Cardeal Tempesta publica nova Carta Pastoral por ocasião do Jubileu de 2025
Com a Carta Pastoral: "Missão, Esperança e Paz",
por ocasião do Ano Santo de 2025 - “Peregrinos da Esperança”, cardeal Tempesta
institui também na Arquidiocese do Rio de Janeiro o Ministério de Catequistas.
Carlos Moioli – Arquidiocese do Rio de Janeiro
MISSÃO, ESPERANÇA E PAZ
Carta Pastoral do Cardeal
Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo de São Sebastião do Rio
de Janeiro
por ocasião do Ano Santo de 2025
“Peregrinos da Esperança”
20 de outubro de 2024
Dia Mundial das Missões.
Os Jubileus na história da Igreja
26.
À medida que se aproxima o Jubileu do Ano Santo 2025, e com ele toda a
exultação da Igreja pelo tempo de graça que será celebrado, é natural que se
intensifique o interesse pela história das celebrações jubilares que tem suas
raízes na Escritura Sagrada e na vida e missão da Igreja.
27.
Fundamentada na tradição bíblica, a Igreja desenvolveu a tradição das
celebrações jubilares, proclamando-as com o objetivo de serem efetivamente
“tempos de graça”, experiências de perdão geral, e, portanto, de encontro com a
misericórdia divina. O primeiro jubileu, de que se tem notícia, foi
celebrado na história da Igreja foi o do Ano Santo de 1300, convocado pelo Papa
Bonifácio VIII por meio da bula Antiquorum habet, de 22 de
fevereiro de 1300, na qual proclamava aos romanos a concessão de uma
“Indulgência Plenária” se visitassem por 30 vezes dentro do ano santo as
Basílicas de São Pedro e de São Paulo, enquanto aos romeiros ou peregrinos que
viessem de fora de Roma proclamava a mesma concessão de indulgência mediante 15
visitas às citadas basílicas.
28.
De acordo com a proclamação jubilar de Bonifácio VIII, os jubileus seriam
celebrados a cada 100 anos. Contudo, o Papa Clemente VI reduziu
para 50 anos o intervalo entre os jubileus por meio da bula Unigenitus
Dei Filius, em 1343. O Papa Urbano VI, por sua vez, determinou pela
bula Salvator noster Unigenitus, de 8 de abril de 1389, que a
celebração do Jubileu deveria ocorrer a cada 33 anos, fazendo com que o ano
santo ocorresse em 1390 quando, em vez disso, deveria ter caído em 1400.
29.
Pela bula Immensa et innumerabilia, de 19 de janeiro de 1449, o
Papa Nicolau V restaurou o intervalo de 50 anos para as celebrações jubilares.
No entanto, pela bula Ineffabilis Providentia, de 19 de abril de
1470, o Papa Paulo II proclamou o ano de 1475 como o próximo ano santo,
determinando que a partir de então as celebrações jubilares deveriam ocorrer
com intervalos regulares de 25 anos, mencionando expressamente a visita às
Basílicas de São Pedro, São Paulo, São João de Latrão e Santa Maria Maior para
se poder lucrar a indulgência jubilar, o que foi confirmado por Sisto IV através
da bula Quemadmodum operosi, de 29 de agosto de 1473, tendo
em vista a morte de Paulo II antes das celebrações jubilares por ele
convocadas.
30.
Já o Papa Alexandre VI tornou as celebrações jubilares fortemente incrementadas
quando da celebração do Jubileu do Ano Santo de 1500, fixando definitivamente o
cerimonial de abertura e de encerramento dos anos santos, uma vez que até então
esses ritos não tinham seguido uma liturgia específica. Sua intenção era que o
início de cada jubileu fosse marcado por uma simbologia de forte impacto
cerimonial, o que promoveu por meio da abertura da “Porta Santa” em alusão às
palavras de Jesus no Evangelho: “Eu sou a porta. Quem passar por mim será salvo”
(Jo 10,9). Alexandre VI estabeleceu ainda que nas outras três Basílicas papais
se reservasse uma porta santa para os peregrinos dos anos santos, a qual se
manteria emparedada em todos os intervalos jubilares. Deste modo, a abertura da
Porta Santa da Basílica de São Pedro seria desde então reservada ao próprio
Pontífice, e a das outras três basílicas patriarcais aos legados papais. De
acordo com a vontade do Papa, as portas santas deveriam permanecer abertas
noite e dia.
31.
Sobretudo a partir do Concílio de Trento, as celebrações jubilares, já
enriquecidas pelo incremento ritual dado por Alexandre VI, foram marcadas por
aspectos penitenciais pessoalmente manifestados por alguns pontífices. Assim,
por exemplo, quando o Papa Gregório XIII convocou o Jubileu do Ano Santo de
1575 por meio da bula Dominus ac Redemptor, procurou manifestar a
Reforma Católica fortemente alavancada pelo Concílio de Trento através de um
testemunho eclesial de vida devota consonante com o serviço de Deus no
cumprimento dos deveres do estado de vida e no serviço ao próximo. Desta
maneira, aboliu naquele ano os gastos para as comemorações do carnaval em Roma,
destinando todo o recurso ao Hospital dos Peregrinos, sob a tutela de Filipe Neri.
Nessa linha, Clemente VIII conferiu semelhante bom exemplo público quando, ao
proclamar o Ano Santo de 1600 por meio da bula Annus Domini Placabilis,
de 19 de maio de 1599, buscou ouvir confissões durante a Semana Santa, fazendo
inclusive o exercício penitencial de subir a Escada Santa de joelhos, enquanto
os cardeais renunciaram a vestir-se de vermelho no período, como sinal de
penitência.
32.
Por ocasião do Jubileu do Ano Santo de 1625, proclamado pela bula Omnes
Gentes, o Papa Urbano VIII concedeu a indulgência jubilar mesmo àqueles que
não tinham oportunidade de ir a Roma, concedendo-a também aos prisioneiros e
aos doentes. Sobre esse aspecto, convém destacar que no Arquivo da nossa Cúria
Metropolitana se encontram transcritas desde o século XVIII várias diplomações
pontifícias de proclamação de jubileus juntamente com editais dos nossos bispos
antecessores no governo diocesano do Rio de Janeiro, regulando a forma de
celebrar os jubileus, bem como de lucrar a Indulgência Plenária jubilar.
33.
Desde o Ano Santo de 1500, os Jubileus mantiveram uma periodicidade
relativamente constante. Contudo, alguns contextos históricos influenciaram o
intervalo de suas celebrações, como no caso das guerras napoleônicas, que
impediram a celebração do Jubileu do Ano Santo de 1800, e outros fatores que
impossibilitaram o Jubileu de 1850. A regularidade dos intervalos de 25 anos
foi restabelecida somente com o Jubileu do Ano Santo de 1875, convocado pelo
Papa Pio IX pela bula Gravibus Ecclesiae, de 24 de dezembro de
1874. Desde então, celebraram-se regularmente os anos santos jubilares de 1900,
1925, 1950, 1975 e 2000.
34.
Houve, entretanto, os jubileus dos anos santos extraordinários, como o de 1933,
proclamado pelo Papa Pio XI pela bula Quod Nuper, de 6 de janeiro
de 1933, em celebração do 1900º aniversário da Redenção; o de 1983, proclamado
pelo Papa São João Paulo II pela bula Aperite Portas Redemptori, de
6 de janeiro de 1983, em celebração do 1950º aniversário da Redenção; e o
chamado “Jubileu da Misericórdia” de 2016, proclamado pelo Papa Francisco pela
bula Misericordiae Vultus, de 11 de abril de 2015.
35.
Não obstante as variações rituais, as expressões simbólicas e os condicionantes
históricos, as celebrações jubilares foram estabelecidas e vividas ao longo dos
séculos pela Igreja como verdadeiros “anos da graça”, ocasiões solenes de
experiência da misericórdia divina e momentos extraordinários de avivamento do
povo cristão. Por isso, permanecem sempre atuais, convidando o povo cristão a
vivenciá-las fervorosamente em todas as épocas em que são celebradas.
As peregrinações e indulgências jubilares
36.
Na bula de proclamação do Jubileu Ordinário de 2025, o Papa Francisco indica
que a vida cristã é um caminho de esperança, cuja meta é o encontro com o
Senhor Jesus.[2] Desde os primeiros séculos, a
peregrinação é um elemento constitutivo da espiritualidade e da piedade cristã.
Na verdade, a tradição judaica já enxergava a subida a Jerusalém para as festas
celebradas no templo como uma peregrinação ao encontro do Senhor. São
testemunhas desse aspecto da religiosidade judaica os chamados salmos
graduais, como o salmo 121 (122): “Que alegria, quando ouvi que me
disseram: ‘vamos à casa do Senhor!’ E agora nossos pés já se detêm, Jerusalém,
em tuas portas.”[3]
37.
Ao longo da história da Igreja, muitas tradições surgiram da piedade do povo
cristão acerca das peregrinações a santuários e locais considerados pelos fiéis
como de especial encontro com Deus, seja pela presença de relíquias, seja pelos
relatos de aparições ou graças alcançadas. Santuários como o de Compostela, na
Espanha, onde repousam as relíquias do apóstolo São Tiago Maior, a Santa Casa
de Loreto, na Itália, e mesmo o nosso Santuário Nacional de Nossa Senhora
Aparecida são belos sinais de como os fiéis reconhecem a presença de Deus e
suas maravilhas, invocando a intercessão de sua Santa Mãe e de seus santos.
38.
Além desses santuários e locais de particular devoção, dois lugares receberam
ao longo dos séculos especial atenção dos que partiam em peregrinação: a Terra
Santa e Roma. Nos locais sagrados onde viveu Nosso Senhor e onde o cristianismo
teve a sua origem, os fiéis encontram verdadeira fonte de piedade e de contato
com o elemento histórico da fé cristã. Seja visitando a Basílica da Natividade,
em Belém, ou o Santo Sepulcro, em Jerusalém, ou os demais locais santos, os
peregrinos recordam cada passo do Salvador enquanto caminhou em meio aos
homens. Muitos foram os cristãos que, ao longo de séculos de história,
peregrinaram até a Palestina com espírito de fervor e piedade, vivendo a
proximidade com Cristo através dos locais em que Ele viveu. Essa realidade não
passou despercebida a São Paulo VI, que, em visita à Terra Santa em 1964,
chamou-a de o “quinto evangelho”.
39.
Também a cidade de Roma se tornou um dos destinos preferidos daqueles que viam
na peregrinação uma forma de santificação e testemunho da fé. Suas basílicas,
santuários e igrejas, onde se encontram não poucas relíquias de inestimável
valor espiritual e histórico, são como casas que acolhem aqueles que se
achegam ad limina apostolorum (aos túmulos dos apóstolos),
para ali, junto de onde estão sepultadas essas colunas de nossa fé que são os
apóstolos Pedro e Paulo, renovar aquela fé recebida de Cristo e conservada pelo
Sucessor de Pedro e pelo Colégio Universal dos Bispos.
40.
O Papa Francisco recorda que “a peregrinação representa um elemento fundamental
de todo o evento jubilar.”[4] E apresenta uma
justificativa que deve suscitar nossa meditação: “Pôr-se a caminho é típico de
quem anda à procura do sentido da vida.”[5]
Compreendendo o alto valor simbólico da peregrinação para o cristão que está em
constante jornada, rumo à morada eterna com o Senhor, a Igreja sempre
enriqueceu os passos daqueles que se colocavam a caminho dos santuários e
outros lugares santos com o tesouro espiritual das indulgências, sobretudo nos
jubileus.
41. Aqui vale citar
algumas palavras que recordam o valor das indulgências na espiritualidade
cristã. Como nos ensina a Igreja, a indulgência é “a remissão, diante de Deus,
da pena temporal devida pelos pecados já perdoados quanto à culpa, que o fiel,
devidamente disposto e em certas e determinadas condições, alcança por meio da
Igreja, a qual, como dispensadora da redenção, distribui e aplica, com
autoridade, o tesouro das satisfações de Cristo e dos Santos.”[6] Sinais do amor misericordioso de Deus que tudo faz
para nos alcançar, as indulgências educam os cristãos na prática da oração, da
caridade e da comunhão. Afirmou o Papa Francisco: “Apesar do perdão,
carregamos na nossa vida as contradições que são consequência dos nossos
pecados. No sacramento da Reconciliação, Deus perdoa os pecados, que são
verdadeiramente apagados; mas o cunho negativo que os pecados deixaram nos
nossos comportamentos e pensamentos permanece. A misericórdia de Deus, porém, é
mais forte também do que isso. Ela torna-se indulgência do Pai que, através da
Esposa de Cristo, alcança o pecador perdoado e liberta-o de qualquer resíduo
das consequências do pecado, habilitando-o a agir com caridade, a crescer no
amor em vez de recair no pecado”[7].
42.
Recordamos que as indulgências devem ser buscadas sempre com espírito de
contrição e plena adesão a Cristo. Para isso, os fiéis devem estar atentos ao
cumprimento das condições ordinárias, a saber: ter repulsa a todo afeto por
qualquer pecado, até mesmo venial; fazer a confissão sacramental; receber a
comunhão eucarística; e oferecer uma oração pelas intenções do Sumo Pontífice,
que pode ser o Credo, um Pai-Nosso e uma Ave-Maria.[8]
43.
Ao longo do Jubileu, os fiéis poderão lucrar a indulgência plenária ao seguirem
em piedosa peregrinação para os lugares que o bispo diocesano indicar em cada
diocese. Nesses locais sagrados, deverão participar da Santa Missa ou de outros
atos litúrgicos e de piedade que aí se promoverem, tais como a oração da
Liturgia das Horas, a oração do Rosário, a celebração penitencial seguida de
confissões individuais e outras celebrações.
44.
Além da peregrinação, feita muitas vezes em grupos, a Igreja também concederá a
indulgência plenária jubilar aos fiéis que fizerem uma piedosa visita a esses
mesmos lugares indicados pelo bispo. Aí devem se dedicar a um período
considerável de adoração ao Santíssimo Sacramento, concluindo com a Profissão
de Fé (o Credo), o Pai-Nosso e a Ave-Maria.
45.
Dentre os lugares que o bispo pode indicar como local de peregrinação jubilar
numa Diocese, em primeiro lugar está a Igreja Catedral, ponto de unidade de
toda a vida diocesana. Dessa forma, a nossa a Catedral Metropolitana de São
Sebastião será um lugar especial de peregrinação, proporcionando aos fiéis um
ambiente de reconciliação, oração e vivência da caminhada de cada cristão como
peregrino da esperança.
46.
Além de lucrar as indulgências na ocasião das visitas a essas igrejas e
santuários, também será possível lucrar indulgência pela participação em
missões populares, em retiros, e em encontros formativos sobre textos do
Concílio Vaticano II e do Catecismo da Igreja Católica. Também as obras de
misericórdia, que se concretizarão principalmente nas visitas aos doentes, aos
presos e aos necessitados, serão uma oportunidade para um autêntico encontro
com o Coração misericordioso de Cristo.
47.
A Igreja, que tem uma opção preferencial pelos mais pobres e sofredores, se
unirá ainda mais intensamente, no período jubilar, àqueles que não terão a
possibilidade de se deslocar aos locais de celebração e peregrinação, como os
idosos, enfermos e reclusos. Incluem-se também aqueles que, nos hospitais ou em
outras instituições, dedicam-se ao serviço contínuo de assistência a estes
irmãos e irmãs impossibilitados. A todos esses a Igreja oferecerá a
oportunidade de lucrar a indulgência jubilar se, unidos em espírito aos fiéis
presentes nesses locais, sobretudo acompanhando pelos meios de comunicação a
transmissão das palavras do Sumo Pontífice ou do bispo diocesano, recitarem o
Pai-Nosso, a Profissão de Fé e outras orações em conformidade com as
finalidades do Ano Santo, oferecendo os seus sofrimentos ou as dificuldades da
sua vida.
48.
Todas essas oportunidades indulgenciadas – às quais se acrescenta ainda a
faculdade dada aos bispos diocesanos de conceder a Bênção Papal com indulgência
plenária no dia mais oportuno do tempo jubilar[9]
– são sinais da missão entregue por Cristo à Igreja de ser casa de misericórdia
para todos aqueles que se aproximam com o coração sincero e desejoso de
conversão. Cristo, nos recorda São Paulo VI, é a “nossa indulgência”[10], o Primogênito do Pai que por nós se entregou em
sacrifício no altar da cruz. De sua entrega brotam os tesouros de salvação que
a Igreja aplica aos fiéis, primeiramente nos Sacramentos, que causam em nós a
graça. Mas também nas oportunidades sacramentais, como o Jubileu, a Igreja abre
esse tesouro que brota da Cruz, e como despenseira da graça de que Cristo a fez
depositária, enriquece cada fiel que se aproxima para experimentar “a plenitude
do perdão de Deus que não conhece limites.”[11]
____________
2. Deus nos olha, terno e paciente:
nasce a aurora de um futuro novo. / Novos Céus, Terra feita nova: passa os
muros, ‘Spirito’ de vida.
3. Ergue os olhos, move-te com o vento,
não te atrases: chega Deus, no tempo. / Jesus Cristo por ti se fez Homem: aos
milhares seguem o Caminho.
[1] FRANCISCO, Carta ao Arcebispo Rino Fisichella
pelo Jubileu 2025, 11 de fevereiro de 2022.
[2] FRANCISCO, Spes non Confundat, n. 5.
[3] Salmo 121 (122), 1.
[4] FRANCISCO, Spes non Confundat, n. 5.
[5] Ibidem.
[6] MANUAL de indulgências: normas e concessões, p. 8.
[7] FRANCISCO, Misericordiae Vultus, 22.
[8] As indulgências e concessões listadas a partir daqui são
retiradas das Normas para a concessão de indulgências durante o Jubileu
Ordinário do ano 2025, publicadas pela Penitenciaria Apostólica em 13 de
maio de 2024.
[9] PENITENCIARIA APOSTÓLICA. Sobre a concessão da
indulgência do Jubileu Ordinário do ano de 2025 proclamado por sua Santidade o
Papa Francisco.2024.
[10] Apostolorum limina, II.
[11] FRANCISCO, Spes non Confundat, n. 23.
Com afetuosa bênção,
São Sebastião do Rio de Janeiro,
20 de outubro de 2024.
Orani João Cardeal Tempesta, O. Cist.
Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt