Translate

segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

O Papa: uma Teologia apenas de homens é uma Teologia pela metade, é necessária a contribuição feminina

O Papa Francisco com os participantes do Congresso Internacional sobre o Futuro da Teologia  (Vatican Media)

Francisco recebeu em audiência os participantes do Congresso Internacional sobre o Futuro da Teologia, organizado pelo Dicastério para a Cultura e a Educação. Ele fez um apelo para que esta disciplina, “luz” que faz emergir o Evangelho, possa ser “acessível a todos” e ajude a “repensar o pensamento” num mundo complexo. O Pontífice exortou a combater as ideologias que “achatam tudo” e matam a realidade, o pensamento, a comunidade.

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Pontífice manifestou satisfação por professores, pesquisadores e reitores, provenientes de várias partes do mundo, terem se reunido para refletir sobre "como herdar o grande patrimônio teológico das gerações passadas e imaginar o futuro".

Francisco disse que quando pensa na Teologia, vem à sua mente a luz. "Graças à luz, as coisas emergem da escuridão, os rostos revelam os seus contornos, as formas e as cores do mundo aparecem finalmente. A luz é bela porque faz com que as coisas apareçam, mas sem se exibir", disse ele.

"Agora, aqui, admiramos esta sala, vemos nossos rostos, mas não percebemos a luz, porque ela é discreta, é gentil, é humilde e, portanto, permanece invisível", disse o Papa, acrescentando:

Assim também é a Teologia: ela faz um trabalho escondido e humilde, de modo que a luz de Cristo e seu Evangelho possa emergir. A partir dessa observação, surge para vocês um caminho: buscar a graça e permanecer na graça da amizade com Cristo, a verdadeira luz que veio a este mundo. Toda Teologia nasce da amizade com Cristo e do amor por seus irmãos, suas irmãs, seu mundo; este mundo, dramático e magnífico ao mesmo tempo, cheio de dor, mas também de beleza comovente.

O Papa convidou os participantes do Congresso Internacional sobre o Futuro da Teologia a se fazerem as seguintes perguntas: Teologia, onde você está? Com quem você está caminhando? O que está fazendo pela humanidade? "Esses dias serão importantes para abordar essas questões, para perguntar se a herança teológica do passado ainda pode dizer alguma coisa aos desafios de hoje e nos ajudar a imaginar o futuro. Este é um caminho que vocês são chamados a percorrer juntos, teólogos e teólogas", disse ainda Francisco.

A seguir, o Papa recordou uma passagem do Segundo Livro dos Reis que diz que "durante a restauração do Templo de Jerusalém, foi encontrado um texto, talvez seja a primeira edição perdida de Deuteronômio. Um sacerdote e alguns estudiosos o leram; até o rei o estudou; eles intuem algo, mas não o entendem. Então o rei decide entregá-lo a uma mulher, Hulda, que imediatamente o entende e ajuda o grupo de estudiosos – todos homens – a entendê-lo". "Há coisas que só as mulheres intuem e a Teologia precisa da sua contribuição. Uma Teologia apenas de homens é uma Teologia pela metade. Ainda há um longo caminho a percorrer neste sentido", sublinhou o Papa.

A seguir, o Papa entregou-lhes um desejo e um convite.

O desejo é que a Teologia ajude a repensar o pensamento. O nosso modo de pensar, como sabemos, também molda nossos sentimentos, nossa vontade e nossas decisões. Um coração amplo corresponde a uma imaginação e um pensamento amplos, enquanto um pensamento retraído, fechado e medíocre dificilmente pode gerar criatividade e coragem.

O Papa recordou os livros didáticos de Teologia que eram usados para estudar. Disse que eram "todos fechados, todos parecidos com museus, com bibliotecas, mas não faziam pensar".

Segundo o Pontífice, "a primeira coisa a fazer, para repensar o pensamento, é curar a simplificação. De fato, a realidade é complexa, os desafios são variados, a história é habitada pela beleza e, ao mesmo tempo, ferida pelo mal, e quando não se consegue ou não se quer lidar com o drama dessa complexidade, facilmente se tende a simplificar".

Mas a simplificação, no entanto, quer mutilar a realidade, dá origem a pensamentos estéreis e, pensamentos unívocos, gera polarizações e fragmentações. Assim fazem, por exemplo, as ideologias. A ideologia é uma simplificação que mata: mata a realidade, mata o pensamento, mata a comunidade. As ideologias achatam tudo numa única ideia, e depois a repetem de forma obsessiva e instrumental, superficial e como papagaios.

De acordo com o Papa, "um antídoto contra a simplificação é indicado na Constituição Apostólica Veritatis gaudium: interdisciplinaridade e transdisciplinaridade. Trata-se de fazer “fermentar” a forma do pensamento teológico junto com a de outros conhecimentos: filosofia, literatura, artes, matemática, física, história, ciências jurídicas, políticas e econômicas. Deixar fermentar o conhecimento, porque são como os sentidos do corpo: cada um tem a sua especificidade, mas precisam um do outro, segundo também diz o apóstolo Paulo: «Se todo o corpo fosse olho, onde estaria a audição? Se tudo fosse ouvido, onde estaria o olfato?»".

Francisco recordou que "este ano celebramos o 750º aniversário da morte de dois grandes teólogos: Santo Tomás de Aquino e São Boaventura. Tomás lembra que não temos apenas um sentido, mas múltiplos sentidos, e sentidos diferentes, para que a realidade não nos escape. E Boaventura afirma que, na medida em que alguém «acredita, espera e ama Jesus Cristo», «recupera a audição e a visão, o olfato, o paladar e o tato»". "Ao ajudar a repensar o pensamento, a Teologia voltará a brilhar como merece, na Igreja e nas culturas, ajudando todos e cada um na busca da verdade", disse ainda o Papa.

A seguir, Francisco fez um convite: que a Teologia seja acessível a todos. Segundo o Pontífice, "há alguns anos, em muitas partes do mundo, existe um interesse entre os adultos em retomar a sua formação, incluindo a formação acadêmica. Homens e mulheres, especialmente de meia-idade, talvez já formados, desejam aprofundar a sua fé, querem fazer um caminho, muitas vezes matriculam-se numa faculdade universitária. E este é um fenômeno de crescimento. É também um fenômeno em crescimento que merece o interesse da sociedade e da Igreja".

"A meia-idade é uma época especial da vida. É uma época em que geralmente se goza de uma certa segurança profissional e solidez emocional, mas também é uma época em que os fracassos são sentidos com maior dor e novas questões surgem à medida que os sonhos juvenis desmoronam. Nesta fase é possível sentir uma sensação de abandono e, às vezes, a alma se bloqueia. É a crise da meia-idade. Sente-se a necessidade de retomar uma busca, talvez tateando, talvez sendo segurado pela mão, e a Teologia é esta companheira de viagem ", disse ainda o Papa, concluindo:

Se alguma dessas pessoas bater à porta da Teologia, das escolas de Teologia, por favor, encontre-a aberta. Façam com que estas mulheres e homens encontrem na Teologia uma casa aberta, um lugar onde possam retomar o caminho, onde possam procurar, encontrar e procurar novamente. Preparem-se para isso. Imaginem coisas novas nos programas de estudo para que a Teologia seja acessível a todos.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

domingo, 8 de dezembro de 2024

O triste Natal de Belém, a cidade do Natal por excelência

Gary Yim | Shutterstock - Belém, Palestina

Francisco Vêneto - publicado em 26/12/23

A cidade palestina onde nasceu Jesus cancelou as festividades públicas do Natal deste ano - mas o contexto é mais complexo que o da guerra.

Em novembro, no contexto da guerra em andamento entre o Estado de Israel e o grupo terrorista islâmico Hamas, a prefeitura de Belém, na Palestina, anunciou a remoção de todas as decorações natalinas “em luto pelas almas dos mártires e em solidariedade com o nosso povo em Gaza”. A prefeita da cidade onde Jesus nasceu, aliás, é cristã: Vera Baboun governa em coalização com políticos muçulmanos.

Pouco antes dessa decisão, as igrejas cristãs na Terra Santa haviam lançado um comunicado conjunto orientando os fiéis a priorizarem o aspecto espiritual do Natal em vez de celebrações “desnecessariamente festivas”, já que, devido à guerra, “tem havido uma atmosfera de tristeza e dor”, em que “milhares de civis inocentes, incluindo mulheres e crianças, morreram ou sofreram ferimentos graves”.

O texto não faz menção aos lados em conflito e por isso foi interpretado de distintas maneiras mundo afora: por um lado, como sinal busca pela paz; por outro, como uma demonstração da autonomia cada vez menor dos cristãos palestinos.

População cristã em declínio acentuado

De fato, é impactante a diminuição do número de cristãos palestinos. Eles chegaram a ser 11% da população local em 1922, caindo para 6% em 1967 e reduzindo-se hoje para menos de 1%.

Especificamente em Belém, que por motivos óbvios é uma cidade de imensurável importância para os cristãos, a população cristã era de 84% em 1922, mas já tinha caído para 28% em 2007. Atualmente, todas as estimativas a calculam como inferior a 20%.

Os cristãos palestinos, que na maioria são árabes, se concentram em poucas cidades, como a própria Belém, Nazaré e a capital, Ramala – que, aliás, foi fundada no século XVII por árabes cristãos. Além de minoritários, os cristãos são fragmentados: só em Ramala, mesmo com apenas 40 mil habitantes dos quais a grande maioria são muçulmanos, há cerca de dez tradições cristãs diferentes, entre elas a católica romana e a ortodoxa grega, que são as duas maiores, e também, em menor número, a copta, a católica grega, a luterana, a anglicana, entre outras.

A redução acelerada da presença cristã na Palestina costuma ser “explicada” de modo simplista como decorrente da emigração.

Mas o que leva os cristãos a terem de emigrar?

Restrições religiosas

Ehab Hassan é um cristão palestino que vive hoje nos Estados Unidos e não pretende voltar à Palestina. Ele mesmo afirma que, nos Estados Unidos, tem liberdade e segurança para criticar as autoridades palestinas, o que não teria na sua própria terra. Entrevistado pelo jornal brasileiro Gazeta do Povo, Hassan relatou que nasceu em família muçulmana, mas se converteu ao cristianismo em 2015 – e era o único cristão da sua vila.

Chama a atenção, no seu relato, a informação de que as igrejas cristãs em Ramala foram muito reticentes em aceitá-lo como membro: demorou três anos até que uma delas o aceitasse. E por quê? Hassan resume: os cristãos são relativamente protegidos pelo governo local, desde que não tentem converter muçulmanos. Por isso, as igrejas têm medo de represálias se aceitarem a adesão de muçulmanos convertidos.

Desconfiança das autoridades

Em 2020, o Centro Palestino de Política e Pesquisa divulgou um levantamento apontando que 23% dos cristãos palestinos pretendiam deixar o território, aumentando para mais de 50% na faixa etária dos 18 aos 29 anos. Eles também demonstraram desconfiança tanto no tocante às autoridades palestinas quanto às israelenses: 62% disseram acreditar que Israel pretendia removê-los, enquanto 77% declarou temer os fundamentalistas islâmicos.

Discriminação religiosa

No tocante às oportunidades sociais e econômicas na Palestina, 43% dos cristãos palestinos entrevistados disseram acreditar que os muçulmanos não querem a sua presença; 44% afirmaram que existe discriminação religiosa na busca por um emprego; pouco mais de 50% consideraram que a Autoridade Palestina deveria promover melhor as oportunidades de trabalho para os cristãos.

Gaza, um caso à parte

As difíceis condições de vida dos cristãos mencionadas acima se referem à área da Palestina conhecida como Cisjordânia, separada da Faixa de Gaza. Em Gaza, região submetida ao controle do grupo terrorista Hamas, a situação é incomparavelmente mais dramática. Ehab Hassan chega a sintetizar: “A situação em Gaza é mil vezes pior do que em Ramala”. Restam em Gaza menos de mil cristãos.

Opressão política

Mesmo na Cisjordânia, a participação cristã na vida política é cada vez mais condicionada à sua adesão pública às diretrizes da maioria islâmica e anti-Israel. Ehab Hassan observa, na sua entrevista à Gazeta do Povo, que não é comum ouvir críticas de líderes cristãos locais às autoridades palestinas: “Você não pode criticar livremente a comunidade muçulmana ou as autoridades muçulmanas. Eles acusam Israel por tudo, mas nunca dizem nada sobre o Hamas”.

Cancelamento do Natal em Belém

Dadas as circunstâncias, é difícil saber até que ponto a supressão das festividades natalinas na própria cidade em que nasceu Jesus não se deve ao medo de represálias locais. O que não é difícil constatar é que, sofrendo restrições à ação missionária, discriminação religiosa no cotidiano e opressão política sistemática, a tendência é que restem cada vez menos cristãos na Palestina para celebrar os Natais do futuro próximo.

Fonte: https://pt.aleteia.org/2023/12/26/o-triste-natal-de-belem-a-cidade-do-natal-por-excelencia

Reflexão para o 2º domingo do Advento (C)

Evangelho do domingo (Vatican News)

A misericórdia de Deus é maior que todas as crises e tragédias humanas, por isso Ele não cessa de recriar, de reanimar seus filhos.

Padre Cesar Augusto, SJ – Vatican News

Jerusalém é convidada a trocar as vestes de luto pelas da justiça. Com essa frase introdutória à primeira leitura deste domingo, o Profeta Baruc está anunciando a restauração da cidade, promovida pelo coração misericordioso de Deus. O Senhor ao ensinar as pessoas a praticarem a justiça, estará restabelecendo uma sociedade justa.  Nela as relações humanas serão dirigidas para a paz.

A misericórdia de Deus é maior que todas as crises e tragédias humanas, por isso Ele não cessa de recriar, de reanimar seus filhos.

No Evangelho, Lucas mostra João Batista anunciando a nova sociedade que nasce do batismo de conversão, isto é, nasce de uma profunda mudança de vida, de um voltar-se para Deus, da prática da justiça e do desejo de paz. A sociedade antiga, marcada pelos poderes políticos e religiosos, cederá seu espaço à nova, construída sobre os alicerces da partilha, do serviço, da misericórdia. Por isso as estradas deverão ser endireitadas, deverá ser corrigido tudo aquilo que machuca, que incomoda, que faz o povo de Deus sofrer. É necessário que tudo fique pronto para que todos possam ver a salvação de Deus.

Essa salvação de Deus só poderá chegar quando os corações forem libertos das amarras da opressão, de qualquer escravidão, livres de egoísmo e de desvios. Somente aí o Messias, o Salvador, o Príncipe da Paz poderá exercer sua missão de Pacificador e de Redentor. Poderá realizar as transformações pessoais e sociais.

A segunda leitura, extraída da Carta aos Filipenses, coloca-nos Paulo  falando: “Tenho a certeza de que aquele que começou em vós uma boa obra, há de levá-la à perfeição até à vinda de Cristo Jesus.” Para Paulo, a força do Evangelho é tamanha que é capaz de criar uma nova sociedade, comprometida com o projeto de Deus, capacitada em discernir o que é melhor para todos.

Preparemo-nos para o Natal. Preparemo-nos para celebrar a chegada da Vida. Que este tempo nos ajude a um reajuste ou, se for necessário, a uma total mudança de vida. O Príncipe da Paz encontre em nossa vida, pessoa capacitada a colaborar com ele na mudança para um mundo mais justo, mais fraterno, com feições mais humanas, capaz de gestos concretos de misericórdia – reflexo do seu Criador.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Terceira catequese do Advento: Advento, na escola de Nossa Senhora da Expectação

O Sentido do Advento (Catequizar)

TERCEIRA CATEQUESE DO ADVENTO: ADVENTO, NA ESCOLA DE NOSSA SENHORA DA EXPECTAÇÃO 

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro (RJ)
 

O Advento é o tempo litúrgico em que a Igreja se prepara para a chegada de Jesus Cristo. Neste período, a figura de Nossa Senhora ganha especial destaque, especialmente sob o título de Nossa Senhora da Expectação, que representa Maria como aquela que espera, com fé e esperança, o nascimento do Salvador. Com o tema Advento, na escola de Nossa Senhora da Expectação, somos convidados a aprender com Maria como viver a espera ativa, a oração e a prontidão espiritual. 

Quem é Nossa Senhora da Expectação? Nossa Senhora da Expectação, também conhecida como Nossa Senhora do Ó, é um título atribuído à Virgem Maria que destaca sua atitude de expectativa e preparação para o nascimento de Jesus. Esta devoção remonta ao século VII, quando a Igreja começou a celebrar a festa da Expectação do Parto de Maria no dia 18 de dezembro, poucos dias antes do Natal. 

O título “do Ó” é associado às antífonas maiores do Advento, conhecidas como Antífonas do Ó, que expressam a ansiedade e o desejo pela vinda do Messias. Maria, com sua espera silenciosa e cheia de fé, é o modelo perfeito para os cristãos que aguardam a chegada de Cristo no Natal e sua vinda gloriosa no fim dos tempos. 

A Escola de Maria: Como Esperar com Fé. Maria nos ensina que a espera não é passiva, mas ativa. Sua atitude no Advento é marcada por três dimensões principais: a fé, a esperança e a prontidão para o serviço. 

 A fé que Confia no Plano de Deus: Maria recebeu o anúncio do anjo Gabriel com uma fé inabalável: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1,38). Sua resposta revela uma total entrega ao plano de Deus, mesmo diante da incerteza e dos desafios. 

Na escola de Maria, aprendemos que, durante o Advento, é necessário confiar plenamente no Senhor, mesmo quando não compreendemos todos os aspectos de sua vontade. A fé nos permite reconhecer que Deus está presente em cada momento de nossa vida, conduzindo-nos ao bem. 

Por isso nestes abençoados dias de espera rezemos o “Magnificat” (Lc 1,46-55), louvando a Deus por suas maravilhas e renovando sua confiança no plano divino. 

A Esperança que Sustenta a Caminhada: Maria esperou o nascimento de Jesus com uma esperança firme, sabendo que a promessa de Deus seria cumprida. Essa esperança é a base de sua serenidade e coragem. No Advento, somos chamados a renovar nossa esperança, especialmente em tempos de dificuldade. Assim como Maria, devemos acreditar que Deus cumpre suas promessas e que sua presença transforma toda realidade. 

Durante este tempo do Advento, reserve um momento diário para meditar sobre as promessas de Deus na Bíblia, especialmente as profecias sobre a vinda do Messias. 

 O Serviço como Resposta à Espera: A espera de Maria foi ativa: ela foi ao encontro de sua prima Isabel para ajudá-la, mesmo estando grávida (Lc 1,39-56). Sua prontidão para o serviço mostra que a verdadeira preparação para Cristo inclui o cuidado com o próximo. 

No Advento, a escola de Maria nos ensina que a caridade é uma forma de preparar o coração para receber Jesus. O amor ao próximo reflete a luz de Cristo que está por vir. 

Numa preparação mais próxima do Natal recomendo que na medida do possível, você participe de iniciativas solidárias, como campanhas de doação ou visitas a pessoas necessitadas, seguindo o exemplo de Maria. 

 Maria: Modelo de Oração e Silêncio. Nossa Senhora da Expectação nos ensina o valor da oração e do silêncio durante o Advento. Maria guardava todas as coisas em seu coração, meditando sobre os mistérios de Deus (Lc 2,19). Este silêncio contemplativo não é vazio, mas cheio da presença de Deus. 

O Silêncio que Escuta: Em um mundo ruidoso, Maria nos ensina a importância de criar espaço para ouvir a voz de Deus. No Advento, somos convidados a diminuir o ritmo, evitar distrações excessivas e focar na escuta da Palavra de Deus. Dedique momentos do dia ao silêncio e à leitura orante da Bíblia (Lectio Divina), deixando que a Palavra de Deus fale ao seu coração. 

A Oração que transforma: A oração de Maria não era apenas contemplativa, mas profundamente transformadora. No Advento, a oração é o canal que nos permite entregar nossos anseios e preparar o coração para acolher Cristo. Como é salutar ter intimidade com a oração mariana por excelência que nos conduz aos mistérios do nascimento, vida, morte e ressurreição de Jesus. Reze o terço diariamente, contemplando os mistérios gozosos, que destacam os momentos iniciais da vida de Jesus e sua vinda ao mundo. 

 Preparar o Coração com Maria: Maria nos ensina que a preparação para o Natal é uma experiência interior e comunitária. Sua atitude de humildade, entrega e amor nos convida a refletir sobre como estamos nos preparando para acolher Jesus em nossa vida. 

Endireitar as Veredas: Assim como João Batista pregava a conversão, Maria nos inspira a remover os obstáculos espirituais que nos afastam de Deus. O Advento é um tempo de reconciliação e de renovação interior. Aproveite este tempo do Advento para participar do Sacramento da Reconciliação e renovar sua vida espiritual. 

Viver a Comunhão: Maria nos ensina a importância de viver em comunhão com a Igreja e a comunidade. Ao visitar Isabel, ela nos mostra que a fé se fortalece no encontro com os outros. Participe ativamente das celebrações comunitárias de sua paróquia durante o Advento, especialmente da Novena de Natal. 

Acompanhar Maria na Expectativa: Nossa Senhora da Expectação nos guia no caminho do Advento, ensinando-nos a esperar com fé, esperança e amor. Seu exemplo de oração, humildade e serviço é um farol para todos os cristãos que aguardam a chegada do Salvador. 

Ao longo deste tempo sagrado, sigamos os passos de Maria, abrindo nossos corações para que Cristo nasça em nós e transforme nossa vida. Que a espera do Natal, vivida na escola de Nossa Senhora, nos conduza a um encontro renovador com Jesus, fonte de toda paz e alegria! 

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Papa cria 21 novos cardeais em Consistório, como o brasileiro Jaime Spengler

Dom Jaime Spengler, arcebispo de Porto Alegre, é um dos 21 novos cardeais (foto: Reuters)

Dom Jaime Spengler, presidente da CNBB e do Celam, está em Roma desde quarta-feira (04/12) e cumpriu intensa agenda até o final da tarde deste sábado (07/12) quando participou do Consistório Ordinário Público e foi criado cardeal pelo Papa Francisco.

A biografia dos novos cardeais do Consistório de 7 de dezembro

Andressa Collet - Vatican News

Dom Jaime Spengler, franciscano brasileiro de 64 anos, foi criado cardeal pelo Papa Francisco neste sábado (07/12), na Basílica de São Pedro, durante o Consistório Ordinário Público. O arcebispo de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, é presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e do Celam (Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho), além de ser membro dos dicastérios para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos e do Instituto de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica da Santa Sé, no Vaticano.

O rito de criação dos novos cardeais

A celebração começou com o canto Tu es Petrus e as palavras de agradecimento a Francisco pronunciadas pelo primeiro cardeal da lista, Angelo Acerbi, ex-núncio apostólico. Em seguida, o Papa pronunciou a fórmula para a criação dos novos purpurados, que juraram fidelidade e obediência ao Pontífice e a seus sucessores "até o derramamento de sangue". Um a um eles se aproximaram da sede do Papa para receber os símbolos do cardinalato de joelhos: solidéu vermelho, barrete, anel e a atribuição a um Título ou Diaconia. Após, todos receberam o abraço de paz de Francisco.

Dom Jaime Spengler, por exemplo, recebeu o título da igreja de "S. Gregório Magno alla Magliana Nuova", que está localizada no bairro Portuense, em Roma, com sede paroquial desde 14 de dezembro de 1963. A partir de 26 de agosto de 2023 o título estava vacante. O título cardinalício, diferentemente do cargo eclesiástico específico a que um cardeal pode ser chamado, é vitalício e simboliza a participação do cardeal no clero romano e a unidade do Colégio de Cardeais como um instrumento de apoio à atividade pastoral do Bispo de Roma: o Papa. É uma “pertença que exprime a unidade da Igreja e o vínculo de todas as Igrejas com a Igreja de Roma”, como já havia escrito o próprio Papa Francisco em carta divulgada em 12 de outubro dirigida a todos os novos cardeais deste 7 de dezembro.

A primeira missa de dom Jaime como cardeal em Porto Alegre será em 17 de dezembro, às 10h, na Catedral Metropolitana (foto Reuters)
Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

CRISTANDADE: A oração, os milagres, a virgindade de Maria, a humanidade de Jesus (II)

Maria e o Dragão (Jornal O São Paulo)

Arquivo 30Giorni nº. 12 - 2011

A oração, os milagres, a virgindade de Maria, a humanidade de Jesus

Bento XVI no Advento e no Natal

Solenidade da Imaculada Conceição da Bem-Aventurada Virgem Maria
Quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Nossa Senhora e a Igreja

O único perigo que a Igreja pode e deve temer é o pecado dos seus membros

Na visão do Apocalipse há outro detalhe: na cabeça da mulher vestida de sol há “uma coroa de doze estrelas”. Este sinal representa as doze tribos de Israel e significa que a Virgem Maria está no centro do Povo de Deus, de toda a comunhão dos santos. E assim esta imagem da coroa de doze estrelas nos apresenta a segunda grande interpretação do signo celeste da “mulher vestida de sol”: além de representar Nossa Senhora, este sinal personifica a Igreja, a comunidade cristã de todos os tempos . Ela está grávida, no sentido de que leva Cristo no seu seio e deve dá-lo à luz no mundo: eis o trabalho da Igreja peregrina na terra, que no meio das consolações de Deus e das perseguições do mundo deve levar Jesus aos homens.

É precisamente por esta razão, porque transporta Jesus, que a Igreja encontra a oposição de um adversário feroz, representado na visão apocalíptica por «um enorme dragão vermelho» ( Ap 12, 3). Este dragão tentou em vão devorar Jesus – o “filho homem, destinado a governar todas as nações” (12, 5) – em vão porque Jesus, através da sua morte e ressurreição, ascendeu a Deus e sentou-se no seu trono. Portanto o dragão, derrotado de uma vez por todas no céu, volta os seus ataques contra a mulher – a Igreja – no deserto do mundo. Mas em todos os tempos a Igreja é sustentada pela luz e pela força de Deus, que a alimenta no deserto com o pão da sua Palavra e a santa Eucaristia. E assim, em cada tribulação, em todas as provações que encontra ao longo do tempo e em diferentes partes do mundo, a Igreja sofre perseguições, mas sai vitoriosa. E precisamente deste modo a comunidade cristã é a presença, a garantia do amor de Deus contra todas as ideologias de ódio e de egoísmo.

O único perigo que a Igreja pode e deve temer é o pecado dos seus membros. Na verdade, enquanto Maria é Imaculada, livre de toda mancha de pecado, a Igreja é santa, mas ao mesmo tempo marcada pelos nossos pecados.

Por isso também nós, especialmente nesta ocasião, não deixamos de pedir a sua ajuda com confiança filial: “Ó Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a ti”. Ora pro nobis, interceda pro nobis ad Dominum Iesum Christum !

 Fonte: https://www.30giorni.it/

Papa: Maria salva o mundo; não há salvação sem a mulher

Solenidade da Imaculada Conceição (Vatican Media)

Na missa no Vaticano com os novos cardeais, Francisco deseja que o modo como a Virgem viveu a filiação, a esponsalidade e a maternidade “nos conquiste”, porque a Imaculada não é um mito, mas um projeto bonito e concreto. Toda presunção de autossuficiência, de fato, não gera nem amor, nem felicidade: “de que adiantam os altos níveis de crescimento econômico dos países privilegiados, se metade do mundo morre de fome e de guerra, e outros ainda observam com indiferença?”

Antonella Palermo - Vatican News

Na Solenidade da Imaculada Conceição, que este ano coincide com o segundo Domingo do Advento, o Papa Francisco preside a Santa Missa na Basílica Vaticana, onde neste sábado (07/12) criou 21 cardeais, “portadores de uma única Sabedoria com muitas faces”, que neste domingo (08/12) participam da celebração de ação de graças com o Pontífice. A homilia se concentrou na beleza de Maria, “serva” não no sentido de “subjugada”, mas de “estimada”. Uma existência, a dela, a ser tomada como critério praticável de vida, no aqui e agora, capaz de fecundar com amor autêntico tanto a esfera familiar quanto as relações sociais e entre as nações.

Não há salvação sem a mulher, a Igreja é a mulher 

A contemplação da Virgem oferecida pelo Papa a torna particularmente próxima e familiar. Maria, Francisco nos lembra, teve uma infância que não é contada nos textos sagrados. E, no entanto, nesse mesmo anonimato - que nos Evangelhos dá lugar à sugestão de uma vida rica em fé, humilde e simples, toda harmonia e candura - o reflexo do amor de Deus floresce e se irradia muito além do desconhecido vilarejo de Nazaré. É “uma flor que cresceu sem ser notada”. Uma filha de “coração puro” com o “perfume da santidade”. A vida de Maria é uma doação contínua. Como esposa, é definida como “serva do Senhor”; mas aqui o Papa faz questão de esclarecer: “serva” não no sentido de “subjugada” e “humilhada”, mas de uma pessoa “confiável”, “estimada”, a quem o Senhor confia os tesouros mais preciosos e as missões mais importantes. E mais uma ênfase, acrescentada pelo Pontífice:

O Concílio diz o seguinte: Deus escolheu Maria, escolheu uma mulher como companheira para o seu projeto de salvação. Não há salvação sem a mulher, porque a Igreja também é mulher.

A Imaculada Conceição não é uma doutrina abstrata ou um ideal impossível

A maternidade de Maria, que se tornou a característica que mais interessou aos artistas na história da Igreja, sugere uma generatividade que está totalmente atenta à exaltação do outro, o Filho. Com um coração livre de pecado, dócil à ação do Espírito Santo. A fecundidade da Imaculada, observa o Papa, é bonita precisamente porque ela sabe morrer para dar vida, “em seu esquecer-se de si mesma para cuidar daqueles que, pequenos e indefesos, a Ela se agarram”. Entretanto, é uma figura que encarna uma beleza que não é muito alta, inatingível. 

A Imaculada, portanto, não é um mito, uma doutrina abstrata ou um ideal impossível: é a proposta de um bonito e concreto projeto, o modelo plenamente realizado de nossa humanidade, por meio do qual, pela graça de Deus, todos nós podemos contribuir para mudar o nosso mundo para melhor.

A beleza de Maria salva o mundo da autossuficiência

A beleza de Maria é uma beleza “que salva o mundo” e, portanto, deve nos conquistar e nos converter, espera o Sucessor de Pedro. Uma beleza em que as famílias são um espaço de verdadeira partilha e em que os pais estão “presentes em carne e osso junto dos filhos”. Se esse estilo for internalizado, poderão surgir atitudes de abertura, solidariedade, empatia e harmonia, afetando todas as áreas da vida que, com muita frequência, são condicionadas por pretensões de autossuficiência. É essa preocupação em “ser como Deus”, diz o Papa, que continua a ferir a humanidade e não gera nem amor nem felicidade.

De que serve o dinheiro se metade do mundo morre?

Ele prossegue listando uma série de situações críticas: “quem exalta como uma conquista a rejeição de qualquer vínculo estável e duradouro, concretamente não fomenta liberdade. Aqueles que não respeitam o pai e a mãe, que não querem ter filhos, que consideram os outros como um objeto ou um incômodo, que avaliam a partilha como uma perda e a solidariedade como um empobrecimento, não espalham alegria nem futuro”. Em seguida, o Pontífice faz algumas perguntas, provocações que analisam algumas contradições óbvias nas sociedades contemporâneas:

De que serve o dinheiro no banco, o conforto nos apartamentos, as falsas “amizades” do mundo virtual, se os corações permanecem frios, vazios, fechados? De que adiantam os altos níveis de crescimento econômico dos países privilegiados, se metade do mundo morre de fome e de guerra, e outros ainda observam com indiferença? De que adianta viajar pelo mundo inteiro, se cada encontro é reduzido à emoção de um momento, a uma fotografia que, em alguns dias ou meses, ninguém se lembrará mais?

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

sábado, 7 de dezembro de 2024

Papa aos novos cardeais: não ceder à competição corrosiva, mas construir a unidade

Consistório para a criação dos 21 cardeais (Vatican News)

Na Basílica de São Pedro, Francisco presidiu o Consistório para a criação dos 21 cardeais: o convite é para que não se deixem deslumbrar pelo fascínio do prestígio, pela sedução do poder e da aparência. Para animar o serviço, recomenda Francisco, que seja sempre “a aventura do caminhar, a alegria de encontrar os outros, o cuidado com os mais frágeis”.

Antonella Palermo - Vatican News

É o décimo Consistório do pontificado de Francisco. Na solenidade e no calor do tempo do Advento, na Basílica de São Pedro, repleta de 5.500 fiéis, foram criados 21 cardeais. Desde o início do rito, a palavra “unidade” é recorrente. Nós a encontramos na homilia, bem como nas palavras introdutórias de homenagem e agradecimento pronunciadas pela pessoa mais idosa a receber o cardinalato, o ex-núncio apostólico Angelo Acerbi, de 99 anos, que lembra precisamente a necessidade de “caminhar juntos”, expressa no recente Sínodo, como o caminho a ser seguido. Ele falou do desejo comum de paz em um mundo desfigurado por desigualdades, guerras e pobreza, e acrescentou que a Encíclica Dilexit nos é “uma fonte de inspiração especial para o trabalho pastoral que cada um dos novos cardeais é chamado a realizar no seu próprio âmbito”. Na homilia, o Papa reiterou um dos pilares do seu magistério: não perseguir os primeiros lugares, mas cultivar a humildade e a fraternidade. 

Não se deslumbrar pela sedução do prestígio

Nosso coração é uma “miscelânea”, lembra o Papa citando Manzoni em "Os Noivos". Ele se refere à atitude dos discípulos, não imunes a cedências, fragilidades, desorientações, infidelidades, mal-entendidos. Enquanto, de fato, Jesus está em um caminho cansativo, em subida, que o levará ao Calvário, lembra Francisco, eles pensam na estrada suave, em descida, do Messias vitorioso. Esse é um dos grandes mal-entendidos do seguimento de Cristo, do qual devemos nos tornar “humildemente conscientes”. 

Isso também pode acontecer conosco: que nosso coração se perca pelo caminho, deixando-se deslumbrar pelo fascínio do prestígio, pela sedução do poder, por um entusiasmo demasiado humano pelo Senhor. Por isso é importante olhar para o nosso interior, colocar-nos humildemente diante de Deus e honestamente diante de nós mesmos, e nos perguntar: Para onde está indo o meu coração? Em que direção ele está se movendo? Talvez esteja indo na direção errada?

Retornar ao coração, a dobradiça sendo Jesus

É o “retorno ao coração” recomendado por Santo Agostinho, também citado pelo Papa. Esse retorno ao que é essencial, profundo, verdadeiramente necessário. Porque muitas vezes acontece que confundimos os planos, considerando essencial o que não é. Com uma metáfora adequada, o Pontífice se refere à imagem da “dobradiça” de uma porta: o suporte, o centro de gravidade no qual confiar a própria vida deve permanecer Cristo.

Hoje, especialmente para vós, caros irmãos que recebeis o cardinalato, eu gostaria de dizer: tende o cuidado de caminhar na estrada de Jesus. O que isso significa? Caminhar na estrada de Jesus significa, antes de tudo, voltar para Ele e recolocá-Lo no centro de tudo. Na vida espiritual, assim como na vida pastoral, às vezes corremos o risco de nos concentrarmos naquilo que é acessório, esquecendo-nos do essencial.

Caminhar pelas ruas, encontrando o próximo

O Papa continua a declinar as formas de imitar Jesus, colocando-o em seu caminho: curando as feridas do homem, aliviando os fardos de seu coração, removendo as pedras do pecado e quebrando as correntes da escravidão. O cardinalato, insiste o Sucessor de Pedro, não é o isolamento, mas a imersão contínua na vida das pessoas, em suas lutas e feridas, em seus desencantos. O próprio Pe. Mazzolari, de quem o Papa se lembra, falou da necessidade de andar pelas ruas, de uma ação livre e sem filtros: isso ainda é necessário hoje, diz Francisco. "Não esqueçamos que o cansaço estraga o coração e a água cansada é a primeira a se corromper", acrescenta o Papa.

“A aventura do caminhar, a alegria de encontrar os outros, o cuidado com os mais frágeis: isso deve animar o vosso serviço como cardeais.”

Buscar a unidade, não os primeiros lugares

No grupo de discípulos, “a traça da competição destrói a unidade”, continua o Papa. Os cardeais são convidados a não cair nessa tentação, mas a derrubar os muros da inimizade, animados por aquele ardor na busca da unidade que era tão caro a São Paulo VI. Esse é o espírito que faz a diferença, conclui ele, em um mundo marcado pela “competição corrosiva”, em uma sociedade dominada pela obsessão das aparências e pela busca dos primeiros lugares.

Portanto, lançando seu olhar sobre vocês, que vêm de diferentes histórias e culturas e representam a catolicidade da Igreja, o Senhor os chama a serem testemunhas, testemunhas da fraternidade, os chama a serem artesãos da comunhão e construtores da unidade. E essa é a missão de vocês!

Com a criação dos novos 21 cardeais, o Colégio de Cardeais agora é composto por 253 cardeais, dos quais 140 são eleitores e 113 são não eleitores. 

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Santo Ambrósio

Santo Ambrósio (Templário de Maria)
07 de dezembro
Localização: Alemanha (Trèves)
Santo Ambrósio, Bispo e doutor da Igreja (339-397)

Conselheiro e pai espiritual de três imperadores romanos, Graciano, Valentiniano II e Teodósio I, Ambrósio é o símbolo da Igreja nascente, após os sofridos anos de perseguições e vida escondida. Foi graças à sua atuação que a Igreja de Roma conseguiu tratar com o poder público sem servilismo.

Tanto que Ambrósio chegou a repreender asperamente o imperador Teodósio I, obrigando-o a fazer uma penitência pública por ter massacrado a população da Tessalônica para conter uma revolta. A sua figura representa o ideal de bispo pastor, que se deve impor como símbolo de liberdade e de pacificação para o Povo de Deus.

Nasceu em Trèves, atual Alemanha, por volta do ano 339. Era de família cristã: seu pai era alto funcionário do Império Romano, governador de uma província do outro lado dos Alpes, no norte da Itália. Quando o pai morreu, a família foi para Roma, onde Ambrósio estudou direito, retórica e iniciou sua carreira jurídica.

Certa vez, estava em Milão quando o bispo morreu. Bom jurista e funcionário imperial, procurou evitar um conflito nas novas eleições eclesiásticas com um discurso firme e muito sensato. Foi tão sereno e equilibrado que, ao final, a assembleia o aclamou o novo bispo de Milão. Muito surpreso, recusou, dizendo que essa não era a sua intenção, até porque era um pecador, e não era ainda batizado, ainda se preparava para esse sacramento. Mas não adiantou. Logo foi batizado e consagrado.

Desde então, dedicou-se com afinco ao estudo das Sagradas Escrituras. Não era intelectual, mas suas obras litúrgicas, comentários sobre as Escrituras e tratados ascético-morais o fizeram especialista da doutrina cristã e da arte de administrar a comunidade cristã a ele confiada.

A marca do seu apostolado foi impressa pela importância que deu aos valores da virgindade de Maria e dos mártires de Cristo. Considerado o pai da liturgia ambrosiana, recebeu com mérito o título de doutor da Igreja.

Os livros de sua autoria que chegaram até nós são, quase todos, a reprodução de suas pregações e sermões. Agostinho, convertido por ele e um dos seus ouvintes frequentes, conta que o prestígio dos sermões do bispo Ambrósio de Milão era enorme, graças ao eficaz tom de voz e sua eloquência com a escolha das palavras. Por isso foi chamado de ‘o apóstolo da amizade’.

Morreu em Milão, em 4 de abril de 397, uma Sexta-Feira Santa. Santo Ambrósio é venerado no dia 7 de dezembro, data em que, no ano 374, foi aclamado pela população bispo de Milão.

Texto: Paulinas Internet

Santo Ambrósio: Destemido defensor da Igreja

Aclamado pelo povo, admirado por Santo Agostinho, este “insigne pregador e piedoso Prelado” não receou enfrentar sequer o próprio Imperador.

Aclamado pelo povo, admirado por Santo Agostinho, este “insigne pregador e piedoso Prelado” não receou enfrentar sequer o próprio Imperador.

Luiz Francisco Beccari

De importante família romana, Ambrósio nasceu em 340, na Gália, da qual seu pai era governador. Ainda jovem, viu sua irmã, Santa Marcelina, beijar a mão de um Bispo e deu-lhe a sua a beijar, dizendo: “Também eu serei Bispo um dia”.

Estudou direito e retórica em Roma, e fez brilhante carreira: Advogado Consular, Conselheiro do Imperador e Governador das províncias de Emília e Ligúria, com sede em Milão.

Uma singular eleição

No ano 374, morreu o Bispo dessa cidade. Para eleger seu sucessor, a população se dividiu em dois partidos.

Santo Ambrósio (Arautos do Evangelho)

Os católicos queriam eleger um homem fiel ao Papa, os arianos propugnavam por um sequaz de Ario. A exaltação dos ânimos ameaçava degenerar em guerra civil. O Governador Ambrósio viu-se obrigado a intervir para manter a ordem.

Dispôs suas tropas na praça e fez cessar o tumulto. Em seguida, acompanhado de uma escolta, entrou na Catedral para garantir o bom andamento da eleição. Graças à sua eficaz ação, logo se acalmaram os ânimos exaltados.

Então ele postou-se em lugar bem visível a todos os presentes, com olhar vigilante sobre a assembleia. Nesse momento, ouviram-se uns brados partidos do fundo do grandioso templo: – Ambrosius episcopus! (Ambrósio seja o Bispo!) Como surgiu essa surpreendente aclamação? Um menino, tão novo que ainda não sabia falar, foi quem deu o primeiro brado. Altamente admirada de ver o filho pronunciar suas primeiras palavras – e que palavras! – a mãe fez coro com ele, e logo se lhes juntaram outras vozes. Em pouco tempo, todos na Catedral, inclusive os arianos, bradavam em uníssono: – Ambrosius episcopus! Ambrosius episcopus! – Sou um pecador! Sou um pecador! – replicava o Governador.
– Não importa, não importa! Invocamos sobre nós os teus pecados! – gritava o povo, a uma só voz.

Ante essa inesperada manifestação, aquela autoridade do maior império do mundo não encontrou outra saída senão o recurso dos indefesos: fugiu e foi esconder-se no sítio de um amigo.  Os cristãos milaneses não desistiram.

Enviaram uma delegação para relatar a Valentiniano I o que havia acontecido e rogar-lhe autorização para o Governador Ambrósio ser sagrado Bispo.

O Imperador consentiu, reconhecendo no eleito um verdadeiro “enviado de Deus”. À vista disso, o amigo de Ambrósio indicou o lugar onde ele se encontrava. Reconduzido a Milão, o Santo acabou por reconhecer naqueles acontecimentos a vontade de Deus.

De catecúmeno a Bispo, em oito dias

O Bispo recém-eleito tinha 34 anos de idade e pertencia a uma família cristã, mas era apenas catecúmeno.

Foi batizado, recebeu a ordenação sacerdotal logo em seguida e, oito dias depois, foi sagrado Bispo, a 7 de dezembro de 374. O clero e fiéis de todo o Império acolheram com indizível júbilo a notícia dessa prodigiosa intervenção divina.

Não é difícil, sob impulso do Espírito Santo, ordenar um Bispo apenas oito dias após seu Batismo. Mas como, num curto tempo, transformar em pastor de almas um homem que, uma semana antes, era ainda catecúmeno? Pergunta interessante para se ver como a graça divina, quando bem correspondida, opera maravilhas.

Ambrósio era rico, mas não apegado à riqueza deste mundo. Doou para a Igreja as terras que herdara. Quanto aos outros bens, distribuiu parte aos pobres, dando à Igreja o restante. Altos cargos no governo imperial, posição social brilhante, vida familiar – tudo isto ele sacrificou para se ocupar somente do serviço de Deus.

Assim desembaraçado de qualquer preocupação terrena, o novo Bispo aplicou-se ao estudo das Sagradas Escrituras e dos autores eclesiásticos, sobretudo São Basílio. À medida que estudava, fazia pregações. Apenas três anos haviam decorrido, e já ele inaugurava – com a publicação dos livros “As Virgens” e “As viúvas” – a prodigiosa atividade de escritor que lhe valeu os títulos de Doutor e Padre da Igreja. Em breve tempo, ele brilhava no mundo cristão como o campeão da luta contra o arianismo, muito forte naquela época, e os restos do antigo paganismo. Triunfou sobre ambos, impondo silêncio à heresia e conquistando a Itália inteira para a Fé Católica.

Tinha sempre presente sua alta responsabilidade na escolha dos candidatos ao sacerdócio. Por seu espírito de vigilância nesta matéria, adquiriu uma aguda capacidade de discernir quem estava apto ou não a ser admitido à recepção da sagrada Ordem. Por exemplo, pelo simples modo de andar, ele podia recusar um pretendente, pois dizia estar persuadido de que os movimentos desregrados do corpo são efeito do desregramento da alma.

Confronto com o Imperador

Teodósio I, o Grande, ascendeu ao trono imperial em 379.

No ano seguinte, declarou o Cristianismo religião do Estado e proibiu os cultos pagãos. Entretanto, embora muito amigos, não deixou de haver certas divergências entre o Bispo e o Imperador, um propugnando pela inteira independência da Igreja, outro, pela do Estado.

Durante uma rebelião no ano 390, foi assassinado em Tessalônica o comandante militar local. Por excitação de um camareiro intrigante, Teodósio decretou terrível vingança contra os habitantes dessa cidade. Sem distinguir inocentes de culpados, sem mesmo tomar em consideração idade e sexo, as tropas imperiais massacraram sete mil pessoas.

Um clamor de indignação ressoou por todo o Império. Não podendo calar- se ante essa atrocidade criminosa, o Bispo – com solicitude de amigo e respeito de súdito, mas também com firmeza de representante de Deus – admoestou o Soberano de que nenhum sacerdote de sua Diocese lhe daria a absolvição. E, recordando-lhe o exemplo do Rei Davi, o exortou a fazer sincera penitência.

Como para mostrar que ninguém tinha direito de vituperar-lhe o procedimento, o Imperador se dirigiu à igreja com grande aparato, segundo o costume.

À porta do recinto sagrado, Ambrósio barrou-lhe a entrada: “Vejo que por desgraça, ó Imperador, não medes a gravidade do fato sanguinário ordenado por ti (…) Não acrescentes um novo crime ao que já te pesa. Retira-te e submete-te à penitência que Deus te impõe. Já que imitaste David no crime, imita-o também na penitência!” Com lágrimas nos olhos, o Imperador retirou-se. Oito meses se passaram sem ele se apresentar na igreja, nem o Bispo no palácio.

Por fim, porém, a Fé triunfou sobre o orgulho. Na manhã do dia de Natal, banhado em lágrimas, o Imperador disse a seu camareiro: “Não sentes minha desdita? A Igreja de Deus está aberta até para os escravos e mendigos; porém, para o Imperador está fechada e com ela a porta do Céu, pois Cristo disse: ‘O que atares na terra será atado no Céu'”.

Decidido a obter o perdão de Deus, dirigiu-se à igreja, onde o esperava Santo Ambrósio, de pé no alto da escadaria.

– Aqui estou, livra-me do meu pecado – rogou.

– Onde está tua penitência? – perguntou o Santo.

– Suplico-te que me livres desta pena, em consideração da clemência de nossa Mãe a Igreja. Não me feches a porta, dize-me o que hei de fazer.

A decisão de Ambrósio mostra o incansável esforço da Santa Igreja para abrandar os costumes pagãos. Exigiu de Teodósio a promulgação de uma lei determinando que as sentenças de morte e de confisco não seriam executadas antes de 30 dias, e deveriam ser reapresentadas ao Imperador para sua confirmação.

Teodósio fez escrever e assinou imediatamente o decreto. Ato contínuo, recebeu a absolvição.

“Agradavam-lhe mais as repreensões que as adulações”

Despojando-se dos ornamentos imperiais, Teodósio entrou na igreja e, prostrado no chão, recitou o salmo de Davi: “Minha alma está atada à terra; dai-me, Senhor, a vida, segundo a vossa palavra!” Assim orando, arrancava os cabelos, inundava de lágrimas o pavimento e implorava, cheio de dor: “Misericórdia, ó Senhor, misericórdia!” A cena não podia ser mais grandiosa.

Diante de tanta humildade, o povo suplicava e chorava com o Imperador.

Cinco anos depois, chegado o momento de comparecer perante o Tribunal de Deus, Teodósio clamou pela presença de seu amigo Ambrósio, de cujas mãos recebeu os últimos Sacramentos antes de falecer.

Em sua célebre oração fúnebre, testemunhou o santo Bispo a respeito dele: “Eu amava este varão, porque lhe agradavam mais as repreensões que as adulações. Como Imperador, não se envergonhou da penitência pública, e depois chorou seu pecado todos os dias que lhe restaram”.

A conversão de Santo Agostinho

Era tal o poder de irradiação do Bispo Ambrósio, que a rainha dos marcomanos (povo antigo da Germânia), chamada Fretigila, apenas por ter ouvido um cristão falar a respeito de sua ciência e santidade, acreditou em Jesus Cristo e enviou embaixadores a Milão, rogando ao Santo que lhe informasse por escrito o que devia crer.

Uma dama de alta estirpe insistiu com o Santo para ir celebrar Missa em sua casa. Uma mulher paralítica fez-se transportar até lá, tocou na veste episcopal e, instantaneamente curada, levantou-se e se pôs a andar, na presença de todos.

Outros milagres operou nosso Santo, ainda em vida. Porém, a mais preciosa pedra de sua coroa de glória é a conversão de Santo Agostinho, um dos homens mais inteligentes e cultos de todos os tempos, coluna da Santa Igreja.

Com cerca de 30 anos, o futuro Bispo de Hipona foi levado por Santa Mônica a relacionar-se com Santo Ambrósio. De início hostil à Fé Católica, por causa de más influências dos maniqueus, Agostinho era, entretanto, admirador da cultura e da suave eloquência do Bispo de Milão. Gostava não somente de ouvir seus sermões, mas também de passar horas inteiras em seu gabinete, em silêncio, vendo esse homem de Deus trabalhar ou estudar.

Não sem grande dose de sagacidade, Ambrósio desfez na mente de seu ouvinte os maléficos sofismas da seita maniqueísta. Quem lê as Confissões, é levado a conjeturar que o grande pregador adaptava suas palavras às dúvidas de Agostinho, quando notava sua presença na igreja. Este narra, inclusive, que ele “muitas vezes, vendo-me quando pregava, prorrompia em louvores a ela [Santa Mônica] e me chamava ditoso por ser filho de tal mãe”.

Convertido, Santo Agostinho não esconde seu entusiasmo por Santo Ambrósio. “Insigne pregador e piedoso Prelado”, homem cujas palavras eram “fonte de água que corria para a vida eterna”, “santo Bispo” – são expressões usadas por ele ao referir-se àquele que o batizou na vigília da Páscoa de 387.

Em resumo, ele considerava Santo Ambrósio o arquétipo do Bispo católico. Opinião confirmada pelo Missal Romano, onde se lê que ele “representa a figura ideal do Bispo”. Onde encontrar testemunho mais elogioso, mais credenciado e mais insuspeito?

A recompensa

Em 4 de abril de 397, o Divino Redentor chamou seu servo para receber no Céu a recompensa por sua vida de fidelidade e combates em defesa da Fé. No início desse ano, antes de ser atingido pela mortal doença, predisse que tinha pouco tempo de permanência neste mundo, pois viveria só até a Páscoa.

Estando já prostrado no leito de morte, alguns diáconos conversavam no fundo do aposento, levantando hipóteses sobre quem seria seu sucessor.

Um deles mencionou o nome de Simpliciano.

Não se sabe como, o Santo ouviu e aprovou: “É muito velho, mas é ótimo!” Pouco depois disto, enquanto ele rezava em voz baixa, apareceu-lhe Jesus Cristo com o rosto belíssimo. Após cinco horas de oração com os braços em forma de cruz, Santo Honorato, Bispo de Arles, foi chamado para dar-lhe o viático. Logo que o recebeu, entregou sua alma a Deus.

(Revista Arautos do Evangelho, Dez/2004, n. 36, p. 34 a 37)

Fonte: https://templariodemaria.com/

Notre-Dame de Paris, onde as pedras falam da beleza da fé

Notre-Dame de Paris (Vatican News)

A reabertura no dia 7 de dezembro já faz parte da história centenária da catedral parisiense. Para além da solenidade das cerimônias inaugurais que a Igreja de Paris deseja necessariamente que sejam humildes e radiantes, a restauração material permite-nos regressar à essência de Notre-Dame: à sua natureza, à sua identidade, à sua forma de existir. O filósofo das religiões Roger Pouivet: “A restauração religiosa é central”.

https://youtu.be/isdfBNWKM4k

Delphine Allaire - Città del Vaticano

“Uma verdadeira ação de graças e um ato de fé. Não olhe apenas para as pedras magníficas. Não se esqueça que este é um presente de Deus e um presente para Deus. Assim, dom Laurent Ulrich, arcebispo de Paris, comentou à Rádio Vaticano o trabalho de restauração e reconstrução da emblemática catedral de Paris, poucas semanas antes da sua reabertura.

Notre-Dame de Paris (Vatican News)

No limiar deste momento, a reflexão filosófica sobre a identidade da catedral, no necessário entrelaçamento entre cultura e patrimônio, essencial ao seu renascimento cinco anos após a tragédia do incêndio, o que permitiu a verdadeira proeza material, técnica e artística de reabrir em cinco anos a centenária catedral e realçar uma catedral de fé, vocação original e perpétua deste lugar onde cada pedra tem uma alma.

A Rádio Vaticano conversou com o filósofo e pensador Roger Pouivet, professor emérito da Universidade de Lorena, autor em março de 2022 da obra «Du mode d'existence de Notre-Dame. Philosophie de l’art, religion et restauration» (“Sobre o modo de existência de Notre-Dame. Filosofia da arte, religião e restauração”), publicado pela Editions du Cerf. Ele foi o editor francês do European Journal for Philosophy of Religion.

Conseguir manter a essência espiritual de um lugar, por meio de um sábio diálogo entre fé e arquitetura, é um desafio recorrente nos processos de restauração do patrimônio?

Uma obra de arte como Notre-Dame é caracterizada por aquilo que significa. A inteligibilidade da fé, isto é, o que podemos compreender da fé cristã, está em jogo numa visita à catedral. Para que Notre-Dame seja sempre a mesma, o visitante deve ser confrontado com o mesmo significado e a mesma espiritualidade. Uma restauração física bem feita permite isso, mas não é suficiente. Deve haver uma certa ideia do que veremos, um discurso adequado e adaptado sobre o que vemos e o que é. Fazer com que Notre-Dame funcione como o objeto que é, um lugar que pretende fazer-nos compreender algo da fé através da sua própria forma, das estátuas, das pinturas e dos vitrais que contém. Além de uma restauração material, é uma verdadeira questão ontológica.

Como conseguir conjugar a quantidade certa de patrimônio, necessário e desejável, sem que este dilua a existência espiritual do lugar?

É muito difícil, porque você tem que fazer tudo de uma vez. Por um lado, a restauração de Notre-Dame é a de uma Meca do turismo internacional parisiense, uma espécie de patrimônio nacional com o qual a França e os franceses se identificam. Mas tudo isto é um pouco externo ao que é Notre-Dame, ou melhor, é algo que se acrescenta e pode impedir que Notre-Dame seja sempre o que é, ou seja, uma catedral de fé. É necessário que se possa fazer a restauração de um monumento nacional, mas sem transformar a catedral num fac-símile ou num monumento de turismo internacional. Este é o risco de restauração, mas neste caso é amplamente evitado. Não foi uma conclusão precipitada e podemos esperar que, uma vez passadas as grandes cerimônias, teremos mais uma vez a Notre-Dame, que é algo diferente de um monumento, um elemento de patrimônio ou um objeto turístico.

Esta emoção, que diz respeito apenas ao patrimônio artístico, e o espírito de comunhão que dele derivou nos últimos cinco anos, testemunham, na sua opinião, o sinal de unidade e de união que a catedral encarna?

É claro que o entusiasmo em torno de Notre-Dame e a emoção real e internacional sentida por aqueles que a viram queimar são uma prova de algo. É natural dar grande importância à conclusão desta restauração e ao seu sucesso do ponto de vista da história da arte e do trabalho de restauração. Mas existe sempre o risco de que a restauração transforme uma catedral em um monumento. Devemos, portanto, insistir também na dimensão estritamente religiosa, na alma do prédio. Notre-Dame é diferente do Louvre e do Palácio de Versalhes.

Como podemos ver a restauração à luz de uma retomada espiritual? Muitas pessoas veem o incêndio, a restauração e a reabertura como um sinal inegável de fé. Como esta visão pode ser realizada e como pode ser perpetuada espiritualmente?

Devemos enfatizar o que Notre-Dame significa e o que a faz funcionar do ponto de vista estético. Não é simplesmente uma obra arquitetônica de sucesso, mas tem um significado religioso que os seus visitantes devem compreender. Deve ser também, de certo modo, a restauração da fé e da vida cristã. É uma arquitetura que só pode continuar a ser o que é em uma condição estritamente religiosa e até teológica.

“Notre-Dame é uma espécie de somatório teológico arquitetônico, sob a forma de um prédio. É feito de pedras em vez de palavras latinas.”

Qual é a condição teológica de Notre-Dame?

Do ponto de vista teológico, a catedral é de considerável importância. Um historiador de arte alemão do início do século XX, Erwin Panofsky, um eminente iconologista, escreveu um livro intitulado “Arquitetura Gótica e Pensamento Escolástico”. Nele ele fala de Notre-Dame e demonstra que as grandes catedrais góticas têm a mesma função do pensamento escolástico, ou seja, a forma como a teologia, a partir dos séculos XI e XII e durante dois ou três séculos subsequentes, foi constituída através da Summa e, por exemplo, a Summa Theologica de São Tomás. Num certo sentido, Notre-Dame é uma espécie de summa teológica arquitetônica em forma de prédio. É feita de pedra e não de palavras latinas. Não se dirige exatamente da mesma forma a quem o visita e a quem lê a Summa Theologica, mas tem a mesma função de tornar a fé inteligível. Esse recurso deve retornar com a restauração. A restauração de Notre-Dame será um momento importante para a fé.

Como podemos explicar a transcendência muitas vezes emanada das pedras?

A elevação espiritual não pode ser desvinculada da vida material. Ela adquire significado, para nós, nas coisas materiais. Quase poderíamos fazer uma analogia com alguém como São Tomás sobre o que somos e a catedral: somos seres materiais, mas temos algo que é razão e que é espiritual, mas que não é redutível à matéria. A catedral é uma coisa física e material, e para restaurá-la, o que temos que fazer é cortar novamente as pedras, é um assunto material, mas há algo mais a fazer reaparecer: esta espiritualidade verdadeiramente humana. Os seres humanos são corpos, mas são corpos que têm uma alma e uma alma racional, uma alma que é espiritual. A catedral funciona exatamente como um ser humano, ao mesmo tempo uma coisa material que morre, e depois como um ser que não é completamente redutível ou que não é inteiramente redutível à sua matéria. De certa forma, poderíamos dizer que Notre-Dame também tem uma alma imortal, mas que devemos conseguir fazê-la reaparecer através da restauração material.

E a evangelização por meio da beleza? A beleza da catedral pode tocar também os corações fechados à fé?

Podemos esperar que a apreciação estética de Notre-Dame seja ou possa ser a fonte de uma elevação para uma beleza espiritual e não simplesmente material. Este é o mais difícil. Evitar que Notre-Dame seja reduzida ao que podem ter sido outros monumentos arquitetônicos como as pirâmides ou o Partenon, lugares altos do turismo internacional onde o essencial se perdeu. Tudo o que resta é um testemunho de algo em que as pessoas outrora acreditaram e que levou à construção de monumentos estética e arquitetonicamente impressionantes. Existe o risco de que Notre-Dame se torne simplesmente depois da sua restauração, e já era um pouco antes, simplesmente um desses pontos altos do turismo internacional. Como podemos torná-la diferente? Restaurar a sua dimensão espiritual, ou seja, fazer com que tenha um significado para quem nele entra e algo mais do que uma simples visita durante as férias entre o Louvre e o Palácio de Versalhes. Notre-Dame é um importante lugar de fé. Nada de tudo isto depende das cerimônias de inauguração deste fim de semana. Não se trate deste momento, mas sim da forma como esta catedral restaurada continuará a ter uma verdadeira função religiosa ou se se tornará cada vez mais um monumento ou uma atração turística. Sob esta ótica, o dia 8 de dezembro não é tão decisivo como os anos vindouros. Para saber se a restauração foi bem sucedida, temos agora de esperar 50 anos. Teremos que esperar para descobrir o que acontecerá com a Notre-Dame depois que a restauração física  for realizada.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF