

A proximidade dos indivíduos não é apenas material, ela se consolida, com muito mais razão, nas aspirações, pontos de vistas e desejos de verem suas ideias, principalmente àquelas que dizem respeito ao seu bem e ao bem dos demais realizados. O fato de os indivíduos viverem tão próximos, sem muitos princípios norteadores, coloca constantemente os termos do Contrato sob suspeita. A situação de estranhamento social, mesmo na efetivação das ideias de bem, já foi largamente examinado com fartos argumentos e pesquisas em nosso tempo. 

Todas essas possibilidades juntas, acrescentadas pela constante dificuldade de classificá-las em quantidade e qualidade, como se discutiu na mensurabilidade do Estado de Hobbes, dispõe inúmeras probabilidades de agrupamentos e reagrupamentos para os indivíduos. Ao tomar essas duas categorias em suas acepções clássicas, quando se admitia que a quantidade de bens que os indivíduos buscam é mais claro e calculável que a qualidade desses mesmos bens, que são subjetivos, parece não mais ser correto, pois a capacidade de valorar livremente o que mais interessa para si mesmo faz com que eles sejam classificados com a mesma dose de subjetividade e de objetividade. 

A sociedade contemporânea, portanto, assemelha-se a ideia do claustro, onde inovações e criatividades são necessárias para não produzir a claustrofobia

As definições simples e assertivas parecem não mais corresponderem a nenhuma solução digna num debate tão disperso. 

A visão do claustro conduz, inegavelmente, ao emaranhado medieval expresso nos infinitos labirintos da biblioteca em O nome da rosa, de Umberto Eco. Entretanto, apenas a imagem pode representar a sociedade atual, dado que os corredores daquele medievo pareciam sempre terminar em um beco sem saída ou numa parede sólida, mas os corredores contemporâneos levam, com absurda velocidade, às direções que dificilmente encontram algum impedimento. 

Embora pareça sem sentido comparar a ilimitada capacidade de progredir no pensar, julgar e agir com a figura do claustro, ela não é estranha, pois o que importa na observação é o fato de que todos os juízos e caminhos são possíveis numa proximidade desconcertante. Na origem, portanto, de todas as possibilidades contemporâneas, presencia-se um aglomerado de vontades, ideologias e razoáveis discordâncias sobre quase todos os aspectos da realidade. 

As combinações e recombinações de posições no ponto de partida da sociedade tornam a ideia de Contrato ainda mais complicada. As definições de suas cláusulas e limitações podem variar essencialmente entre temas que a maioria preza, mas não preza do mesmo modo, nem na mesma ordem de prioridades. Portanto, acertar o equilíbrio nas diversas partes e proposições do Contrato na democracia contemporânea se impõe como a mais crítica e urgente das questões, chegando a exigir, até mesmo, a conciliação das contradições. 

 Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Cristianismo, a língua materna da Europa (2)

Alojamento dos peregrinos, detalhe das Obras de Misericórdia , décimo primeiro nicho do Batistério de Parma | 30Giorni

Arquivo 30Dias – 09/2009

Cristianismo, a língua materna da Europa

Entrevista com Monsenhor Rino Fisichella, reitor da Pontifícia Universidade Lateranense e presidente da Pontifícia Academia para a Vida, sobre seu último livro Identità dissolta.

Entrevista com Rino Fisichella por Walter Montini

O Cristianismo ainda terá espaço na Europa? Serão os cristãos capazes de não dispersar esta herança?
FISICHELLA: O primeiro e o último capítulo constituem os pilares do meu livro: o primeiro capítulo mostra a riqueza que produzimos e a capacidade de saber transmiti-la, sem limites, sem preclusões, mas sempre e exclusivamente como um desejo de buscar o verdade e alcançar diferentes etapas no caminho rumo à verdade total. O último capítulo torna-se uma nova assunção de responsabilidade com o apelo à urgência educativa.

Se tudo o que foi descrito no decorrer do meu volume for verdade, torna-se ainda mais importante assumir uma responsabilidade que nos leve a responsabilizar-nos pelas novas gerações, para que tenham a solidez da memória histórica e uma consequencialidade da nossa parte, que é isso para começar a se comunicar novamente, com uma linguagem comum, ainda que diferenciada e mediada por diferentes contextos. A família tem inevitavelmente uma linguagem própria, que é a da transmissão quase natural dos valores de uma educação que se realiza num ambiente de amor e de responsabilidade; a linguagem da escola que ocorre na cultura; o da comunidade cristã, que inevitavelmente ocorre no âmbito da religião: estas três realidades devem ser capazes de comunicar os mesmos valores, valores profundamente humanos, não tipicamente cristãos: lealdade, honestidade, verdade, direito, justiça, dignidade, respeito... É um património comum do qual a escola é testemunha a nível cultural, a família porque os vive, a comunidade cristã porque os sustenta com o testemunho.

Antecipou uma pergunta minha: falando do processo de formação, apela muitas vezes à credibilidade das pessoas (autoridade do formador, testemunho), e isto aplica-se tanto à política (instituições civis) como à Igreja (comunidade cristã), como assim como para a escola, família...
FISICHELLA: Exatamente. Na minha opinião, um elemento importante não é apenas a circularidade da formação, porque quando falamos de valores e de formação nunca nos deparamos apenas com noções a transmitir; estamos a transmitir um estilo de vida: para que a formação seja plenamente adequada é necessário que a pessoa e as instituições que transmitem a formação sejam também credíveis. Apostamos tudo na credibilidade. Hoje assistimos a uma perda progressiva de credibilidade de todas as instituições; quando se realizam inquéritos à credibilidade dos políticos ou das instituições, creio que devemos estar sempre atentos a esta dimensão. Na verdade, se por um lado a credibilidade mostra a responsabilidade que inevitavelmente cabe a cada um de nós, por outro mostra também como é um elemento incontornável na integralidade do processo formativo.

A credibilidade também dá autoridade às pessoas. Autoridade deriva do latim augere que significa “aumentar”, não “impor”; aumentar o que está presente em cada pessoa. A pessoa que tem autoridade é aquela que ajuda os outros, sobre os quais exerce a sua autoridade, a crescer. Se isso não acontecer, não há sequer autoridade.

O senhor fecha as páginas do seu livro com uma referência às palavras de Dom Luigi Giussani sobre o risco educativo. Por que?
FISICHELLA: Fechei com grande prazer as páginas do meu volume, abordando sobretudo o tema da emergência educativa com as palavras de um grande sacerdote que, entre os primeiros e entre os poucos, compreendeu o risco educativo, que não é apenas o título de um belo volume seu, mas sobretudo é uma grande intuição que o fundador de Comunhão e Libertação teve e que perseguiu ao longo da sua vida.

Certamente a formação é um risco, mas é um risco que deve ser assumido.

Giussani, que considero um verdadeiro apologista do século XX no sentido pleno do termo - porque apologista é aquele que apresenta, que dá as razões da fé -, nos seus escritos enfrentou o risco educativo precisamente por dar força à razão; uma razão que, no entanto, tornou-se também uma experiência de vida, capaz de dar razões de fé ao crente, mas, ao mesmo tempo, razões para acreditar ao descrente que, inserido numa experiência concreta, encontrou as razões não tão uma teoria pura, mas como um estilo de vida.

 Fonte: https://www.30giorni.it/

Papa: os Salmos nos conduzem à felicidade e nos preparam para o Jubileu

Audiência Geral de 19/06/2024 com o Papa Francisco (Vatican News)

Na Praça São Pedro, Francisco prosseguiu seu ciclo de catequeses sobre o Espírito Santo e recordou que a Igreja vive o Ano da Oração em preparação ao Jubileu de 2025, aconselhando a meditação do Livro dos Salmos.

Vatican News

Os Salmos e o Espírito Santo foram o tema da catequese do Papa na Audiência Geral de hoje, realizada na Praça São Pedro.

Francisco definiu este livro do Antigo Testamento como uma “sinfonia de oração", cujo compositor é o Espírito Santo. E citou as edições que contêm o Novo Testamento e os Salmos juntos, revelando que mantém em sua escrivaninha um desses volumes em ucraniano, que pertenceu a um soldado que morreu na guerra: "E ele rezava na frente de combate com este livro".

Como em toda sinfonia, nela existem vários “movimentos”, ou seja, vários tipos de oração: louvor, ação de graças, súplica, lamento, narração, reflexão de sabedoria e outros, tanto na forma pessoal quanto comunitária.

Alguns salmos refletem, por vezes, uma situação histórica e uma mentalidade religiosa que já não são as nossas. Mas vale lembrar que foram a oração de Jesus, de Maria, dos Apóstolos e de todas as gerações cristãs que nos precederam. É um elemento fixo na celebração da Missa e na Liturgia das Horas. 

“Eu me pergunto: vocês rezam com os salmos algumas vezes? Peguem a Bíblia ou o Novo Testamento e rezem um salmo. Por exemplo, quando estão um pouco tristes por terem pecado, rezam o salmo 50? Existem muitos salmos que nos ajudam a ir em frente. Criem o hábito de rezar com os salmos. Eu lhes garanto que, no final, ficarão felizes.”

Mas não podemos viver apenas da herança do passado, afirmou o Pontífice. É necessário fazer dos salmos a nossa oração, como se fôssemos nós os “autores”. Se existem versículos que falam ao nosso coração, recomendou o Papa, é bom repeti-los e rezar durante o dia, pois são válidos para todos os momentos e aumentam a sua eficácia com a constância.

De fato, não há estado de espírito ou necessidade que não encontre neles as melhores palavras para transformá-los em oração. Culpa, medo e angústia se transformam em prece. Podemos repetir com David, por exemplo: “Tem piedade de mim, ó Deus, pela tua misericórdia, segundo a tua grande compaixão” (Sl 51,3). Ou “O Senhor é meu pastor […]. Mesmo que eu ande por vales tenebrosos, não temerei mal algum” (Sl 23,1,4).

E mais: os salmos enriquecem a nossa oração, pois não está centrada em nós mesmos, pois com eles podemos expressar louvor, bênção, ação de graças, envolvendo também a criação.

“Irmãos e irmãs, o Espírito Santo, que deu à Igreja Noiva as palavras para rezar ao seu divino Esposo, nos ajude a fazê-las ressoar na Igreja de hoje e a fazer deste ano preparatório para o Jubileu uma sinfonia de oração”, concluiu o Pontífice.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

São Romualdo

São Romualdo (A12)
19 de junho
São Romualdo

Romualdo nasceu em Ravena, na Itália, no ano de 956. Membro de família nobre, porém sem vínculo algum com religião.

A origem de sua vocação parece ligada a um acontecimento sangrento na família onde em um duelo seu pai acabou assassinando um primo. Chateado com o ocorrido, ele decidiu se tornar um monge e entrou no antigo mosteiro de Santo Apolinário em Classe. Mas ali não se sentia à vontade, pois a vida daqueles monges era bastante descontraída.

Após conhecer o abade Guarino, um dos mais importantes monges refundadores do século X; Romualdo o acompanhou até sua abadia de Cuixà, na Catalunha. Lá, Romualdo permaneceu por dez anos e completou sua formação.

Retornando à Itália em 988, dedicou-se a uma vida eremita, perto de Ravena. Por volta de 1014 Romualdo fundou uma ermida em Sitria. Foi o promotor da Congregação Camaldulense, ramo reformado da Ordem Beneditina. Romualdo buscou incessantemente a solidão mais radical para conduzir sua conversa com Deus.

Romualdo viveu cerca de 75 anos: morreu em 19 de junho de 1027 na abadia de San Salvatore em Valdicastro, na mais perfeita solidão.

Ele foi canonizado apenas cinco anos após sua morte e foi declarado santo em 1595 pelo Papa Clemente VIII.

Colaboração: Padre Evaldo César de Souza, CSsR

Reflexão:

São Romualdo foi um monge interessado pelos problemas do seu tempo. Tinha o dom da contemplação e foi homem de uma vida profundamente dedicada a Deus e aos irmãos. Seu retiro num mosteiro não o impediu de viver preocupado com as dificuldades do seu povo e procurou, por palavras e ações, fazer acontecer o Reino de Deus na vida das pessoas. Que nós também saibamos nos interessar pelos desafios do nosso mundo e façamos nossa parte na construção do reino da justiça e da partilha.

Oração:

Ó Deus, que nos destes no Abade São Romualdo um testemunho de perfeição evangélica, fazei-nos em meio às agitações deste mundo, fixar o coração nos bens eternos. Por Cristo Nosso Senhor. Amém!

Fonte: https://www.a12.com/

terça-feira, 18 de junho de 2024

Cristianismo, a língua materna da Europa (1)

Rino Fisichella, Identidade Dissolvida. Cristianismo, língua materna da Europa , Mondadori, Milão 2009, 140 pp., 17,00 euros | 30Giorni

Arquivo 30Dias – 09/2009

Cristianismo, a língua materna da Europa

Entrevista com Monsenhor Rino Fisichella, reitor da Pontifícia Universidade Lateranense e presidente da Pontifícia Academia para a Vida, sobre seu último livro Identità dissolta.

Entrevista com Rino Fisichella por Walter Montini

Tomando uma frase de Goethe no subtítulo do livro, você afirma que a Europa nasceu da peregrinação. De facto, o peregrino, nas suas viagens e viagens, integrando-se numa sociedade que ultrapassava a sua pertença territorial, enriqueceu-se de conhecimentos e de cultura: sentimentos, sinais de identificação, interesses e necessidades tornaram-se assim uma bagagem comum. Hoje a imigração – ao contrário – causa um pouco da mesma coisa. Mas estamos divididos entre aqueles que afirmam que o fenômeno migratório é enriquecedor para a nossa civilização e aqueles que, pelo contrário, acreditam que é um fator de empobrecimento económico e cultural. O que você acha?
RINO FISICHELLA: É preciso distinguir entre a realidade do peregrino e a do imigrante. O peregrino sempre pertenceu à sua pátria; tinha uma dimensão que o unia quando atravessava as diversas regiões para chegar ao santuário, e era a unidade da fé. Para o peregrino o ponto central era cumprir um voto, e foi precisamente por isso que iniciou a viagem; Assim aprendeu também muitas outras situações e comportamentos de vida, conhecimentos literários, tudo o que se enquadra no gênero “cultura”. O imigrante vivencia uma situação diferente. Na maioria das vezes ele persegue um sonho. A primeira é a de um direito fundamental à vida de cada pessoa, que provavelmente lhe é negado no seu próprio país devido à pobreza, nomeadamente a estabilidade no emprego. Ao perseguir este sonho, ele dirige-se a nações que oferecem a possibilidade de realização através de um trabalho que o cidadão do país ocidental industrializado muitas vezes já não quer fazer.

Então hoje é apenas uma diferença de objetivos diferentes que existe entre o peregrino e o imigrante?
FISICHELLA: O fenômeno da imigração sempre esteve presente na história do mundo e, portanto, não pode ser subestimado ou marginalizado: penso que no nosso tempo devemos ser capazes de dar respostas coerentes.

Acredito que a primeira resposta deveria ser que os países mais desenvolvidos deveriam investir riqueza nos países em desenvolvimento: esta é a primeira forma através da qual se exerce um caminho de solidariedade num momento de globalização, caso contrário ficaremos sempre com uma realidade feita de Países ricos e populações pobres.

Em segundo lugar, há a questão do acolhimento dos imigrantes. E aqui devemos reconhecer dois aspectos. Certamente deve ser mantida uma dose de legalidade; sem legalidade não creio que possamos beneficiar verdadeiramente de uma solidariedade genuína, porque seriam impostas situações de privação e pobreza e seria criada discriminação social. Acredito que, juntamente com a legalidade, devemos também ser capazes de uma solidariedade autêntica. O princípio que deve orientar o fenómeno da imigração é, portanto, duplo: a atenção aos mais pobres realiza-se na solidariedade e na subsidiariedade, mas isto não pode acontecer contra as leis de um Estado.

Contudo, há um terceiro fator que, na minha opinião, suscita a sua pergunta e diz respeito ao facto de hoje, ao contrário do antigo peregrino, sermos capazes de ser proativos em relação aos nossos valores. Vivemos numa situação cultural de profunda crise de valores que conduz inevitavelmente a uma crise de identidade. O imigrante encontra-se perante uma dupla situação: ou encontra uma forte proposta identitária para se integrar ou, se esta não existe, fecha-se no seu próprio mundinho. Ninguém pode afirmar que no processo de integração há uma perda da identidade original, mas deve certamente haver um esforço para assimilar aqueles elementos básicos que são, por exemplo, a língua para comunicar e o conhecimento e respeito pelas tradições culturais e religiosas dos o país em que você chega. Muitos aspectos fazem-nos compreender que se por um lado esta forma de integração é possível, por outro continua a ser o lado exposto da capacidade proativa de valores e de identidade que vejo hoje em profunda crise.

Você afirma no livro: O Cristianismo é a língua materna da Europa. Portanto, para os cristãos é necessário repensar as razões da fé a partir da pessoa, da sua dignidade e centralidade, “na sua atividade de expressar o que há de mais íntimo: o amor” (p. 28).
FISICHELLA: Recomeçar a partir da pessoa e da sua dignidade é, na minha opinião, um dos caminhos que nos permite devolver à fé cristã uma das contribuições mais originais que ela deu à cultura universal. Todos sabemos que o conceito de pessoa passou da cultura originária grega para uma interpretação profundamente cristã, relida à luz da teologia trinitária, segundo a qual a pessoa já não é uma máscara que o ator coloca para desempenhar um papel, mas é, em vez disso, um relacionamento amoroso. É isso que muda tudo no próprio conceito; este ainda é um autêntico desafio que podemos trazer ao mundo de hoje, especialmente diante de uma ideologia que tende a excluir o conceito de pessoa para favorecer a centralidade do indivíduo, onde faltam relações no indivíduo porque na verdade ele vive em um profundo narcisismo em que tudo o que ele deseja, quer e pensa se torna seu próprio rosto.

Um certo otimismo transparece nas páginas do livro. Otimismo não confirmado pelo título, Identidade Dissolvida , que, em vez disso, sem sequer um ponto de interrogação, parece agora perder todas as esperanças.
FISICHELLA: O título foi uma provocação deliberada: Identidade Dissolvida nos convida a refletir sobre aqueles elementos que mostram a dissolução de alguns comportamentos e conteúdos de pensamento, de alguns estilos de vida. O título dispensa ponto de interrogação porque é imediatamente orientado pelo subtítulo, expressão emprestada de Goethe, que dizia: «A Europa nasceu da peregrinação e a sua língua materna é o cristianismo». Portanto, a provocação do título já corresponde em si à resposta do subtítulo que convida a uma maior assunção de responsabilidades, para que a Europa não esqueça a sua língua materna.

Fonte: https://www.30giorni.it/

Festas Juninas

Festas Juninas (Educa Mais Brasil)

FESTAS JUNINAS, EXPRESSÕES VIVAS DE ALEGRIA, AMIZADE SOCIAL E CONVIVIALIDADE FRATERNA

Dom Roberto Francisco Ferreria Paz
Bispo de Campos (RJ)

O ciclo Pós-Pentecostes apresenta uma variada galeria de Santos populares, que geraram em torno a sua proximidade e intercessão com os fiéis festas e costumes que integram e valorizam as comunidades. Já Harvey Cox tinha estudado nas festas do medievo a sua importância social de coesão, esperança, e porque não dizer de verdadeira cura e reconciliação para o povo mais humilde.  

Surge assim um rico e variado folclore registrado pela antropologia religiosa que dá destaque a dádiva, gratuidade, acolhida e convívio fraterno. Basta dizer o número de feriados religiosos que haviam para tomar conhecimento de que longe de serem povos submetidos ao medo e a tristeza denotavam alegria de viver, compartilhamento e um senso de solidariedade comunitária muito apurado.  

Hoje pode-se afirmar que embora tenha-se perdido um pouco da religiosidade vertical e marcante em todas as atividades, o espírito do que Yung chamara inconsciente religioso coletivo e para nós memória e patrimônio cultural-celebrativo que constitui a alma de um povo, tem raízes firmes e profundas em várias regiões dos nossos municípios do interior e na nossa cidade. 

Especialmente as festas juninas acontecem espontaneamente organizadas por pessoas das comunidades que reavivam tradições vivas nunca esquecidas que guardam um verdadeiro tesouro simbólico que resiste o tempo e descortina sempre o mistério de Deus, da vida e da própria condição humana.  

Num tempo de incertezas e de um individualismo centrífugo, revisitar e participar destas festas não só  nos desperta lembranças e recordações esplêndidas, mas significam como uma lufada de liberdade interior e senso familiar e comunitário que nos humaniza e nos faz retomar a inocência das coisas belas de inestimável valor.  

Precisamos mais de festas, de convivência social para retecer e curar os relacionamentos calcificados pelo ódio, a desavença e a polarização de todo tipo. O cristão é um ser festivo, porque sonha e tem no coração a esperança que não decepciona, e que dá sentido a história dando-lhe um horizonte de eternidade, Cristo a Alegria dos homens e de todas as criaturas. Louvado seja Deus! 

 Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Sob o olhar do Redentor!

Comissão Teológica Internacional no Cristo Redentor (Vatican News)

A Comissão Teológica Internacional desembarcou recentemente em solo sul-americano para uma semana de estudos da Subcomissão encarregada de aprofundar o tema: O primeiro Concílio Ecumênico de Nicéia e a atualidade de seu dogma.

Mons. Maurizio Barba - Secretário Adjunto da Comissão Teológica Internacional

No pitoresco cenário do Rio de Janeiro, a "Cidade Maravilhosa", a Subcomissão "Nicéia" foi recebida com solicitude paternal e braços abertos pelo arcebispo do Rio de Janeiro, cardeal Orani João Tempesta, e seu bispo auxiliar dom Antonio Luiz Catelan Ferreira, membro da Subcomissão, para sua sessão de verão, hóspedes da estrutura diocesana "São João Paulo II".

Mas é sobretudo sob o olhar acolhedor do Cristo Redentor, a estátua colocada no topo do Monte Corcovado a 709 metros acima do nível do mar, que o grupo de teólogos de diferentes partes do mundo - Estados Unidos, Brasil, México, Itália, França, Líbano - sob a sábia orientação do Secretário Geral, Mons. Piero Coda, e a competente coordenação do Prof. Philippe Vallin, continuou a delicada tarefa de redigir o documento que verá a luz no início do ano 2025, por ocasião do 1700º aniversário da abertura do Concílio de Nicéia.

Não são poucas as iniciativas preparadas, já a partir deste ano, para comemorar esse aniversário, tanto no contexto acadêmico quanto no pastoral-eclesial, com uma variedade de perspectivas que contribuem para considerar o evento conciliar a partir das perspectivas histórico-patrística, teológico-doutrinal, disciplinar-canônica e ecumênico-pastoral.

O Concílio de Nicéia foi o primeiro concílio chamado "ecumênico", um evento teológico e ao mesmo tempo eclesial, no qual a violenta disputa ariana sobre a confissão cristológica foi resolvida de forma sinodal e foi definida a questão pastoral-disciplinar da data da Páscoa. Isso nos deixou em herança o Símbolo, no qual a fé trinitária e cristológica da Igreja encontra sua plena identidade, e, acima de tudo, nos fez saborear a beleza da salvação oferecida em Cristo Jesus, Filho de Deus e Salvador da humanidade.

O documento da Comissão Teológica Internacional se insere nessa linha de aprofundamento do evento conciliar, com o objetivo de realizar uma leitura "doxológica" do Símbolo, para evidenciar seus recursos soteriológicos e, portanto, cristológicos, trinitários e antropológicos. Trata-se, de fato, de redescobrir Cristo, "Luz da Luz" e luz do mundo, em todo o seu poder de atração.

Da esq. para a dir., padre Gaby Alfred Hachem, monsenhor Maurizio Barba, Dom Antonio Luiz Catelan Ferreira, padre Philippe Vallin, Cardeal Orani João Tempesta, Dom Etienne Vetö, monsenhor Piero Coda, padre Mario Ángel Flores Ramos, frei Fernando Saraiva, Robin Darling Young | Vatican News

De um ponto de vista patrístico, o texto examinará a vida litúrgica e a vida de oração para ver como essas áreas foram frutíferas na Igreja após o Concílio e como ainda podem ser frutíferas hoje.

Além disso, o documento também é enriquecido por um olhar especial sobre o "evento" que Niceia representou para a história do pensamento e para a história das estruturas de governo da Igreja, juntamente com uma visão geral da estrutura de "teologia fundamental" delineada pelo que o primeiro concílio ecumênico manifestou sobre a missão constante da Igreja a serviço da credibilidade de sua fé. Nesse sentido, manifesta-se assim a fecundidade da Revelação cristã para renovar o pensamento e as formas de vida comum do ser humano.

O documento retoma e aprofunda o convite do Papa Francisco, expresso em seu discurso na Assembleia Plenária da Comissão Teológica Internacional no ano passado, para redescobrir a atualidade do evento do Concílio de Nicéia e a beleza do conteúdo da fé trinitária e cristológica da Igreja, retomando as três razões que ele deu para tornar essa redescoberta promissora e eficaz.

Antes de tudo, um motivo espiritual, reiterado a partir da profissão de fé em Cristo, "Deus de Deus, luz da luz". O Papa exortou os teólogos a testemunharem com a própria vida aquela "luz nascente e eterna", que não é apenas "a luz de um conhecimento impensável, mas é a luz que ilumina a existência", comprometendo-se a irradiá-la com uma vida luminosa e alegre, "difundindo novos e surpreendentes fulgores da luz eterna de Cristo na casa da Igreja e nas trevas do mundo".

Uma segunda razão é a sinodal, já que em Nicéia a Igreja pôde refletir sobre a natureza de sua fé e de sua missão e tratou as questões debatidas com um método sinodal. Em tal horizonte, explica o Papa, a sinodalidade constitui a ocasião propícia "para traduzir em atitudes de comunhão e em processos de participação a dinâmica trinitária com a qual Deus, por meio de Cristo e no sopro do Espírito Santo, vem ao encontro da humanidade". A tarefa dos teólogos, portanto, é "liberar a riqueza dessa maravilhosa 'energia humanizadora'".

Outro motivo é ecumênico, lembrando a relevância do evento conciliar no contexto do caminho rumo à unidade dos cristãos. A esse respeito, o Papa, lembrando que o Símbolo Niceno não só une os discípulos de Cristo, mas que em 2025 a data da Páscoa coincidirá para todas as denominações cristãs, fez votos que essa ocasião possa marcar "o início concreto de uma celebração sempre comum da Páscoa".

O documento da Comissão Teológica, caminhando na direção de compreender a eficácia desse Concílio para a vida da Igreja no século XXI, chamada a enfrentar antigos e novos desafios, tanto em nível universal quanto local, privilegia a perspectiva da atualidade do dogma niceno, compreendendo a necessidade do homem moderno de reafirmar sua fé dentro de um contexto cultural que solicita a redescoberta da relação entre fé e vida.

Em seu discurso solene na abertura do Concílio Vaticano II, São João XXIII assim se expressou: "É necessário que essa doutrina certa e imutável, que deve ser fielmente respeitada, seja aprofundada e apresentada de uma forma que responda às necessidades de nosso tempo. Outra coisa é, de fato, o depósito da fé, ou seja, as verdades contidas em nossa doutrina, outra coisa, é a forma em que são enunciadas, preservando o mesmo significado e o mesmo objetivo. Será preciso dar grande importância a essa forma e, se necessário, será preciso insistir pacientemente em sua elaboração; e será preciso recorrer a uma maneira de apresentar as coisas que melhor corresponda ao magistério, cujo caráter é preeminentemente pastoral.

A ocasião da comemoração do Concílio de Nicéia e, em particular, o Símbolo que dele emergiu, desempenha um papel fundamental na custódia e transmissão da fé, colocando no centro da evangelização o aprofundamento do Kerigma Trinitário, como uma experiência vital do encontro com o Senhor crucificado e ressuscitado, Filho de Deus e Salvador, na luz do Espírito.

A famosa estátua monumental do Cristo Redentor no Rio de Janeiro oferece iconicamente uma parábola da salvação em Cristo que a Igreja deseja celebrar em 2025. Esplendidamente colocada no Morro do Corcovado, ela, ao mesmo tempo em que atrai milhares de peregrinos, revela ao homem moderno infinitos vislumbres de beleza, através de uma vista impressionante de toda a cidade reunida e abraçada no horizonte encantador dos braços abertos de Cristo, cuja extensão parece alcançar todos os cantos da Terra.

Aos pés do monumento que delineia a inconfundível silhueta da cruz, o homem crente tem a oportunidade de mergulhar naquela visão espiritual e cristã da existência que lhe permite ver a história, o mundo e a humanidade com os próprios olhos do Redentor.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Oração e castidade são antídotos contra o vício em pornografia, diz teólogo

Jason Evert passou mais de duas décadas viajando pelo mundo falando a jovens e adultos sobre a importância da pureza e da dignidade humana. | Crédito: ACI Prensa.

A oração, a castidade e buscar os sacramentos com frequência são os únicos antídotos para a epidemia global do vício em pornografia, disse o autor e palestrante católico americano Jason Evert, pois “libertam você para amar e para saber se está sendo amado autenticamente”.

Evert é especialista em promoção da castidade e educação na teologia do corpo. Ele é bacharel em Teologia e Aconselhamento e mestre em Teologia. Além disso, dedicou mais de duas décadas a viajar pelo mundo falando a jovens e adultos sobre a importância da pureza e da dignidade humana no contexto das relações pessoais.

Junto com sua esposa, Crystalina, ele fundou o Projeto Chastity, uma organização dedicada a fornecer recursos e apoio para viver uma vida casta.

Ao longo de sua carreira, Jason escreveu vários livros populares, incluindo Pure Love (Amor Puro) e Theology of the Body for Teens (Teologia do Corpo para adolescentes), que foram traduzidos para vários idiomas e distribuídos globalmente.

Seu trabalho foi divulgado em diversos meios de comunicação e alcançou milhões de pessoas por meio de palestras em escolas, universidades e eventos católicos.

Em entrevista à ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, com sua abordagem distinta, acessível e compassiva, Evert forneceu orientação prática e espiritual para aqueles que buscam viver uma vida de integridade e amor verdadeiro.

Ao responder sobre as consequências psicológicas e emocionais do vício em pornografia, comentou que é uma situação “desoladora” e que estes conteúdos estão formando os jovens numa espécie de “poligamia mental”, o que os leva a considerar os seus parceiros sentimentais como algo que podem jogar fora se não cumprirem certos padrões sexuais.

Em relação às novas políticas da plataforma X de Elon Musk, que na semana passada permitiu oficialmente aos usuários publicar conteúdos pornográficos, Evert disse que isso só levará a mais dependência, especialmente entre os jovens.

“Antes que você perceba, seu cérebro não consegue acompanhar a quantidade [de estímulos] que você precisa consumir para se sentir satisfeito. E assim a pessoa não só fica entediada com outras pessoas, mas também fica entediada consigo mesma”, disse.

“O homem que se entregou a tanta pornografia é quase como se ele tivesse esses ‘óculos pornográficos’. Ele não consegue nem mesmo olhar para a mulher, a não ser pelas lentes da luxúria. E o coração de uma mulher consegue perceber a diferença. Por isso a cura é necessária”, acrescentou o especialista.

Diante desta perigosa realidade, Evert propõe a experiência da castidade – além dos meios espirituais propostos pela Igreja – como um “antídoto” para superar o vício da pornografia. Recordou as palavras de são João Paulo II, durante a audiência geral de 2 de janeiro de 1980, na qual falou sobre a relação entre homens e mulheres.

“Se os homens puderem crescer na pureza de coração, poderão verdadeiramente abençoar suas esposas 'com a paz do olhar interior', ou seja, quando olham para suas esposas com reverência, amor e paixão, isso cria paz em seus corações, porque ela sabe que não olham para ela com luxúria, mas com amor”, disse Evert.

Por outro lado, “se olham para ela como uma coisa que é usada para a gratificação, cria-se esta vulnerabilidade, este ressentimento em relação aos homens e à sexualidade”, disse. “E o coração de uma mulher pode perceber a diferença”, acrescentou.

O que é castidade e para que serve?

Evert falou da importância de compreender o que realmente é a castidade: “A castidade não é celibato. Celibato é o estado de não estar casado, é isso que a palavra significa. A castidade não é a mesma coisa que a abstinência. A abstinência significa simplesmente não fazer sexo”, disse ele.

“A castidade é um conceito mais completo. É a virtude da pureza do meu coração, da minha palavra, dos meus olhos, da minha intenção, das minhas roupas, da minha conduta, de toda a minha pessoa”, disse Evert.

Segundo o autor e palestrante, a castidade tem duas funções: libertar a pessoa para amar e saber se está sendo amada de forma autêntica. “Se eu estou dominado por vícios sexuais e depois me caso, não amarei realmente a minha esposa. Eu realmente não vou fazer amor com ela. Vou simplesmente usar o corpo dela como uma saída para minha luxúria”, disse.

“Se um garoto não sai contigo se você não faz certas coisas com ele, ou [por exemplo] não manda fotos para ele, fica bem claro: ele não te ama. Ele só quer o prazer que obtém de você”, acrescentou Evert.

Sobre o sofrimento que a pornografia causa nos casamentos, devido ao vício de um dos cônjuges, comentou que é falsa a crença generalizada de que estes conteúdos “intensificam a intimidade”, mas, pelo contrário, a bloqueiam.

“A luxúria é a redução da pessoa humana ao seu valor sexual. Isso é luxúria. Não é paixão. Não é desejo ou atração sexual. É a redução da pessoa ao seu valor sexual”, disse.

“Quando crescemos na pureza do coração, sim, somos atraídos pelo corpo e pela sexualidade, mas também somos atraídos pela masculinidade, pela feminilidade da outra pessoa: o ser humano completo, não apenas o prazer que pode nos oferecer”, acrescentou.

Os meios da Igreja Católica para superar o vício da pornografia

Evert falou da importância dos sacramentais na luta contra a pornografia. “Borrife seu quarto com água benta, use uma medalha milagrosa, um crucifixo, carregue um terço no bolso. Rezar. Isto é o que deveríamos estar fazendo, o básico”, disse.

Ele reforçou a importância do Santíssimo Sacramento. Receber a eucaristia, disse, é “o maior antídoto” para o vício, porque daí vêm todas as graças necessárias para enfrentar “esta longa jornada”.

“Passar um tempo diante do Santíssimo Sacramento, porque deleitamos os nossos olhos com a luxúria com a pornografia, mas o que nossos olhos realmente precisam é contemplar o Corpo de Cristo, para começar a curar essas memórias”, disse.

“Você pode não sentir que está recebendo todas essas graças, mas é como estar ao ar livre em um dia nublado de verão. Você ainda pode pegar uma insolação, mesmo que não consiga ver o sol”, disse.

Por fim, Evert disse que “não há vergonha em querer ser curado” do vício em pornografia. “Não há vergonha se você é um soldado e está ferido no campo de batalha. Não há vergonha nisso. Vergonha é quando você sai do campo de batalha: 'Eu desisto e saio daqui'”, comentou.

Por isso, recomendou aproximar-se regularmente do sacramento da confissão - especialmente os pais, para que possam dar o exemplo aos filhos - e fazê-lo, na medida do possível, com o mesmo sacerdote, para que ele possa ajudar nas suas lutas. “Estamos todos nas trincheiras lutando e Deus está com vocês nesta batalha”, disse.

*Andrés Henríquez é um jornalista venezuelano especializado em religião e política. Mais de 5 anos de experiência em meios bilingues. É membro da Federação Regnum Christi.

Fonte: https://www.acidigital.com/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF