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sexta-feira, 12 de julho de 2024

O Papa: ouvir as mulheres, que comumente sofrem com a falta de reconhecimento

O Papa com algumas das participantes da assembleia sinodal de outubro de 2023 (ANSA)

Francisco assinou o prefácio de "Mulheres e ministérios na Igreja sinodal", um volume publicado recentemente, escrito pelos cardeais Hollerich e O'Malley e por três teólogas, incluindo a bispa anglicana Wells, que participaram da reunião de fevereiro do C9. "O drama dos abusos forçou a abrir os olhos para a chaga do clericalismo. Não se trata apenas de ministros ordenados, mas de uma forma distorcida de exercer o poder na Igreja, na qual todos podem cair: até mesmo leigos e mulheres".

Vatican News

As mulheres, seu papel e o sofrimento pelo reconhecimento "do que são e do que fazem". Em seguida, os ministérios ordenados, a sinodalidade, o drama dos abusos que abriu os olhos para a "chaga" do clericalismo e o exercício distorcido do poder dentro da Igreja, até mesmo pelos leigos, até mesmo pelas próprias mulheres.

Há todas as questões eclesialmente sensíveis no prefácio que o Papa Francisco assinou para o livro, publicado pelas Paulinas, “Mulheres e ministérios na Igreja sinodal”, um volume escrito por dois cardeais e três teólogas: a irmã salesiana Linda Pocher, professora de Cristologia e Mariologia no Auxilium de Roma (que também assinou a introdução); Jo B. Wells, bispa da Igreja da Inglaterra e subsecretária geral da Comunhão Anglicana; Giuliva Di Berardino, consagrada da Ordo Virginum da Diocese de Verona, liturgista, professora e responsável pelos cursos de espiritualidade e exercícios espirituais. Os dois cardeais são Jean-Claude Hollerich, arcebispo de Luxemburgo e relator geral do Sínodo, e Seán Patrick O'Malley, presidente da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores.

Diálogo entre os autores

Um diálogo, neste caso virtual, ou melhor, "literário", que é, no entanto, o fruto do diálogo real entre os próprios autores e com o Papa e o Conselho de cardeais durante a conhecida reunião do C9 em 5 de fevereiro. Aquela à qual - pela primeira vez desde a instituição do órgão - as três teólogas também foram convidadas pelo Pontífice a participar, a fim de oferecer contribuições e "provocações", como Francisco as define, sobre o tema do "papel feminino na Igreja".

A questão é agora aprofundada nessa nova publicação, datada de 9 de julho, que segue o livro anterior da irmã Linda Pocher e outros autores intitulado "Desmasculinizar a Igreja", tomado emprestado da expressão que Francisco proferiu pela primeira vez em sua audiência à Comissão Teológica Internacional.

Ministérios eclesiais, um tema importante e delicado

No prefácio, publicado na íntegra esta quinta-feira (11/07), pelo L'Osservatore Romano, o Papa desenvolve sua reflexão a partir de uma das principais máximas de seu pontificado: "A realidade é mais importante do que a ideia". É o mesmo princípio - e Francisco diz estar satisfeito com isso - que orienta "o programa proposto pela irmã Pocher para a formação do Conselho de cardeais sobre o tema das mulheres na Igreja, também com relação a um tema tão importante quanto delicado como o dos ministérios na comunidade eclesial".

O drama dos abusos

O tema por trás do qual se encontra "um certo sofrimento das comunidades eclesiais em relação ao modo como o ministério é entendido e vivido não é uma realidade nova", enfatiza o Papa, apontando como "o drama dos abusos nos forçou a abrir os olhos para a chaga do clericalismo, que não diz respeito apenas aos ministros ordenados, mas a um modo distorcido de exercer o poder dentro da Igreja, no qual todos podem cair: até mesmo os leigos, até mesmo as mulheres".

"Ouvir os sofrimentos e as alegrias das mulheres é certamente uma maneira de nos abrirmos para a realidade", diz Francisco. "Ouvindo-as sem julgamentos e sem preconceitos, percebemos que em muitos lugares e em muitas situações elas sofrem justamente pela falta de reconhecimento do que são e do que fazem e também do que poderiam fazer e ser se tivessem o espaço e a oportunidade. As mulheres que mais sofrem são geralmente as mais próximas, as mais disponíveis, preparadas e prontas para servir a Deus e ao seu Reino.

Não sacrificar a realidade no altar das ideias

Portanto, o Papa Francisco nos convida a olhar a realidade mais do que a ideia, para evitar cair na "armadilha" na qual a própria Igreja tropeçou com frequência durante a era moderna. A saber, a de "considerar a fidelidade às ideias mais importante do que a atenção à realidade". "A realidade, no entanto, é sempre maior do que a ideia, e quando nossa teologia cai na armadilha das ideias claras e distintas, ela inevitavelmente se transforma em um leito de Procrustes, que sacrifica a realidade, ou parte dela, no altar da ideia", ressalta o Pontífice. O mérito do volume "Mulheres e ministérios na Igreja sinodal" é, portanto, "não partir da ideia, mas da escuta da realidade, da interpretação sapiencial da experiência das mulheres na Igreja".

O tema das mulheres no Instrumentum Laboris

A questão do papel feminino na Igreja ressurgiu dias atrás com a publicação do Instrumentum laboris da segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo, em outubro. De fato, nos fundamentos do texto-base para o trabalho dos padres e madres sinodais destaca-se "a necessidade de dar um reconhecimento mais pleno" a seus carismas e vocações. As mulheres, diz o texto, "em virtude do Batismo, estão em uma condição de plena igualdade, recebem a mesma efusão de dons do Espírito e são chamadas ao serviço da missão de Cristo". A primeira mudança a ser feita, portanto, "é a de mentalidade", com "uma conversão a uma visão de relacionalidade, interdependência e reciprocidade entre mulheres e homens, que são irmãs e irmãos em Cristo, em vista da missão comum".

Quanto ao tema do diaconato feminino, o cardeal secretário-geral do Sínodo, Mario Grech, na coletiva de imprensa de apresentação do Instrumentum, lembrou que ele não será abordado na próxima Assembleia, pois é objeto de um dos grupos de estudo criados pelo Papa para aprofundar a reflexão teológica e pastoral sobre questões específicas. O tema do diaconato das mulheres Francisco o confiou ao Dicastério para a Doutrina da Fé, no contexto mais amplo das formas ministeriais, em colaboração com a Secretaria Geral do Sínodo. O trabalho, anunciou o documento sobre os grupos de estudo publicado em março, terá como objetivo responder ao desejo da Assembleia sinodal de "um maior reconhecimento e valorização da contribuição das mulheres e um aumento das responsabilidades pastorais confiadas a elas em todas as áreas da vida e da missão da Igreja".

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

São João Gualberto

São João Gualberto (A12)
12 de julho
São João Gualberto

João Gualberto Visdonini nasceu no ano de 995 em Florença, Itália, de pais nobres e cristãos. Seu pai o educou, junto com o irmão mais velho, para saber defender e administrar o patrimônio e a honra da família, como bons cavaleiros, hábeis nas armas e nas palavras. Sua mãe proveu o ensino religioso.

Aconteceu que o irmão foi assassinado, e João jurou vingança. Na Sexta-Feira Santa de 1028 ele encontrou o homicida sozinho e desarmado numa estrada deserta próxima da cidade, e imediatamente puxou da espada. O homem caiu de joelhos e abrindo os braços implorou: “Por amor de Jesus, que neste dia morreu por nós, tem piedade de mim, não me mates!”. Tocado pela misericórdia do Senhor, João largou a espada, desceu do cavalo e o abraçou fraternalmente, perdoando-o.

E saindo dali dirigiu-se diretamente para a igreja de São Miniato, ajoelhando-se diante do crucifixo do altar; consta que a imagem do Cristo inclinou-Se sobre ele, em aprovação, e Dele João ouviu: "Vem e segue-Me". Foi tomado então de grande paz de espírito, e resolveu tudo abandonar para se tornar religioso.

Ingressou no mosteiro beneditino de Florença, vivendo exemplarmente a humildade, a disciplina e o seguimento da santa Regra, na oração e no estudo, na penitência e na caridade. Aprendeu então a ler e escrever – os nobres na época davam mais importância ao conhecimento das armas – e adquiriu os dons da profecia e dos milagres.

Estimado por todos, foi eleito abade em 1305, mas logo renunciou, indignado, descobrindo que o tesoureiro do mosteiro havia subornado o bispo local para a sua escolha. João os denunciou e combateu, mas foi tão ameaçado que saiu do mosteiro.

Mudou-se para uma rústica casa encontrada numa floresta da montanha Vallombrosa, nos Montes Apeninos, seguido por alguns monges. Sua fama de santidade logo atraiu jovens para a vida religiosa, e João fundou novo mosteiro, com as regras beneditinas. O Papa acabou por aprovar a Ordem dos Monges Beneditinos de Vallombrosa, onde João implantou tão respeitado centro de estudos que bispos e sacerdotes vinham de fora para se aprofundar em espiritualidade.

De acordo com a Regra de São Bento, os monges oravam e trabalhavam a terra, plantando para alimentar o mosteiro e inclusive replantando os bosques do local. Por isso são considerados os precursores da agricultura autossustentável. Saíram dali também monges missionários, para evangelizar em Florença e depois em muitas outras cidades italianas, com a construção de novos mosteiros em por exemplo Passignano, na Úmbria.

Foi neste último que João Gualberto faleceu, em 12 de julho de 1073, sendo considerado o herói do perdão.

Os monges da sua fundação tornaram-se, nos séculos seguintes, especialistas em Botânica, e assim convidados para criar a Cátedra de Botânica da reconhecida Universidade de Pávia. Já outras universidades famosas como as de Roma, Pádua e Londres buscavam nos seus mosteiros os seus mestres para essa matéria. Desse modo, o Papa Pio XII declarou São João Gualberto o padroeiro da Engenharia Florestal.

Colaboração: José Duarte de Barros Filho

Reflexão:

São João Gualberto é um típico monge e santo beneditino, vivendo exemplarmente a sua Regra, fundando mosteiros, levando espiritualidade, cultura, trabalho e paz – “tranquilidade na ordem” – a se fixarem em novos locais de evangelização. Em comum com São Bento, fundador da Ordem, foi perseguido pelos próprios monges e teve que se mudar de mosteiro. Mas destas provações a Providência divina espalhou mais longe a semente do apostolado. Por isso devemos entender que as dificuldades que Deus permite que passemos, mesmo as muito sérias, nada mais são do que os passos necessários pelos quais nos conduz a Ele. Agradeçamos sinceramente por elas, com serenidade e confiança no Seu desejo do nosso bem, o verdadeiro Bem que é a Salvação e que só teremos carregando – com Ele – a nossa cruz.

Oração:

Senhor, que nos perdoastes na Paixão e Ressurreição do Vosso Filho, concedei-nos por intercessão de São João Gualberto a graça de rejeitar energicamente os favorecimentos ilícitos e outras tentações egoístas, como a vingança covarde; e não recusemos o trabalho de cultivar a Verdade, de modo a que floresça em nossa alma a árvore que dá bons frutos, aquela que forneceu o Madeiro da Cruz, de onde, pregados ao Salvador, podemos pedir a Vós: “Perdoai as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tenha ofendido”. Por Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora. Amém.

 Fonte: https://www.a12.com/

quinta-feira, 11 de julho de 2024

A avareza: um vício capital que enfraquece a alma

A avareza (Aleteia)

A AVAREZA: UM VÍCIO CAPITAL QUE ENFRAQUECE A ALMA

Dom João Santos Cardoso 
Arcebispo de Natal (RN)

No Catecismo da Igreja Católica (n. 1866), a avareza se encontra entre os sete pecados capitais. Ela é um pecado que se opõe à liberalidade e é considerado um dos vícios capitais porque gera outros pecados e vícios. Hugo de São Victor, em sua obra “Os cinco setenários”, explica que os vícios capitais são doenças que enfraquecem a alma. Ele coloca a avareza em quinto lugar, descrevendo-a como o vício que “joga o homem no chão”. Despojado pela soberba, inveja, ira e tristeza, o homem busca consolo exteriormente por meio da acumulação de bens. 

Na Suma Teológica, Santo Tomás de Aquino discute a avareza de maneira detalhada e conclui que a avareza é um pecado porque representa o desejo imoderado de possuir bens materiais, excedendo a medida necessária para a vida humana. Para Santo Tomás, a avareza se opõe à liberalidade, virtude que modera nossos desejos e afetos em relação às riquezas, ensinando-nos a usar nossos bens de maneira justa e generosa. Segundo ele, a avareza é um pecado especial porque representa um desejo excessivo e desordenado de possuir bens materiais, superando a medida necessária para a vida humana. A avareza pode ser tanto um pecado mortal quanto venial, dependendo da intensidade do desejo e das ações resultantes desse desejo. 

Em sua Catequese na Audiência Geral de 24/01/2024, o Papa Francisco destaca que a avareza não é apenas uma questão de dinheiro, mas uma doença do coração que afeta pessoas de todas as classes sociais. Ele observa que a avareza impede a generosidade e cria uma relação doentia com os bens materiais, comparando esse apego ao comportamento infantil de se agarrar a brinquedos. Para curar essa doença, o Papa recomenda a meditação sobre a morte, lembrando-nos de que não podemos levar nossos bens conosco após a morte e que devemos focar em acumular tesouros no céu. 

A avareza é um vício capital que leva à busca desenfreada por bens materiais, impedindo a prática da generosidade e do amor ao próximo. Aprender com Jesus que “a vida de alguém não consiste na abundância dos bens que possui” (Lc 12,15) é fundamental para superar a avareza. 

O Rico Avarento da parábola contada por Jesus (Lc 12,13-21) passou a vida acumulando riquezas e, ao alcançar sua meta, acreditava que poderia finalmente usufruir delas. No entanto, morreu naquela mesma noite, sem aproveitar o que acumulou, deixando tudo para outros que deles irão desfrutar. A avareza é o mais estúpido dos vícios capitais, pois impede o avarento de desfrutar do poder de suas posses, uma vez que ele tem medo de se utilizar do seu dinheiro, vendo o uso dele como gasto e perda. Ele transforma o dinheiro em um fim em si mesmo, vivendo em constante angústia de perder o que possui e, com isso, não desfruta do bem-estar e prazeres que o dinheiro pode proporcionar. O avarento acredita que o dinheiro lhe dá poder absoluto, mas esse poder nunca se concretiza. Ele evita usar seus bens como meios para uma vida feliz e generosa, vivendo uma vida vazia. A realização humana, conforme ensinado por Jesus, não reside na acumulação de bens materiais: “O homem não vive somente de pão, mas de toda Palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4, 4). A verdadeira realização humana está em seguir a palavra de Deus e viver uma vida de generosidade e desapego material. 

Combater a avareza requer uma mudança de coração e de atitude em relação aos bens materiais.  Hugo de São Victor destaca a importância de buscar consolo não na acumulação de bens, mas na prática das virtudes e na relação com Deus. Encorajar a liberalidade, meditar sobre a mortalidade e focar na acumulação de tesouros espirituais são passos essenciais para superar esse vício capital. Assim, podemos viver uma vida mais plena, focada no que realmente importa: nossa relação com Deus e com o próximo. A verdadeira riqueza não está na acumulação de bens materiais, mas na capacidade de viver uma vida de generosidade, amor e serviço. Seguir os ensinamentos de Jesus e a sabedoria dos santos nos ajuda a encontrar a realização verdadeira e a viver de acordo com a vontade de Deus. 

 Fonte: https://www.cnbb.org.br/

NAZARENO: Trinta denários (o coração de Judas) - (49)

Nazareno (Vatican News)

Cap. 49 - Trinta denários (o coração de Judas)

Trinta denários (o coração de Judas)

Naquelas horas um dos apóstolos ficava cada vez mais inquieto. Sonhara acordado em ver finalmente o Filho do Homem coroado rei, esperava que o messias usasse seu poder para se impor às multidões e acabar com o domínio romano. Judas Iscariotes percebeu que faltava um passo decisivo do Nazareno. Em vez de se converter ao Mestre, ele ainda esperava converter Jesus ao ideal político e messiânico do libertador que finalmente expulsaria os romanos. Algo se rompe no coração de Judas. Sente-se dominado por um estranho frenesi. Jesus despertara enormes esperanças, era necessário forçar os acontecimentos, forçá-lo a se manifestar em todo o esplendor de sua grandeza e poder. Ele tinha de ser pressionado. Para isso, decidiu traí-lo, facilitando a sua captura.

Na manhã da quarta-feira, 5 de abril daquele ano 30, ao amanhecer, Iscariotes entrou secretamente pela porta do palácio dos sumos sacerdotes. Pediu e foi recebido. E disse: “O que me dareis se eu o entregar?”. Fixaram-lhe, então, a quantia de trinta moedas de prata. E a partir disso, ele procurava uma oportunidade para entregá-lo.

Ele retorna com os outros discípulos e, durante todo o dia, não abre a bolsa para contar as moedas recebidas dos sacerdotes. O preço da traição.

A noite de quarta-feira passa aparentemente tranquila, mas há uma estranha atmosfera de expectativa que vai muito além da espera para a celebração da festa que se aproxima.

Quinta-feira, 6 de abril, veio o dia dos Ázimos, quando devia ser imolada a Páscoa. Para celebrar solenemente a festa, eles teriam que parar na Cidade Santa, sem poder voltar a Betânia, no Monte das Oliveiras. Jesus então enviou Pedro e João dizendo: “Ide preparar-nos a Páscoa para comermos”. Perguntaram-lhe: “Onde queres que a preparemos?”. Respondeu-lhes: “Logo que entrardes na cidade, encontrareis um homem levando uma bilha de água. Segui-o até a casa onde ele entrar. Direis ao dono da casa: ‘O Mestre te pergunta: onde está a sala em que comerei a Páscoa com os meus discípulos?’. E ele vos mostrará, no andar superior, uma grande sala, provida de almofadas; preparai ali”.

Os dois apóstolos entram em Jerusalém pela porta que se abre perto do tanque de Siloé e lá encontram um homem segurando uma grande bilha. Eles ficam novamente surpresos com a exatidão com que Jesus descreveu aquela cena.

https://media.vaticannews.va/media/audio/s1/2024/07/09/15/138119669_F138119669.mp3

 Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

São Bento de Nórcia

São Bento de Nórcia ( A12)
11 de julho
São Bento de Nórcia

A principal fonte sobre a vida de São Bento é o livro II dos “Diálogos” de São Gregório Magno, totalmente dedicado a ele. Bento nasceu por vota do ano 480 em Núrcia (Norcia, em Italiano), província de Perúgia, região da Úmbria na Itália central. Tinha uma irmã gêmea, Escolástica, também canonizada. Os pais provavelmente tinham boa condição social e financeira, e por isso Bento teve a oportunidade de ir estudar em Roma.

A época era difícil, de decadência, desagregação e confusão, pois todo o território do antigo Império Romano ainda sofria com as sucessivas invasões de variados povos bárbaros. Roma apresentava desorganização e mediocridade moral. Também na Igreja a situação era difícil, incluindo um cisma de três anos após a morte do Papa Anastácio II em 498, que foi seguida pela disputa entre Símaco, Papa legítimo, e Lourenço, antipapa. Neste ambiente, corrompido por barbárie e antiga cultura decante, ficou evidente para Bento que seus desejos de busca elevada e sobrenatural não poderiam ser alcançados.

De fato, mesmo moço, já tinha a personalidade sedimentada numa profunda maturidade: assim São Gregório se refere a ele, “Houve um varão de vida venerável, bento por graça e por nome, dotado desde sua mais tenra infância de uma cordura de ancião. Com efeito, antecipando-se por seus costumes à idade, jamais entregou seu espírito a qualquer prazer (…), desprezou o mundo com suas flores, como se estivessem murchas”.

Portanto abandonou os bens, a casa e os estudos, escolhendo viver na erma aldeia de Efide (atual Affile), a aproximadamente 50 km de Roma, nas montanhas de Sabina, em recolhimento e oração. Sua antiga governanta não se quis separar dele e o acompanhou, servindo-o nos afazeres domésticos.

Veio a ocorrer que esta mulher, por descuido, deixou cair e quebrar uma jarra de argila emprestada de uma vizinha. Bento a encontrou chorando pelo acontecido, e, compadecido, juntou os pedaços e rezou sobre eles, que se reconstituíram de forma perfeita. Este foi o primeiro milagre por sua intercessão, que logo lhe trouxe muita fama e popularidade; ele, que “desejava mais os desprezos que os louvores deste mundo” (São Gregório Magno), retirou-se, agora sozinho, para as montanhas de Subíaco.

Ali, por volta de 505, refugiou-se numa gruta, tendo antes encontrado com um monge chamado Romão (ou Romano) de um mosteiro próximo. Romão o ajudou baixando diariamente, por uma corda, o pão que durante certo tempo foi o único alimento do jovem eremita; também forneceu a Bento um hábito monástico.

Durante três anos, entregue à direção do Espírito Santo, viveu Bento, sofrendo muito as tentações do diabo. Em relação à pureza, em ocasião particularmente intensa, encontrou como recurso o expediente de, para não fraquejar, retirar as vestes e atirar-se nu nas moitas de espinhos e urtigas, nas quais arrastou-se, de modo que todo o corpo ficou ferido, e a dor substituiu o desejo. Depois do episódio, não mais foi tentado pela luxúria.

Estando com cerca de 30 anos, a comunidade de um mosteiro próximo, em Vicaro, insistiu para que ele se tornasse o abade. Estes monges, tíbios e insinceros, logo se arrependeram, pois Bento os queria conduzir para a perfeição, através da observância estrita da regra monástica e do dever, o que não desejavam; decidiram então matá-lo, colocando veneno no seu vinho.

Ao abençoar Bento a bebida, com o sinal da Cruz, o recipiente se quebrou, e o santo abade descobriu as suas intenções. Abandonando o mosteiro, Bento voltou para a sua gruta (conhecida depois como Sacro Speco, “gruta sagrada”, e que foi protegida para preservação com a construção do Mosteiro de São Bento na montanha de Subíaco).

Mesmo na solidão a sua fama de santidade se espalhou, e surgiram discípulos em número crescente. De Roma chegavam nobres varões, e filhos de muitos patrícios desejosos de que Bento os ensinasse e formasse. Entre eles estavam por exemplo os futuros São Mauro e São Plácido, importantíssimos na História da Ordem e da Igreja. Houve a necessidade de Bento fundar 12 mosteiros nas proximidades, no vale do rio Aniene, cada qual com 12 monges dirigidos por um abade sob sua supervisão.

Na prática, estava fundada assim a Ordem Beneditina. Em paz e harmonia, dedicando-se à oração e ao trabalho, a comunidade prosperava, e os milagres, a doutrina e santidade de Bento despertavam numerosas vocações.

Muitos foram os milagres de São Bento ali. Curou doentes, salvou pessoas de perigos, expulsou demônios, fez um monge andar sobre as águas, ressuscitou um menino morto. Um dos mais famosos foi ter feito brotar água de um ponto alto na montanha, para abastecer três dos mosteiros, cujos monges tinham grande dificuldade em subir e descer para consegui-la.

A fonte permanece abundante até hoje. Bento recebeu também o dom de saber o que se passava com os seus filhos espirituais, sem vê-los, à distância; assim pôde corrigir, por exemplo, dois monges que indevidamente tinham bebido e comido fora do mosteiro, e outro que, também indevidamente, aceitara um presente das monjas de um mosteiro próximo, ao qual Bento lhe mandara dar assistência espiritual.

Como é comum, tais maravilhas despertam inveja, e o pároco de uma igreja nas vizinhanças de Subíaco, de nome Florêncio, iniciou uma campanha de difamação dos beneditinos e seu abade, procurando afastar deles as pessoas. Não tendo sucesso, presenteou São Bento com um pão envenenado. Ora, todo dia o santo oferecia pão a um corvo que vinha na hora da refeição.

Bento ordenou-lhe que levasse o pão envenenado para longe, onde não pudesse fazer mal a ninguém, e assim aconteceu. Florêncio então tentou corromper os outros monges, fazendo entrar no quintal do mosteiro sete moças nuas para despertar a sua luxúria. Bento, sabendo que era ele próprio o motivo desta perseguição, resolveu ir embora com alguns poucos irmãos, depois de organizar a direção da comunidade. Florêncio contemplava satisfeito a partida do abade, sobre um terraço, quando só esta parte da construção ruiu, e o matou… São Bento, avisado, chorou pelo inimigo. A data aproximada era 529.

Bento chegou com seus companheiros a Cassinum, uma antiga vila fortificada romana, entre Roma e Nápoles. Reformando a fortaleza e o antigo templo pagão do lugar, transformou-os na célebre Abadia de Monte Cassino, de onde a Ordem Beneditina se espalhou por toda a Europa. Realmente foi a sua influência de comunidade verdadeiramente católica, de governo sábio e organizado, baseado nas diretrizes do Evangelho, que se tornou o exemplo iluminado para os costumes espirituais e materiais, tanto no âmbito público como no privado, de toda uma época, sendo igualmente referência para todos os tempos.

Um dos aspectos essenciais deste sucesso é a famosíssima Regra que São Bento aí escreveu (ao menos na sua redação atual) para os seus monges, um farol de sensatez, equilíbrio e sabedoria espiritual e prática, que permite “aos fortes progredirem a aos fracos não desanimarem”. É uma leitura obrigatória para todo católico, religioso ou leigo, que queira aprofundar e desenvolver a sua vida espiritual, sob o benefício da equidade.

Como esclarece o erudito bispo e teólogo Bossuet, do século XVII, a Regra de São Bento é “uma suma de cristianismo, um douto compêndio de toda a doutrina do Evangelho, de todas as instituições dos Santos Padres, de todos os conselhos de perfeição. Nela sobressaem eminentemente a prudência e a simplicidade, a humildade e o valor, a severidade e a mansidão, a liberdade e a dependência; nela a correção desdobra todo o seu vigor, a condescendência todo o seu atrativo, a autoridade a sua robustez, a sujeição a sua tranqüilidade, o silêncio a sua gravidade, a palavra as suas graças, a força o seu exercício, e a debilidade o seu sustentáculo”.

O seu objetivo é afastar do coração humano as trivialidades, facilitando a alma a elevar-se sem obstáculos a Deus, serena e permanentemente focando na vida infinita do Paraíso, e o seu modus operandi é o conhecido aforismo Ora et Labora, “reza e trabalha”, que harmoniza – na ordem certa – as atividades vitais do ser humano, a oração e a ação.

A obra civilizadora de São Bento e sua Regra foram a resposta de Deus ao caos do período, trazendo obediência e beleza, cultura e espiritualidade – os fundamentos da vida humana comunitária – para as sociedades medievais e posteriores.

Monte Cassino e São Bento passaram a ser procurados e visitados por bispos, abades, reis, príncipes, nobres, pessoas comuns, em busca de conselho, conforto, orientação e aprendizado. Da mesma forma, posteriormente, outros mosteiros beneditinos passaram a ser o centro de núcleos de civilização e progresso, em torno dos quais os países europeus fixaram as bases do seu desenvolvimento, que só é possível com paz e estabilidade.

Santa Escolástica, irmã gêmea de São Bento, promoveu o desenvolvimento do ramo feminino da Ordem. Encontravam-se anualmente numa casa pertencente ao mosteiro de Monte Cassino, relativamente próxima do mosteiro feminino. No ano de 547, sabendo que sua morte estava próxima, e tendo passado como sempre aquela data especial em elevada conversação com o irmão, Escolástica pediu que ele ali ficasse e tivessem ainda a noite para falar das coisas de Deus. Bento recusou energicamente, pois disciplinadamente queria passar a noite no mosteiro.

Ela então abaixou a cabeça, rezando por alguns momentos, e quando a ergueu de novo o tempo, límpido, transformou-se numa tempestade tão absurdamente violenta que água e raios impediam completamente que o abade e seus poucos monges acompanhantes saíssem da casa.

“— Que Deus Todo-Poderoso te perdoe, irmã! O que fizeste?

— Supliquei a ti e não quiseste atender-me. Roguei ao meu Senhor e Ele me ouviu. Agora sai, se podes, e regressa ao mosteiro…”

São Bento entendeu, e passaram a noite em vigília. Três dias depois, ele viu a alma da irmã, sob a forma de pomba, subir ao Paraíso. Mandou recolher o seu corpo e o sepultou no local que havia aprontado para si. Bento faleceu provavelmente no mesmo ano, 547, em 21 de março.

Tendo conhecimento do que ia acontecer, mandou preparar a sepultura ao lado da irmã com seis dias de antecedência. Logo foi tomado de febre, com a condição piorando rapidamente. No dia previsto, fez questão de ser levado ao oratório, onde, apoiado nos braços dos irmãos, recebeu a Santíssima Comunhão e morreu, de pé, com a alma erguida diante do Senhor.

Após sua morte, a Ordem Beneditina continuou a crescer, especialmente a partir da Abadia de Cluny, na França do século X: chegaram estar subordinados a ela 17 mil mosteiros. Nações inteiras foram convertidas ao Catolicismo sob a influência beneditina; muitas e famosas universidades, como Paris, Cambridge, Bolonha, Oviedo, Salamanca e Salzburgo tiveram origem a partir de colégios beneditinos; mais de 30 Papas adotaram sua Regra; incontáveis mártires, cardeais, bispos, santos, discípulos, partilharam e partilham desta espiritualidade.

São Bento é o Fundador e Patriarca do monaquismo do Ocidente, e primeiro Patrono da Europa, atualmente junto com santos Metódio e Cirilo e santas Brígida, Catarina de Sena e Tereza Benedita da Cruz.

 Colaboração: José Duarte de Barros Filho

Reflexão:

Absolutamente notável é a vida e a figura de São Bento, bem como a sua obra. Claro, muitos são os santos que tiveram vidas e missões particularmente excepcionais, e também com obras imensas. O alcance do que fez e o legado que deixou é que o torna um destaque mesmo entre eles. O equilíbrio da Regra Beneditina, de profundíssima espiritualidade a par com um bom senso “divinamente humano”, e uma praticidade chã e elevada ao mesmo tempo a torna verdadeiramente acessível a potencialmente qualquer um, religioso ou leigo. É uma receita de santidade palpável e universal, uma solução direta às aspirações do “como viver”, e bem, do ser humano. Tem, neste sentido, a catolicidade da própria Igreja. Sua própria vida incluiu harmoniosamente milagres estrondosos e a mais normal rotina de oração, trabalho, estudo, lazer e descanso, dando exemplo da maior elevação espiritual em todos os aspectos que compõem a vida humana, de forma simples e realmente praticável, tanto individual quanto comunitariamente. Isto de fato é tão inusitado quanto grandioso: as vidas e obras de outros gigantes de santidade não apresentam todos estes aspectos juntos. São conhecidos muitos que passaram por exemplo por experiências, místicas ou humanas, de exigência extrema, grandes taumaturgos, grandes doutores, grandes missionários, grandes penitentes…uma lista incontável; mas o aspecto individualíssimo das suas vivências, situações e desdobramentos na vida dos povos e da Igreja, principalmente considerando todos os aspectos em conjunto, não abarca ou pode incluir na sua proposta de santidade um número tão grande de almas como é possível pela espiritualidade beneditina. Não quer dizer que todos tenham gosto, propensão, vocação específica para ela, mas sim que ela pode de alguma forma ser praticada por qualquer um, porque é maleável o suficiente para se adaptar a circunstâncias diferentes, sem perder o conteúdo. Traz sempre um equilíbrio acessível. E isto, em outras palavras, é possibilitar que se torne individual a salvação universal de Cristo, num mesmo âmbito de comunhão: a própria essência da unidade na diversidade desejada pela Igreja.

Oração:

“Escuta, filho, os preceitos do mestre, e inclina o ouvido do teu coração; recebe de boa vontade e executa eficazmente o conselho de um bom pai para que voltes, pelo labor da obediência, Àquele de Quem te afastaste pela desídia da desobediência. A ti, pois, se dirige agora a minha palavra, quem quer que sejas que, renunciando às próprias vontades, empunhas as gloriosas e poderosíssimas armas da obediência para militar sob o Cristo Senhor, verdadeiro Rei” (Início do Prólogo da Regra de São Bento). Ó Deus de amor e sabedoria, concedei-nos que, por intercessão de São Bento, como ele reformemos a dura fortaleza e antigo templo mundano da nossa própria alma, pela vivência humilde da regra de Salvação que nos destes na Palavra da Vossa Igreja, ouvindo e obedecendo ao Mestre a Quem queremos voltar. Por Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora. Amém.

 Fonte: https://www.a12.com/

quarta-feira, 10 de julho de 2024

As lições da experiência de um acampamento

Acampamento (Crédito: Revista Direcional Escola)

AS LIÇÕES DA EXPERIÊNCIA DE UM ACAMPAMENTO

Dom Antônio de Assis
Bispo auxiliar de Belém do Pará (PA)

De modo geral, a experiência dos acampamentos juvenis, de caráter pastoral, gera uma profunda atração nos jovens; para que possamos compreender esse fenômeno é necessário considerarmos a realidade que vivem milhões de jovens atualmente, sobretudo no contexto urbano das grandes cidades.   

Os jovens urbanos, respeitando a variedade de contextos, estão de modo geral, cada vez mais confinados em suas estruturas domésticas e tem pouca experiência de amizades e interação social; sentem-se movidos pela forte atração e ou dependência tecnológica, que os levam ao distanciamento do divertimento coletivo e a viverem uma vida artificializada, distantes da natureza. Sentem forte estresse nas relações familiares, oprimidos para terem bons resultados nos estudos e muitos vivem solitários na família. Fenômenos como a drogadição, a automutilação, o vazio existencial, a criminalidade são consequências de muitos fatores. No último acampamento do qual participei um jovem me disse: “isto para mim é uma espécie de experiência de paraíso!”  

 Os jovens e a experiência do acampamento  

O Setor Juventude da Arquidiocese de Belém promoveu o III Acampamento Juvenil Arquidiocesano nos dias 04-07 de julho (2024) para jovens de 15 a 29 anos. Vale a pena recordarmos os números dos participantes e refletir sobre eles: no I Acampamento (2022) participaram 470 jovens; no II 1170 e no III 1672. Essa significativa expressão numérica crescente nos convida à reflexão. Uma pergunta é inevitável: por que os jovens gostam desse tipo de evento?  

Antes de tudo, porque eles estão de férias; isso significa que o dinamismo da pastoral juvenil deve levar em conta também a disponibilidade de tempo dos jovens; o tempo de férias dos jovens nos oferece a possibilidade da pastoral juvenil planejar e oferecer-lhes atividades pastorais extraordinárias. Em muitos ambientes décadas atrás, era comum a promoção das colônias de férias; houve uma crise dessas atividades, mas se sente hoje a necessidade da reproposição delas. A sensibilidade pastoral e pedagógica da catequese deve também saber servir-se dos tempos de férias das crianças e dos adolescentes. 

Os jovens gostam da experiência do acampamento porque a sua programação não está presa à rotina do cotidiano, mas lhes oferece experiências extraordinárias de novas aprendizagens através de atividades festivas, lúdicas, esportivas, culturais, religiosas; a atratividade dos acampamentos nos fala da necessidade de levarmos em conta a sensibilidade juvenil nas nossas propostas pastorais; isso se refere à linguagem, modos de relacionamento, tempos de atenção, ambientes educativos… A psicologia juvenil exige da pastoral juvenil uma visão mais aberta, dinâmicas criativas, metodologias ativas e envolventes, encontro com a natureza; gostam porque os jovens apreciam o desafio da adaptabilidade, da ação conjunta e competitiva e estão abertos a aprendizagem através de novas experiências.  

 Interessantes referências bíblicas 

Na Bíblia encontramos muitas referências sobre acampamentos; de modo particular encontramos duas categorias: há os acampamentos estratégicos enquanto agrupamento de combatentes em tempos de guerra e os acampamentos enquanto ambiente de convivência de um processo de deslocamento e libertação. Assim Abraão respondendo positivamente ao chamado de Deus, pôs-se a caminho rumo a Terra Prometida, parando “de acampamento em acampamento” (cf. Gn 12,9). Essa mesma dinâmica encontramos também no processo de saída do Egito. O processo libertário após a travessia do Mar Vermelho aconteceu também através de etapas, passo a passo, pouco a pouco, de acampamento em acampamento, atravessando territórios; algumas vezes na amizade com povos diferentes, outras vezes em graves conflitos.  

A experiência do acampamento com as tendas no deserto, são metáforas da nossa existência humana, porque movidos pela fé, estamos em busca da pátria eterna. Neste mundo tudo é provisório e, por isso, não temos estruturas definitivas, mas somente tendas. A imagem da tenda e do acampamento nos chama a atenção para a consciência da provisoriedade da vida neste mundo e para a necessidade do olhar para frente porque estamos caminhando e não devemos nos apegar a nada que nos impeça de chegar ao santuário celeste nossa pátria definitiva. De fato, é isso que nos diz a Carta aos Hebreus: movidos pela fé, confessamos que somos estrangeiros e peregrinos sobre a terra e estamos a caminho da nossa pátria definitiva (cf. Hb 11,13-14). Estamos acampados neste mundo e a qualquer momento nossa tenda pode ser desfeita! 

O acampamento nos apresenta a ideia de que a nossa vida de fé não é uma corrida imediatista, instantânea, isolada, mas é uma experiência comunitária, que implica fases e processo de amadurecimento com seus desafios, tentações, conquistas, conflitos e perdas. No deserto, apesar da grande preocupação de Moisés e seus colaboradores com a higiene física, moral e religiosa dos acampamentos, também neles aconteciam coisas desagradáveis (cf. Ex 32; Nm 14-16). No acampamento aparecem também as marcas das fragilidades humanas como em toda comunidade, sociedade e instituição. Em todas as dinâmicas humanas o “joio e o trigo” estão sempre presentes (cf. Mt 13,24-30).  

Mas o acampamento era sobretudo, lugar da experiência de Deus (cf. Gn 32,3; Dt 23,15); acompanhando os homens o acampamento se torna também a casa de Deus, ambiente das suas múltiplas manifestações. O acampamento é espaço no qual se manifesta a generosa bondade da Providência Divina que conforta, fortalece, alimenta o seu povo (cf.  Ex 16,13; Nm 11,9). O acampamento também é lugar de convocação, de chamada vocacional, de serviço e também de espaço para profecias (cf. Nm 11,26-27); o acampamento é lugar da experiência da convivência fraterna e da santidade (cf. Dt 23,15).  

O sentido bíblico do acampamento nos convida a pensar na vida de fé como peregrinação, processos, caminhada, desenvolvimento, esforço virtuoso para superar limitações e as tentações do estacionamento; o sentido bíblico do acampamento nos estimula a crescer na virtude da adaptabilidade encarando desafios, abraçando sacrifícios, acolhendo o novo, cultivando o otimismo, conservando a liberdade, reforçando a vida fraterna. 

Algumas questões importantes

A experiência da participação dos jovens no III Acampamento Juvenil Arquidiocesano (Belém) foi muito bem avaliado por seus participantes, colaboradores e nos ofereceu alguns dados dignos de reflexões para a pastoral juvenil.   

·         A qualidade de um evento pastoral depende primordialmente da seriedade e da clareza do seu projeto e da sintonia de todos os seus colaboradores envolvidos; 

·         Não basta assegurar a qualidade técnica de um evento pastoral é necessário que haja uma forte dimensão socioafetiva, motivação, diversidade de conteúdos e experiências, leveza na programação, articulação de lideranças, ousadia pedagógico-pastoral;  

·         Não basta movimentos, é necessário dar tempo para a escuta, meditação e oração, por isso é de extrema importância a disponibilidade do maior número possível de confessores e orientadores (psicólogos) antenados com a psicologia juvenil; o acampamento também é espaço para a experiência da orientação espiritual, do discernimento moral, de tomadas de decisão, conversão, provocação vocacional, estímulo ao sentido da vida. 

·         É bom que o acampamento seja uma experiência aberta a todos e não somente para os bonzinhos, porque tem como finalidade a promoção da formação humana e da evangelização; essa abertura propicia a participação de jovens de outras Igrejas e são muitos os jovens evangélicos que estão buscando amparo na Igreja Católica em processo de conversão.  

PARA A REFLEXÃO PESSOAL: 

Você já participou de algum acampamento, como foi a experiência? 

Por que, muitas vezes, temos medo de ousar pastoralmente? 

Como podemos crescer na propositividade pastoral em relação ao tempo de férias do nossos adolescentes e jovens?  

 Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF