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quarta-feira, 4 de setembro de 2024

A virgindade de Maria: um teólogo?

A Anunciação , Beato Angélico, Museo del Prado, Madrid (à esquerda está representada a expulsão de Adão e Eva do Paraíso terrestre) | 30Giorni

Arquivo 30Giorni – 09/2009

A virgindade de Maria: um teólogo?

por Ignace de la Potterie

Em 392 realizou-se em Cápua um Concílio do qual também participou Santo Ambrósio. Foi proclamado para condenar solenemente um bispo que negou a virgindade perpétua de Maria. Hoje, mil e seiscentos anos depois, a mesma dúvida insinua-se sorrateiramente no corpo eclesiástico. Sem que o povo católico, e muitas vezes nem mesmo os seus guias teológicos, perceba o que está acontecendo.

Na realidade, esta concepção herética recuperou o fôlego já há cento e cinquenta anos, como consequência do famoso contraste entre o Jesus histórico e o Cristo da fé. Mas até agora permaneceu limitado aos círculos protestantes. Na verdade, os teólogos da famosa Escola de Tübingen foram protestantes, os primeiros a formulá-la. E no arquivo de Tübingen há um documento que mostra qual era o seu objetivo, que já foi declarado diversas vezes nas obras oficiais: se é possível quebrar todos os elos entre o que viveram os primeiros discípulos de Jesus e a história posterior que veio deles até nós – lemos – está aberto o caminho para reduzir o Evangelho a um “mitólogo”.

Esta concepção do Evangelho como mito foi retomada neste século, novamente em ambiente protestante, pela chamada escola Formgeschichte cujos dois fundadores são Rudolf Bultmann e Martin Dibelius. E foi o próprio Dibelius quem, num texto de 1932, usou pela primeira vez o termo “teólogo”.

Era um artigo sobre a concepção virginal de Maria, no qual Dibelius explicava que “teologumen” é uma teoria teológica que nada tem a ver com acontecimentos históricos. Os Evangelhos, segundo o Formgeschichte, não são livros históricos, mas falam de acontecimentos que, sob a influência da história das religiões, foram mitificados.

Esta tese, infelizmente, ainda é extraordinariamente atual. Apenas uma coisa mudou desde os tempos da Escola de Tübingen e do Formgeschichte : surpreendentemente, aqueles que hoje falam da concepção virginal de Maria e da ressurreição como “teologumen” são muitas vezes autores católicos!

O fenômeno começou imediatamente após o fim do Concílio Vaticano II com o famoso Catecismo Holandêsde 1966. É verdade que ali não se usa a palavra “teologumen”, mas lemos que a narração evangélica da concepção virginal significa apenas que Cristo é o dom de Deus à humanidade: ele é “inteiramente” concebido pelo Espírito Santo "". Mas então, ele não “nasceu mais da Virgem Maria”?

Esta tese foi posteriormente retomada por Edward Schillebeeckx, Raymond Brown e muitos outros autores até hoje. Muitos sustentam que o nascimento de Jesus, que ocorreu dentro de um casamento normal, foi então mitificado. Jesus é teologicamente o Filho de Deus, mas fisicamente é filho de José.

Na família católica, não é apenas o teólogo da moda Eugen Drewermann que afirma que as histórias de Lucas e Mateus sobre a concepção de Maria remontam aos mitos orientais, particularmente egípcios. O teólogo espanhol Xabier Pikaza afirma: «O “teologumen” é um fato primordial exclusivamente teológico. As leis naturais seguiram o seu curso, José manteve relações conjugais com Maria, mas através deste contato inter-humano [!] a mão poderosa de Deus se atualizou de tal forma que o aparecimento do filho foi, em última análise, a implementação definitiva do espírito divino, o gênese primordial do filho de Deus”. O que significa essa linguagem ambígua?

A Natividade , Beato Angélico, Museu de San Marco, Florença | 30Giorni

Muitos teólogos católicos concordam com Drewermann e Pikaza. Eles não querem aceitar a historicidade da história do Evangelho. No entanto, nenhum deles tem a capacidade real de levar a reflexão crítica até ao fim, perguntando de onde vem este “mito” e o que este “teologumen” pode ter sido historicamente. Porque é importante notar que não há absolutamente nenhum exemplo entre os mitos pagãos de uma mulher concebendo virginalmente. E como poderia uma pobre jovem judia, num casamento normal, ter a pretensão, só ela em toda a história da humanidade, de ter concebido o Filho de Deus? Isso só pode fazer sentido se for um evento real.

Hoje, porém, não é apenas a concepção virginal de Maria que cai sob o machado dos teólogos que querem reduzir o Evangelho a “teologumen”. Até a ressurreição corporal de Jesus é reduzida a um simples mito. E talvez não seja por acaso que sejam questionados o próprio início e o fim da vida de Cristo, isto é, os dois pólos sobre os quais assenta a encarnação. Estes são dogmas fundamentais da Igreja Católica, mas estes exegetas modernos não querem levar em conta a Tradição. Eles estabelecem uma ruptura clara e decisiva entre história e fé. E quais são as consequências? O teólogo alemão Karl Hermann Schelkle explica-lhe: «Se a teologia católica interpretasse a concepção virginal como um “teologumen”, teríamos que mudar muitas coisas na Igreja. O tema da inerrância da Bíblia, da infalibilidade da Igreja deveria ser reformulado, a consciência dos fiéis e a própria doutrina mariológica deveriam ser mudadas" (1) .

Somente um julgamento negativo pode ser dado a esta teoria do “teologumen”. Mas é certamente inegável que os próprios evangelistas acreditavam que a concepção virginal era um facto histórico (ver Lucas 3:23). E teriam ficado chocados ao ver as tentativas que alguns teólogos “católicos” fazem hoje para naturalizar a encarnação. 

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1 KH Schelkle, Theologie des Neuen Testaments , II, Patmos Verlag, Düsseldorf 1973, p. 182.

 Fonte: http://www.30giorni.it/

Rezar pelo grito da Terra!

Rezar pelo grito da Terra! (Vatican News)

Rezar pelo grito da Terra!

Dom Roberto Francisco Ferreria Paz
Bispo diocesano de Campos

Com esta intenção do Papa para o mês de setembro introduzimos o denominado Tempo de Oração pelo Cuidado da Criação. Esta experiência espiritual iniciou-se pela Igreja Ordodoxa em 1985, paulatinamente foram se unindo várias Igrejas Cristãs a iniciativa e o Papa Francisco aderiu em 2015. Este ano vem com o tema para o Dia mundial de Oração que abre o Tempo de Cuidado pela Criação:

“Espera e age com a Criação”. Inspirado na Carta de São Paulo aos Romanos que esclarece o profundo significado da vida no Espírito, a vivência da fé porque somos habitados pelo Espírito, e pelo seu derramamento em nossos corações superamos a lógica do mundo, tornando-nos cristãos fiéis e criativos para amar e cuidar da Terra e de todas as criaturas.

É pelo Espírito Santo que geme em nosso interior que aprendemos a escutar e atender os gemidos da Terra. Gemer diz o Papa manifesta inquietação e sofrimento, juntamente com suspiro e sonho. Pois toda a Criação está implicada neste processo de um novo nascimento, gemendo, espera libertação. Enquanto expectativa de um nascimento (a revelação dos filhos de Deus), a esperança é a possibilidade de permanecer firmes no meio das tribulações e contradições nunca desanimando face a barbárie humana. Esperança abraâmica, como espera paciente que antevê a realização dos sonhos. E com o espírito profético do abade calabrês Joaquin de Fiore, citado por Dante Alighieri que numa época de lutas acirradas e cruéis de conflitos entre o Papado e o Império, as cruzadas e os movimentos heréticos, soube apontar o surgimento de um novo espírito de convivência, amizade social e fraternidade social, explicitado pelo Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti. Esta harmonia deve pautar um novo relacionamento com a Criação a partir de um “antropocentrismo situado” desenvolvido na Laudate Deum.

A salvação que Cristo trouxe a humanidade é a esperança segura inclusive para a criação, com efeito, também ela será libertada da escravidão da corrupção, para alcançar a liberdade na glória dos filhos de Deus”. (Rm 8,21). Esperar e agir com a criação, exige unir forças caminhando com toda a humanidade, repensando seriamente a questão do poder humano, do seu significado e dos seus limites, (Laudate Deum,28).

Como as crianças reunidas na Praça de São Pedro por ocasião da Solenidade da Santíssima Trindade, compreenderam que o Espirito Santo acompanha-nos na vida e muda radicalmente nossa atitude, inspirados por Ele poderemos passar de predadores a cultivadores e cuidadores do jardim da Terra. E assim pela força do mesmo Espírito e sua presença em nós, faremos de nossa vida um cântico de amor para Deus, para a humanidade e a criação, vivendo a plenitude da santidade. Louvado seja Deus!

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Transmitir a fé (II) (1)

Foto: Vironevaeh | Opus Dei

Transmitir a fé (II)

Dar exemplo, dedicar tempo, rezar… a transmissão da fé aos filhos é uma tarefa que exige empenho. Segunda parte do editorial sobre a fé e a família.

02/08/2012

Quando se busca educar na fé, não se deve separar a semente da doutrina da semente da piedade[1]: é preciso unir o conhecimento com a virtude, a inteligência com os afetos. Neste campo, mais que em muitos outros, os pais e educadores devem cuidar do crescimento harmonioso dos filhos. Não bastam algumas práticas de piedade com um verniz de doutrina, nem uma doutrina que fortaleça a convicção de dar o culto devido a Deus, de relacionar-nos com Ele, de viver as exigências da mensagem cristã, de fazer apostolado. É preciso que a doutrina se faça vida, que resulte em determinações, que não seja algo desligado do dia a dia, que se converta em compromisso, que leve amar a Cristo e aos demais.

Elemento insubstituível da educação é o exemplo concreto, o testemunho vivo dos pais: rezar com os filhos (ao levantar-se, ao deitar-se, ao abençoar os alimentos); dar a devida importância ao papel da fé no lar (prevendo a participação na Santa Missa durante as férias ou procurando lugares sadios – que não sejam dispersivos – para distrair-se) ; ensinar de forma natural a defender e transmitir sua fé, a difundir o amor a Jesus. “Assim, os pais infundem profundamente no coração de seus filhos, deixando marcas que os acontecimentos posteriores da vida não conseguirão apagar"[2].

É necessário dedicar tempo aos filhos: o tempo é vida[3], e a vida – a de Cristo que vive no cristão – é o melhor que se lhes pode dar. Passear, organizar excursões, falar de suas preocupações, de seus conflitos: na transmissão da fé, é preciso, sobretudo, “estar e rezar"; e se nos equivocamos, pedir perdão. Por outro lado os filhos também devem experimentar o perdão, que faz com que sintam que o amor que se lhes tem é incondicional.

POR PROFISSÃO, PAIS

Explica Bento XVI que os mais jovens, “desde que são pequenos, têm necessidade de Deus e têm a capacidade de perceber sua grandeza; sabem apreciar o valor da oração e dos ritos, assim como intuir a diferença entre o bem e o mal. Acompanhando-os, portanto, na fé, desde a idade mais tenra"[4]. Conseguir nos filhos a unidade no que se crê e o que se vive é um desafio que deve enfrentar evitando a improvisação, e com certa mentalidade profissional. A educação na fé deve ser equilibrada e sistemática. Trata-se de transmitir uma mensagem de salvação, que afeta toda a pessoa, e deve enraizar na cabeça e no coração de quem a recebe; e isto, entre aqueles que mais queremos. Está em jogo a amizade que os filhos tenham com Jesus Cristo, tarefa que merece os melhores esforços. Deus conta com nosso interesse por fazer-lhes acessível a doutrina, para dar-lhes sua graça e fixar-se em suas almas; por isso, o modo de comunicar não é algo acrescentado ou secundário à transmissão da fé, mas que pertence à sua própria dinâmica.

Foto: Bob Jagendorf | Opus Dei

Para ser um bom médico não é suficiente atender a uns pacientes: é preciso estudar, ler, refletir, perguntar, investigar, assistir a congressos. Para sermos pais, é preciso dedicar tempo a examinar-se sobre como melhorar no próprio trabalho educativo. Em nossa vida familiar saber é importante, o saber fazer é imprescindível e o querer fazer é determinante. Pode não ser fácil, porém não basta enganar-se escondendo-se nas outras tarefas que temos: convém sempre tirar alguns minutos do dia, ou umas horas nos períodos de férias, para dedicá-los a própria formação pedagógica.

Não faltam recursos que possam ajudar a este aperfeiçoamento: são muitos os livros, vídeos e portais da internet bem orientados nos quais os pais encontram ideias para educar melhor. Além disso, são especialmente eficazes os cursos de Orientação Familiar, que não só transmitem um conhecimento, ou umas técnicas, mas que ajudam a percorrer o caminho da educação dos filhos e o da melhoria pessoal, matrimonial e familiar. Conhecer com mais clareza as características próprias da idade dos filhos, assim como o ambiente no qual se movem seus iguais, forma parte do interesse normal por saber o que pensam, o que os move, o que os põe em dúvida. Em última análise, permite conhecê-los, e isso facilita educá-los de um modo mais consciente e responsável.

MOSTRAR A BELEZA DA FÉ

Conseguir que os filhos interiorizem a fé requer aproveitar as diferentes situações de modo que aconselhem a consonância entre as razões humanas e as sobrenaturais. Os pais e educadores devem sim, propor-se metas, porém mostrando a beleza da virtude e de uma existência cristã plena. Convém, pois, abrir horizontes, sem limitar-se a mostrar o que é proibido ou é obrigatório. Se não fosse assim, poderíamos induzir a pensar que a fé é uma dura e fria normativa que limita, ou um código de pecados e imposições; nossos filhos acabariam fixando-se somente na parte áspera da senda, sem ter em conta a promessa de Jesus: “meu jugo é suave"[5]. Pelo contrário, na educação deve estar muito presente que os mandamentos do Senhor valorizam a pessoa, a elevam a um desenvolvimento mais pleno: não são insensíveis negações, mas propostas de ação para proteger e fomentar a vida, a confiança, a paz nas relações familiares e sociais. É tentar imitar a Jesus no caminho das bem-aventuranças.

Seria, por isso, um erro associar “motivos sobrenaturais" ao cumprimento de encargos, ou tarefas. Ou de “obrigações" que lhes sejam difíceis. Não é bom, por exemplo, abusar do recurso de pedir à criança que tome a sopa como um sacrifício ao Senhor: dependendo de sua vida de piedade e de sua idade, pode se tornar conveniente, porém há que se procurar outros motivos que os estimulem. Deus não pode ser o “antagonista" dos caprichos, deve-se procurar antes que não tenham caprichos, e cheguem a estar em condições de alcançar uma vida feliz, desprendida, guiada pelo amor a Deus e aos demais.

Foto (Crédito: Opus Dei)

A família cristã transmite a beleza da fé e do amor a Cristo, quando se vive em harmonia familiar por caridade, sabendo sorrir e esquecer-se das próprias preocupações para atender aos demais, a não dar importância a pequenos atritos que o egoísmo poderia converter em montanhas; a depositar um amor grande nos pequenos serviços de que se compõe a convivência diária[6].

Uma vida dirigida para o esquecimento próprio é, um ideal atrativo para uma pessoa jovem. Somos os educadores os, que por vezes, não cremos totalmente, talvez porque ainda nos falte muito que caminhar. O segredo está em relacionar os objetivos da educação com motivos que nossos interlocutores entendam e valorizem: ajudar os amigos, ser úteis ou valentes... Cada criança terá suas próprias inquietações, que lhes faremos aparecer quando se questionem: por que viver a castidade, a temperança, a laboriosidade, o desprendimento; porque ser prudentes com a internet, ou por que não passar horas e horas com videogames. Assim, a mensagem cristã será compreendida na sua racionalidade e sua beleza. Os filhos descobrirão a Deus não como um “instrumento" com o qual os pais conseguem pequenas metas domésticas, mas como quem é: o Pai que nos ama acima de todas as coisas, e que temos de querer e adorar; o Criador do universo, a quem devemos nossa existência; o bom Mestre, o Amigo que nunca engana, e que não queremos nem podemos decepcionar.

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A. Aguiló

[1] Forja, n. 918.

[2] João Paulo II, Exhort. Apost. Familiaris consortio, 22-11-1981, n. 60.

[3]Sulco, n. 963.

[4] Benedito XVI, discusrso ao congresso

Eclesial das dioceses de Roma, 13-06-2011.

[5] Sulco, n. 198.

[6] É Cristo que passa, n. 23.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/transmitir-a-fe-ii/

'Se seus filhos têm celular, quem manda neles são as redes sociais' (2)

Pediatra e ativista pela infância, como se autodefine, Daniel Becker tem se tornado uma das principais vozes quando o assunto é o bem-estar de crianças e adolescentes (Crédito: Marco Weyne/Divulgação)

'Se seus filhos têm celular, quem manda neles são as redes sociais', diz pediatra Daniel Becker

31 agosto 2024

BBC News Brasil - Muitos educadores dizem que birra não existe. O que o senhor acha?

Becker - A gente chama de birra, mas acho que tem nomes mais apropriados. Seria uma crise de irritabilidade e está essencialmente ligada ao momento de desenvolvimento daquela criança.

Com cerca de 1 ano e meio, ela começa a dominar todas as capacidades de um ser adulto para a interação social. Começa a falar, a entender, a se movimentar, a alcançar as coisas, a desenvolver autonomia. E é por isso que quer fazer só o que ela quer, não vai aceitar ordens.

Qualquer coisa que venha contrariar seus desejos vai gerar uma briga e ela vai ficar irritada, porque não tem noção de controle de impulso. Se ficar chateada, aquela chateação vai dominá-la completamente. Ela vai chorar, se jogar no chão, vai bater.

As pessoas ficam ofendidas quando isso acontece, dizem "meu filho me bateu". Isso é um absurdo. São crianças que estão aprendendo as noções de sociabilidade e que não têm a menor noção das relações sociais. Não sabem o que significa um tapa ou se jogar no chão. Isso é adrenalina que está circulando ali dentro, e a criança precisa de movimento. Isso é parte do desenvolvimento necessário e natural de toda criança.

Crédito: Getty Images

BBC News Brasil - Até que idade isso é normal?

Becker - Até os 4 anos. Se passar muito disso, já é preciso ter um olhar mais cuidadoso. Com 4 anos, existe um salto de desenvolvimento em que a criança fica com mais inteligência, mais discernimento, mais capaz de compreender as regras sociais, ela fica com uma certa malícia, começa a entender piadinhas, ironias e brincadeiras.

É um momento delicioso de desenvolvimento. Os 4 anos são a minha idade preferida, porque a criança brinca contigo, sorri, entende a maldade, vira uma palhaçada, entende a piada.

A gente precisa entender que isso é parte do desenvolvimento e ter um pouco de paciência. Isso passa. Brigar, castigar, dar tapas nessa hora vai piorar e ainda gerar consequências muito negativas no futuro.

O momento da birra pode ser uma oportunidade educativa para a criança, porque é uma explosão emocional. Não adianta você fazer discurso nesse momento. É ridículo dizer para a criança que ela deve ir para o cantinho do pensamento, isso não funciona. Você acha que ela vai pensar sobre o que fez?

Nessa hora, é preciso acolher, acalmar, respirar junto. É o que a gente chama de corregulação. No meio da birra, o que a criança precisa é de um abraço, de ser contida. Respire junto com ela.

Uma coisa legal é ensinar a respiração do "cheira a florzinha, assopra a velinha" antes da crise. Na hora da crise, você faz com ela. Essa respiração é mágica, porque respirar fundo e expirar soprando tem um efeito calmante no cérebro. É um gesto que traz alívio.

Você pode usar esse momento para mostrar o que sente. Acolha os sentimentos, dê legitimidade a ela. Todo sentimento é legítimo. O que a gente não deve legitimar é a reação inadequada a um sentimento. Qualquer emoção é válida, e ninguém pode deixar de sentir uma emoção porque quer.

Acolha a emoção, diga: "Olha, você pode estar com raiva, eu também fico com raiva. Mas você não pode bater em mim. Aqui em casa, a gente não bate em ninguém".

BBC News Brasil - A Assembleia Legislativa de São Paulo está debatendo um projeto de lei para proibir o uso de celular nas escolas. Como estabelecer uma relação minimamente saudável dos jovens com o celular?

Becker - A tecnologia ocupa uma parte da nossa vida, e as crianças não vão ficar fora disso.

O problema é: a partir de que idade a criança tem que ter contato com uma tela digital? A partir de que idade ela tem que ter um celular ou estar em uma rede social? Essa é uma discussão muito relevante.

Existem tecnologias que são apropriadas e outras não, porque vão trazer riscos altíssimos para o desenvolvimento. A gente sabe que qualquer tela vai trazer prejuízos para uma criança pequena. Por isso, especialistas insistem que até 1 ano e meio, 2 anos, a criança não tenha acesso à tela. Isso não quer dizer que, se a mãe estiver amamentando um bebê de 6 meses enquanto assiste à novela, isso vai ser um problema. Não é isso.

Agora, uma mãe não deve ficar no celular enquanto amamenta, por exemplo, porque as redes sociais têm um algoritmo que determina o que vamos assistir, que geralmente é lixo viciante. Pode acontecer da criança se distrair também e ficar assistindo. Às vezes, acontece até de a criança morder o peito da mãe sem querer, devido a um estímulo vindo do celular.

Depois dos 2 anos, até uns 5 anos, você pode permitir o uso de tela, de preferência da televisão, porque você escolhe o que vai passar ali e, de preferência, com interação com um adulto. Até os 5 anos, você pode estabelecer uma hora e meia por dia de televisão.

Depois, dos 5 aos 10 anos, dá para flexibilizar um pouco. Mas ter um telefone celular, com acesso à internet, aos 8 anos, é escandaloso. É um erro muito absurdo e vai custar muito caro para a família depois. Quanto mais cedo a criança tiver o celular, mais nocividade ela vai sofrer. Maior tendência à depressão, ansiedade, pânico e até problemas graves de vício.

Uma criança com 8 anos não tem discernimento para distinguir um golpista de um amigo, um pedófilo de um professor. O crime mudou para a internet, e ele não está só nas redes sociais, está no WhatsApp também.

Por isso, a recomendação é não entregar um celular nas mãos da criança antes do fim do ensino fundamental. E não deixar que elas entrem em redes sociais antes dos 15, 16 anos. As redes sociais são um mundo de horror que se abre para a criança.

A ansiedade no Brasil, de 2013 para cá, aumentou 1500% na adolescência, segundo pesquisa do Datafolha feita com dados da atenção psicossocial do SUS [Sistema Único de Saúde].

É escandaloso. Superou o atendimento de adultos em número absolutos. E o que aconteceu de 2013 para cá? Teve a pandemia, mas ali só foi registrada uma leve oscilação. O problema começou em 2010, 2012, quando todo mundo começa a ter celular, redes sociais.

A escola é um lugar absolutamente estratégico hoje em dia, porque é regulamentada. É onde ainda é possível aplicar regras. As famílias não conseguem aplicar regras, porque ninguém consegue vencer a Meta [dona do Instagram, Facebook e WhatsApp] ou a ByteDance [dona do Tik Tok]. Quem manda nos seus filhos hoje, se eles têm celular, são essas empresas.

Por isso, tem que proibir o uso de celular não só na sala de aula, como também no recreio, que é o último reduto do brincar hoje. Brincar é a coisa mais importante da infância. Uma infância que não brinca gera adultos estúpidos, infelizes, deprimidos, violentos e intolerantes.

O recreio é precioso e não pode ser com celular. A escola tem que ser uma pausa dessa invasão do digital ao mundo real. É celular zero, da entrada até a saída.

Crédito: Getty Images

BBC News Brasil - Nessa era de cyberbullying, quais sinais a família precisa ficar atenta para saber se seu filho está sofrendo esse tipo de crime? E, por outro lado, o que fazer quando quem pratica o bullying é o seu filho?

Becker - A criança que sofre bullying não conta para ninguém, porque a humilhação é tão terrível. Ela se sente tão mal que tem vergonha do que ela está passando, de ser quem ela é, de ser tão fraca, de não conseguir reagir. Ela não vai contar para os pais, porque tem medo que reajam mal.

É preciso prestar atenção em quem são as vítimas preferenciais. Os tímidos, os mais nerds, os diferentões, o gorducho ou o magrelo, o cara que usa óculos fundo de garrafa, ou o que é atípico, o que não joga bola bem, o negro em uma escola branca.

Os mais novos da turma são vítimas preferenciais também, porque eles têm menos malícia e menos inteligência social para enfrentar essa malícia.

[Fique atento] Se o seu filho começa a dar qualquer sinal de que não está legal, seja porque ele chega da escola triste, inventa doença, faz cara triste para ir para a escola, está desanimado na hora de sair.

Ou a escola está reportando que ele não quis participar de alguma aula de educação física, que no recreio ele está sozinho. A escola geralmente não informa isso, mas esse é um sinal clássico.

Ele também deixa de conversar com a família, fica mais arredio, dentro do quarto jogando e deixando de sair com os amigos de fora da escola. São sinais claros de que algo não está bem, e você tem de conversar com ele de forma sutil.

Vá fazer um programa que ele goste, chame para passear. Tem vários filmes hoje sobre bullying — assista um com ele, converse depois sobre isso. São algumas das formas de conseguir chegar nessa criança.

Bullying é hoje um crime tipificado por lei, com consequências para quem pratica, para os responsáveis pela criança e para a escola. A escola que não toma providências pode ser responsabilizada judicialmente.

Existem muitas estratégias hoje em dia. Tem que ter educador preparado, fazer capacitação para enfrentamento de bullying. Sempre recomendo devolver isso para a turma em que o bullying ocorreu, questionando como resolver isso.

Aí, eles pesquisam, fazem debates, fazem roda de conversa, acolhem esses dois lados. Porque o agressor muitas vezes tem que ser acolhido também, ele está sofrendo em casa, muitas vezes.

A escola tem que ter política de prevenção de bullying, que começa com educação antirracista, inclusiva, cultura africana. Tem que ter a educação ambiental, socioemocional, tem que ter espaços de acolhimento para quem está sofrendo, tem que identificar meninos e meninas isolados, tem que ter tutores para essas crianças, um espaço de privacidade onde a criança possa contar para alguém o que está acontecendo com ela.

Em relação a quem está praticando bullying, essa criança está geralmente sofrendo também, mas é óbvio que aí a conversa é um pouco mais rigorosa. Também é importante a família falar de respeito ao outro, de privacidade, de educação, de etiqueta na internet.

Os sinais de um agressor são crianças mais raivosas, mais agressivas. Mas, geralmente, os pais sabem que a criança está praticando bullying quando a queixa chega na família,

Mas é importante dizer que ambos os lados do bullying têm trauma para o futuro.

Vítimas e praticantes de bullying, quando essas vivências não são processadas de forma adequada, são crianças que, no futuro, terão mais problemas de relacionamento, no trabalho, terão mais tendência a adoecimento físico, mental, ao uso de remédios e de drogas também.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c5yd0d2vplno

EDITORIAL: O que faz o mundo progredir

Papa Francisco com uma criança (Vatican Media)

O Papa Francisco explica que a compaixão “faz ver melhor as coisas”

ANDREA TORNIELLI

O que “faz o mundo progredir”? Alguns poderiam responder a economia, outros a luta de classes, outros ainda a curiosidade ou o desejo de empreender e experimentar, outros ainda o amor. Há mais de trinta anos, na Argentina, uma senhora idosa disse ao bispo Bergoglio que a misericórdia divina é o pilar que sustenta o mundo (“se o Senhor não perdoasse tudo, o mundo não existiria”); hoje, Francisco indica qual é o “motor” que faz o mundo progredir. Da catedral de Jacarta, o Papa explicou que o que impulsiona o mundo é “a caridade que se doa” na compaixão. Ele disse que compaixão não significa distribuir ajuda ou esmolas aos necessitados “olhando-os de cima para baixo”, mas significa inclinar-se para realmente se conectar com aqueles que estão no chão e, assim, erguê-los e dar-lhes esperança. Significa também abraçar sonhos e desejos de redenção e justiça dos necessitados, tornando-se promotores e cooperadores.

Há aqueles que têm medo da compaixão, observou ainda o Sucessor de Pedro, “porque a consideram uma fraqueza e, em vez disso, exaltam, como se fosse uma virtude, a astúcia daqueles que servem a seus próprios interesses mantendo distância de todos, não se deixando ‘tocar’ por nada nem por ninguém, pensando que assim são mais lúcidos e livres para atingir seus objetivos”. Mas isso”, explicou, ‘é uma maneira falsa de ver a realidade’. Porque “o que faz o mundo progredir não são os cálculos de interesse próprio - que geralmente acabam destruindo a criação e dividindo as comunidades - mas a caridade que se doa. A compaixão não obscurece a visão real da vida; pelo contrário, ela nos faz ver melhor as coisas, à luz do amor”.

É a compaixão que Jesus nos testemunha em cada página do Evangelho: ele não permanece indiferente à realidade, ele se comove visceralmente, se deixa ferir pelo drama e pela necessidade daqueles que encontra. Em vez disso, a indiferença, que a longo prazo se transforma em cinismo, nos faz acreditar que somos mais livres, mas na realidade nos torna, pouco a pouco, cada vez menos humanos.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

São Marino

São Marino (A12)
04 de setembro
País: Croácia
São Marino

Há uma certa confusão de dados reais e lendários sobre a vida de São Marino, inclusive se viveu no século III ou entre os anos 500 e 700. Certo é que Marino (Marinho, ou Marinus – “do mar”) era cristão, originário da ilha de Arba ou Arbe, da Dalmácia (hoje ilha de Rab, Croácia, no mar Adriático), e pedreiro de profissão. Viajou com um amigo chamado Leão para Rimini, na Itália, para aí trabalhar. Se fugindo da perseguição do imperador Dioclesiano ou convocado por este com arquitetos e pedreiros de todo o império para reconstruir a cidade costeira de Arímino, a atual Rimini (neste caso no século III, em 275), é discutível. Mas lá encontraram muitos cristãos, mesmo nobres, obrigados a trabalhos forçados por serem cristãos.

Parece que os dois amigos estiveram no monte Titano, mais no interior, para a extração de rochas. Depois de aproximadamente 13 anos, desenvolvendo intenso apostolado além do serviço nas construções, seja por perseguição ou o término do trabalho, separaram-se, indo Leão para Montefeltro (hoje San Leo) e Marino voltando para Rimini. O Bispo desta diocese, São Gaudêncio, os ordenou diáconos como reconhecimento da sua profícua evangelização, e para que assim melhor pudessem exercê-la. A reputação das virtudes de Marino cresceu e se espalhou, chegando inclusive à Dalmácia, do outro lado do mar Adriático. (A referência ao bispo São Gaudêncio de Bréscia, falecido em 410, situaria a vida de São Marino no século V).

O diabo, irritado com as conversões conseguidas por Marino, instigou uma mulher da sua terra natal a se apresentar em Rimini como sua esposa legítima e abandonada, para humilhá-lo e desmerecer a sua boa fama. Foi rejeitada firmemente pelo santo, e ela então recorreu ao governador para que lhe fosse feita “justiça”. Marino então refugiou-se numa caverna do monte Titano, mas ainda assim ela o encontrou. Como ele se recusasse a recebê-la, depois de vários dias naquele lugar inacessível e isolado, ela desistiu; voltou para a cidade e confessou a sua culpa, vindo a morrer depois.

Marino, embora inocentado, decidiu ficar no monte Titano, levando uma vida eremítica. Construiu uma cela para si no cume, e uma igreja, dedicada a São Pedro, dedicando-se à oração. Realizou vários milagres, como a cura de um possesso da Dalmácia. Conta-se também que domesticou um urso que havia matado o seu burro, e que passou portanto a fazer o seu trabalho. Com o tempo e a fama da sua santidade, outros começaram a ir ter com ele, e surgiu assim um início de comunidade monacal sob os cuidados de Marino e Leão.

monte Titano ficava num terreno pertencente a uma viúva chamada Felicíssima (ou Felicidade) e ao seu filho Veríssimo, que começaram a exigir que eles fossem embora. Marino e Leão se puseram a rezar, pois havia a ameaça de violência. Inesperadamente Veríssimo ficou paralisado dos braços e das pernas, e sua mãe, em desespero, pediu a Marino que rogasse a Deus pelo filho, oferecendo-lhe o que desejasse para fazer isso. Marino lhe disse que não tinha outro desejo que a conversão dela e dos seus, e um terreno para descansar.

Felicíssima aceitou, e logo Veríssimo ficou curado; ela, o filho e mais 53 membros da família receberam o batismo, e o monte Titano foi doado a Marino e aos seus descendentes. Ali foi oficialmente fundado um mosteiro em 301, onde Marino permaneceu até o seu falecimento em 366. As suas últimas palavras aos companheiros teriam sido “Relinquo vos liberos ab utroque homine” (“Eu vos deixo livres de ambos os homens”).

Esta frase foi entendida tradicionalmente como uma promessa de autonomia em relação ao poder civil e ao Exarcado Bizantino, isto é, uma divisão administrativa do império romano do Oriente, dos territórios não conquistados pelos lombardos na Itália, no século VI (cf. https://www.a12.com/reze-no-santuario/santo-do-dia?s=sao-gregorio-magno). Ora, o Imperador bizantino Maurício, em 584, repartiu o exarcado em sete distritos, um deles o de Roma, que na prática era regida pelo Papa, gerando conflitos também no aspecto espiritual com o patriarcado religioso de Constantinopla (Bizâncio); por fim, com a expulsão dos lombardos em 756, o exercado de Ravena, onde ficava o monte Titano, foi doado à Igreja como parte do território que depois seria conhecido por Estados Pontifícios.

Em resumo, no execrado havia a influência tanto civil quanto religiosa, esta a do patriarcado bizantino que se opunha ao Papa. Portanto a última frase de São Marino garantiu a independência da região, que perdura até hoje, destas duas influências, civil e religiosa não-católica: de forma profética, se ele viveu no século III, ou de maneira concreta, se viveu entre os anos 500 e 700. Da comunidade fundada por São Marino desenvolveu-se a República de San Marino, a mais antiga da Europa.

São Marino é reconhecido pela Igreja como fundador e patrono da República de San Marino. A festa desse santo, venerado também pela Igreja Ortodoxa Oriental, e também feriado nacional no país é 3 de setembro – festa obrigatória de São Gregório Magno – e por isso foi deslocada no catolicismo para o dia seguinte.

 Existem mais sete santos com o nome de Marino, seis mártires dos primeiros séculos cristãos e um monge na Itália falecido em 1170, bem como três santas chamadas Marina.

Colaboração: José Duarte de Barros Filho

Reflexão:

Sair do isolamento insular do egoísmo, atravessar o mar revolto da vida e alcançar o cume da montanha espiritual, para aí edificar morada: este o programa de vida que nos é exemplificado na prática por São Marino. Mas nunca o conseguiremos sozinhos: para dominar a bestialidade de comportamento, e colocar o seu vigor ursulino no serviço humilde e benéfico, como o dos burricos, é necessário o auxílio do Leão de Judá… e este serviço não é outro que extrair rochas sólidas de espiritualidade dos picos de sabedoria e caridade da Palavra de Deus, e com elas construir para a Igreja. São Marino não foi estadista ou político, militar ou invasor, mas um simples pedreiro, que fundou uma nação a partir das “pedras vivas” (cf. 1Pe 2,5-6) de uma comunidade religiosa. A casa edificada sobre a rocha, não cairá (cf. Mt 7,24): sim, é possível erigir um país sobre a pedra angular (cf. At 4,10-12) sobrenatural do Cristo, cujo Corpo Místico e ao mesmo tempo concreto e encarnado está edificado sobre outra pedra (cf. Mt 16,18), Pedro, o pescador que, como São Marino, navegou em profundidade as águas do Batismo. Construir uma nação a partir de uma vida religiosa verdadeira, em Cristo Jesus: vocação natural no maior país católico do mundo.

Oração:

Senhor Deus, rochedo sólido de amor que sustenta o barro e o pó que somos nós, concedei-nos por intercessão de São Marino a sua mesma humildade e trabalho de caridade constantes, de modo a conseguirmos total independência dos poderes mundanos e das falsas doutrinas, mas sendo veríssimos na pureza do desejo de Vos seguir, alcançarmos a vida felicíssima no Paraíso. Por Nosso Senhor Jesus Cristo e Nossa Senhora. Amém.

https://www.a12.com/

terça-feira, 3 de setembro de 2024

'Se seus filhos têm celular, quem manda neles são as redes sociais' (1)

Pediatra e ativista pela infância, como se autodefine, Daniel Becker tem se tornado uma das principais vozes quando o assunto é o bem-estar de crianças e adolescentes (Crédito,Marco Weyne/Divulgação)

'Se seus filhos têm celular, quem manda neles são as redes sociais', diz pediatra Daniel Becker

31 agosto 2024

Ele tem mais de 1 milhão de seguidores no Instagram, rede social que utiliza para falar, dentre outras coisas, que crianças não deveriam estar ali.

Pediatra e ativista pela infância, como se autodefine, Daniel Becker tem se tornado uma das principais vozes quando o assunto é o bem-estar das crianças.

Ele defende cuidados simples, como a interação com elas, brincadeiras ao ar livre, acolhimento e criação de intimidade com os filhos.

Parece algo básico, mas a vida agitada e especialmente o uso excessivo do celular estão distanciando os adultos das crianças, causando uma série de efeitos, alerta Becker.

Para o pediatra, o celular se interpõe entre o olhar dos cuidadores e das crianças, tornando-se uma barreira para a criação de vínculo, afeto e intimidade.

Isso gera o que ele chama de "parentalidade distraída", o que pode ter até mesmo consequências catastróficas.

Estamos tão apegados a esse aparelho, que, segundo o médico, que é formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e é mestre em saúde pública, até a televisão é melhor que o celular.

Ao menos você tem maior poder de escolha sobre o que assistir na TV e não fica submetido aos algoritmos, diz Becker, de seu consultório no Rio de Janeiro, nesta entrevista realizada por videochamada.

Mas, embora o celular seja o meio de propagação de conteúdos "viciantes" e comparáveis ao "lixo" que está nas redes sociais, o pediatra diz que dá para estabelecer uma relação minimamente saudável para crianças e adolescentes com ele.

BBC News Brasil - Este é um ano de eleições municipais, mas o debate entre os candidatos passa longe de temas voltados para a infância. O que um bom plano de governo voltado à infância deveria ter, na sua opinião?

Daniel Becker - Proteger a criança e promover a saúde e a qualidade de vida dela significa cuidar das famílias também, especialmente das mães. Existem muitas políticas que são municipais e que estão fora do radar, como a cobertura de creches.

O Brasil tem a meta de ter 50% de cobertura de creche [ou seja, ter creche para ao menos metade das crianças de 0 a 3 anos], mas existem municípios onde não há praticamente nenhuma creche. E, sem creche, você tem uma mãe completamente assoberbada que não tem onde deixar a criança, ou vai deixar sob cuidados precários.

No plano da saúde, é importante o investimento na saúde da família, que envolve, dentre outras coisas, a vacinação, algo que depende muito do município. O apoio à amamentação, crucial para o bebê e para a mãe, também precisa ser bem desenvolvido.

Todo médico de atenção básica e todo médico de família deveria ser treinado para dar apoio à amamentação. Temos uma política aqui no Brasil maravilhosa que são os bancos de leite, mas o município sequer divulga isso, muitas vezes.

Outra atividade muito bacana são os grupos de gestantes e os grupos de puérperas, que podem ser formados por meio da atenção básica da saúde. Os programas municipais de infância estão trabalhando algo também importantíssimo, que são os programas de educação parental.

Na maioria das vezes, as famílias, especialmente as mais pobres, não têm noção da importância, por exemplo, do estímulo ao desenvolvimento, do carinho e do afeto na criação dos filhos.

Isso inclui orientações sobre uma boa alimentação também. As pessoas não sabem que miojo não faz mal, que dar salgadinho e refrigerante para o bebê faz mal. Hoje, 80% das crianças acima de 8 meses já provaram coisas açucaradas, inclusive refrigerantes.

Tem outra política que considero especialmente importante e que é muito benéfica para toda a sociedade: a cidade amiga da criança.

Ou seja, manter as praças bem cuidadas, acessíveis, iluminadas, seguras, com bons brinquedos, com sombra, arborizar as calçadas. A brincadeira no espaço público é o melhor benefício possível para uma criança: vai beneficiar saúde física, mental, espiritual, emocional, melhora a imunidade, reduz problemas de comportamento, melhora o apetite.

Além disso, ativa o turismo e o comércio, aumenta a arrecadação da prefeitura.

BBC News Brasil - O senhor fala muito da importância de brincar em meio à natureza, no parque, na areia. Mas esses espaços, os parques, geralmente não estão nas periferias. Ou seja, as crianças da periferia, mais uma vez, são privadas dessa convivência.

Becker - Isso se chama racismo ambiental ou injustiça ambiental ou injustiça recreativa também.

BBC News Brasil - O uso do celular por crianças e adolescentes é um tema, mas queria perguntar antes sobre o uso pelos adultos. O senhor usa um nome para as consequências disso, "parentalidade distraída". Do que se trata?

Becker - O celular tem um apelo viciante muito mais profundo do que a televisão, e o adulto se perde nas redes sociais, deixando de olhar para a criança.

O celular acaba se interpondo entre o olhar do pai e do filho. O olhar é fundamental para a criança, porque é nesse olhar que ela vai encontrar o afeto, o carinho e o vínculo.

É na interação com a gente, por exemplo, que a linguagem se desenvolve. Não existe desenvolvimento da linguagem olhando para tela ou vídeo.

A precarização desse vínculo gera um empobrecimento de relação, e isso vai afetar a autoestima da criança. Ela vai perceber que aquele negócio na mão do pai é mais importante do que ela. Não é apenas o desenvolvimento em geral que está em risco. Acidentes estão acontecendo.

Canso de ouvir que filho não vem com manual. Mas o manual está ali dentro dos olhos dos seus filhos. Olhe para eles. Ninguém precisa passar duas horas brincando com a criança no chão para desenvolver intimidade. São ações simples, é o convívio simples, é acordar a criança, dar o café da manhã, dar um banho, contar uma história, jantar junto, brincar um pouquinho. Contar histórias na hora de dormir, que é um gesto simples, mas marca a criança pelo resto da vida dela de forma positiva.

Esse convívio gera uma coisa chamada intimidade, que é a chave da educação. Quem consegue intimidade com seus filhos não precisa apelar nem para a permissividade excessiva, nem para o castigo, para a palmada, para coisas piores. Castigo e palmada não fazem ninguém aprender nada.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c5yd0d2vplno

A Palavra de Deus nos Santos Padres

Rezar a Deua (CNBB Norte 2)

A Palavra de Deus nos Santos Padres

Dom Vital Corbellini
Bispo de Marabá (PA)  

A Palavra de Deus possui uma validade que não passa, é eterna a sua normalidade porque ela provém de Deus Uno e Trino na qual ela visa à conversão das pessoas e dos povos. Tudo o que sai da boca do Senhor e vem a este mundo não volta para Deus sem dar o seu devido fruto (cf. Is 55,11). Jesus é a Palavra eterna do Pai em comunhão com o Espírito Santo. Ele nos revelou o Pai: “Quem me vê, vê o Pai” (Jo 14,9). Nós estamos prestes a iniciar o mês bíblico, onde refletiremos a importância da Palavra de Deus nas nossas comunidades eclesiais em vista da conversão de vida e pela necessidade de realizar práticas de amor. Os primeiros escritores cristãos, os santos padres perceberam a Palavra de Deus como compromisso para uma vida de santidade no mundo para que assim o Reino de Deus crescesse sempre mais pelas suas atuações junto às suas comunidades, às pessoas necessitadas e pobres. 

As duas alianças 

Santo Ireneu de Lião, bispo, nos séculos II e III, afirmou que todos os apóstolos ensinaram a existência de duas alianças para dois diversos povos; no entanto único e idêntico é Deus que os concedeu para a utilidade dos seres humanos e à medida que as pessoas creram em Deus (1). O Antigo Testamento foi dado ao serviço divino, para o louvor próprio do Senhor e esse era ao mesmo tempo um símbolo das realidades celestes, pois o ser humano ainda não podia ver as coisas de Deus senão pelo seu Filho, Jesus Cristo, vindo a este mundo, fundamentando o Novo Testamento (2). 

O Antigo Testamento cumpriu-se em Cristo Jesus

Santo Agostinho, bispo de Hipona, séculos IV e V teve presentes as idades que se cumpriram para a vinda de Cristo Jesus de modo que o Antigo Testamento deu o seu cumprimento no enviado do Pai, o Messias. A primeira idade iniciou com a criação do gênero humano e foi até Noé, pois com o dilúvio, ele construiu a arca (3). O segundo período foi até Abraão na qual ele foi chamado pai de todos os povos, de modo que o imitaram na fé. Ele também estava ligado ao futuro povo de Israel, antes mesmo que os povos acolhessem a fé cristã para que toda a terra adorasse o Deus verdadeiro e da qual Cristo, o Redentor, viria da sua descendência segundo a carne (4). Para Santo Agostinho estas duas etapas são percebidas com toda a clareza já nos livros do Antigo Testamento. O Evangelho de Mateus (cf. Mt 1,17) afirmou a descendência corpórea do Senhor Jesus Cristo na realidade humana afirmada no Antigo Testamento (cf. Is 7,14) (5). 

Jesus Cristo revelou o Novo Testamento

O bispo de Hipona ainda disse que Jesus Cristo revelou o Novo Testamento da hereditariedade eterna, na qual o ser humano novamente criado pela graça de Deus é chamado a viver uma vida nova no amor do Senhor. Ele também mostrou que os patriarcas, os profetas, as pessoas justas no Antigo Testamento almejavam em ver o Messias, o Salvador da humanidade (cf. Mt 13,17).  Assumindo a realidade humana, como a fome, a sede, o sofrimento, a dor, a cruz, Ele chegou à glória da ressurreição, para desta forma elevá-la até a divina, em vista da redenção de todas as pessoas junto de Deus (6).  

Jesus Cristo é a salvação das pessoas justas do Antigo Testamento

São Gregório de Nazianzo, bispo de Constantinopla, século IV disse que no Antigo Testamento, muitas pessoas justas, profetas sofreram perseguições, foram mártires ou mesmo viveram bem a lei do Senhor Deus acreditando na promessa divina da salvação, como dom em unidade com Cristo Jesus. O caso dos Macabeus (cf. 2 Mc 7) que sofreram o martírio, passaram a paixão de Cristo, não a teriam assumido se não fosse pela morte de Cristo por toda a humanidade. Eles imitaram o Senhor, mesmo não o conhecendo antes. Desta forma nenhum deles teriam alcançado a perfeição, sem a fé  e a caridade em Cristo Jesus. O Logos, Jesus Cristo foi anunciado de uma forma posterior, mas também isso antes ocorreu pelas almas das pessoas justas. Se eles não conheceram a cruz de Cristo, no entanto viveram conformidade à cruz do Senhor e na unidade da sua ressurreição (7).  

O Antigo Testamento em função do Novo Testamento

São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, séculos IV e V afirmou que o Antigo Testamento fosse lido em função do Novo Testamento. Para o bispo é fundamental a palavra de São Paulo que diz que “Quando virá o que é perfeito, será abolido aquilo que é imperfeito” (1 Cor 13,10). Isto valeu pelo Antigo Testamento por causa do Novo Testamento, não que ele fosse imperfeito, mas a antiga aliança apontou para a nova aliança. Desta forma, o Senhor exige de seu novo povo frutos e dons maiores que o povo da antiga aliança, por causa da vinda do Messias, do Salvador. Deus, em Jesus Cristo não prometeu mais ao ser humano uma terra onde fluía leite e mel, nem uma longa idade, abundância de pão e de vinho, mas acompanhadas por obras de caridade, o Senhor promete ao ser humano o céu, o paraíso, os bens celestes, a dignidade de ser filhos e filhas adotivos no Pai, irmãos e irmãs no Filho Unigênito, iluminados pelo Espírito Santo, participantes da sua gloria e do seu Reino (8). 

A Palavra de Deus é sempre viva e eficaz para a nossa vida de seguidores e de seguidoras de Jesus Cristo, de sua Igreja e de seu Reino. Ela não irá passar (cf. Mt 24,25) porque ela é vida eterna em vista da conversão do ser humano e de sua salvação.  

______________

Notas:

1 Cfr. Ireneu de Lião. IV,32,2. Paulus, São Paulo, 1995, pg. 470.
2 Cfr. Idem, pg. 470.
3 Cfr. Agostino. Come catecchizzare i principianti, 2, 39-40. In: La Teologia dei Padri, Volume IV. Roma:
Città Nuova Editrice. 1982, pg. 197.
4 Cfr. Idem, pg. 197.
5 Cfr. Ibidem, pg. 197.

6 Cfr. Ibidem, pg. 198.
7 Cfr. Gregorio di Nazianzo. Discorso in lode dei Maccabei, 15,1-2. In: Ibidem, pg. 197.
8 Cfr. Giovanni Crisostomo. Commento al Vagelo di San Matteo, 16,4-5. In: Ibidem, págs. 190-191.

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Transmitir a fé (I) (2)

Foto: Mhonpoo (cc).| Opus Dei

Transmitir a fé (I)

É na própria família que se forja o caráter, a personalidade, os costumes... e também se aprende a conviver com Deus. Uma tarefa que cada dia é mais necessária, como se assinala neste artigo.

03/01/2012

O MISTÉRIO DA LIBERDADE

Ao utilizar a liberdade pessoal, as pessoas nem sempre fazem o que mais lhes convém, ou o que pareceria previsível tendo em conta os meios empregados. Às vezes, as coisas são bem feitas mas não saem como se esperava – pelo menos, aparentemente – e pouco serve culpar-se por esses resultados ou atribuir a culpa a outros.

O mais sensato é pensar como educar cada vez melhor e como ajudar outros a fazerem o mesmo; não há, neste âmbito, fórmulas mágicas. Cada um tem o seu próprio modo de ser, que o leva a explicar e a encarar as coisas de modo diverso. O mesmo se pode dizer dos educandos que, embora vivam num ambiente semelhante, possuem interesses e sensibilidades diversas.

Essa variedade não é, no entanto, um obstáculo. Aliás, amplia os horizontes educativos: por um lado, possibilita que a educação se enquadre, realmente, no quadro de uma relação única, alheia a estereótipos; por outro, a relação com os temperamentos e caráteres dos diversos filhos favorece a pluralidade de situações educativas.

Foto: More Good Foundation (cc). | Opus Dei

Por isso, se bem que o caminho da fé seja o mais pessoal que existe – pois faz referência ao mais íntimo da pessoa, a sua relação com Deus –, podemos ajudar a percorrê-lo; e isso é a educação. Se considerarmos com calma na nossa oração pessoal o modo de ser de cada pessoa, Deus dar-nos-á luzes para acertar.

Transmitir a fé não é tanto uma questão de estratégia ou de programação, mas é facilitar que cada um descubra o desígnio de Deus para a sua vida. Ajudá-lo a que veja, por si próprio, que deve melhorar e em quê, porque nós, de fato, não mudamos ninguém, eles mudam porque querem.

DIVERSOS ÂMBITOS DE ATENÇÃO

Há diversos aspetos que têm grande importância para transmitir a fé. Um primeiro é talvez a vida de piedade na família, a proximidade a Deus na oração e nos sacramentos. Quando os pais não a “escondem” – às vezes involuntariamente –, esse convívio com Deus manifesta-se em ações que O tornam presente na família, de um modo natural e que respeita a autonomia dos filhos. Abençoar as refeições, ou rezar com os filhos pequenos as orações da manhã ou da noite, ou ensinar-lhes a recorrer aos Anjos da Guarda ou a ter manifestações de carinho com Nossa Senhora, são modos concretos de favorecer a virtude da piedade nas crianças, tantas vezes dando-lhes recursos que os acompanharão por toda a vida.

Outro meio é a doutrina; uma piedade sem doutrina é muito vulnerável perante o assédio intelectual que sofrem ou sofrerão os filhos ao longo da vida; necessitam de uma formação apologética profunda e, ao mesmo tempo, prática.

Logicamente, também neste campo é importante saber respeitar as peculiaridades próprias de cada idade. Muitas vezes, falar sobre um tema de atualidade ou de um livro poderá ser uma ocasião de ensinar a doutrina aos filhos mais velhos (isto, quando não sejam eles próprios que se nos dirijam para nos perguntarem).

Com os menores, a formação catequética que podem receber na paróquia ou na escola é uma ocasião ideal. Rever com eles as lições que receberam ou ensinar-lhes de modo sugestivo aspectos do Catecismo que talvez tenham sido omitidos, fará com que as crianças entendam a importância do estudo da doutrina de Jesus, graças ao carinho que os pais demonstram por ela.

Outro aspecto relevante é a educação nas virtudes. Quando há piedade e doutrina, mas faltam virtudes, os filhos acabarão pensando e sentindo como vivem, e não como lhes dite a razão iluminada pela fé, ou a fé assumida, porque pensada. Formar as virtudes requer salientar a importância da exigência pessoal, do empenho no trabalho, da generosidade e da temperança.

Educar nesses bens eleva o ser humano acima dos desejos materiais; torna-o mais lúcido, mais apto para entender as realidades do espírito. Aqueles que educam os filhos com pouca exigência – nunca lhes dizem que “não” a nada e procuram satisfazer todos os seus desejos – fecham-lhes as portas do espírito.

É uma condescendência que pode nascer do carinho, mas também do querer poupar o esforço que exige educar melhor, pôr limites aos apetites, ensinar a obedecer ou a esperar. E como a dinâmica do consumismo é de per si insaciável, cair nesse erro leva as pessoas a estilos de vida caprichosos e volúveis e introduzem-nos numa espiral de procura de comodidade que implica sempre um déficit de virtudes humanas e de interesse pelos outros.

Crescer num mundo em que todos os caprichos são saciados é uma pesada carga para a vida espiritual, que incapacita a alma – quase na raiz – para a doação e o compromisso.

Outro aspeto importante é o ambiente, pois tem uma grande força de persuasão. Todos conhecemos jovens educados na piedade que se viram arrastados por um ambiente que não estavam preparados para superar. Por isso, é preciso estar pendentes de onde se educam os filhos e criar ou procurar ambientes que facilitem o crescimento da fé e da virtude. É algo parecido ao que ocorre num jardim: nós não fazemos crescer as plantas, mas podemos sim proporcionar os meios – adubo, água, etc. – e o clima adequados para que cresçam.

Como aconselhava São Josemaria aos pais: "procurai dar-lhes bom exemplo, procurai não esconder a vossa piedade, procurai ser puros na vossa conduta: então aprenderão e serão a coroa da vossa maturidade e da vossa velhice" [5].

A. Aguiló

[5] São Josemaria Escrivá, Tertúlia, 12-11-1972, em "Educação dos filhos"

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/transmitir-a-fe-i/

“Vivemos com naturalidade” (3)

Fiéis lotam a igreja principal da Administração Apostólica na missa dominical | Davi Corrêa / ACI Digital

“Vivemos com naturalidade”, dizem católicos nascidos e criados no rito romano antigo em Campos.

Por Natalia Zimbrão*

31 de agosto de 2024

A vida paroquial

O padre Ivoli Latrônico é pároco do Imaculado Coração de Nossa Senhora do Rosário de Fátima, em Campos dos Goytacazes, maior cidade do Estado do Rio de Janeiro em área, com mais de 4 mil km², e o quinto maior em população, com 483.540 pessoas.

“Os paroquianos têm uma vida muito corrida no sentido de trabalho, coisas de uma cidade grande”, diz o padre Ivoli. “A questão da frequência é um pouco diferente de uma paróquia do interior, por exemplo, onde o acesso é mais fácil, por conta de uma proximidade da igreja”.

Padre Ivoli coloca o sal bento na boca de bebê durante a celebração do batismo na igreja principal da Administração Apostólica. Davi Corrêa / ACI Digital

Mas “a vida dos paroquianos, da paróquia em si, é muito sadia”, ressaltou o padre. “É uma paróquia normal. Embora pertença à Administração Apostólica e tenha a peculiaridade do rito na forma antiga, mas temos movimentos, pastorais, pastoral da acolhida, pastoral dos jovens, associações como Apostolado da Oração, Congregação Mariana, catequese, Cruzada Eucarística. Então, é uma vida muito normal, como outras paróquias, sendo que temos aquela característica da forma mais antiga da celebração dos sacramentos e a orientação mais tradicional da Igreja”, disse.

O casal Rafael Ferreira e Ana Cristina de Souza cresceu fazendo parte dessas atividades paroquias e hoje incentivam os filhos a seguir o mesmo caminho. “Desde novos, sempre fizemos parte de grupos e associações. Nós fizemos parte da Cruzada Eucarística, e as crianças hoje fazem parte da Cruzada Eucarística. Eu fui coroinha e o Tadeu também faz parte dos coroinhas. Ana é professora de catequese, fez parte da Pia União das Filhas de Maria. Eu faço parte da Congregação Mariana e ela hoje faz parte do Apostolado da Oração. E hoje nós somos o casal de apoio do grupo de jovens”, contou Rafael.

Integrantes da Pia União das Filhas de Maria fazem a coroação de Nossa Senhora no dia da Assunção de Maria, 15 de agosto. Davi Corrêa / ACI Digital

Para Luzia Salvatte Zanon, a participação na vida paroquial “vai além da participação da santa missa”. Há festa junina, almoço, festa com jovens, encontro de jovens, passeios, excursões. “Estamos aí, vivos, para quem quiser acompanhar a gente”, diz ela. 

O padre Ivoli contou que muitas pessoas acabam se aproximando “da paróquia porque se identificam com o carisma, digamos assim, da Administração Apostólica, do canto gregoriano, do silêncio da igreja e, sobretudo, da missa tradicional”, e acabam integrando a comunidade paroquial. Segundo ele, essas pessoas “têm o desejo de uma espiritualidade mais profunda, sobretudo litúrgica”, o que é favorecida na missa no rito romano antigo com “o canto, o incenso, a liturgia, que são muito ricos”.

O sacerdote disse que muitas famílias participam das missas com seus filhos. “Uma missa dominical tem 100, 120 crianças”, disse. A missa dominical com maior presença de crianças é a das 9h15. Depois, vem a catequese. “Enquanto as crianças vão para o catecismo de acordo com as faixas etárias, temos um momento de formação para os pais. Isso tudo ajuda muito a frequência”, disse.

Crianças da catequese na igreja principal da Administração Apostólica, depois da missa dominical. Davi Corrêa / ACI Digital

O pároco contou que, ao visitar os paroquianos em suas casas, observa “essa espiritualidade que é também vivida em suas vidas de oração, as famílias rezam juntas, frequentam ambientes que são mais católicos, evitam aqueles que são mais mundanos, o modo de falar, de se comportar, de se vestir, a questão da oração pessoal”. “Então, é uma característica que vai para além do recinto da igreja, que as pessoas levam consigo”, acrescentou.

Para Rafael Ferreira, a vivência na paróquia da Administração Apostólica “reflete positivamente” na vida da família, “por causa da sacralidade, da piedade que o rito antigo traz”.

“A vida ativa de missas, de catequese e de terço em família faz a gente conseguir ver coisas na nossa vida pelas mãos de Deus mesmo, providência divina na nossa vida, na nossa família, a gente sente a presença de Deus mesmo. Se a gente esmorece na fé, sente que está faltando alguma coisa a mais. E a gente acaba se entregando mais e a graça de Deus vem”, disse Ana Cristina.

Para o médico e organista Víctor Barcelos, a participação na paróquia e a formação que recebe o ajuda “a colocar Deus no centro de tudo”, o que faz a “procurar sempre seguir os princípios da fé, a ética, tudo isso como forma de louvar a Deus”.

Esta matéria faz parte de uma série de reportagens sobre a Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney. A próxima será publicada dia 2 de setembro.

*Natalia Zimbrão é formada em Jornalismo pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É jornalista da ACI Digital desde 2015. Tem experiência anterior em revista, rádio e jornalismo on-line.

Fonte: https://www.acidigital.com/noticia/59011/vivemos-com-naturalidade-dizem-catolicos-nascidos-e-criados-no-rito-romano-antigo

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF