Dom
Vital: Os padres da Igreja e a esperança | Vatican News
A esperança foi um dos temas fundamentais dos santos padres,
os primeiros autores cristãos. Eles a percebiam como doutrina bíblica,
sobretudo presente no Apóstolo Paulo (Rm 12,12).
Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.
A igreja iniciará o um ano jubilar ao final de dezembro de
2024 que terá como tema: Peregrinos de esperança e o seu lema: A esperança não
engana (Rm 5,6). O Papa Francisco elaborou uma Bula que é um documento selado,
tendo valor como lei onde o Sumo Pontífice concede indulgencia que é o perdão
dos pecados, e graças seguindo as normas da Igreja que é a participação da vida
da comunidade pela missa, confissão dos pecados, eucaristia, rezar pelo Papa e
realizar obras de caridade[1]. A palavra esperança vem do latim; Speransa cujo
significado é esperar, sentimento de expectativa confiante na realização
presente[2]. A esperança é a mensagem central do ano jubilar. Ainda que as
pessoas carreguem dúvidas, no entanto acreditam na esperança, no hoje da
existência e no amanhã, na vida verdadeira, a eterna. O Papa Francisco solicita
a toda a Igreja para que o ano jubilar seja ocasião para reanimar a esperança,
deixarmo-nos guiar pela esperança em Jesus Cristo, porque a esperança não
decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações, pelo
Espírito Santo que nos foi dado (Rm 5,1-2, 5). Vejamos a seguir a esperança nos
santos padres, os primeiros escritores cristãos.
A esperança nos padres da Igreja
A esperança foi um dos temas fundamentais dos santos padres,
os primeiros autores cristãos. Eles a percebiam como doutrina bíblica,
sobretudo presente no Apóstolo Paulo (Rm 12,12). Os padres da Igreja
desenvolveram o tema da esperança segundo exigências pastorais e espirituais
devido aos confrontos do cristianismo com a cultura antiga. Eles tinham
presentes os Salmos e as Cartas Paulinas sobretudo a Carta aos Romanos (Rm
5-8). Havia a explicitação de que era preciso aprofundar a esperança cristã da
vida além da morte, a ressurreição da carne, ponto afirmado pelos Padres como
Tertuliano e Orígenes diante do confronto as vezes negado pelo paganismo, em
relação à vida além da morte[3].
A consolação provinda da esperança
Santo Agostinho, bispo dos séculos IV e V em Hipona, Norte
da África afirmou que o fiel, a pessoa que segue Jesus Cristo e a sua Igreja
passa por muitos sofrimentos, perseguições até por viver o amor de Cristo.
Existem muitas discórdias entre as pessoas, povos. No entanto a alegria é
própria da pessoa cristã. A esperança é graça do Senhor na qual vive a
consolação pelo dom de Deus. O amor é possível entre as pessoas na convivência,
nos lares, na comunidade e no mundo. Deus caminha com as pessoas que lutam pelo
bem, pela graça da esperança, para que a unidade em Cristo Jesus se realize[4].
A esperança humana em Jesus Cristo
Santo Agostinho ainda teve presentes que as tribulações vão
se difundindo pelas pessoas mas Jesus vem caminhando sobre as ondas, garantindo
a sua presença para as pessoas que acreditam nele num mundo melhor. Se as
pessoas se espantam porque as perseguições ocorrem contra os cristãos, Jesus
Cristo é a esperança pois ele caminha sobre as ondas, afastando as ambições e a
soberba terrenas. Os discípulos ficaram com medo ao ver Jesus caminhando sobre
as ondas do mar, mas Jesus lhes garantiu a sua presença, a esperança de uma
vida melhor (cf. Mt 14,27). Jesus disse aos seus discípulos que não era para
temer ninguém pois era Ele, de modo que os discípulos não teriam medo, mas a
esperança de que era Ele, o Salvador da humanidade (cf. Jo 6,20)[5]
A esperança nos bens eternos
Santo Agostinho também afirmou que a família que confia em
Deus, possui a esperança nos bens eternos e não naqueles que passam, pois são
caducos. É claro que a família enquanto peregrina neste mundo, usa dos bens
terrenos, sabendo que estes passam e é preciso que a comunidade, a Igreja não
se tornem escravas dos mesmos[6], de modo que ela utiliza-se deles, como
instrumento da graça e nunca como fim.
As coisas deste mundo e as do mundo futuro
São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, séculos IV e
V, disse que a graça de Deus não tem fim, porque ela sempre alude para o melhor
em relação aos seres humanos. No futuro, as coisas de Deus são dadas pelo amor
dele para cada pessoa humana, porque serão concedidas em plenitude. Por isso o
Apóstolo Paulo disse que nós nos gloriamos na esperança da glória de Deus ( cf.
Rm 5,2) para que assim as pessoas não se apegam demais nas coisas deste mundo,
esquecendo-se daquelas do futuro dadas em sua plenitude. A esperança das
realidades futuras deve superar aquelas que passam, porque a glória de Deus é o
seu resultado, não por obra humana, mas pela graça de Deus que age na pessoa
humana[7].
E a esperança não decepciona
São João Crisóstomo disse que a esperança é reforçada pelas
tribulações que as pessoas passam neste mundo devido à vida futura. São Paulo
foi bem objetivo na afirmação que a esperança não decepciona (Rm 5,5), porque
ela aponta para o futuro em vista das realidades eternas. O bispo disse que as
pessoas que não vivem bem caem no desespero em vista do futuro, temendo o
juízo, enquanto as pessoas que levam uma vida honesta, com muito amor ao
próximo e a Deus não tem medo porque estão em comunhão com o Senhor e com as
pessoas. Elas possuem uma grande esperança que não decepciona das verdades
futuras. As pessoas passarão pela morte, mas carrega-se a esperança da
ressurreição e nada haverá que faça confundir as pessoas que acreditem no
Senhor, porque elas não abraçaram uma esperança transitória, mas sim a eterna.
A esperança não decepciona porque o amor de Deus foi derramado em nossos
corações (cf. Rm 5,5), de modo que o apóstolo afirmou que não foi dado, mas ele
foi derramado, indicando a iniciativa de sua divina liberalidade[8].
O dom divino
São João Crisóstomo disse também que a esperança vem por
graça do Espírito Santo. Ele fez de cada um de nós, filhos e filhas de Deus,
irmãos em Cristo, por graça do Espírito Santo. A caridade com o próximo aponta
para a esperança de modo que somos chamados a fazer obras de caridade. O bispo
convidou os fiéis para não perder a esperança porque nós temos a caridade
perante o juiz, o Senhor Deus, de modo que a esperança não decepciona (Rm 5,5),
não atribuindo às nossas obras, mas ao amor de Deus pelas obras de caridade, de
amor[9].
Nós somos chamados a viver bem o ano jubilar pela graça da
indulgência, pela esperança que vem de Deus Uno e Trino em vista da nossa
salvação e da salvação do mundo inteiro. Sejamos na família, na comunidade e na
sociedade pessoas de esperança. Os Padres da Igreja ressaltaram a graça da
esperança em ligação ao Espírito Santo, a Jesus Cristo e ao Pai, Deus Uno e
Trino.
Notas:
[1] Cfr> https://www.vatican.va/content/francesco/pt/bulls/documents/20240509_spes
non confundit - Bula de proclamação do Jubileu Ordinário do Ano 2025 (9 de maio
de 2024) | Francisco
[2] Cfr. Speranza. In: Il Vocabolario
Treccani, Il Conciso. Roma, 1998, pg. 1652.
[3] Cfr. Basil Studer. Speranza. In: Nuovo
Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angelo Di Berardino.
Genova, Marietti, 2008, pg. 5074
[4] Cfr. Agostino. Le Lettere, II, 130,4-5 (A.
Proba). In: La teologia dos pdres, volume 3, Roma,
Città Nuova Editrice. 1982, pg. 99
[5] Cfr. Agostino, Ciommento al Vangelo di San
Giovanni, 25,6-7.In: Idem, pg. 100.
[6] Cfr. Agostino. La Città di Dio, 1,29.
In: Idem, pg 101,
[7] Cfr. Giovanni Crisostomo. Commento alla lettera
ai Romani, 10,2. In: Idem, pg. 102.
[8] Cfr. São João Crisóstomo. Comentário às Cartas
de São Paulo/1. São Paulo, Paulus, pg. 169-170.
[9] Cfr. Idem, pg. 170.
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt